A lesão e a rescindibilidade do negócio jurídico

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19/06/2017 às 17:20
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O artigo discute o instituto, diante da doutrina brasileira.

I –  OS ELEMENTOS DO NEGOCIO JURÍDICO   E OS VICIOS DE VONTADE

a) O CONCEITO DE NEGÓCIO JURIDICO E OS SEUS ELEMENTOS 

Negócio jurídico (art. 104 até o 184 do CC) é uma manifestação de vontade humana que está de acordo com o ordenamento jurídico que produz efeitos jurídicos "ex voluntate", ou seja, que estão de acordo com a vontade das partes. Aliás o ato jurídico em sentido estrito que também está de acordo com o ordenamento jurídico,(strictu sensu) a eficácia é "ex lege", ou seja, a eficácia vem da lei, não produzindo os efeitos da mesma maneira que os negócios jurídicos.

Pontes de Miranda(Tratado de direito privado) estabelecia três planos para o negócio jurídico. Assim, devemos observar se primeiro o negócio jurídico existe, depois se ele tem validade e depois se ele possui alguma eficácia. 

Assim com a presença de seus elementos essenciais e acidentais temos a existência do negócio jurídico; passa-se ao campo da validade, de modo a verificar se há vícios próprios do negócio jurídico, a verificar se há nulidade ou anulabilidade(será o caso de analisar se há incapacidade da parte ou das partes  para o negócio, vício de forma, falta de motivo, de causa, de objeto, de boa fé e ainda  erro, dolo, coação, simulação) e, por fim, há o que se tem como campo da eficácia, num terceiro momento.

 Há elementos essenciais para o negócio jurídico e há elementos acidentais.

vontade que é manifestação do consentimento das partes para a realização do negócio jurídico é um dos elementos essenciais. 


Deve-se verificar a se a vontade foi efetivamente manifestada e se coincide com a vontade real daquele que a declarou. 

Ressalta-se que o Código Civil de 2002 consagra a idéia de que, será mais valorizado para a interpretação do negócio jurídico, a intenção daquele que manifestou a vontade, do que seu sentido literal, conforme preceitua o art. 112 do CCB. 

Ademais, também servirão de auxílio para a interpretação dos negócios jurídicos a boa- fé (de forma que as intenções maliciosas sejam repudiadas ) e os usos do local da celebração. (art. 113 do CCB). 

Outro elemento essencial é que exista um objeto, sobre o qual vai se referir o negócio jurídico. 

Por fim o negócio jurídico deve possuir forma, ou seja, se dar mediante acordo escrito ou verbal. 

Assim, são elementos essenciais, que tornam possível a existência dos negócios jurídicos, a manifestação de vontade, o objeto e a forma. A esses elementos essenciais devemos incluir a causa. 

Aliás, a causa é a razão determinante  da vontade e, para os negócios de conteúdo patrimonial, o fundamento objetivo que justifica a atribuição patrimonial que são diversos dos motivos, as causas impulsivas, individuais e subjetivas.

Ensinou Ebert Chamoun(Instituições de direito romano, 1968, pág. 86 e seguintes) que “as partes do ato jurídico procuram atingir um objetivo prático que é precisamente a função econômico-social do ato que estão praticando. Esse objetivo prático, socialmente útil, recebe a proteção do direito. Chama-se causa do ato jurídico. A causa não pode ser impossível nem ilícita”.

Há profundas diferenças entre a causa e o motivo. Os motivos impelem a vontade à consecução da causa conservando, porém, o caráter subjetivo, a causa se exterioriza no mundo dos fatos através de um ou outro ato jurídico, mas sempre consoante um tipo. Exemplificou Ebert Chamoun(obra citada, pág. 87) que na venda de uma coisa, a causa do procedimento do vendedor é o recebimento do preço do comprador: esse recebimento teve que se enquadrar num tipo de ato jurídico, a compra e venda. Os motivos, sendo individuais, variam conforme as partes; a causa, no ensinamento de Ebert Chamoun, sendo objetiva, só varia conforme o tipo de negócio, sendo uma única para cada tipo. A causa é digna de proteção do direito que nela encontra o titulo justificativo dos efeitos aquisitivos, modificativos ou extintivos dos atos jurídicos, os motivos lhe são irrelevantes, a não ser que se manifestem no ato sob a forma de cláusula acessória.

No direito romano, vários eram os remédios jurídicos que eram utilizados para anular os efeitos do ato jurídico realizado sem causa, como a condictio, ou ação de repetição de indébito, a actio doli, a querela non numeratae pecuniae.

O pagamento sem causa feito pela stipulatio podia, no direito clássico, ser repetido mediante a condictio indebiti. A execução de uma stipulatio através de uma exceptio doli mali e o pagamento feito em vista de sua execução podia ser repetido pelo promitente não envolvido na torpeza, mediante uma condictio ob turpem causam. No direito imperial, facultava-se à pessoa que reconhecera num documento haver recebido uma quantia que, em verdade, não recebera, negar-se ao seu pagamento, defendendo-se com a querela non numeratae pecuniae. Ela operava a inversão do ônus normal da prova: o pretenso credor é que devia provar a existência do empréstimo. No direito de Justiniano não se podia suscitar a querela quando a causa da numeratio era revelada no documento e era admissível dentro de dois anos, mas inclusive acerca de débitos de coisas diferentes de dinheiro e do dote quando ao madido que não o recebeu era exigida a sua restituição, se intentada de forma temerária, importava a pena do dobro.

Código civil brasileiro não menciona expressamente a causa ou o motivo como elemento essencial do negócio jurídico, mas determina que o falso motivo, quando expresso como razão determinante ou essencial, vicia o ato negocial  bem como prevê que, quando o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito, o negócio jurídico será nulo.

Caio Mário da Silva Pereira(Instituições de direito civil, volume I, 14ª edição, pág. 343) afirmou que ¨toda ação humana se prende a uma razão. Todo ato é precedido de motivação mais ou menos complexa. Toda declaração de vontade decorre de um motivo, que ora pode ser puramente interior e psíquica, ora exterior e objetivo. È na pesquisa da determinação do ato que vai asentar o problema da causa do negócio juridico".

Ensinou ainda Caio Mário da Silva Pereira(obra citada, pág. 344) que na pesquisa das razões determinantes do negocio jurídico é necessário fazer uma distinção fundamental, que consiste em destacar a causa do ato, dos motivos que levaram o agente a praticá-lo. Tais motivos se apresentam como uma razão ocasional ou acidental do negócio, e nunca faltam como impulso originário, mas não têm nenhuma importância jurídica. Por isso, o jurista deve relegá-los para o plano psicológico, a que seria então afeta a indagação da deliberação consciente. Disse ainda Caio Mário da SIlva Pereira: "E detém-se apenas na investigação da causa propriamente dita, que dve caracterizar na última das razões determinantes do ato". Na venda de um imóvel a causa do negócio jurídico seria a obtenção do dinheiro, e, como esta constitui a prestação do vendedor, pode-se dizer que a causa do negócio juridico praticado por quem realiza uma venda se situa na obrigação da outra parte, e se configura como o motivo próximo, determinante dele, desprezada assim toda a motivação individual ou razão subjetiva.

Assim na caracterização da causa é preciso expurgá-la do que sejam meros motivos, e isolar o que constitui a razão jurídica do fenômeno, para  abandonar aqueles e atentar nesta. Isso porque na causa há um fim econômico ou social reconhecido e garantido pelo direito, uma finalidade objetiva e determinante do negócio que o agente busca além da realização do ato em si mesmo. Distingui-se da causa a motivação, pois que esta, mesmo ilílicita, não chega a afetar o ato, desde que àquele nao se possa irrogar a mesma falha, como ensinou Dabin(La teoria de la causa, n. 298).

Roberto de Ruggiero, ao tratar a causa dos negócios jurídicos no direito italiano afirma que: “A generalidade dos escritores costuma tratar do assunto principalmente a propósito da teoria do contrato (arts. 1.108, 1.133 do cc) seguindo assim o sistema do Código francês e do nosso, que do primeiro, também nesse ponto é uma cópia, salvo a adição do art. 1.121 do cc que naquele não se encontra. No Código francês o conceito de causa foi introduzido com base nas doutrinas de Pothier e de Domat, mas seria errôneo pensar que constitua uma inovação do direito moderno: o conceito de causa deriva das doutrinas romanistas e, posto que modificado à face do conceito próprio do direito romano, é nele que encontra a sua primeira e mais sólida base.”( Instituições de direito civil. Vol. 1 São Paulo: Bookseller, 2005, p. 357).

Em suas lições Ruggiero ainda disse:

“Ora, dentre toda a série de motivos que estão entre si indissoluvelmente ligados como os elos de uma cadeia, o direito apenas atende ao último, o mais próximo da ação, o que a determina e que, objetiva e, juridicamente justifica a promessa ou o ato, não se importando dos outros mais remotos, que é certo terem atuado a vontade e a levaram a manifestar-se, mas que por si só não bastam para a determinar e para justificar o ato ou a promessa, isto porque tais motivos são por via de regra irrelevantes para o direito, salvo se foram incorporados de pressuposição, de maneira a constituir parte integrante da mesma declaração. Pois bem, o primeiro é a causa, quer dizer: a razão determinante da vontade, e, para os negócios de conteúdo patrimonial, os segundos são os motivos, isto é: as causas impulsivas, individuais e subjetivas. O primeiro é condição essencial da existência do negócio jurídico, sem a qual a vontade não seria, por si só, capaz de produzir o efeito que pretende: os segundos, a razão ocasional e acidental do negócio, a qual posto que nunca falte, como impulso primordial da vontade, não tem para o direito importância alguma. Se a toda essa série se quer dar o nome de motivos, diremos então que o primeiro é o motivo próximo, que é sempre um e não muda visto ser objetivamente determinado e caracterizado pela natureza e finalidade intrínseca do negócios; e os outros os motivos remotos, correspondentes às representações psíquicas íntimas, que podem ser tão variáveis e infinitas como as circunstâncias individuais que levam os homens a criar relações entre eles”(Instituições de direito civil, volume I, quinta edição, traduzido por Ary dos Santos, pág. 247).

Os motivos individuais assim não devem se confundir com a causa.

Causa é o fim econômico e social reconhecido e garantido pelo direito; é a própria função do negócio objetivamente considerado, a condição que justifica a aquisição excluindo o fato de ser lesiva do direito alheio e que, de certo modo, representa a vontade da lei face à vontade privada.

Há o entendimento de que a causa é a motivação típica do ato, critério objetivo, caracteriza pelo fim econômico ou social reconhecido e garantido pelo direito, na qual se procura o fim prático a que todo negócio se destina. A causa é o motivo juridicamente relevante, motivo gerador de consequências jurídicas.

Diante do problema relacionado com a indagação causal, a doutrina se divide. Uns estudiosos dão-lhe grande importância sustentando a sua unidade conceitual, embora admitam a varidade de aspectos que pode revestir. Caio Mário da SIlva Pereira(Instituições de direito civil, volume I, 14ª edição, pág. 346) bem estudou o problema ao dizer: "Outros, porém, negam-lhe a relevância, e ainda outros vão mais longe, desprezando-a, por entenderem que a distinção causal nada mais é do que uma desnecessária duplicação dos elementos integrantes do negócio jurídico. Nos onerosos, argumentam os não-causalistas, se a causa está na contraprestação dada ou prometida ao agente, ela coincide com o objeto do ato,  sendo mera sutileza argumentar que se não confunde propriamente com a prestação da outra parte, porém, prende-se à bilateralidade da obrigação: nos gratuitos, se se situa na liberalidade ou no benefício proporcionado pelo agente, confunde-se então com a sua intenção, e, em última análise, com a própria vontade, não passando de preciosismo sustentar que a causa donandi difere da vontade geradora do contrato."

Realmente essa controvérsia não se resolve no estudo dos escritos que ocupam posição contrária, seja no campo causalista, com Domat, Pothier, Aubry et Rau, Cenzi, Cariota-Ferrara, Ruggiero, Bonfante, Messineo, seja com relação aos chamados anticausalistas como Planiiol Laurent, Demongue, Dabin, Carvalho de Mendonça e Clóvis Beviláqua.

Contra o conceito de causa há objeções e críticas conhecidas na doutrina. Há uma série de escritores que contesta a sua existência como elemento separado e distinto e que, referindo-se aos contratos, afirmou ser inútil a adição de um quarto elemento. A objeção seria baseada na aparente falta de unidade conceitual da causa; se ela é nos negócios onerosos a contraprestação prometida ou recebida, pareceria estranho que, para os gratuitos, onde falta uma contraprestação, a ela se deva recorrer para preencher a lacuna da intenção liberal. Entendem que a causa se identificaria com a vontade, não sendo, pois, um elemento distinto, pelo que vários foram levados a eliminar a causa dos chamados negócios gratuitos, admitindo a sua existência apenas para os onerosos.

A causa não se confunde com o objeto ou com o consenso.

A corrente subjetivista, que predominou entre os juristas franceses, sustenta que a causa é a razão determinante, a motivação típica do ato que se pratica, objetivamente relacionada à espécie do negócio jurídico praticado, e que não pode ser tomada como seu motivo. Tal concepção entende que a causa deve ser compreendida como a representação psicológica que fazem as partes concluir o negócio ou fim próximo para referida conclusão. Os fins remotos são simplesmente os motivos ou móveis do ato (móvel subjetivo), irrelevantes para o Direito. O fim próximo (motivo determinante é relevante) é justamente a causa. 

Código Civil de 2002 não  deixou de admiti-la (arts. 166, III e 140). Para alguns autores  optou-se  pela teoria subjetivista.

Ensinou  Darcy Bessone(Do contrato: teoria geral, 1997, pág. 102 e seguintes), citando Domat (Domat, Oeuvres complètes – lês lois civile), que a  causa “... É, pois, o fundamento da obrigação, no sentido de que, sempre que alguém se obriga, o vínculo se funda em algo oriundo do credor da obrigação. Pode não haver uma contrapartida ou contraprestação, mas haverá a entrega de uma coisa ou, quando menos, um mérito do donatário (contratos gratuitos) a fundamentar a vinculação de quem assume a obrigação. As perquirições posteriores não afetaram, no essencial, a teoria de Domat. Mas precisaram de uma distinção rica de consequências: a que discrimina entre a causa da obrigação e os motivos determinantes do vínculo. A doutrina de Domat recebeu, algum tempo depois, poderoso estímulo, partido da autoridade de Pothier “Todo ajuste deve ter uma causa honesta. Nos contratos interessados, a causa da obrigação que contrai uma das partes é que a outra lhe dê ou se obrigue a lhe dar, ou se arrisque àquilo de que se encarrega. Nos contratos benéficos, a liberalidade que uma das partes quer exercer para com a outra é causa suficiente da obrigação que aquele contrai para com este (Cód. Civ. Fr. Art. 1.131). Mas quando a obrigação não tem causa alguma, ou quando a causa pela qual foi construída é falsa, é nula a obrigação, e nulo o contrato “

O Código Civil da França,  em seus artigos 1.108 e 1.131 a 1.133 (do Code Civil) e o italiano, especialmente os artigos 1.325 e 1.343 a 1.345, mencionam a causa como elemento do contrato. Outros como o alemão, o suíço, o português e o brasileiro(Código Civil de 1916), omitem-na, ou, referindo-a, não lhe reconhecem o caráter que lhe atribuem os Códigos da França e da Itália, por exemplo. Listam-se os chamados códigos anticausalistas, como o BGB, o suíço e o austríaco.

Na lição de Vicente Ráo(Ato jurídico, 1979, pág. 100 e seguintes) a  corrente objetivista,  da qual fazem parte Betti, Cariota-Ferrara e Torquato Castro, por sua vez, sustenta não haver relação de investigação da causa com a motivação subjetiva do ato, desvinculando seu aspecto subjetivo, interior, da noção de causa, concentrando-se essa na conotação social do negócio, de forma que ela se configure pela função prática do negócio jurídico, com suas  matizes sociais reconhecidas pelo direito, que somente vem a tutelar atos que se prestem ao atendimento do interesse coletivo, de toda a sociedade.Os objetivistas sustentam que a investigação da causa nada tem a ver com a motivação subjetiva do ato, mas vai confinar com o fim econômico e social do negócio jurídico.

Há negócios jurídicos causais ou materiais e abstratos ou formais.

Ainda Roberto de Ruggiero(obra citada, pág. 249) explicou que há negócios nos quais a relação é fixa e incindível, estando os dois elementos conjugados de maneira que a vontade revela sem mais nada a causa. Assim é o caso da compra e venda, da doação.

Há, outros, pelo contrário, em que essa relação falta, de modo que se apresentam como independentes da causa. Não porque ela falte, mas porque o negócio não a exprime nem a traz consubstanciada em si, parece que a vontade é por si só suficiente para produzir o efeito que tem em vista, devendo a causa ir procurar-se fora do negócio, numa outra relação entre as partes e podendo, assim, ser vária e diversa, conforme a sua índole. Ensinou Roberto de Ruggiero que tais são os negócios abstratos, que são ainda chamados de formais, visto neles a vontade se dever manifestar de forma determinada e às vezes solene para poder produzir o efeito jurídico, o que levou a dizer que neles a causa é substituída pela forma ou que esta se identifica com aquela. No direito romano, tinha-se como exemplos a mancipatio, a in iure cessio, que se consideravam perfeitas logo após se terem pronunciado as palavras da sponsio ou cumpridas as formalidades de venda ou do processo. No nosso direito, registramos: os títulos ao portador, os títulos de crédito que não estão vinculados à causa, daí porque se fala em abstratividade.

Os negócios causais não podem produzir efeito algum quando se prove a falta ou ilegalidade da causa. 

Por sua vez, são elementos acidentais: condição, termo e encargo ou modo. 

Condição: Subordina a eficácia do negócio jurídico a um evento futuro e incerto, somente existe condição quando termos o evento tanto futuro quanto incerto, se faltar um deles a condição não existe.

A condição pode ser suspensiva ou resolutiva.. Ela suspende o exercício e a aquisição do direito, quando implementada a condição suspensiva, as partes terão de volta o exercício e a aquisição dos efeitos do negócio jurídico . Já a condição resolutiva é absolutamente o contrário da suspensiva, nesse caso, a eficácia acaba quando a condição é satisfeita.

De acordo com Maria Helena Diniz, Código Civil Anotado, p. 158-171, ed. 11ª, 2005:

“Art. 121. Considera-se condição a cláusula que, derivando exclusivamente da vontade das partes, subordina o efeito jurídico a evento futuro e incerto.

 Condição é a cláusula que subordina o efeito do negócio jurídico, oneroso ou gratuito, a evento futuro e incerto.

Requisitos. Para a configuração da condição será preciso a ocorrência dos seguintes requisitos: a) aceitação voluntária, por ser acessória da vontade incorporada a outra, que é a principal por se referir ao negócio que a cláusula condicional se adere com o objetivo de modificar uma ou algumas de suas conseqüências naturais; b) futuridade do evento, visto que exigirá sempre um fato futuro, do qual o efeito do negócio dependerá; e c) incerteza do acontecimento, pois a condição relaciona-se com um acontecimento incerto, que poderá ocorrer ou não.

Art. 122. São lícitas, em geral, todas as condições não contrárias à lei, à ordem pública ou aos bons costumes; entre as condições defesas se incluem as que privarem de todo efeito o negócio jurídico, ou o sujeitarem ao puro arbítrio de uma das partes.

Condição lícita. Lícita será a condição quando o evento que a constitui não for contrário à lei, a ordem pública ou aos bons costumes.

Condições proibidas. Estão defesas as condições: a)  perplexas, se privarem ao ato negocial de todo o efeito, como a venda de um prédio sob a condição de não ser ocupado pelo comprador; e b) puramente potestativas, se advindas de mero arbítrio de um dos sujeitos (RT, 678:94, 680:115 e 691:206). P. ex., constituição de uma renda em favor se você vestir tal roupa amanhã ou se ficar de pé durante 24 horas; aposição de cláusula que, em contrato de mútuo, dê ao credor poder unilateral de provocar o vencimento antecipado da dívida, diante de simples circunstância de romper-se o vínculo empregatício entre as partes (RT, 568:180). Urge lembrar que a condição resolutiva puramente potestativa é admitida juridicamente, pois não subordina o efeito do negócio jurídico ao arbítrio de uma das partes, mas sim sua ineficácia. Sendo tal condição resolutiva, nulidade não há porque existe um vínculo jurídico válido consistente na vontade atual de se obrigar, de cumprir a obrigação assumida, de sorte que, como observa Vicente Ráo, o ato jurídico chega a produzir os seus efeitos, só se resolvendo se a condição, positiva ou negativa, se realizar e quando se realizar. O art. 122 veda a condição suspensiva puramente potestativa. Logo, são admitidas as simplesmente potestativas, por dependerem da prática de um ato e não de um mero ou puro arbítrio. Além do arbítrio requer uma atuação especial do sujeito. P. ex., doação de uma casa a um jogador de tênis, se ele tiver bom desempenho no torneio de Wimbledon.

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Art. 123. Invalidam os negócios jurídicos que lhe são subordinados:

I – as condições física ou juridicamente impossíveis, quando suspensivas;

II – as condições ilícitas, ou de fazer coisa ilícita;

III – as condições incompreensíveis ou contraditórias.

Condições suspensivas física ou juridicamente impossíveis. As condições fisicamente impossíveis são as que não podem efetivar-se por serem contrárias à natureza. Por exemplo, a doação de uma casa a quem trouxer o mar até a Praça da República da cidade de São Paulo será inválida, visto que a condição suspensiva que subordina a eficácia negocial a evento futuro e incerto é impossível fisicamente.
As condições juridicamente impossíveis são as que invalidam os atos negociais a ela subordinados, por serem contrárias à ordem legal, como, p. ex., a outorga de uma vantagem pecuniária sob condição de haver renúncia ao trabalho, o que fere os arts. 193, 6º, 5º, XIII, e 170, parágrafo único, da Constituição Federal de 1988, que considera o trabalho uma obrigação social ou de realizar a venda que tenha por objeto herança de pessoa viva (CC, art. 426).

Condições ilícitas ou de fazer coisa ilícita. As condições ilícitas ou as de fazer coisa ilícita são condenadas pela norma jurídica, pela moral e pelos bons costumes e, por isso, invalidam os negócios a que forem apostas. Por exemplo, prometer uma recompensa sob a condição de alguém viver em concubinato impuro (RT, 122:606); dispensar, se casado, os deveres de coabitação e fidelidade mútua; entregar-se à prostituição; furtar certo bem; mudar de religião, ou, ainda, não se casar.

Condições perplexas, incompreensíveis ou contraditórias. Se os negócios contiverem cláusulas que subordinam seus efeitos a evento futuro e incerto, mas eivadas de obscuridades ou incongruências, possibilitando várias interpretações pelas dúvidas que levantam, ou pela incoerência de seus termos tais atos negociais invalidar-se-ão. Por exemplo, constituirei Mário meu herdeiro universal, por ato de última vontade, se Ricardo for meu herdeiro universal. Inválida será tal cláusula, visto que a condição não poderá realizar-se.

Art. 124. Têm-se por inexistentes as condições impossíveis quando resolutivas, e as de não fazer coisa impossível.

Condição resolutiva impossível. Se for aposta num negócio condição resolutiva impossível (física ou juridicamente) ou de não fazer coisa impossível, será tida como não escrita; logo, o negócio valerá como ato incondicionado, sendo puro e simples, como se condição alguma se houvesse estabelecido, por ser considerada inexistente.

Art. 125. Subordinando-se a eficácia do negócio jurídico à condição suspensiva, enquanto esta se não verificar, não se terá adquirido o direito, a que ele visa.

Condição suspensiva. Será suspensiva a condição se as partes protelarem, temporariamente, a eficácia do negócio até a realização do acontecimento futuro e incerto (RT, 706:151; JTACSP, 108:156 w 138:93). P. ex., adquirirei seu quadro “X” se ele for aceito numa exposição internacional.

Efeito da condição suspensiva pendente. Pendente a condição suspensiva não se terá direito adquirido, mas, expectativa de direito ou direito eventual. Só se adquire direito após o implemento da condição. A eficácia do ato negocial ficará suspensa até que se realize o evento futuro e incerto. A condição se diz realizada quando o acontecimento previsto se verificar. Ter-se-á, então, o aperfeiçoamento do ato negocial, operando-se ex tunc, ou seja, desde o dia de sua celebração, se inter vivos, e à data da abertura da sucessão, se causa mortis, daí ser retroativo.

Art. 126. Se alguém dispuser de uma coisa sob a condição suspensiva, e, pendente esta, fizer quanto àquela novas disposições, estas não terão valor, realizada a condição, se com ela forem imcompatíveis.

Irretroatividade da condição suspensiva nos contratos reais. A retroatividade da condição suspensiva não é aplicável aos contratos reais, uma vez que só há transferência pública devidamente transcrita. Esclarece Clóvis Beviláqua que o implemento da condição suspensiva não terá efeito retroativo sobre bens fungíveis, móveis adquiridos de boa-fé e imóveis, se não constar do registro hipotecário a inscrição, ou melhor, o assento do título, onde se acha consignada a condição.

Inserção posterior de novas disposições:  A norma não veda a possibilidade de, na pendência de uma condição suspensiva, fazer-se novas disposições, que, todavia, não terão validade se, realizada a condição, forem com ela incompatíveis. A esse respeito bastante esclarecedores são os seguintes exemplos de R. Limongi França: A doa a B um objeto, sob condição suspensiva, mas, enquanto esta pende, vende ou empenha o mesmo objeto a C; nula será a venda ou a garantia real (penhor). A doa a B o usufruto de um objeto, sob condição suspensiva, mas, enquanto esta pende, aliena a C a nua propriedade do mesmo objeto; válida será a alienação, porque não há incompatibilidade entre a nova disposição e a anterior.

Art. 127. Se for resolutiva a condição, enquanto esta se não realizar, vigorará o negócio jurídico, podendo exercer-se desde a conclusão deste o direito por ele estabelecido.

Condição resolutiva. A condição resolutiva subordina a ineficácia do negócio a um evento futuro e incerto. Enquanto a condição não se realizar, o negócio jurídico vigorará, podendo exercer-se desde a celebração deste o direito por ele estabelecido, mas, verificada a condição, para todos os efeitos extingue-se o direito a que ela se opõe. Por exemplo, constituo uma renda em seu favor, enquanto você estudar (RT 433:176, (…)).

Art. 128. Sobrevindo a condição resolutiva, extingue-se, para todos os efeitos, o direito a que ela se opõe; mas, se aposta a um negócio de execução continuada ou periódica, a sua realização, salvo disposição em contrário, não tem eficácia quanto aos atos já praticados, desde que compatíveis com a natureza da condição pendente e conforme os ditames de boa-fé.

Implemento de condição resolutiva. Se uma condição resolutiva for aposta em um ato negocial, enquanto ela não se der, vigorará o negócio jurídico, mas, ocorrida a condição, operar-se-á a extinção do direito a que ela se opõe, retornando-se ao status quo ante. Mas, se tal negócio for de execução continuada ou periódica (p. ex., uma locação), a efetivação da condição, exceto se houver disposição em contrário, não atingirá os atos já praticados (como pagamento de aluguéis ou de encargos locativos) desde que conformes com a natureza da condição pendente e aos ditames da boa-fé (CC, art. 422). Acatado está o princípio da irretroatividade da condição resolutiva, quanto às prestações executadas, pois implemento da condição resolutiva terá eficácia ex nunc, preservando os efeitos negociais já produzidos.

Efeitos “ex nunc” e “ex tunc” da condição. Quanto aos atos de administração praticados na pendência da condição, ela não terá efeito retroativo, salvo se a lei expressamente o determinar, de maneira que tais atos serão intocáveis, e os frutos recolhidos não precisarão ser restituídos. Porém, a norma jurídica estabelece que a condição terá efeito retroativo quanto aos atos de disposição, que, com sua ocorrência, serão tidos como nulos.

Outros elementos acidentais são o termo e o encargo.

termo: cláusula que subordina a eficácia do negócio jurídico à um evento futuro e certo (data- evento futuro e certo)

-Suspensivo: termo inicial- dá início aos efeitos do negócio jurídico. Gera direito adquirido

-Resolutivo:termo final- quando verificado põe fim aos efeitos do negócio jurídico.

Encargo ou modo: prática de uma liberalidade subordinada à um ônus.Por exemplo, a doação de um terreno com o encargo de que nele seja construído uma escola. O encargo deve ser cumprido, caso não seja, a pessoa que praticou a doação poderá pedir a revogação ou o cumprimento do encargo.

A doutrina civilista usa a expressão ato jurídico entendendo que se trata de manifestação de vontade destinada a constituir, modificar ou extinguir um direito subjetivo, através da objetivação de um fim protegido pelo sistema jurídico.

b) A NULIDADE E A ANULABILIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO 

Os negócios juridicos estã sujeitos a vícos que levam a nulidade ou anulabilidade, dependendo da espécie:
Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando:
I - celebrado por pessoa absolutamente incapaz;
II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;
III - o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito;
IV - não revestir a forma prescrita em lei;
V - for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade;
VI - tiver por objetivo fraudar lei imperativa;
VII - a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção.
Art. 167. É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válido for na substância e na forma.
§ 1o Haverá simulação nos negócios jurídicos quando:
I - aparentarem conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às quais realmente se conferem, ou transmitem;
II - contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira;
III - os instrumentos particulares forem antedatados, ou pós-datados.
§ 2o Ressalvam-se os direitos de terceiros de boa-fé em face dos contraentes do negócio jurídico simulado.
Art. 168. As nulidades dos artigos antecedentes podem ser alegadas por qualquer interessado, ou pelo Ministério Público, quando lhe couber intervir.
Parágrafo único. As nulidades devem ser pronunciadas pelo juiz, quando conhecer do negócio jurídico ou dos seus efeitos e as encontrar provadas, não lhe sendo permitido supri-las, ainda que a requerimento das partes.
Art. 169. O negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo.
Art. 170. Se, porém, o negócio jurídico nulo contiver os requisitos de outro, subsistirá este quando o fim a que visavam as partes permitir supor que o teriam querido, se houvessem previsto a nulidade.
Art. 171. Além dos casos expressamente declarados na lei, é anulável o negócio jurídico:
I - por incapacidade relativa do agente;
II - por vício resultante de erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão ou fraude contra credores.
Art. 172. O negócio anulável pode ser confirmado pelas partes, salvo direito de terceiro.
Art. 173. O ato de confirmação deve conter a substância do negócio celebrado e a vontade expressa de mantê-lo.
Art. 174. É escusada a confirmação expressa, quando o negócio já foi cumprido em parte pelo devedor, ciente do vício que o inquinava.
Art. 175. A confirmação expressa, ou a execução voluntária de negócio anulável, nos termos dos arts. 172 a 174, importa a extinção de todas as ações, ou exceções, de que contra ele dispusesse o devedor.
Art. 176. Quando a anulabilidade do ato resultar da falta de autorização de terceiro, será validado se este a der posteriormente.
Art. 177. A anulabilidade não tem efeito antes de julgada por sentença, nem se pronuncia de ofício; só os interessados a podem alegar, e aproveita exclusivamente aos que a alegarem, salvo o caso de solidariedade ou indivisibilidade.
Art. 178. É de quatro anos o prazo de decadência para pleitear-se a anulação do negócio jurídico, contado:
I - no caso de coação, do dia em que ela cessar;
II - no de erro, dolo, fraude contra credores, estado de perigo ou lesão, do dia em que se realizou o negócio jurídico;
III - no de atos de incapazes, do dia em que cessar a incapacidade.
Art. 179. Quando a lei dispuser que determinado ato é anulável, sem estabelecer prazo para pleitear-se a anulação, será este de dois anos, a contar da data da conclusão do ato.
Art. 180. O menor, entre dezesseis e dezoito anos, não pode, para eximir-se de uma obrigação, invocar a sua idade se dolosamente a ocultou quando inquirido pela outra parte, ou se, no ato de obrigar-se, declarou-se maior.
Art. 181. Ninguém pode reclamar o que, por uma obrigação anulada, pagou a um incapaz, se não provar que reverteu em proveito dele a importância paga.
Art. 182. Anulado o negócio jurídico, restituir-se-ão as partes ao estado em que antes dele se achavam, e, não sendo possível restituí-las, serão indenizadas com o equivalente.
Art. 183. A invalidade do instrumento não induz a do negócio jurídico sempre que este puder provar-se por outro meio.
Art. 184. Respeitada a intenção das partes, a invalidade parcial de um negócio jurídico não o prejudicará na parte válida, se esta for separável; a invalidade da obrigação principal implica a das obrigações acessórias, mas a destas não induz a da obrigação principal.
Na simulação, as partes entram em acordo para fazer uma declaração deliberadamente diferente da verdadeira vontade, com o intuito de ludibriar terceiros. Isso causa a nulidade do contrato, pois o ordenamento jurídico não pode, obviamente, permitir que tais atos imbuídos de má-fé logrem alcançar seus distorcidos desígnios.
Há mais de um tipo de simulação, e aqui será feita uma breve análise de uma das formas de classificação do nosso objeto de estudo: simulação absoluta e relativa. A absoluta diz respeito ao caso em que as partes não desejam efetivamente realizar determinado ato, mas apenas fazer com que outros pensem que o ato foi concretizado. Só se observa o negócio jurídico simulado. Na simulação relativa, diferentemente, as partes realizam um negócio, mas é diferente daquele que verdadeiramente pretendem realizar. Neste caso, observamos dois negócios: o simulado, que as partes consolidaram na aparência, e não é verdadeiro, e o dissimulado, cujos efeitos as partes realmente almejavam.

Tem-se considerado que só merece consideração o caso de referir-se, no direito civil, o erro à divergência entre a determinação e a manifestação da vontade; em se tratando de algum outro elemento do negócio(capacidade das partes, objeto, causa, forma) a nulidade irá resultar de sua falta. 
Eduardo Espínola(Sistema de direito civil),  nos ensinou que o erro induz falsa representação da natureza ou dos elementos de uma relação jurídica ou de algumas de suas consequências. Leva-se a conclusão exterior nos negócios que as partes nele envolvidas não quiseram.
Há o denominado erro impróprio, ensinado por Savigny, ou erreur obstacle, ou errore ostativo(Giorgi e a doutrina italiana) o qual incide sobre a determinação da vontade, impedido que haja um consentimento válido.
Fala-se num erro essencial que incide não sobre a determinação da vontade, mas sobre a declaração e seu conteúdo, viciando o consentimento.
Tem-se considerado que só merece consideração o caso de referir-se, no direito civil, o erro à divergência entre a determinação e a manifestação da vontade; em se tratando de algum outro elemento do negócio(capacidade das partes, objeto, causa, forma) a nulidade irá resultar de sua falta. Aliás, a causa é a razão determinante  da vontade e, para os negócios de conteúdo patrimonial, o fundamento objetivo que justifica a atribuição patrimonial que são diversos dos motivos, as causas impulsivas, individuais e subjetivas.

Verificada a divergência, entende-se que o contrato não se constituiu por falta de consentimento.

Numa análise comparativa, vários códigos afastaram-se dessa doutrina, suprimindo qualquer distinção entre o erro sobre a determinação da vontade e sobre a declaração ou sobre o seu conteúdo, ao lhes dar igual tratamento.
Há uma tradição no sistema jurídico brasileiro pouco importando que se trate de erro, que a doutrina corrente dominante chama de erro obstáculo, que obste o consentimento, ou de erro que o vicie.
Fala-se no erro(assim como na coação em que há pressão moral ou psiquica, na lesão em que há um lucro exagerado de uma parte em detrimento de outra seja por inesperiência ou necessidade econômica da outra, na fraude a credores ou no dolo em que há artíficio ou manobra visando induzir a outra em erro com objetivo de tirar proveito para si ou para outrem) numa anulabilidade ao contrário da simulação em que há a nulidade.
O negócio jurídico é nulo quando celebrado por pessoa absolutamente incapaz; for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto; o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito; não revestir a forma prescrita em lei; for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade; tiver por objetivo fraudar lei imperativa; a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção (art. 166).
Por outro lado, será anulável o negócio jurídico, além dos casos expressamente declarados na lei, por incapacidade relativa do agente e por vício resultante de erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão ou fraude contra credores (art. 171).
O anulável, ao contrário do nulo, pode sanar-se, pode adquirir uma validade irrevogável. É a imperfeição menos grava do negocio a que a lei atribui a determinadas pessoas o direito de invocar a invalidade e provocar a anulação, sendo, em regras, as pessoas que sofrem a incapacidade, aquelas cujo consentimento foi viciado, as que representam o incapaz ou lhe assistem.
Fala-se nas diversas espécies de erro.
Para que o erro vicie a vontade, afastando-se do fim que alcançaria se fosse normal, é preciso que recaia sobre elementos essenciais, por cuja declaração se determinou o querer do declarante.
Pode haver erro substancial sobre o objeto da declaração de vontade, erro que recai sobre o próprio corpo ou sobre a substância e a qualidade. Estamos diante de um erro essencial.
Relevante é o erro que recai sobre a identidade do contraente, mas não é essencial o erro  que recai sobre o nome, simplesmente, ou sobre as qualidades que não individualizem a pessoa, por não influir na determinação da vontade.
Mas o erro essencial deve ser escusável, como ensinavam Chironi e Abello(Trattato di diritto civile italiano, pág. 475): o caráter essencial, que tem o erro determina a possibilidade objetiva; o ser escusável acentua a possibilidade subjetiva. Assim quanto ao falso conhecimento que teve, deve o agente estar em tal condição de conduta que não se lhe possa imputar ser responsável pelo erro.
Faz-se, por fim, uma dicotomia entre o erro de fato e o erro.
Para Coviello(Manuale di diritto civile, volume primeiro e único, segunda edição, 1955, pág. 388) “o erro de direito é inteiramente equiparado ao erro de fato. Por isso pode-se anular qualquer negócio salvo os executados pela lei, tendo em vista sua própria natureza. Mas os casamentos não podem ser anulados, senão por erro de direito. Aliás, a doutrina, em sua maioria, considera inescusável o erro de direito, pois a ninguém é dado a ignorância da lei. Aliás, tratando-se de normas coativas considera-se inescusável o erro de direito.
Interessa-nos nesse trabalho o dolo e a coação.
Dolo é o meio empregado para enganar alguém. Ocorre dolo quando o sujeito é induzido por outra pessoa a erro.
Coação é o constrangimento a uma determinada pessoa, feita por meio de ameaça com intuito de que ela pratique um negócio jurídico contra sua vontade. A ameaça pode ser física (absoluta) ou moral (compulsiva).
 Requisitos: A conduta dolosa deve apresentar os seguintes requisitos: intenção de enganar o outro contratante; induzir o outro contratante em erro em virtude do dolo; causar prejuízo ao outro contratante; angariar benefício para o seu autor ou terceiro; que o dolo tenha sido a causa determinante da realidade do negócio.
São espécies de dolo: Positivo ou comissivo; Negativo ou omissivo; Essencial; Acidental; Dolo de terceiro; Dolo de Representante; dolo bonus; dolo malus; Dolo Bilateral ou recíproco; dolo positivo ou negativo.
a) Dolo principal: é aquele determinante do negócio jurídico celebrado, isto é, a vítima do engano não teria concluído o negócio ou o celebraria em condições essencialmente diferentes, se não houvesse incidido o dolo do outro contratante. È assim, porque o dolo é um vício de consentimento, e, como tal, necessita ser fator determinante do ato voluntário de quem foi a sua vítima. Gera a anulação do negócio com efeitos ex nunc.
b) Dolo acidental: é aquele em que as maquinações empreendidos não tem o poder de alterar o consentimento da vítima, que de qualquer maneira teria celebrado o negócio, apenas de maneira diversa, não gera a anulação do negócio, mas apenas a satisfação em perdas e danos.
c) Dolo de terceiro: ocorre quando o artifício ardil é pratica por uma terceira pessoa que não integra a relação jurídica, gerando os seguintes efeitos. I - se beneficiário da vantagem indevida tinha ciência do dolo ou tinha como saber, trata-se de dolo que torna anulável o negócio; II - porém, se o beneficiário não tinha conhecimento da existência do dolo praticado pelo terceiro, de modo que o negócio é mantido válido e o terceiro provocador do dolo responderá pelas perdas e danos causados ao lesado. O dolo de terceiro, para se constituir em motivo de anulabilidade, exige a ciência de uma das partes contratantes (RT 485/55). O acréscimo constante do vigente Código é absorção do que a doutrina e a jurisprudência já entendiam. Caberá ao critério do juiz entender o ato anulável por ciência real ou presumida do aproveitador do dolo de terceiro. O dolo pode ocorrer, de forma genérica, nos seguintes casos: 1. dolo direto, ou seja, de um dos contratantes; 2. dolo de terceiro, ou seja, artifício praticado por estranho ao negócio, com a cumplicidade da parte; 3. dolo de terceiro, com mero conhecimento da parte a quem aproveita; 4. dolo exclusivo de terceiro, sem que dele tenha conhecimento o favorecido (Sílvio Venosa, 2012, Direito Civil. 12ª Ed. São Apulo: Atlas, 2012. V.1.p. 412).
d) Dolo de Representante; pode ter origem numa representante legal ou convencional. Assim, o representante é aquela pessoa (outorgante) que possui capacidade negocial e, portanto, age em nome do representando. Assim, o representante é o sujeito que emite uma declaração em nome do representando. Se o representante for legal, ouse já, importo pela lei, a sua declaração só obriga o representado a responder civilmente até a importância do proveito que teve. Se, porém a o representante dor convencional, ou seja, escolhido pelo representado, haverá responsabilidade solidária, em decorrência da culpa in elegendo.
e) Dolus bonus e malus: o bonus não induz anulabilidade; é um comportamento lícito e tolerado, consistente em reticências, exageros nas boas qualidades, dissimulações de defeitos; é o artifício que não tem a finalidade de prejudicar; o malus consiste no emprego de manobras astuciosas destinadas a prejudicar alguém; é desse dolo que trata o Código Civil, erigindo-o em defeito do ato jurídico, idôneo a provocar sua anulabilidade.
f) Dolo Bilateral ou recíproco: Se ambas as partes procederam com dolo, há empate, igualdade na torpeza. A lei pune a conduta de ambas, não permitindo a anulação do ato. "Art. 150. Se ambas as partes procederem com dolo, nenhuma pode alegá-lo, para anular o negócio, ou reclamar indenização" Note que não se compensam dolos. O que a lei faz é tratar com indiferença de ambas as partes que foram maliciosas, punindo-as com a impossibilidade de anular o negócio, pois ambos os partícipes agiram de má-fé.
g) Dolo positivo ou negativo: os positivos, ou seja, afirmações falsas sobre a qualidade da coisa; o negativo se constitui numa omissão dolosa ou reticente; dá-se quando uma das partes oculta alguma coisa que o cocontratante deveria saber e se sabedor não realizaria o negócio; para o dolo negativo deve haver intenção de induzir o outro contratante a praticar o negócio, silêncio sobre uma circunstância ignorada pela outra parte, relação de causalidade entre a omissão intencional e a declaração de vontade e ser a omissão de outro contratante e não de terceiro (Sílvio Venosa, obra citada, 2012, p. 410)
O dolo, então, é um vício negocial porque busca a proteção de uma vontade corretamente declarada.
Segundo Stolze Gagliano e Pamplona Filho( Novo Curso De Direito Civil. 10. Ed. São Paulo: Saraiva, 2008. v. 1.) o dolo é o erro provocado por terceiro, e não pelo próprio sujeito enganado. Pode-se confirmar que tanto o erro como o dolo são representações errôneas da realidade, porém, no dolo, esta representação errônea é provocada por um terceiro, como usualmente é dito pela doutrina que o erro é espontâneo e o dolo surge provocado.
Outra semelhança que se pode tomar em questão, segundo Venosa, é que, da mesma maneira que há erro essencial e erro acidental, existe dolo principal (ou essencial) e dolo incidente, com as mesmas conseqüências: a primeira opção dos dois defeitos resulta na anulabilidade do negócio e a segunda, não. De acordo com o mesmo autor, “o dolo essencial, assim como erro essencial, são aqueles que afetam diretamente a vontade, sem os quais o negócio jurídico não teria sido realizado”. (2008, obra citada, pág. 394)
Costumeiramente, as ações anulatórias de negócios jurídicos são fundadas no dolo, uma vez que o erro tem natureza subjetiva, não havendo, assim, como precisar o que realmente se passa na mente do autor no momento do negócio. Assim, as partes legitimadas preferem alegar dolo e demonstrar o artifício ardiloso da outra parte, menos difícil de se evidenciar.
Em relação à fraude, segundo Venosa, esta tem intenção de burlar lei ou convenção preexistente ou futura. Já o dolo surge no mesmo momento do negócio jurídico e tem como objetivo enganar o próximo. Ainda de acordo com o mesmo autor, “a fraude geralmente visa à execução do negócio, enquanto o dolo visa à sua própria conclusão”. (2008, p. 394)
Para o  entendimento de dolo e fraude leia-se a lição de  Venosa: “há dolo quando alguém omite dados importantes para elevar o valor do seguro a ser pago no caso de eventual sinistro; há fraude se o sinistro é simulado para o recebimento do valor do seguro”.
Tenho da lição de Diogo Dias Ramis(O dolo no direito civil, âmbito jurídico):
“Existe a necessidade de o dolo ser essencial, ou seja, ele que impulsiona a vontade do declarante. Para viciar o negócio, este deve estar na base do negócio jurídico, caso contrário, será dolo acidental e não viciará o ato. O artigo 145 explica que o dolo deve ser a causa da realização do negócio jurídico, sendo assim chamado de dolo principal ou essencial.
Conforme o artigo 148, o dolo deve promanar do outro contratante ou, se vindo de terceiro, o outro contratante dele deve ter conhecimento. Outra característica interessante é que, como mencionado anteriormente, para parte da doutrina o prejuízo é secundário no dolo, e o que realmente importaria seria a intenção de enganar, de prejudicar. Segundo Serpa Lopes (1962), o ato ou negócio é anulável ainda que a pessoa seja levada a praticar ato objetivamente vantajoso, mas que ela não desejava.
O silêncio intencional, ou seja, uma das partes omitir algum fato relevante ao negócio jurídico também constitui negócio jurídico.”
O prazo para se anular um negócio jurídico é de quatro anos, contado do dia em que se realizou o negócio, segundo artigo 178, inciso II.”
Não se pode confundir erro com o dolo, pois naquele o equivoco se forma espontaneamente, no dolo ele é induzido.
Isso dá a ideia de essencialidade, pois a causa é a razão determinante da vontade no negócio jurídico.
Passo ao tema da coação.
A coação pode ser conceituada como sendo uma pressão de ordem moral, psicológica, que se faz mediante ameaça de mal serio e grave, que poderá atingir o agente, membro da família ou a pessoa a ele legada, ou, ainda, ao patrimônio, para que a pessoa pratique determinado negócio jurídico.
Devemos ter em mente  que no conceito de coação é importante distinguir a coação absoluta, que tolhe totalmente à vontade, da coação relativa, que é vicio da vontade propriamente falando.
Na coação absoluta, coação física ou vis absoluta, não vontade, pois trata-se de violência física que não concede escolha do coagido. Neste caso a coação neutraliza completamente a manifestação de vontade tornando o negócio jurídico inexistente. Imagine a hipótese de um lutador de boxe pegar a mão de uma velhinha analfabeta, à força, para apor a sua impressão digital m um instrumento de contrato que ela não quer assinar. Nesta espécie de violência não permite ao coagido liberdade de escolha, pois passa a ser mero instrumento nas mãos do coator.
Desta forma apenas a coação moral, coação relativa ou vis compulsiva acarretará a anulabilidade do negocio jurídico.
São requisitos  de acordo com o art. 151, do CC “a coação para viciar a declaração de vontade, há de ser tal inócua ao paciente fundado temor de dano iminente e considerável à sua pessoa, à sua família, ou a seus bens”. No parágrafo único deste artigo também se admite a coação quando dirigida a uma pessoa ligada ao declarante. Dai podemos extrair três requisitos caracterizadores da coação: violência psicológica, declaração de vontade viciada seja a causa do negócio e receio sério e fundado de dano grave à pessoa, a família ou a pessoas próximas do coagido ou então a bens pertencentes a este.
a) violência psicológica: esta deve ser injusta, pois se o autor da coação moral acena com a possibilidade de exercer regularmente um direito, tal atitude não tem o poder de configurar o vício de consentimento. Se a ordem jurídica reconhece o legítimo e regular exercício de um direito, não se poderá considerar abusiva a ameaça de seu exercício (ex: se o locatário, tornando-se inadimplente, não poderá alegar haver sido coagido pelo fato de o locador tê-lo advertido de que se não pagar os aluguéis em atraso recorrerá à justiça).
b) declaração de vontade viciada seja a causa do negócio: a declaração, sob coação moral, é um ato viciado de vontade. Está não se expressa espontaneamente, livre e de acordo com a vontade real do declarante. Este declara o que não quer, mas por se achar premido diante de uma alternativa que lhe parece grave. Ao fazer a declaração, o agente opta pelo sacrifício que lhe parece menor.
c) Bem ameaçado: este deve ser relevante. Se ordem patrimonial logicamente, o bem ameaçado pode ser valor superior ao do negocio feito. Se o alvo da ameaça for a pessoa do declarante ou algum membro de sua família ou, ainda, individuo de sua ligação.
Coação por terceiro: A coação por terceiro pode levar a anulação do negocio, desde que o declarante tivesse ou devesse dela tomar conhecimento. Quer dizer, se o declarante não tomou ciência da violência moral, nem dela devia conhecer o negócio jurídico não será anulado. É o que dispõe o art. 154, do CC “vicia o negocio jurídico a coação exercida por terceiro, se dela tivesse ou devesse ter conhecimento a parte que aproveite, e esta responderá solidariamente com aquele por perdas e danos”. Assim, só se admite a nulidade relativa do negócio se o beneficiário soube ou devesse saber da coação, respondendo solidariamente com o terceiro pelas perdas e danos. Se a parte coagida de nada sabia, subsiste o negócio jurídico, respondendo o autor da coação por todas as perdas e danos que houver causado ao coagido, conforme preceitua o art. 155, do CC. (ex: Quando O sujeito “A” ameaça o sujeito “B” para que este celebre o negocio jurídico com ”D”).


II – A LESÃO E A AÇÃO DE RESCISÃO

Tem-se no Código Civil de 2002, o que segue:
Art. 157. Ocorre a lesão quando uma pessoa, sob premente necessidade, ou por inexperiência, se obriga a prestação manifestamente desproporcional ao valor da prestação oposta.
§ 1o Aprecia-se a desproporção das prestações segundo os valores vigentes ao tempo em que foi celebrado o negócio jurídico.
§ 2o Não se decretará a anulação do negócio, se for oferecido suplemento suficiente, ou se a parte favorecida concordar com a redução do proveito.
Originário de uma interpolação levada a efeito quando da codificação de Justiniano sobre os textos de duas constituições dos imperadores Diocleciano e Maximiliano, o instituto da lesão tem sido objeto de muitas discussões.
Na lição de De Page(Traité Élementaire, I, n. 67) definiu-se a lesão como o prejuízo eu uma pessoa sofre na conclusão de um ato negocial, resultante da desproporção existente entre as prestações das duas partes.
O instituto da lesão surgiu nas discussões com relação a compra e venda. No direito português a lesão enorme tinha cabimento nos chamados contratos comutativos e importava na sua rescisão quando uma das partes era enganada em mais da metade do justo preço.
O Código Civil de 1916 aboliu a rescisão por lesão, em contrário do pensamento que havia no direito brasileiro pré-codificado. Falava-se numa lesão enorme como defeito objetivo do contrato; o seu fundamento não era nenhum vício presumido do consentimento, mas assentava na injustiça do contrato em si; já lesão enormíssima fundava-se no dolo com que se conduzia aquele que do negócio tirava proveito desarrazoado, porém dolo presumido ou dolo ex re ipsa, que não precisava de ser perquirido na intenção do agente.
A matéria da lesão se fez presente no Decreto-lei  n. 859, de 18 de novembro de 1928, modificado pela Lei 1.521, artigo 4º.
A lesão ,no formato moderno, desloca-se do enfoque que era dado apenas a compra e venda e generaliza-se a qualquer contrato.
A lesão não é um vício do consentimento, como observado, no formato legal, uma vez que o desfazimento do negócio não tem por fundamento uma desconformidade entre a vontade real e a vontade declarada. Difere a lesão do erro em que o agente, no momento da declaração de vontade tem a consciência da realidade material das circunstâncias, não há nele o emprego de artifícios por parte de alguém que procure induzir o agente a realizar o negócio jurídico; difere, como ensinou Caio Mário da Silva Pereira(Instituições de direito civil, volume I, 14º edição, pág. 377), difere da coação em que falta o processo de intimidação sobre o ânimo do agente para compeli-lo ao negocio jurídico; e distancia-se da simulação e da fraude. A lesão é limítrofe, pois, aos vícios do consentimento por aproveitar-se o beneficiário da distorção volitiva.

A rescindibilidade do negócio jurídico prescinde de qualquer vicio do consentimento ou de incapacidade da pessoa, sendo o seu pressuposto uma lesão.
Por lesão, como ensinou Roberto de Ruggiero(Instituições de direito civil, volume I, 3º edição, tradução de Ary dos Santos, pág. 276) deve entender-se não a violação comum e genérica da esfera jurídica alheia, mas uma tão grave desproporção entre a prestação dada ou prometida e a contraprestação recebida ou prometida que origine um iníquo depauperamento de um e o injustificado e desproporcionado enriquecimento do outro. No sentido técnico, existe a lesão nos chamados contratos comutativos, quando a prestação de uma parte corresponde uma prestação de outra tão gravemente desproporcionada que exceda qualquer limites toleráveis da livre avaliação dessas partes acerca da vantagem ou do ônus que cada uma promete ou espera no contrato.
De lesão, é certo, ainda se fala em outras diversas relações jurídicas, como, por exemplo, na sucessão hereditária dos legitimários, isto é, daqueles que têm direito a uma quota legítima, pois se diz que há lesão da legítima quando o testador tenha, com disposições mortis causa ou com doações, comprometido a quota própria, isto é: ultrapassado a medida da disponível. Ao herdeiro legitimatário é concedida uma actio supplendam legitimam, que tem por fim a redução das doações e das disposições testamentárias.
A lesão é um vicio de formação sendo apreciada no tempo em que o negócio jurídico foi celebrado. Visa ajustar o contrato aos seus devidos termos, afastando a distorção provocada pelo aproveitamento da necessidade e da inexperiência da outra parte. O objetivo principal da lesão é evitar o enriquecimento sem causa, a exploração usuária de um contratante por outro, nos contratos bilaterais, fundado em negócio totalmente desproporcional
A doutrina admite uma ação de rescisão, só quando a lesão for enorme(laesio enormis), fixando assim a sua medida e circunscrevendo tal ação a casos determinados e fixos como sejam: a lesão na venda de imóveis, quando o vendedor tenha alienado por um preço inferior à metade do preço justo e a lesão na divisão quando o comparte tenha recebido bens inferiores a um quarto do que segundo a própria quota, lhe deviam ser adjudicados.
Fala-se assim numa lesão qualificada que ocorre quando o agente, premido pela necessidade, induzido pela inexperiência ou conduzido pela leviandade, realiza um negócio jurídico que proporciona à outra parte um lucro patrimonial desarrazoado ou exorbitante da normalidade.
Há elementos para realizar a análise dessa situação. O primeiro, de cunho objetivo, situa-se na desproporção evidente e anormal das prestações quando uma das partes aufere ou tem possibilidade de auferir do negócio um lucro desabusadamente maior do que a prestação que pagou, ou prometeu, aferida ao tempo mesmo do contrato. Essa desproporção resulta do excesso sobre um lucro maior do que um quinto da contraprestação da outa parte, que, para parte da doutrina, como o entendimento de Caio Mário da Silva Pereira(obra citada) parece inconveniente. Lembre-se que das legislações modernas que trataram do instituto nenhuma delas se referiu a uma cifra determinada, destinada a ser um paradigma. O segundo requisito, de natureza subjetiva, será o dolo do aproveitamento, que se configura na circunstância de uma das partes aproveitar-se das condições em que se encontra a outra, acentuadamente a sua inexperiência, a sua leviandade ou o estado de espírito premente de necessidade em que se ache, no momento de contratar. Não seria necessário que o agente induza o agente a praticar o ato, levando-o a emissão de vontade por algum processo de convencimento e nem que tenha a intenção de explorá-lo. Basta que se aproveite, de forma consciente, daquela situação de inferioridade, ainda que momentaneamente do agente, e com ele realize negócio de que aufira um lucro considerado anormal.
Anote-se que a doutrina considera que a lesão não é nulidade de pleno direito do negócio jurídico.
Ensinou Caio Mário da Silva Pereira(obra citada, pág. 379) que, com a lesão, busca-se a rescisão ou ainda o restabelecimento do equilíbrio da diferença necessária ao desaparecimento da desproporcionalidade evidente das prestações. Assim poder-se-ia falar, tal como na anulabilidade, no convalescimento do negócio jurídico, por iniciativa espontânea das partes que independeria de pronunciamento judicial, isto porque não existiu  qualquer efeito sobre a capacidade, onde se pode falar em nulidade ou anulabilidade, conforme o caso.
A questão da renúncia à faculdade de pleitear o desfazimento do ato, encontra solução na ressalva de que somente é válida e apta a restituir eficácia ao ato, quando realizada fora totalmente das circunstâncias que induziram o agente ao ato lesivo. 


III – A REVOGAÇÃO  E A RESOLUÇÃO
Diversa da rescisão é a revogabilidade, que não trata de um vício de imperfeição a abrir caminho à impugnação, mas trata-se de um caráter específico que apresenta o negócio jurídico e que consiste em que a vontade do indivíduo, posto que devidamente manifestada e capaz de produzir os seus efeitos próprios, continua ainda a pertencer ao sujeito, o qual pode assim retomá-la e impedir que produza o efeito a que se destinava: o declarante tem um ius poenitendi. Há negócios jurídicos que, pela sua própria natureza, são essencialmente revogáveis, o que depende do fato da vontade; posto que manifestados por formas legítimas, não são capazes de criar um direito subjetivo mas, quando muito, uma simples expectativa, como, exemplificou Ruggiero, é o caso do testamento e de todas as disposições mortis causa; se a vontade se destina a operar no tempo o efeito não se esgotou, não se extinguiu com a simples declaração de vontade. É inerente a esses negócios a revogabilidade, sendo nula qualquer disposição em contrário. Será ainda o caso da doação que pode ser objeto de revogação, nas causas que a lei determina.
Diversa da rescindibilidade é a resolubilidade que é aquela situação particular em que o negócio se submete ao aparecimento de uma condição que opera o seu desaparecimento. Assim a vontade está, desde o início, circunscrita e limitada, de modo que, se a eventualidade prevista se verifica, se considera como se nunca tivesse existido.Mas há quem entenda que a resolução é o meio de dissolução do contrato em caso de inadimplemento culposo ou fortuito. Quando há descumprimento do contrato, ele deve ser tecnicamente resolvido.

Resilição é o desfazimento de um contrato por simples manifestação de vontade, de uma ou de ambas as partes. Ressalte-se que não pode ser confundido com descumprimento ou inadimplemento, pois na resilição as partes apenas não querem mais prosseguir. A resilição pode ser bilateral (distrato, art. 472 , CC) ou unilateral (denúncia, art. 473 , CC). 

IV – O ESTADO DE PERIGO
Outro é o estado de perigo.
Conceitua o art. 156 do CC/02, o estado de perigo como: “configura-se o estado de perigo quando alguém, premido de necessidade de salvar-se, ou a pessoa de sua família, de grave dano conhecido pela outra parte, assume obrigação excessivamente onerosa”, continua o paragrafo único “tratando-se de pessoa não pertencente afamília do declarante, o juiz decidirá segundo as circunstâncias.”
Estado de perigo é uma situação extrema em que uma pessoa temerosa de sofrer grave dano ou prejuízo celebra negócio jurídico desproporcional, assumindo obrigação exorbitante, cuja onerosidade é excessiva. Afeta a declaração de vontade do contratante, diminuindo a sua liberdade por temor de dano à sua pessoa ou à sua família.

V- FRAUDE A CREDORES E A AÇÃO PAULIANA 

Diverso do que se lê da lesão é a fraude a credores. 

 É reconhecido o ensinamento de Pontes de Miranda: “a ação dos arts. 106-113, do Código Civil é ação de anulação: a sentença tem eficácia constitutiva-negativa no tocante à existência do ato jurídico; era anulável o ato jurídico, foi anulado e passa a não existir”. O mestre alagoano acentua que a revogação dos atos do falido apenas torna ineficazes os atos, não os anula: os atos são válidos e válidos permanecem, salvo posterior anulação, segundo os princípios das anulabilidades. Diz mais:

"Na execução contra o devedor, não é possível oporem-se - no direito brasileiro - embargos de terceiro com a alegação de fraude contra credores, embora se possa alegar em defesa". 

 O estudo presente parte da ilação de que trata-se de ação de anulação que nasce ao titular do crédito prejudicado pelo ato do devedor, que violou dever jurídico (o dever de não dispor do patrimônio a ponto de prejudicar os credores já existentes, que contam com a estabilidade patrimonial, ação civil). Entretanto, necessário será reconhecer seu caráter não anulatório na medida em que o ato, em verdade, é ineficaz, voltando a estudar, data venia, o caráter constitutivo-negativo da ação pauliana, antes regida pelos artigos 106-113 e, hoje, com a Lei n.° 10.406 (“Novo Código Civil”), pelos artigos 158 a 165 sem esquecer-se que o 768 do Código de Processo Civil fala de ação anulatória consorcial, permitindo-se a legitimação extraordinária para qualquer credor. O Novo Código Civil, em seu art. 159, diz que “serão anuláveis os contratos onerosos do devedor insolvente, quando a insolvência for notória, ou houver motivo para ser conhecida do outro contratante”. Por sua vez, diz no art. 158, que substitui o vetusto art. 106 do Código Civil, que “os negócios de transmissão gratuita de bens ou remissão de dívida, se os praticar o devedor insolvente, ou por eles reduzido à insolvência, ainda quando o ignore, poderão ser anulados pelos credores quirografários como lesivos dos seus direitos”.

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

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