OS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE E DA ANTERIORIDADE DIANTE DO DÉFICIT ORÇAMENTÁRIO

19/07/2017 às 17:54
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O ARTIGO ABORDA A QUESTÃO À LUZ DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E DIANTE DE SOLUÇÕES PARA O NOTICIADO DÉFICIT ORÇAMENTÁRIO DA UNIÃO.

OS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE  E DA ANTERIORIDADE DIANTE DO DÉFICIT ORÇAMENTÁRIO

 Rogério Tadeu Romano

I - O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

O princípio da legalidade da função executiva, de que a legalidade da Administração é simples aspecto, desdobra-se nos princípios da preeminência da lei e o princípio da reserva de lei.

O princípio da preeminência da lei, princípio da legalidade em sentido amplo, fórmula negativa ou regra da conformidade, traduz-se na proposição de que cada ato concreto da Administração é inválido, se e na medida em que contraria uma lei material.

Por sua vez, o princípio da reserva de lei, princípio da legalidade em sentido restrito, surgiu originalmente com o sentido de que cada ato concreto da administração que intervém na liberdade ou propriedade do cidadão, carece de autorização de uma lei material; mas veio mais tarde a evoluir no sentido de exigir a mesma autorização para todo e qualquer ato administrativo, ainda que, de forma direta, não contendesse na aludida esfera privada dos particulares.

Entende-se pela experiência doutrinária que, se o princípio da preeminência da lei representa muito mais a defesa da própria ideia de generalidade numa fase de evolução do poder administrativo concebido essencialmente como uma ampla esfera de autonomia ou mero âmbito da licitude, o princípio da reserva legal desempenha uma função de garantia dos particulares contra as intervenções do poder.

Na doutrina alemã, do que se lê das observações de Peters, Huber, Wolff e Forsthoff, o princípio da legalidade reveste no direito administrativo o seu conteúdo mínimo de uma simples regra de preeminência da lei. Assim,  no direito administrativo brasileiro, há o entendimento de que apenas se deve exigir uma reserva de lei no que se diz respeito à criação de deveres, de conteúdo positivo ou negativo. A Constituição dita: “Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”(artigo 5º, inciso II, da Constituição Federal).

Fala-se em reserva de lei material e reserva de lei formal. No primeiro caso, basta que a conduta da Administração seja autorizada por uma norma geral e abstrata, seja ela a lei constitucional (norma paratípica), a lei ordinária (norma típica primária) ou mesmo o regulamento (norma típica secundária). No segundo caso, torna-se necessário que o fundamento legal do comportamento do órgão executivo seja um ato normativo dotado com força de lei, de ato provindo de órgão com competência legislativa normal e revestido da forma externa legalmente prescrita.

A atividade administrativa que não se traduz na criação de limites à liberdade pessoal ou patrimonial dos cidadãos, apenas se encontra submetida à regra da preeminência da lei.

No direito administrativo, há uma reserva relativa de lei formal, porém, no que concerne ao direito tributário, a trilha é a reserva absoluta de lei formal.

Toda a conduta em sede de direito tributário será norteada e se fundamentará na lei, de que seja o seu pressuposto necessário.

Assim, o direito administrativo se contenta com uma simples reserva de lei material, baseado no item generalidade, novidade, próprios de um perfil normativo.

Todavia, no direito tributário, há o entendimento, uma vez que é intensa a intervenção da administração na propriedade, na renda, nos serviços, na circulação de bens industrializados ou não, por parte dos cidadãos, que essa intervenção estatal deve se dar dentro das garantias da lei formal, pois, como disse o juiz Marshall: “the power to tax involves the power to destroy”, como se viu no caso Mc Culloch v. Maryland, e, H. 316.

Isso porque, toda vez que se tratar de limitação de direitos fundamentais, a lei será imprescindível.

Desde já se  expõe que, em direito público tributário, vale o conceito de processo legislativo, de modo a permitir que as medidas provisórias (artigo 64,§ § 1º e 4º), que têm o caráter de lei, tenham força de lei nos limites da urgência e relevância, e sejam fonte de obrigação tributária.

Admitem-se no direito administrativo e no direito tributário os decretos do Poder Executivo.

No direito tributário, esses decretos regulamentares envolvem importância diante de atos do Executivo para permitir alterar as alíquotas e bases de cálculo de impostos sobre a importação, exportação, e sobre as operações de crédito, câmbio e seguros, por exemplo, com o objetivo de ajustá-los aos objetivos de uma política econômica. Afora isso, a alíquota e a base de cálculo dos demais tributos só podem ser determinados por lei e o decreto não pode atuar dentro do campo dos elementos essenciais dos tributos.

A Constituição autoriza que o Poder Executivo altere as alíquotas do IPI, atendidas as condições e os limites estabelecidos em lei (artigo 153, parágrafo 1º).

O Código Tributário Nacional, lei de normas gerais, materialmente complementar, no artigo 99, determina que “o conteúdo e o alcance dos decretos restringe-se aos das leis em função das quais sejam expedidos, determinados com observância das regras de intepretação estabelecidas na lei”. Quando se fala em regulamento, fala-se em regulamento secundum legem, não se admitindo os regulamentos independentes ou autônomos. Mas execução não é, literalmente, reprodução, atente-se.

As instruções, ao contrário, obrigam apenas aos serviços e não aos particulares e ao Poder Judiciário, pois são atos ordinatórios da Administração.

Por fim, o Senado Federal tem a missão de fixar os limites das alíquotas estaduais sobre circulação de mercadorias e do imposto de transmissão de bens imóveis, sendo, como tal, a Casa do Congresso representativa dos Estados.

 Fala-se ainda nos convênios, celebrados e ratificados pelos Estados, através dos quais serão concedidas ou revogadas as isenções do ICMS. O Convênio, como se vê, substitui a competência material do Poder Legislativo para disciplinar matéria do Poder Legislativo, para disciplinar isenções tributárias, exercendo assim a função de um sub-rogado constitucional do princípio da reserva absoluta de lei formal em matéria tributária.

As medidas provisórias também estão inseridas no princípio da legalidade diante de cediça jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. 

Exige-se com a aplicação do princípio da legalidade a necessária segurança jurídica.

Há, por certo, exceções ao princípio da legalidade.

A primeira exceção ao princípio da legalidade está esculpida no artigo 97, § 2° do CTN, que dispõe não constituir majoração de tributo a atualização do valor monetário da respectiva base de cálculo. Observe que o dispositivo está a tratar de atualização, e não em aumento da base de cálculo.

A segunda exceção ao princípio da legalidade está plasmada no artigo 153, § 1° da CF ao facultar ao Poder Executivo alterar as alíquotas do Imposto sobre Importação (II), Imposto sobre Exportação (IE), Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). O ato normativo é o decreto presidencial ou Portaria do Ministro da Fazenda, utilizada na prática para os impostos aduaneiros (II e IE).

Esta exceção está baseada no caráter extrafiscal destes impostos, vale dizer, são cobrados com a finalidade precípua de regular determinado setor da economia, exigindo maior dinamismo na alteração das alíquotas a fim de se adequar às rápidas variações da economia.

A terceira exceção ao princípio da legalidade está encartada no art. 177 § 4°, I, “b” da Constituição Federal, consistente na possibilidade de o Poder Executivo reduzir ou restabelecer a alíquota da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE), relativa às atividades de importação ou comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados e álcool combustível. Esta exceção se materializa por decreto presidencial, e passou a ter previsão no texto Constitucional com a Emenda Constitucional n° 33/2001.

A quarta exceção, também inovação trazida pela Emenda Constitucional n° 33/2001, é a do art. 155, § 4°, IV da CF, permitindo aos Estados e Distrito Federal definir as alíquotas do ICMS monofásico incidente sobre combustíveis. O instrumento normativo utilizado no presente caso é o convênio do CONFAZ (Conselho Nacional de Política Fazendária).

Ainda em relação às duas últimas exceções inseridas pela Emenda Constitucional n° 33/01, cabe grifar que enquanto na CIDE as alíquotas podem ser reduzidas ou restabelecidas (retornar ao patamar inicial); no ICMS monofásico incidente sobre combustíveis o texto normativo utiliza a expressão “definir”, o que está a demonstrar uma amplitude maior de poder conferido aos Estados e Municípios que reunidos no Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ) poderão não só restabelecer, mas aumentar a alíquota.

Discute-se com relação a aplicação do princípio da legalidade e a contribuição para o  PIS/COFINS.

Não há se falar em inconstitucionalidade da Lei 10.865/2004, pois o art. 27, § 2º, não autoriza a instituição ou a majoração de tributo mediante ato do Poder Executivo, tampouco delega a este a criação de fato gerador, de alíquota ou de base de cálculo de tributo. A referida permissão legislativa não trata propriamente de nenhum dos elementos que compõem as obrigações, mas apenas da possibilidade de redução e restabelecimento, pelo Poder Executivo, de alíquotas previamente determinadas na lei em sentido estrito. Ausência de ofensa ao princípio da legalidade.
O Decreto 8.426/2015 restabeleceu as alíquotas de contribuição para o PIS e da COFINS exatamente nos moldes indicados pela Lei 10.865/2004, ou seja, o ato infralegal foi perpetrado dentro dos limites do permissivo legal, não se verificando, assim, qualquer invalidade.Veja-se o que se disse no julgamento do RE 986.296, em regime de repercussão geral. 

A fixação de alíquotas do PIS e da Cofins incidente sobre as receitas financeiras está disciplinada no artigo 27, parágrafo 2º, da Lei 10.685/2004, que possibilita a redução e o restabelecimento respectivos por ato do Poder Executivo, e, assim, via decreto. Tal medida se justificaria pela suposta extrafiscalidade inerente a tais incidências. Portanto, valendo-se desse expediente, o governo, no contexto do tão falado ajuste fiscal, no passado,  houve por bem restabelecer as alíquotas, que estavam fixadas em zero, para o seu patamar original, sem falhar, inclusive, no respeito ao princípio da anterioridade.

Contudo, em que pese a existência de previsão legal e a observância da anterioridade, a fixação das alíquotas via decreto é  questionável. O ponto central da discussão está, exatamente, na autorização trazida pelo artigo 27, parágrafo 2º, da Lei 10.685/2004. É princípio basilar de direito tributário que os tributos sejam criados e modificados por lei, nos exatos termos do artigo 150, inciso I, da Constituição. Como se trata de uma diretriz constitucional, que reforça a necessidade de segurança jurídica na criação de ônus tributários, tal regra apenas pode ser excepcionada pela própria Constituição, tal como ocorre com impostos extrafiscais (II, IE, IPI e IOF) e a CIDE Combustíveis.

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A incidência de PIS e Cofins sobre receitas financeiras é legal, inexistindo violação aos comandos legal e constitucional. Essa foi a decisão tomada  pela 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), que negou recurso de uma empresa de tratores do Rio Grande do Sul que alegava inconstitucionalidade da cobrança e pedia a compensação dos valores.

A empresa, que teve o mandado de segurança julgado improcedente pela Justiça Federal de Santa Maria (RS), recorreu ao tribunal. O advogado alega que o artigo 195, inciso I-b, da Constituição, alterado pela Emenda Constitucional nº 20/98, passou a prever como base de cálculo apenas a receita (bruta) ou o faturamento, o que excluiria as receitas financeiras.

A defesa argumenta que o Decreto nº 8.426/15, que restabelece as alíquotas da contribuição para o PIS e Cofins sobre receitas financeiras das pessoas jurídicas sujeitas ao regime de apuração não cumulativa, teve por objetivo constitucionalizar a referida incidência, o que só poderia ter sido feito por lei complementar, já que estaria criando nova fonte de custeio.

Segundo o relator do processo, desembargador federal Otávio Roberto Pamplona, houve equívoco da defesa ao confundir os conceitos de faturamento e de receita. Conforme o desembargador, “faturamento, na acepção constitucional, constitui a receita bruta decorrente da venda de mercadorias e ou da prestação de serviços ou, ainda, aquela decorrente do objeto principal da empresa. Já o conceito de receita é muito mais amplo, abrangendo todos os ingressos na empresa (receitas operacionais e não operacionais, inclusive financeiras)”.

Quanto ao Decreto nº 8.426/15, alterado pelo Decreto nº 8.451/15, Pamplona assinalou que a evolução normativa permite concluir que não há ofensa ao princípio da legalidade, pois ambos foram editados com “prévia e expressa autorização legal, observando os elementos essenciais para a validade e exigibilidade das exações definidas formal e materialmente pelas Leis nºs 10.637/02 e 10.833/03”.

O desembargador ressaltou que a Lei nº 10.865/04, em seu artigo 27, parágrafo 2º, não autorizou o Poder Executivo a elevar as alíquotas das contribuições PIS e Cofins incidentes sobre as receitas financeiras das referidas empresas, mas permitiu ‘reduzir’ ou ‘restabelecer’.

“O fato de inexistir expressa autorização constitucional para que o Poder Executivo edite ato normativo elevando ou reduzindo as alíquotas das exações ora discutidas, a exemplo do que ocorre com o Imposto de Importação, o Imposto de Exportação, o Imposto sobre Operações financeiras, o Imposto sobre Produtos Industrializados e a CIDE relativa às atividades de importação ou comercialização de petróleo, gás natural e álcool (arts. 153, § 1º, e 177, § 4º, inc. I, alínea 'b', da CF), não implica inconstitucionalidade do Decreto nº 8.426/15, visto que amparado em autorização legal, bem como porque não houve inovação em relação ao texto legal, que prevê todos os elementos essenciais para a validade e exigibilidade do tributo (hipótese de incidência, sujeição passiva, alíquota e base de cálculo)”, analisou.

O Desembargador Pamplona acentuou que não há ofensa ao princípio da não-cumulatividade, pois, de acordo com a jurisprudência do TRF4, a forma de incidência das contribuições PIS e Cofins está sujeita à conformação da lei.

Por fim, o desembargador frisou que a Lei nº 10.865/04 excluiu a possibilidade de apuração de créditos de PIS e Cofins sobre despesas financeiras decorrentes de empréstimos e financiamentos. “Dessa forma, não havendo, atualmente, previsão legal para apuração de créditos de PIS e COFINS sobre as despesas correlatas, resta inviável o creditamento pleiteado”, concluiu.

Poder-se-ia dizer que a  modificação se justificaria pelo fato de a incidência nessa hipótese específica estaria vinculada a uma finalidade extrafiscal. Como regra, a Constituição permite a alteração de alíquotas via Decreto exatamente para contemplar situações de intervenção na economia, que devem ser céleres e distantes do jogo político do Poder Legislativo. Não obstante, não é esse o caso. Ainda que a interferência no mercado financeiro possua impactos econômicos significativos, não é possível dizer que, apenas por essa razão, a modificação via decreto estaria autorizada. Reitere-se: tal faculdade concedida ao chefe do Poder Executivo apenas se justifica diante de norma constitucional nesse sentido, inexistente na hipótese.

Destaco a posição do  TRF4 - Região, na Apelação Cível Nº 5017374-57.2013.4.04.7107 (Processo Eletrônico - E-Proc V2 - TRF)
 

"Infere-se da previsão expressa dos artigos 195, § 6º e 150, § 1º que as contribuições sociais devem ser instituídas por lei e exigidas apenas 90 (noventa) dias após sua publicação.
Artigo 195 (...) § 6º - As contribuições sociais de que trata este artigo só poderão ser exigidas após decorridos noventa dias da data da publicação da lei que as houver instituído ou modificado, não se lhes aplicando o disposto no art. 150, III, "b" (anterioridade anual).
Artigo 150 (...) § 1º A vedação do inciso III, b, não se aplica aos tributos previstos nos arts. 148, I, 153, I, II, IV e V; e 154, II; e a vedação do inciso III, c, não se aplica aos tributos previstos nos arts. 148, I, 153, I, II, III e V; e 154, II, nem à fixação da base de cálculo dos impostos previstos nos arts. 155, III, e 156, I.
É cristalino, portanto, que PIS e COFINS perfazem exceção tão somente à anterioridade anual, devendo observar tanto o princípio (ou regra, por precisão teórica) da legalidade quanto da anterioridade nonagesimal.
Tendo em vista tais ditames, cuidou a Lei 10.830/2004 da instituição da Contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público incidente na Importação de Produtos Estrangeiros ou Serviços - PIS/PASEP-Importação e da Contribuição Social para o Financiamento da Seguridade Social devida pelo Importador de Bens Estrangeiros ou Serviços do Exterior - COFINS-Importação, tendo definido sua hipótese de incidência, fato gerador, sujeito passivo, base de cálculo, alíquotas,  isenções e prazo de recolhimento.
 No que pertine ao regime especial estabelecido aos produtores e importadores de combustível, o artigo 23 estipulou expressamente os valores das contribuições sob alíquotas específicas discriminadas em seus incisos. Tais alíquotas, independentemente dos Decretos emanados do Poder Executivo, remanesceram inalteradas.
A permissão trazida pelo § 5º do dispositivo é para que o Executivo fixe coeficientes de redução dessas alíquotas, estabelecendo regime mais benéfico ao importador que a simples aplicação da alíquota específica pura.
Foi com base em tal permissão que o Decreto 5.059/2004 fixou os coeficientes de redução. O Decreto 8.395/2015, por sua vez, diminuiu tais coeficientes sem, contudo, subverter as alíquotas fixadas em lei.
Verifica-se assim que o regime estabelecido via Decreto asseguraria ao contribuinte tratamento menos gravoso que a aplicação isolada da alíquota estabelecida pelo texto legal (incisos do artigo 23). A veiculação de tais permissivos por Decreto, assim, em um juízo de legalidade estrita, não ofenderia o artigo 150, I do texto Constitucional, eis que não há alteração das alíquotas do tributo.
A argumentação trazida pela impetrante, sob essa perspectiva, seria pertinente acaso se estivesse a discutir a majoração, por exemplo, da CIDE Combustíveis. Explica-se. No caso da CIDE combustíveis, por vezes apontada como exceção ao princípio da legalidade em matéria tributária, é permitida a alteração da alíquota por ato do Poder Executivo, desde que para reduzi-la ou restabelecê-la, nos termos do artigo 177, § 4º, I, "b":
§ 4º A lei que instituir contribuição de intervenção no domínio econômico relativa às atividades de importação ou comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados e álcool combustível deverá atender aos seguintes requisitos: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001)
I - a alíquota da contribuição poderá ser: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001)
a) diferenciada por produto ou uso; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001)
b)reduzida e restabelecida por ato do Poder Executivo, não se lhe aplicando o disposto no art. 150,III, b;
Acaso tivesse havido aumento da alíquota por Decreto, haveria aí flagrante inconstitucionalidade.
Havendo no caso em voga mera alteração do critério de redução (que ainda importa tratamento mais benéfico ao contribuinte) de uma alíquota que remanesce inalterada, não haveria, repise-se, em análise sob o prisma da estrita dogmática, prima facie, violação à anterioridade ou à legalidade.
É bem sabido que, diante de problemas macroeconômicos, pode-se se valer o Estado de políticas cambiais, monetárias e fiscais expansionistas ou reducionistas, procurando restabelecer eventual desequilíbrio momentâneo. E para tanto, a CR/88 instrumentalizou o Poder Público com medidas aptas a tal fim.
A opção política em momentos de crise energética, como a que se anuncia neste momento (e o mérito não cumpre ao Poder Judiciário analisar), tradicionalmente empurra a escolha estatal para longe das políticas monetárias e cambiais, avançando pela política fiscal. Ao que parece, a escolha do Poder Executivo Federal tem sido pela redução dos gastos governamentais e conseqüente elevação da carga tributária. O fato é que, por força de previsão constitucional, a tributação sobre o comércio exterior é gravada preponderantemente pela extrafiscalidade, concedendo-se ao Poder Executivo um vasto campo de manejo de alíquotas, e, no caso, de redução ou elevação dos coeficientes de redução, justamente para, "dentro da legalidade estrita que instituiu o PIS/COFINS importação", alcançar momentaneamente os fins estatais políticos almejados.
Todavia, não obstante a justificação lógico-jurídica suso explicitada, uma análise alargada e sistemática da legalidade autoriza a conclusão de que sua observância perfaz garantia também à separação dos poderes. Em matéria tributária, a delegação ao Poder Executivo é possível mas limitada às hipóteses previstas constitucionalmente.
Com efeito, nos casos em que pretendeu outorgar ao Poder Executivo a definição de alcance da tributação sob o aspecto quantitativo, a Constituição Federal o fez expressamente, tal como verificado, por exemplo, nos impostos de importação e exportação, IPI, IOF, Cide combustíveis (para redução e restabelecimento de alíquotas) e ICMS monofásico. Assevera SCHOUERI que "não há mitigação tácita ao Princípio da legalidade em matéria tributária. Quando o constituinte assim desejou, ele expressamente previu a possibilidade de o Executivo, nos limites da lei, aletrar as alíquotas"(SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito Tributário. 2ª Ed. Saraiva: 2012, p. 297).
Assim, o Poder Legislativo viola reserva absoluta da legalidade ao deixar de dispor sobre matéria que lhe compete delegando ao Executivo a fixação do alcance da norma tributária quando não fora expressamente autorizado pela Constituição Federal a tanto. É o que se verifica quando, assim como no presente caso, o Legislativo estabelece uma alíquota elevada e autoriza o Executivo a reduzi-la posteriormente. Prevendo de antemão situação insustentável pela tributação preconizada, permite-se sua "adequação" através do relaxamento à legalidade, o que afeta, sobretudo, os princípios da segurança jurídica (Rechtssicherheit), da razoabilidade (Verhältnissmässigkeitsprinzip) e o da proibição da não-surpresa (Prinzip der geringsten Überraschung) na linha de Klaus Tipke e Joachim Lang.
Uma vez mais se conclui com SCHOUERI que: "a concessão de um benefício inconstitucional  constrange os beneficiários a não o contestarem, sob o risco de não gozarem o privilégio. Cria-se assim uma situação de limitação de exercício da liberdade. Alguns receberão os frutos de um favor do executivo, substituindo, daí, a relação jurídica baseada em direitos, por uma situação de benevolência, carecedora de gratidão ao Executivo, quando este os exclui de serem tratados de acordo com o que diz a lei" (SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito Tributário. 2ª Ed. Saraiva: 2012, p. 299-300).
É exatamente a situação estabelecida pelo artigo 23, § 5º da Lei 10.865/04. Tendo as alíquotas sido estabelecidas em patamar em tese inaplicável faticamente ao regime especial, cuidou o Legislativo, sem qualquer permissivo constitucional nesse sentido, de prever atribuição expressa ao Poder Executivo para sua redução, através do estabelecimento de coeficientes de diminuição. E porque benéfica a situação instalada pelo Decreto 5.059/2004 (por suposta benevolência do poder público), não havia razão para que os contribuintes a questionassem ou para que a Fazenda Pública suscitasse a inadequação de seu próprio ato, até a edição do Decreto 8.395/2013.
Entretanto, cogitar-se da simples declaração de inconstitucionalidade do dispositivo em voga, acarretaria situação extremamente gravosa aos contribuintes (eis que importaria aplicação da alíquota pura fixada por lei sem a redução operada via Decreto), para além de inoportuna sob a perspectiva do controle difuso e do respeito aos limites objetivos da demanda.
Nessa perspectiva, é possível cogitar-se de uma releitura dessa normativa tributária sob o enfoque da boa fé objetiva, enquanto princípio informador das condutas privadas, como imperativo de confiança, e de que deriva os efeitos da supressio e surrectio.
Tendo a alíquota fixada pelo Decreto 5.059/2004 vigorado por mais de 10 (dez) anos, vislumbra-se no caso, de forma análoga à supressio, redução do conteúdo obrigacional sob a perspectiva do fisco, posto que não usufruído por período considerável de tempo sem que tenha revelado a intenção de fazê-lo. A observância pelo Poder Público da alíquota reduzida pelo Decreto, e não do valor específico estabelecido em Lei (incisos do artigo 23) fez surgir para a parte adversa, a exemplo da surrectio, expectativa de que a obrigação seria exercida sob a forma inconstitucionalmente institucionalizada.
A aplicação da alíquota na forma estabelecida pelo Decreto 5.059/2004, portanto, apesar de derivada da previsão inconstitucional contida no § 5º do artigo 23 da Lei 10.865/04, mostra-se adequada, sob o prisma da segurança jurídica, da razoabilidade e da não surpresa, até que sejam integralmente fixadas, por lei, e sem indevidos subterfúgios permissivos ao Poder Executivo, alíquotas específicas adequadas.
Essa inconstitucional delegação legislativa ao Poder Executivo não ocorreu apenas na norma ora hostilizada, mas também em outras normas contidas na mesma Lei 10.865/2004, como são os casos do § 11 do art. 8º e do § 2º do art. 27. E esse vício não passou despercebido pela doutrina, como se vê no seguinte comentário de LEANDRO PAULSEN ao § 11 do art. 8º (Direito tributário: constituição e código tributário à luz da doutrina e da jurisprudência. 16. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2014, p. 646 - grifei): Esta delegação ao Executivo para integrar a norma tributária impositiva, mexendo em seu aspecto quantitativo, contudo, não encontra previsão constitucional.
Embora a norma do § 5º do art. 23 não autorize a alteração da alíquota diretamente, alcança o mesmo objetivo por via transversa, ao permitir ao Poder Executivo criar e alterar "coeficientes para redução das alíquotas", o que não afasta, por óbvio, a nódoa da inconstitucionalidade.
Por fim, no que diz respeito ao segundo requisito exigido pelo art. 273 do CPC para a antecipação da tutela, penso que o risco de dano de difícil reparação decorre da iminente chegada do combustível importado pela autora, aliada à inevitável cobrança da exação indevida pela autoridade fazendária, eis que adstrita ao comando da norma tributária questionada (parágrafo único do art. 142 do CTN), o que implicaria submeter a autora ao indevido solve et repete.
Ante o exposto, defiro o pedido de antecipação da tutela para suspender a exigibilidade dos tributos em tela (PIS-importação e COFINS-importação), calculados com as alterações dos coeficientes de redução trazidas pelo Decreto 8.395/2015, de modo que eles devem continuar sendo calculados (e exigidos) com a utilização dos coeficientes de redução previstos pelo Decreto 5.059/2004 em sua redação original, até que sobrevenha lei (em sentido estrito) dispondo sobre tais coeficientes sem inconstitucionais delegações ao Poder Executivo.
Intimem-se as partes da presente decisão."


A partir de 01/05/2004, por força do art. 23 da Lei 10.865/2004, o importador ou fabricante de gasolina automotiva e óleo diesel poderá optar por regime especial de apuração e pagamento das contribuições para o PIS e COFINS, no qual os valores das contribuições são fixados por unidade de metro cúbico do produto.
 

 
ÁLCOOL PARA FINS CARBURANTES - ALÍQUOTAS
 
ALÍQUOTA COFINS
ALÍQUOTA PIS
SOBRE A RECEITA DECORRENTE DE:
6,74%
1,46%
álcool hidratado para fins carburantes efetuada por distribuidor (exceto quando adicionado á gasolina)
3%
0,65%
álcool anidro para fins carburantes efetuada por produtor ou importador
0%
0%
álcool hidratado para fins carburantes efetuada por comerciante varejista (exceto álcool importado)
0%
0%
álcool anidro para fins carburantes adicionado à gasolina pelo distribuidor
 
Bases: artigo 5 da Lei 9.718/1998, com redação dada pela Lei 9.990/2000, e art. 11 da IN SRF 594/2005.

Anoto, outrossim, outro julgamento do TRF - 4ª Região, no Agravo de Instrumento Nº 5008054-90.2015.4.04.0000 (Processo Eletrônico - E-Proc V2 - TRF): 

"É cristalino, portanto, que PIS e COFINS perfazem exceção tão somente à anterioridade anual, devendo observar tanto o princípio (ou regra, por precisão teórica) da legalidade quanto da anterioridade nonagesimal.
Tendo em vista tais ditames, cuidou a Lei 10.830/2004 da instituição da Contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público incidente na Importação de Produtos Estrangeiros ou Serviços - PIS/PASEP-Importação e da Contribuição Social para o Financiamento da Seguridade Social devida pelo Importador de Bens Estrangeiros ou Serviços do Exterior - COFINS-Importação, tendo definido sua hipótese de incidência, fato gerador, sujeito passivo, base de cálculo, alíquotas, isenções e prazo de recolhimento.
No que pertine ao regime especial estabelecido aos produtores e importadores de combustível, o artigo 23 estipulou expressamente os valores das contribuições sob alíquotas específicas discriminadas em seus incisos. Tais alíquotas, independentemente dos Decretos emanados do Poder Executivo, remanesceram inalteradas.
A permissão trazida pelo § 5º do dispositivo é para que o Executivo fixe coeficientes de redução dessas alíquotas, estabelecendo regime mais benéfico ao importador que a simples aplicação da alíquota específica pura.
Foi com base em tal permissão que o Decreto 5.059/2004 fixou os coeficientes de redução. O Decreto 8.395/2015, por sua vez, diminuiu tais coeficientes sem, contudo, subverter as alíquotas fixadas em lei.
Verifica-se assim que o regime estabelecido via Decreto asseguraria ao contribuinte tratamento menos gravoso que a aplicação isolada da alíquota estabelecida pelo texto legal (incisos do artigo 23). A veiculação de tais permissivos por Decreto, assim, em um juízo de legalidade estrita, não ofenderia o artigo 150, I do texto Constitucional, eis que não há alteração das alíquotas do tributo.
A argumentação trazida pela impetrante, sob essa perspectiva, seria pertinente acaso se estivesse a discutir a majoração, por exemplo, da CIDE Combustíveis. Explica-se. No caso da CIDE combustíveis, por vezes apontada como exceção ao princípio da legalidade em matéria tributária, é permitida a alteração da alíquota por ato do Poder Executivo, desde que para reduzi-la ou restabelecê-la, nos termos do artigo 177, § 4º, I, "b":
§ 4º A lei que instituir contribuição de intervenção no domínio econômico relativa às atividades de importação ou comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados e álcool combustível deverá atender aos seguintes requisitos: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001)
I - a alíquota da contribuição poderá ser: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001)
a) diferenciada por produto ou uso; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001)
b)reduzida e restabelecida por ato do Poder Executivo, não se lhe aplicando o disposto no art. 150,III, b;
Acaso tivesse havido aumento da alíquota por Decreto, haveria aí flagrante inconstitucionalidade.
Havendo no caso em voga mera alteração do critério de redução (que ainda importa tratamento mais benéfico ao contribuinte) de uma alíquota que remanesce inalterada, não haveria, repise-se, em análise sob o prisma da estrita dogmática, prima facie, violação à anterioridade ou à legalidade.
É bem sabido que, diante de problemas macroeconômicos, pode-se se valer o Estado de políticas cambiais, monetárias e fiscais expansionistas ou reducionistas, procurando restabelecer eventual desequilíbrio momentâneo. E para tanto, a CR/88 instrumentalizou o Poder Público com medidas aptas a tal fim.
A opção política em momentos de crise energética, como a que se anuncia neste momento (e o mérito não cumpre ao Poder Judiciário analisar), tradicionalmente empurra a escolha estatal para longe das políticas monetárias e cambiais, avançando pela política fiscal. Ao que parece, a escolha do Poder Executivo Federal tem sido pela redução dos gastos governamentais e conseqüente elevação da carga tributária. O fato é que, por força de previsão constitucional, a tributação sobre o comércio exterior é gravada preponderantemente pela extrafiscalidade, concedendo-se ao Poder Executivo um vasto campo de manejo de alíquotas, e, no caso, de redução ou elevação dos coeficientes de redução, justamente para, "dentro da legalidade estrita que instituiu o PIS/COFINS importação", alcançar momentaneamente os fins estatais políticos almejados.
Todavia, não obstante a justificação lógico-jurídica suso explicitada, uma análise alargada e sistemática da legalidade autoriza a conclusão de que sua observância perfaz garantia também à separação dos poderes. Em matéria tributária, a delegação ao Poder Executivo é possível mas limitada às hipóteses previstas constitucionalmente.
Com efeito, nos casos em que pretendeu outorgar ao Poder Executivo a definição de alcance da tributação sob o aspecto quantitativo, a Constituição Federal o fez expressamente, tal como verificado, por exemplo, nos impostos de importação e exportação, IPI, IOF, Cide combustíveis (para redução e restabelecimento de alíquotas) e ICMS monofásico. Assevera SCHOUERI que "não há mitigação tácita ao Princípio da legalidade em matéria tributária. Quando o constituinte assim desejou, ele expressamente previu a possibilidade de o Executivo, nos limites da lei, aletrar as alíquotas"(SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito Tributário. 2ª Ed. Saraiva: 2012, p. 297).
Assim, o Poder Legislativo viola reserva absoluta da legalidade ao deixar de dispor sobre matéria que lhe compete delegando ao Executivo a fixação do alcance da norma tributária quando não fora expressamente autorizado pela Constituição Federal a tanto. É o que se verifica quando, assim como no presente caso, o Legislativo estabelece uma alíquota elevada e autoriza o Executivo a reduzi-la posteriormente. Prevendo de antemão situação insustentável pela tributação preconizada, permite-se sua "adequação" através do relaxamento à legalidade, o que afeta, sobretudo, os princípios da segurança jurídica (Rechtssicherheit), da razoabilidade (Verhältnissmässigkeitsprinzip) e o da proibição da não-surpresa (Prinzip der geringsten Überraschung) na linha de Klaus Tipke e Joachim Lang.
Uma vez mais se conclui com SCHOUERI que: "a concessão de um benefício inconstitucional constrange os beneficiários a não o contestarem, sob o risco de não gozarem o privilégio. Cria-se assim uma situação de limitação de exercício da liberdade. Alguns receberão os frutos de um favor do executivo, substituindo, daí, a relação jurídica baseada em direitos, por uma situação de benevolência, carecedora de gratidão ao Executivo, quando este os exclui de serem tratados de acordo com o que diz a lei" (SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito Tributário. 2ª Ed. Saraiva: 2012, p. 299-300).
É exatamente a situação estabelecida pelo artigo 23, § 5º da Lei 10.865/04. Tendo as alíquotas sido estabelecidas em patamar em tese inaplicável faticamente ao regime especial, cuidou o Legislativo, sem qualquer permissivo constitucional nesse sentido, de prever atribuição expressa ao Poder Executivo para sua redução, através do estabelecimento de coeficientes de diminuição. E porque benéfica a situação instalada pelo Decreto 5.059/2004 (por suposta benevolência do poder público), não havia razão para que os contribuintes a questionassem ou para que a Fazenda Pública suscitasse a inadequação de seu próprio ato, até a edição do Decreto 8.395/2013.
Entretanto, cogitar-se da simples declaração de inconstitucionalidade do dispositivo em voga, acarretaria situação extremamente gravosa aos contribuintes (eis que importaria aplicação da alíquota pura fixada por lei sem a redução operada via Decreto), para além de inoportuna sob a perspectiva do controle difuso e do respeito aos limites objetivos da demanda.
Nessa perspectiva, é possível cogitar-se de uma releitura dessa normativa tributária sob o enfoque da boa fé objetiva, enquanto princípio informador das condutas privadas, como imperativo de confiança, e de que deriva os efeitos da supressio e surrectio.
Tendo a alíquota fixada pelo Decreto 5.059/2004 vigorado por mais de 10 (dez) anos, vislumbra-se no caso, de forma análoga à supressio, redução do conteúdo obrigacional sob a perspectiva do fisco, posto que não usufruído por período considerável de tempo sem que tenha revelado a intenção de fazê-lo. A observância pelo Poder Público da alíquota reduzida pelo Decreto, e não do valor específico estabelecido em Lei (incisos do artigo 23) fez surgir para a parte adversa, a exemplo da surrectio, expectativa de que a obrigação seria exercida sob a forma inconstitucionalmente institucionalizada.
A aplicação da alíquota na forma estabelecida pelo Decreto 5.059/2004, portanto, apesar de derivada da previsão inconstitucional contida no § 5º do artigo 23 da Lei 10.865/04, mostra-se adequada, sob o prisma da segurança jurídica, da razoabilidade e da não surpresa, até que sejam integralmente fixadas, por lei, e sem indevidos subterfúgios permissivos ao Poder Executivo, alíquotas específicas adequadas.
No entanto, adstrito que está o Julgador aos limites fixados objetivamente pelo demandante, tal aplicação deve circunscrever-se ao universo temporal de 90 (noventa) dias contados da publicação do Decreto, nos termos do pedido deduzido pela Impetrante."

A Contribuição para o PIS/Pasep e a Cofins incidente sobre gasolina (exceto de aviação), óleo diesel, GLP e álcool para fins carburantes é calculada, aplicando-se alíquotas diferenciadas sobre a receita bruta auferida com as vendas destes produtos pelos produtores, importadores, refinarias de petróleo e distribuidores de álcool para fins carburantes.
Fica reduzida para zero as alíquotas aplicadas sobre a receita auferida com as vendas efetuadas pelos distribuidores e comerciantes varejistas.
O importador e o fabricante de gasolina, exceto de aviação, de óleo diesel e de GLP podem optar, na forma disposta na Instrução Normativa SRF 876/2008, por regime de apuração e pagamento da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins no qual os valores das contribuições são calculados por unidade de metro cúbico do produto.

Os produtores e importadores de combustíveis estão submetidos ao regime de incidência monofásica das contribuições ao PIS/PASEP e à COFINS.

A tributação com relação ao PIS/PASEP e da COFINS engloba, basicamente, os seguintes combustiveis: gasolinas, exceto gasolina de aviação; óleo diesel; gás liquefeito de petróleo - GLP e querosene de avião.

Com relação aos distribuidores e varejistas,  as receitas obtidas com a venda de produtos abrangidos na incidência acima mencionada, são integralmente tributadas pelo PIS/PASEP e pela COFINS no fabricante ou importador, por isso devem ser controladas à parte pelos distribuidores e varejistas para facilitar a exclusão dessas parcelas na apuração da base de cálculo das contribuições.

Para fins de apuração do PIS e COFINS devidos, a partir de 01/8/2004, com a entrada em vigor do art. 21 da Lei nº 10.865, de 2004, as receitas obtidas por uma pessoa jurídica com a venda de produtos passaram a submeter-se ao mesmo regime de apuração a que esteja vinculada a pessoa jurídica. No caso de revenda de combustíveis, o pagamento do PIS e COFINS é pelo regime monofásico.
Assim, desde que não haja limitação em vista da atividade comercial da empresa, a uma pessoa jurídica comerciante varejista de gasolina (exceto gasolina de aviação) e óleo diesel que apure o PIS e COFINS pelo regime não cumulativo pode utilizar créditos sobre os demais produtos adquiridos para revenda, sendo vedado o crédito relativo à compra dos combustíveis.
A receita de venda de gás natural veicular (GNV) não sofre incidência monofásica da contribuição do PIS e COFINS. Sujeita-se, portanto, às regras da cumulatividade ou da não cumulatividade aplicadas aos bens em geral, a depender do regime a que esteja submetida a pessoa jurídica. No caso de pessoa jurídica tributada em regime não cumulativo, as receitas de venda desse produto sofrem incidência do PIS e COFINS, com a possibilidade de desconto dos créditos admitidos pela legislação.

O regime monofásico de incidência consiste basicamente em cobrar do fabricante ou importador o PIS/PASEP e a COFINS incidentes em todas as fases da cadeia de produção, distribuição e comercialização, mediante aplicação de alíquotas especiais, maiores que as normais.

II - O PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE

Na alínea “b” do inciso III do art. 150 da CF/88, tem-se  a previsão da regra clássica da anterioridade, denominada “anterioridade genérica”. Tal regra existe desde o poder constituinte originário. A lei tributária que institua tributo, revoga benefício ou majora a tributação, deve respeitar obrigatoriamente o decurso do prazo do exercício financeiro. Em outras palavras, a lei tributária deve gerar os seus efeitos apenas a partir do primeiro dia do exercício financeiro seguinte.

Quer dizer que, uma lei tributária qualquer publicada no meio do exercício,  instituindo um determinado tributo (ou aumentando sua base de cálculo, aumentando sua alíquota, instituindo um novo sujeito passivo, revogando uma isenção, entre outra forma de majoração), somente passará a produzir os seus efeitos a partir do primeiro dia do exercício seguinte.

Na alínea “c”, introduzida por força da Emenda Constitucional n 42/2003, está a chamada “anterioridade qualificada” ou “noventena” Por tal regramento, a legislação tributária que aumenta tributo (revoga benefício, introduza novo sujeito passivo, entre outros), além de respeitar o exercício, ainda terá que respeitar um prazo mínimo de 90 dias entre a sua publicação e o dia em que efetivamente entra em vigor.

Entre a publicação da lei e a sua vigência (momento que ela passa a produzir os seus efeitos) é preciso, pois, que haja um período mínimo de 90 (noventa) dias.

Necessário frisar, entretanto, que tal regra não afasta a necessidade de respeito ao exercício financeiro.

Por sua vez, o  princípio da anterioridade genérica (art. 150, III, “b”) encontra exceção nas contribuições sociais previdenciárias, previstas no art. 195, I ao IV da CF/88. Isto porque, a este tributo se aplica uma anterioridade especial, denominada anterioridade nonagesimal. É o que se lê do  disposto no parágrafo 6º, do artigo 195, da Constituição Federal:

“As contribuições sociais de que trata este artigo só poderão ser exigidas depois de decorridos noventa dias da data da publicação da lei que as houver instituído ou modificado, não se lhe aplicando o disposto no art. 150, III, b”.

A anterioridade nonagesimal das contribuições sociais previdenciárias preceitua, pois, que esta espécie de gravame deverá ser exigida 90 (noventa) dias após a publicação da lei que a instituiu ou a modificou.

Em regra o princípio da anterioridade do exercício financeiro e a nonagesimal aplicam-se a todos a todas as leis que instituam ou majorem tributos. Porém, a própria Constituição Federal excepciona os dois princípios da seguinte forma: A anterioridade anual não se aplica ao II, IE, IOF, IPI, Imposto Extraordinário, Empréstimo Compulsório de Guerra, Cide-Combustível, ICMS-Combustível e Contribuições da Seguridade Social. A anterioridade nonagesimal não se aplica ao II, IE, IOF, IR, Imposto Extraordinário, Empréstimo Compulsório de Guerra, Base de Cálculo do IPTU e IPVA.

Assim o  previsto no art. 150, II, b, a anterioridade de exercício, impede a
cobrança de tributos no mesmo exercício da edição da lei que os instituiu ou
aumentou e o previsto no art. 150, II, c, a noventena impede a cobrança de
tributos, antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a
lei que os instituiu ou aumentou.

Não se confunde com o princípio da anualidade, que reclamava a
existência de autorização anual do Legislativo mediante a inclusão das receitas
a serem arrecadadas no respectivo orçamento (CF 1946, art. 141, §34).

As contribuições social-previdenciárias instituídas ou modificadas por medida provisória, à luz da jurisprudência do STF, devem obedecer ao Princípio da Anterioridade Tributária Especial. Assim, para as contribuições social-previdenciárias (PIS, COFINS, CSLL, e outras previstas no artigo 195 , incisos I a IV da CF), que de acordo com o § 6º do artigo 195 da CF , deverá ser exigida 90 dias após a publicação da lei que a instituiu ou a modificou, assim, aplica-se o Princípio da Anterioridade Nonagesimal ou Mitigada a elas. E mais, a parte final do § 6º do artigo 195, não deve ser aplicada o princípio da anterioridade comum  prevista no art. 150 , III , b , da CF . Isso significa que se aplica somente o período da anterioridade de 90 dias, a qual o termo a quo será o da data da publicação da lei instituidora ou majoradora do gravame.

A CIDE-Combustível também constitui uma exceção ao princípio da
anterioridade nos termos da CF, 177, § 4o:

§ 4º A lei que instituir contribuição de intervenção no domínio
econômico relativa às atividades de importação ou
comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus
derivados e álcool combustível deverá atender aos seguintes
requisitos:
I - a alíquota da contribuição poderá ser:
a) diferenciada por produto ou uso;
b) reduzida e restabelecida por ato do Poder Executivo, não se lhe
aplicando o disposto no art. 150, III, "b";
Como a exceção limita-se à anterioridade de exercício, o restabelecimento
das alíquotas deve observar a limitação da noventena.
É necessário investigar o sentido do termo restabelecimento que não se pode
confundir com majoração. Aqui, restabelecer significa trazer a alíquota ao limite
estabelecido em lei. A majoração ocorre quando a alíquota vai a patamar
superior ao estabelecido na lei.

Naquilo  que se refere à majoração das alíquotas da CIDE-Combustíveis, não há
qualquer exceção ao princípio da anterioridade. 
Também constitui exceção ao princípio da anterioridade (CF, 150, III, b) a
hipótese de ICMS de incidência monofásica (ICMS- Combustíveis).
CF, 155...
§ 4º Na hipótese do inciso XII, "h", observar-se-á o seguinte:...
IV - as alíquotas do imposto serão definidas mediante deliberação
dos Estados e Distrito Federal, nos termos do § 2º, XII, "g",
observando-se o seguinte:
c) poderão ser reduzidas e restabelecidas, não se lhes aplicando o
disposto no art. 150, III, "b".
Cumpre notar que tanto a CIDE-Combustível como o ICMS- Combustível
constituem exceções somente em relação à anterioridade de exercício CF,
150, III, “b”) e não à noventena (CF, 150, III, “c”) que deve ser observada.

III - A QUESTÃO DO DÉFICIT FISCAL  E A CIDE

Pois bem:segundo o site da Folha de São Paulo, dia 20 de julho do corrente ano,  tem-se: 

"Em nota divulgada nesta quinta (20), os ministérios da Fazenda e do Planejamento informaram que o PIS/Cofins que incide sobre a gasolina vai dobrar, de R$ 0,38 por litro para R$ 0,79 por litro.

Com isso, o litro do combustível poderá ficar até R$ 0,41 mais caro nas bombas.

As novas alíquotas serão publicadas na edição desta sexta (21) do Diário Oficial da União. Os aumentos passarão a vigorar a partir de então.

O PIS/Cofins pago pelo distribuidor de etanol, hoje zerado, vai a R$ 0,19.

O litro do diesel poderá ficar R$ 0,21 mais caro, já que alíquota subirá de R$ 0,24 para R$ 0,46.

O governo informou que espera arrecadar R$ 10,4 bilhões neste ano com o aumento de imposto.

Além disso, o Ministério da Fazenda informou que vai bloquear mais R$ 5,9 bilhões em despesas do Orçamento.

O aumento de impostos e o bloqueio extra ocorrem em um momento em que o governo enfrenta dificuldades em obter receitas.

A recuperação da economia é lenta, o que afeta a arrecadação de impostos, e projetos importantes no Congresso, como o Refis e a reoneração da folha de pagamentos, estão emperrados no Congresso Nacional."

Data vênia, diante do que foi dito na presente manifestação, tal exação afigura-se inconstitucional. A uma, porque fere o principio da legalidade; a duas, porque afronta a anterioridade nonagesimal, que se impõe às contribuições sociais.  

 
A matéria aqui discutida é de substancial importância em face do noticiado déficit orçamentário da União Federal.

Em artigo para a Folha, disse o ex-ministro da Fazenda Delfin Neto:

"Entretanto, a realidade, reconhecida pelo próprio ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, é que a situação fiscal "continua gravíssima". Uma das razões para isso é que parece ter havido uma "quebra estrutural" entre a evolução do PIB e a da receita federal, por conta da qual esta última tem sido superestimada.

Por outro lado, a rigidez insuperável das despesas obrigatórias tem elevado o seu montante acima da taxa de inflação. A combinação desses fatos levará à necessidade de algum aumento de imposto.

Pois bem: o único tributo que produz um aumento do PIB é aquele sobre a gasolina, porque estimula a produção de etanol, ajuda o meio ambiente e recupera a situação do setor alcooleiro, além de ter efeito insignificante sobre a inflação neste momento. Há meses a Cide deveria ter sido aumentada para estimular a produção do etanol nacional e para protegê-lo da concorrência desleal das importações criadas em 2017. Chega de filosofia!"

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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