A INCIDÊNCIA DO ICMS SOBRE A TUSD E A TUST

ATUAL(IS) POSICIONAMENTO(S) DO STJ

25/07/2017 às 12:23
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O STJ tem se manifestado tanto a favor quanto contra a incidência do ICMS sobre os valores cobrados a título de TUSD e TUST nas contas de energia, este artigo procura expor sucintamente, as razões que levaram às decisões.

CONTEXTUALIZAÇÃO FÁTICA

No último artigo tentamos delinear o ambiente fático em que se opera a incidência do ICMS sobre o fornecimento de energia elétrica, lá discorremos acerca das duas formas distintas em que este ocorre, a primeira se dá no chamado Ambiente de Contratação Regulado – ACR, quando a contratação pelo consumidor se dá na condição de cliente cativo, nesta forma, ocorrerá concomitantemente, a cobrança pelo uso (kW) dos sistemas de transmissão e distribuição e pela energia fornecida e consumida (kWh), lembrando que, ainda no ambiente regulado, a tarifação ainda pode se dar de forma monômia (kWh) ou binômia (kWh e kW).

A segunda forma de fornecimento se dá no Ambiente de Contratação Livre - ACL, no qual os chamados clientes livres, acaso optem pela livre comercialização, pagarão pelo uso dos sistemas (kW) para a concessionária à qual estiverem ligados, e adquirirão energia elétrica (kWh) de qualquer agente comercializador autorizado, pagando separadamente, em “notas fiscais” distintas, à duas pessoas jurídicas também distintas, pelo “uso dos sistemas” e pela “energia elétrica” adquirida.

Enfim, ressaltamos que o fato de qualquer consumidor (cativo ou livre) adquirir energia elétrica (kWh) de um fornecedor qualquer (até mesmo da própria concessionária distribuidora), sempre implicará o uso de um sistema (meio físico), de sorte a viabilizar a “entrega” da energia (mercadoria: coisa móvel, bem móvel) para a sua unidade consumidora, restando claro que se trata de duas atividades distintas, ainda que sejam realizadas pela mesma pessoa jurídica, uma consistente em “disponibilizar o meio físico”; e outra, a da própria “comercialização” (fornecimento) da energia elétrica, que pode ou não ser realizada pela empresa distribuidora, a depender da forma de contratação, se no ambiente de livre contratação ou no ambiente regulado.

POSICIONAMENTO(S) ATUAL(IS) DO STJ

A 1ª Turma do STJ havia suspendido o julgamento do REsp nº 1163020/RS em 18/11/2016, no qual se definiria se o ICMS incide ou não sobre a Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição de Energia Elétrica (TUSD), nele, a discussão levada a efeito se refere às empresas que negociam energia elétrica Ambiente de Contratação Livre (ACL).

Pois bem, para o REsp nº 1163020/RS foi julgado em 21/03/2017, foi negado provimento, após o voto-vista do Ministro Benedito Gonçalves, por maioria, vencidos os Ministros Napoleão Nunes Maia Filho e Regina Helena Costa (voto-vista), nos termos do voto do Ministro Relator. Os Ministros Benedito Gonçalves (voto-vista) e Sérgio Kukina (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator, tal entendimento foi mantido após a a oposição de embargos de Declaração.

A decisão se deu nos seguintes termos:

TRIBUTÁRIO. ICMS. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. BASE DE CÁLCULO. TARIFA DE USO DO SISTEMA DE DISTRIBUIÇÃO (TUSD). INCLUSÃO.

1. O ICMS incide sobre todo o processo de fornecimento de energia elétrica, tendo em vista a indissociabilidade das suas fases de geração, transmissão e distribuição, sendo que o custo inerente a cada uma dessas etapas – entre elas a referente à Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD) – compõe o preço final da operação e, consequentemente, a base de cálculo do imposto, nos termos do art. 13, I, da Lei Complementar n. 87/1996.

2. A peculiar realidade física do fornecimento de energia elétrica revela que a geração, a transmissão e a distribuição formam o conjunto dos elementos essenciais que compõem o aspecto material do fato gerador, integrando o preço total da operação mercantil, não podendo qualquer um deles ser decotado da sua base de cálculo, sendo certo que a etapa de transmissão/distribuição não cuida de atividade meio, mas sim de atividade inerente ao próprio fornecimento de energia elétrica, sendo dele indissociável.

3. A abertura do mercado de energia elétrica, disciplinada pela Lei n. 9.074/1995 (que veio a segmentar o setor), não infirma a regra matriz de incidência do tributo, nem tampouco repercute na sua base de cálculo, pois o referido diploma legal, de cunho eminentemente administrativo e concorrencial, apenas permite a atuação de mais de um agente econômico numa determinada fase do processo de circulação da energia elétrica (geração). A partir dessa norma, o que se tem, na realidade, é uma mera divisão de tarefas – de geração, transmissão e distribuição – entre os agentes econômicos responsáveis por cada uma dessas etapas, para a concretização do negócio jurídico tributável pelo ICMS, qual seja, o fornecimento de energia elétrica ao consumidor final.

4. Por outro lado, o mercado livre de energia elétrica está disponibilizado apenas para os grandes consumidores, o que evidencia que a exclusão do custo referente à transmissão/distribuição da base de cálculo do ICMS representa uma vantagem econômica desarrazoada em relação às empresas menores (consumidores cativos), que arcam com o tributo sobre o "preço cheio" constante de sua conta de energia, subvertendo-se, assim, os postulados da livre concorrência e da capacidade contributiva.

5. Recurso especial desprovido.”

Podemos observar que nesta decisão foram considerados fatores decisivos, que poderíamos numa singela análise separar em dois pontos, que se acatados, tornariam a incidência em tela, possível juridicamente:

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  1. O fato jurídico tributário neste caso é o fornecimento de energia elétrica, assim considerado como a totalidade das suas etapas, formando assim o “conjunto dos elementos essenciais que compõem o aspecto material do fato gerador, integrando o preço total da operação mercantil”? Ou somente o consumo da “energia elétrica” (kWh), esta sim estaria sujeita, já que é a única passível de ter sua titularidade transferida do agente vendedor ao agente consumidor?

  1. Como foi observado na decisão, quanto aos clientes livres: “a exclusão do custo referente à transmissão/distribuição da base de cálculo do ICMS representa uma vantagem econômica desarrazoada em relação às empresas menores (consumidores cativos), que arcam com o tributo sobre o "preço cheio" constante de sua conta de energia, subvertendo-se, assim, os postulados da livre concorrência e da capacidade contributiva”.

A situação aparentemente estaria resolvida, não fosse o caso de uma decisão posterior proferida acerca de um mês após a decisão anteriormente mencionada,  ter ido em sentido diametralmente oposto, na qual a turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso do Estado de Mato Grosso do Sul, nos termos do voto do Relator, Ministro Herman Benjamin, sendo esse o teor do Acórdão no REsp nº 1.649.648, dando :

“TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO ART. 1.022 DO CPC. ICMS. ENERGIA ELÉTRICA. FATO GERADOR. SAÍDA DO ESTABELECIMENTO FORNECEDOR. CONSUMO. BASE DE CÁLCULO. TUSD. ETAPA DE DISTRIBUIÇÃO. NÃO INCLUSÃO. PRECEDENTES.

1. O Tribunal a quo confirmou sentença de concessão da Segurança para determinar que a autoridade apontada como coatora deixe de lançar o ICMS sobre a Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD) da conta de energia elétrica consumida pela recorrida.

2. Não se configura a alegada ofensa ao artigo 1.022 do Código de Processo Civil de 2015, uma vez que o Tribunal de origem julgou integralmente a lide e solucionou, de maneira amplamente fundamentada, a controvérsia, em conformidade com o que lhe foi apresentado.

3. Não há falar em descumprimento do rito processual relativo à observância da cláusula de reserva de plenário, pois não se verifica o afastamento, pelo Tribunal local, dos dispositivos invocados pelo recorrente, mas, sim, interpretação dos enunciados neles contemplados, a exemplo do conceito de "valor da operação".

4. O STJ possui entendimento consolidado de que a Tarifa de Utilização do Sistema de Distribuição – TUSD não integra a base de cálculo do ICMS sobre o consumo de energia elétrica, uma vez que o fato gerador ocorre apenas no momento em que a energia sai do estabelecimento fornecedor e é efetivamente consumida. Assim, tarifa cobrada na fase anterior do sistema de distribuição não compõe o valor da operação de saída da mercadoria entregue ao consumidor.

5. Não se desconhece respeitável orientação em sentido contrário, recentemente adotada pela Primeira Turma, por apertada maioria, vencidos os Ministros Napoleão Nunes Maia Filho e Regina Helena Costa (REsp 1.163.020/RS, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 27/3/2017).

6. Sucede que, uma vez preservado o arcabouço normativo sobre o qual se consolidou a jurisprudência do STJ e ausente significativa mudança no contexto fático que deu origem aos precedentes, não parece recomendável essa guinada, em atenção aos princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia (art. 927, § 4°, do CPC/2015).

7. Recurso Especial não provido”.

Já nesta decisão, o fator preponderante nos parece ter sido o fato de que o único bem passível de tributação pelo ICMS energia, só poderia ser ela própria, “uma vez que o fato gerador ocorre apenas no momento em que a energia sai do estabelecimento fornecedor e é efetivamente consumida. Assim, tarifa cobrada na fase anterior do sistema de distribuição não compõe o valor da operação de saída da mercadoria entregue ao consumidor”.

CONCLUSÃO

Diante dessa incerteza jurídica, alguns Tribunais como é o caso do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, já adotaram o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas – IRDR, previsto nos artigos 976 e 977 do NCPC, e têm sobrestado as ações ajuizadas para o fim de ter declarada a inexistência desta relação jurídica tributária e também o direito à repetição do indébito nos últimos cinco anos.

Tal incidente tem o condão de sobrestar os feitos até o julgamento do referido incidente ou, nos termos do § 4º do artigo 976, quando um dos tribunais superiores, no âmbito de sua respectiva competência, tiver afetado recurso para definição de tese sobre questão de direito material ou processual repetitiva.

 Resta então ao consumidor, a opção de ajuizar ou não ação pleiteando o direito a não ser tributado por meio da incidência do ICMS sobre os valores cobrados nas contas de energia a título de TUSD e TUST, sendo certo que a decisão final caberá aos Tribunais Superiores, não esquecendo que o ICMS arrecadado por essa via é de uma relevância extrema para os Estados, e “luta” promete ser dura.

Plinio Antonio Aranha Junior

Advogado especialista em Direito Tributário

Engenheiro Eletricista

Sobre o autor
Plinio Antonio Aranha Junior

Advogado com especialização em Direito Tributário pelo IBET, atuante, preponderantemente, nas áreas cível, tributária e em questões regulatórias, também sou graduado em Administração de Empresas e em Engenharia Elétrica.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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