Desacato: o meio protetor para a não incidência do abuso de autoridade policial

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O presente trabalho tem como assunto o crime de desacato e a sua relação direta com o abuso de autoridade. Será analisado, o que vem a ser esse crime, abordando algumas diferenças em relação a outros, bem como será feita uma análise da polícia militar.


 

RESUMO

O presente trabalho tem como assunto o crime de desacato e a sua relação direta com o abuso de autoridade. Serão analisados, a partir de artigos e renomadas doutrinas o que vem a ser esse crime, abordando algumas diferenças em relação a outros, bem como será feita uma analise histórica da policial militar no Brasil, para então seja possível trazer pontos relevantes entre o abuso de autoridade policial e o desacato.

Palavras-chave: abuso de autoridade; desacato, resistência.

1 INTRODUÇÃO

                   O presente trabalho debruça-se sobre o estudo do crime de Desacato e a relação com o abuso de autoridade policial, como forma de limitar a atuação abusiva por parte do Estado. Deste modo, procura-se esclarecer o que vem a ser de fato esse crime de desacato por meio de um esclarecimento de todos os seus aspectos gerais bem como as diferenças existentes com o crime de Resistência.

Para tanto, aborda-se todo um histórico da polícia militar no Brasil, de maneira a compreender como se dá a formação dos militares em nosso país e assim buscar para que ser o trabalho policial e entender até que ponto o poder que exercem sobre a sociedade não está sendo considerado abusivo.

Observa-se, deste modo que o presente estudo visa proporcionar uma visão mais esclarecida a respeito da correlação entre a ação policial na defesa da ordem pública e a amplitude do abuso por parte deles em alguns casos. Logo, o estudo em questão faz-se importante uma vez que tem se tornado constante na sociedade a “confusão” por parte do policial em relação ao seu poder.

2 DESACATO                          

O crime de Desacato encontra-se previsto no artigo 331 do Código Penal: “Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela”. Porém, antes de compreender os seus pormenores, se faz necessário o entendimento do que vem a ser o funcionário público:

Funcionários públicos são os servidores legalmente investidos em cargos públicos da Administração Direta e sujeitos às normas do Estatuto da entidade estatal a que pertencem. O que caracteriza o funcionário público e o distingue dos demais servidores é a titularidade de um cargo criado por lei, com denominação própria, em número certo e pago pelos cofres da entidade estatal em cuja estrutura se enquadra (cargo público). Pouco importa que o cargo seja de provimento efetivo ou em comissão: investido nele, o servidor é funcionário público, sob regime estatutário, portanto (MEIRELLES, sd, p. 370)

Sendo assim, o código Penal adotou uma visão ampliada do conceito de funcionário público, com o intuito de não restringí-lo ao conceito discutido na esfera do Direito Administrativo. Então vejamos:

Art.327 - Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública. §1º - Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal. §2º - A pena será aumentada da terça parte quando os autores dos crimes previstos neste Capítulo forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo poder público (BRASIL, 2013).

Dessa forma, de acordo com Paganelli (2000), pode-se concluir que o artigo 327 mostra que não é a qualidade de funcionário que caracteriza o crime funcional, mas sim o fato de que é praticado por quem se encontra no exercício da função pública podendo ser praticada de forma temporária, remunerada, gratuita, ou se exercida profissionalmente ou não, ou ainda eventualmente.

Diante o exposto, após explanar o que vem a ser esse funcionário público, pode-se adentrar nos pormenores do crime, sendo assim, vejamos. É considerado um crime comum, ou seja, pode ser praticado por qualquer pessoa, porém existem divergências no que diz respeito quando o crime é praticado por funcionário público contra outro funcionário público.

Segundo Paganelli (2000) aqueles que defendem a impossibilidade do crime baseiam-se no fato de que o desacato se encontra no capítulo dos crimes praticados "por particulares" contra a Administração em geral, logo, o agente deve ser um "estranho". Se for funcionário público, não haverá desacato, e a infração é considerada autônoma injúria, lesão, difamação, dentre outros. Por outro lado, continua afirmando que há quem defendem a possibilidade de o crime ser praticado por funcionário público fundamentam tal posição no fato de que o funcionário, ao praticar o delito contra outro funcionário, usa dessa qualidade, equiparando-se ao particular.

Já no que diz respeito ao sujeito passivo, é ele fundamentalmente o Estado, embora há quem considere que seja também o funcionário público.

Com relação à materialidade do Delito, segundo Prado (2012), objeto material encontra-se em desacatar funcionário público, mas para melhor entendimento, Cunha (2014) traz que:

A ofensa constitutiva do desacato é qualquer palavra ou ato que redunde em vexame, humilhação, desprestígio ou irreverência ao funcionário. É a grosseira falta de acatamento, podendo consistir em palavras injuriosas, difamatórias ou caluniosas, vias de fato, agressão física, ameaças, gestos, atos obscenos, gritos agudos etc.

No tocante ao elemento subjetivo este vem a ser o dolo, tendo como consumado o delito no momento e lugar que ocorreu a prática do ato ofensivo, ou seja, a sua consumação se dá no momento em que o agente profere as palavras ofensivas na presença do ofendido. Porém aqui serão encontradas algumas divergências no que diz respeito ao animus do agente.

A primeira corrente fundamenta-se em Nélson Hungria, para quem o tipo exige dolo específico, consistente na intenção de ultrajar, no propósito de depreciar ou vexar a vítima. Entendem os que abraçam tal corrente que esse elemento subjetivo é incompatível com o estado de exaltação ou ira, o que exclui o delito... Quanto à inexigência do ânimo calmo, quem defende essa corrente entende que posição contrária é perigosa para os interesses da Justiça, uma vez que não existe acusado que não alegue exaltação de ânimo na prática do desacato. O dolo seria genérico (PAGANELLI,2000).
 

Outro ponto que pode ser destacado é no que diz respeito à embriaguez no crime de Desacato. De forma minoritária defende a irrelevância da embriaguez na aferição do elemento subjetivo, tendo então o dolo genérico, por outro lado, de acordo com Paganelli (2000) a corrente majoritária corrente que defende a relevância da embriaguez usando como fundamento para defender seu posicionamento de que o crime exige dolo específico, consistente na intenção de ultrajar, no propósito de vexar ou depreciar a vítima, sabendo o agente que o ofendido é funcionário público e se acha no exercício de sua função, ou estando consciente de que a esta se vincula a ofensa. Logo, avulta-se a incompatibilidade entre o estado de embriaguez e a exigência de tal dolo do agente, o que exclui o crime.

Por fim, e não menos importante de acordo com Prado (2012) a sua ação penal é pública incondicionada. Exclui-se, então, qualquer possibilidade de retratação. E no que diz respeito a sua tentativa há quem defenda, como Noronha (2013), que seja possível a depender do meio empregado. Assim, ele será inadmissível se vir a ocorrer injúria oral, pois se estará diante de crime unissubsistente. Ocorrerá, contudo, o conatus, em casos como por exemplo, quando alguém for impedido de agredir o servidor ou quando for impedido de atirar contra ele, entre outros casos. Por sua vez, Damásio que a atitude do sujeito ativo em exemplos como esses já configura o desacato, pois a lei pune a atitude do autor.

2.2 Diferença do crime de Resistência

Os artigos 329 e 331 do Código Penal dispõem sobre tipos que protegem o mesmo núcleo base: o funcionário público. Há uma discussão silenciosa sobre a distinção entre essas duas condutas e sua aplicabilidade e aqui nos cabe tecer maiores considerações.
                   O mero xingamento contra funcionário público vem a ser desacato. Porém, de acordo com cunha (2014) se no caso concreto, o agente xinga e emprega violência contra o funcionário público, teria cometido dois crimes, mas jurisprudência firmou entendimento que, nesse caso, o desacato fica absorvido pela resistência.

 A análise primeira do artigo 329, destaca dois núcleos: "opor-se" a "execução". Expõe com maestria o professor Fernando Capez, que o dispositivo visa proteção legal ao funcionário público, uma vez que se está não existisse, "qualquer indivíduo arvorar-se- ia no direito de insurgir-se contra funcionário pra impedir a execução de ato legítimo." A ação nuclear recai sobre ação positiva, resguardada no emprego de violência ou ameaça contra a pessoa do funcionário, sendo admitida a tentativa.
                   Impende ressaltar, que há veemente dissidência doutrinária no atinente á violência desferida contra coisas, pelo agente, durante a execução do ato legal. Parte dos estudiosos pensam haver a existência do tipo, mesmo quando praticada violência contra coisas, pois, o dano em face da coisa prejudicaria o exercício da atividade pública. O exemplo clássico é o ato ferir cavalo em que oficial de polícia esteja montando enquanto persegue criminoso fugitivo. Em que pese Nelson Hungria defender esta vertente, há quem acredite que o sujeito ativo deve responder pelo crime de dano qualificado em tais casos, desse modo, só restaria configurado o tipo penal descrito se for praticado ato contra a pessoa do agente diretamente.
                   A resistência também se perfaz mediante o emprego de considerável temor de mal grave, ameaça, à pessoa do funcionário ou a terceiro que o auxilia. Acrescenta-se, que não configura o delito em estudo a mera objeção passiva, como o ato de recusa em abrir  a porta de casa para funcionário no exercício de sua função.

                   O disposto no artigo 331 trata do delito de desacato, que, como narrado em linhas pretéritas, consiste na prática de ato ou emprego de palavras que causem vexame, humilhação à pessoa do funcionário, sendo admitida a tentativa, a depender do meio utilizado para a prática delitiva. Ao revés da resistência, pode o desacato constituir-se em palavras ou atos. Consultas como rogar pragas contra funcionário, cuspir-lhe, atirar-lhe dejetos, dizer- lhe xingamentos, fazer-lhe gestos obscenos configuram o tipo em comento. Inclusive as vias de fato desrespeitosas, como agressão física leve contra oficial de justiça, pó exemplo. Desacato é conduta mais gravosa do que a de resistência, conforme pronuncia a Colenda Turma do Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul em apelação criminal:
“APELAÇÃO CRIME. DESACATO E RESISTÊNCIA. AUTORIA E MATERIALIDADE DEMONSTRADAS. RESISTÊNCIA ABSORVIDA PELO DESACATO. CRIME DE DESACATOCARACTERIZADOIMPROVIMENTO.”
               Comprovadas, materialidade e autoria delitivas, impõe-se a manutenção da condenação pelo delito de desacato. Porém, praticados os crimes de desacato e resistência num só contexto, o crime mais grave deve absorver o de menor gravidade, impondo-se a manutenção da absolvição pelo delito de resistência. Recursos improvidos. fd(Apelação Crime Nº 70050576719, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Gaspar Marques Batista, Julgado em 21/02/2013)O crime de Resistência está presente no artigo 329 do Código Penal afirmando que: “opor-se à execução de ato legal, mediante violência ou ameaça a funcionário competente para executá-lo ou a quem lhe esteja prestando auxílio”.

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3 MODELO POLICIAL DO BRASIL

De acordo com Bretas e Rosemberg (2013), o tema da história da polícia é bastante recente na historiografia, bem como o tema também era bastante raro nas ciências sociais. Até os anos 1960, existia apenas uma historiografia, sua maioria por antigos policiais, que fora marcada por diversos elementos como, agitações raciais, estudantis etc. os quais contribuíram para dar maior visibilidade à polícia e começaram a transformá-la em um foco de interesse acadêmico.

Assim, Ribeiro (2011) afirma que como forma de compreender a polícia militar e sua formação existe a necessidade do desenvolvimento de um pequeno histórico, assim como é também conexo conhecer um pouco da origem das Forças Armadas Brasileiras. Pois por meio dessas é que é possível identificar as primeiras composições de polícias militares no Brasil, desta forma será feito um pequeno aparato sobre as Forças Armadas e as polícias desde o Império até a década de 1960.

Nos primeiros anos do Império no Brasil, existia uma polícia frágil, mas que supria os anseios daquela época, vindo a receber funções mais específicas uma organização urbana e todas as atribuições jurídicas necessárias para o funcionamento de uma polícia militar, segundo Ribeiro (2011) somente após a consolidação do Império.

Do ponto de vista acadêmico, a polícia era subsumida em grandes esquemas explicativos, onde se fazia instrumento dócil. Numa perspectiva liberal, ela fazia parte das instituições do progresso moderno, parte pouco significativa da história de um Estado que se fazia melhor, mais racional e democrático. Numa perspectiva marxista, fazia parte do arsenal repressivo, agindo sob as ordens de um Estado ou de uma burguesia opressora. A crise destes grandes modelos explicativos permite uma aproximação maior do objeto policial, mas ainda limitada pela visão profundamente negativa que o mundo universitário tinha (ou tem?) do mundo policial. As conjunturas conflituosas dos anos 1960 não ajudavam a imagem da polícia, e isto talvez de forma mais radical num país como o Brasil, sob o controle de uma ditadura militar. Meio século passado, parece possível afirmar que esse estigma policial permanece e contamina os estudiosos do tema, dedicados a um universo socialmente “baixo”, talvez socialmente relevante, mas externo às discussões culturalmente mais relevantes. (FULANO)

De acordo com Ribeiro (2011) o ponto marcante dessa consolidação da polícia militar no Brasil ocorre no momento da abdicação de Dom Pedro I e o estabelecimento do período regencial momento em que o então ministro da justiça e padre Diogo Antônio Feijó, ordena em 1831, que fossem extintos todos os corpos policiais existentes e manda criar um único corpo a Guarda Municipal de Voluntários por Provinciais, chamado de Corpo de Guardas Municipais Permanentes, que tinha como função a fiscalização da coleta de impostos.

Porém, é válido destacar que esse mesmo autor preceitua que essa Guarda não conseguiu atender às necessidades do momento e por isso ocorreu à criação da Guarda Nacional que fora representativa, pois ela aproximou alguns segmentos das elites nacionais ao controle do aparelho estatal existente no período.

Como mencionamos, o período em que a Coroa portuguesa esteve no Brasil se situa num lugar bastante específico, entre o século XVIII e o Brasil independente. É o momento em que a datação tradicional consagra a criação tanto da Intendência Geral de Polícia (1808) como da Guarda Real de Polícia (1809), ponto de fundação da Polícia brasileira. São os primeiros organismos públicos a carregarem em seu nome a concepção de polícia, nos obrigando a refletir sobre os conteúdos históricos e os nexos dessas definições. O ato de criação da Intendência, que faz referência direta a seu modelo lisboeta, propõe-se como uma transposição, assim como o de Lisboa faz referência a Paris. Seria a genealogia do que foi buscado na historiografia internacional como um “modelo francês” de polícia. Nesse momento, a ideia de polícia comporta uma visão muito mais ampla de gestão da ordem, envolvendo tarefas quemais tarde vão ser atribuídas a outros órgãos do Estado (BRETAS, ROSEMBERG, 2013, p.167)

Sendo assim, Bretas e Rosemberg (2013) concluem que essa nova polícia que começa a se constituir no Brasil a partir do Império, deveria começar a criar um corpo organizacional, ou seja, definir uma hierarquia, disciplinar seus integrantes, ou seja, tornar seu trabalho uma forma integral e assalariada.

Para esses mesmos autores, sobre a polícia, o campo possível de viabilizar pesquisas era o passado, e as primeiras pesquisas aparecem, especialmente voltadas para a polícia militar do estado de São Paulo e sua atuação como um exército local nos primeiros anos da República. São trabalhos isolados, que remetem mais a uma historiografia sobre o mando político coronelista, em que o controle da polícia era um tema central, ou seja, Nesse período, era privilegiado o espaço urbano, como o espaço do novo, muito ainda devendo ser investigado sobre o interior, onde as configurações policiais são muito diversas, entre coronéis e o banditismo

Por fim, tem-se o período pós-1930 que Ribeiro (2011) afirma que a atividade de polícia ganhou um grande destaque num momento em que a historiografia como um todo passa a privilegiar as questões políticas. Isso repete um comentário de um chefe de Polícia do Rio de Janeiro nos anos 1920, que afirmava que a atividade de polícia política fazia com que a Polícia deixasse de lado as tarefas usuais. Sendo assim, pouco se conhece sobre o policiamento no pós-1930.

Sendo assim, conclui afirmando que, a história da polícia no Brasil já possui um conjunto de referências básicas para a constituição de um campo, mas tem ainda um espaço para novas temáticas e mesmo para o preenchimento de claros de informação.

4 ABUSO DO PODER POLICIAL E O CRIME DE DESACATO

 Como já mencionado e de acordo com Noronha (2001), o bem jurídico tutelado no crime de Desacato é a dignidade e o respeito devido à função pública, em que o Estado tem interesse direto que aquele seja protegido e tutelado, por ser indispensável à atividade e à dinâmica da administração pública.

Por exemplo, se um policial, durante uma blitz, solicita que a pessoa saia do seu veículo para ser revistada, e esse cidadão se comporta de forma inadequada, respondendo de forma ofensiva, usando palavras de baixo calão, configura-se o crime citado. Assim, ela deverá ser encaminhada à delegacia para o registro do boletim de ocorrência, que, posteriormente será usado como prova durante a instrução do inquérito policial....Por outro lado, o delito de abuso de autoridade é praticado pelo servidor público, com o poder investido por seu cargo, quando ele age de forma contrária à prevista em lei, atentando contra a liberdade de locomoção do sujeito, inviolabilidade do domicílio, incolumidade física do indivíduo, entre outras condutas. Tratar o abuso de autoridade como um crime significa justamente proteger a dignidade da função pública e o correto exercício da autoridade pelo Estado, uma vez que seus agentes devem sempre atuar em prol do bem-estar comum e não visando interesses particulares e autoritários. (ALKMIM,2012)

Porém, segundo Silva (2014) o que muita das vezes acontece é que a proteção que é dada ao funcionário público acaba sendo utilizada como maneira de “maquiar” a prática do suposto delito de abuso de autoridade, ou seja, o servidor se utiliza da proteção, via desacato, para que o particular seja visto como autor, a fim de evitar que este o denuncie por abuso de autoridade.

Os agentes policiais no exercício de suas funções encontram-se sujeitos aos limites e exigências da lei. A atividade policial, por sua natureza social e situacional, possui aspectos discricionários que são essenciais para o cumprimento das funções de segurança  pública. Pela existência dessa discricionariedade a ação policial fica mais aberta, dificultando assim, diferenciar um ato policial discricionário de um ato arbitrário e contrário ao Estado Democrático de Direito (SILVA, 2014, p. 2)

Diante o exposto, faz-se necessário o entendimento do que vem a ser esse abuso de autoridade. A lei de Abuso de Autoridade (Lei nº. 4.898/65) de acordo com Paganelli (2012) tem com escopo proteger os cidadãos dos abusos praticados pelas autoridades públicas ou por seus agentes, de forma que venham a comprometer os direitos e garantias constitucionais como: liberdade de locomoção, sigilo de correspondência, inviolabilidade domiciliar, incolumidade física etc.

Conforme exposto no Art. 5 da Lei 4.898/65 “Considera-se autoridade, para os efeitos desta lei, quem exerce cargo, emprego ou função pública, de natureza civil, ou militar, ainda que transitoriamente e sem remuneração”. Logo, percebe-se que o policial exerce cargo público e caso se exceda durante a sua atividade pública, ele poderá sofrer sansões.

Sendo assim, como bem afirma Silva (2014) o que se busca é evitar o desrespeito de uma das partes possa influir a mesma atitude pela outra parte, de maneira que pode vir a atingir os direitos fundamentais da pessoa humana e a imagem da administração pública, principalmente no que diz respeito à conduta por parte do poder público.

Logo, pode-se perceber que o crime de desacato é mais aplicado do que o abuso de autoridade contra o cidadão, sendo utilizado como meio protetor da não incidência deste. Pois a questão da violência é já cultural no Brasil, ou seja, está relacionada com a própria formação do Estado brasileiro.

Embora a transição para ao Estado democrático de direito tenha contribuído para a minimização da violência policial no Brasil, as deficiências da democracia brasileira, a desigualdade social e econômica, a persistência de uma cultura da violência e a percepção midiática que é constantemente repassada à sociedade brasileira, contribuem para o insucesso de qualquer estratégia de controle da violência policial e combate à criminalidade. (SILVA, 2014, p.3)

Ainda segundo Meireles (2007, p.84) “No Brasil prevalece o entendimento limitado de que polícia corre atrás de ladrão e prende ladrão”. Por isso, se faz necessário também que a própria sociedade se desprenda da concepção que possui acerca da polícia que geralmente está voltada ao período ditatorial e perceba-a pela sua nova roupagem.

Os agentes policiais no exercício de suas funções encontram-se sujeitos ao limites da lei. A atividade policial possui aspectos discricionários, que são essenciais para o cumprimento das funções de segurança pública. O ato de polícia  como  ato  administrativo  que  é fica sempre sujeito a invalidação pelo Poder Judiciário, quando praticado com excesso ou desvio de poder (MEIRELLES,2007).

Por fim, pode-se compreender então que A atividade policial encontra-se sujeita aos limites da lei, e seus agentes que sem necessidade ultrapassam os limites estabelecidos ficam sujeitos a processos criminais e disciplinares. O ato abusivo praticado pelas forças policiais traz como conseqüência a obrigação do Estado em indenizar o particular pelo dano suportado, como bem preceitua Silva (2014).

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do exposto no decorrer do trabalho, tornou-se possível perceber todos os pormenores presentes no crime de Desacato, bem como as questões relacionadas ao abuso de autoridade, de maneira a tentar explicar qual a relação que existe entre os dois no dia a dia da sociedade brasileira.

Demonstrou-se no primeiro capítulo o que é o crime de Desacato e quem são as pessoas que atuam de forma ativa, bem como aqueles que se manifestam de forma passiva diante desse crime, o que levou ao entendimento do que vem a ser um funcionário público e que a autoridade policial se enquadra como um deles.

Se fez necessário o estudo da historiografia da policia militar no Brasil para perceber-se que a questão da violência por parte dos policiais não é algo recente, mas sim que esse abuso sempre esteve presente na história da policia.

Por fim, chegou-se ao ápice do trabalho quando foi exposta a maneira como o crime de desacato costuma ser aplicado, assim como o abuso de autoridade policial, chegando então a conclusão de que muitas vezes o que acontece é que o funcionário público se utiliza do crime de Desacato como maneira de “maquiar” o abuso de autoridade cometido por eles.

REFERÊNCIAS

ALKMIM, Paulo Vaz. Abuso de autoridade e Desacato. Disponível em: <http://www.aopmbm.org.br/aopmbm-em-acao/vale-a-pena-ler-de-novo/401-abuso-de-autoridade-e-desacato >. Acesso em 10. maio. 2015.

CUNHA, Rogério Sanches. Direito Penal: Parte Especial. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014

BRASIL. Código Civil. Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. In: VadeMecum Compacto, 9ed, São Paulo: Saraiva, 2013.

BRETAS, Marcos Luiz; ROSEMBERG, André. A história da polícia no Brasil: balanço e perspectivas. Disponível em: <http://www.revistatopoi.org/números anteriores/topoi26/ TOPOI26 2013 TOPOI 26 E01.pdf>. Acesso em: 22 abr. 2015.

CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. 11. Ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

Meirelles, Hely Lopes - Direito Administrativo Brasileiro, 6  Ed. Revista dos Tribunais,2007

PRADO, Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro. 11. Ed. São Paulo: RT, 2012, v. 2.

PAGANELLI, Wilson. Desacato (art.331 do Código Penal)Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 5, n 44, ago.2000. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/997>. Acesso em: 24 abr.2015.

RIBEIRO, Lucas Cabral. História das polícias militares no Brasil e da brigada militar no rio Grande do Sul. São Paulo. 2011. Disponível em: <http://www.snh2011.anpuh.org/resources/anais/14/1313022007ARQUIVOtextoANPUH.pdf> Acesso em: 24 abr. 2015.

SILVA, Valdeonne Dias da. Abordagem policial e abuso de autoridade em busca pessoal. In: Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 19, n. 3963, 8 maio. 2014. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/28050>. Acesso em: 22 abr. 2015.

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