Problema à vista

24/08/2017 às 10:05
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O artigo discute caso concreto com relação a chamada reserva nacional do cobre.

A Reserva Nacional de Cobre e seus Associados (Renca) foi criada por decreto do então presidente João Batista Figueiredo, em fevereiro de 1984, a pedido do Almirante Gama e Silva, e abrange uma área considerada de grande potencial nos estados do Pará e Amapá. Pelo decreto, os trabalhos de pesquisa na área passaram a ser exclusividade da CPRM, usando recursos próprios ou de convênios firmados com o Gebam (Grupo Executivo para a Região do Baixo Amazonas). A outorga de áreas para outras empresas somente poderia ser feita a empresas que tivessem negociado os resultados dos trabalhos de pesquisa com a CPRM.

Trata-se de uma área com quase 4 milhões de hectares -- o equivalente ao tamanho do Espírito Santo --, que fica na divisa entre o Sul e Sudoeste do Amapá com o Noroeste do Pará. A área rica em ouro e outros minérios tem grandes reservas naturais e terras indígenas.

A reserva, criada na época da ditadura militar, em 1984, tem alto potencial para extração de ouro e exploração de outros minerais, como ferro, manganês e tântalo.

O decreto também estipulava que a concessão de áreas na região pelo DNPM somente poderia ser feita mediante consulta prévia ao Conselho de Segurança Nacional. E preserva as autorizações e concessões de lavra regularmente outorgadas antes de sua edição.

O interesse pela área abrange aspectos ambientais, antropológicos e de segurança nacional.

Mas os tempos passaram.

O governo federal extinguiu a Reserva Nacional de Cobre e Associadas (Renca), localizada entre os estados do Pará e Amapá, com a intenção de atrair investimentos para o setor de mineração. A área - do tamanho do estado do Espírito Santo, com quase 4 milhões de hectares - tem grandes reservas naturais e presença de tribos indígenas em seu interior.

A reserva - que fica na divisa entre o Sul e Sudoeste do Amapá com o noroeste do Pará - foi criada em 1984, ainda durante o regime militar. Era considerado um local de alto potencial para exploração de ouro e outros minérios (como ferro, manganês e tântalo) e era mantido em posse da União, restringindo as buscas de monopólio do governo ao cobre.

Nas unidades de conservação integral, não é permitida qualquer forma de atividade econômica, inclusive mineração.

Há também unidades de conservação sem proteção integral, florestas estaduais, menos protegidas, mas também reservas biológicas, mais protegidas. E cada uma dessas áreas está sujeita a um regime diferente. Mesmo em áreas que permitem atividade, a mineração pode ser vetada. Há zonas cinzentas entre as áreas de conservação no que se refere à mineração que terão de ser resolvidas, como disse Tatiana Cymbalista, sócia da área ambiental do escritório Manesco Advogados.

Para os especialistas da Fundação Chico Mendes, a ameaça é que atividades de grande impacto sejam realizadas sem o devido acompanhamento nem a participação da população local. Existe muita fragilidade. A vida que é extinta na área de mineração também é extinta no seu entorno.

Há uma ameaça de que atividades de grande impacto sejam realizadas sem o devido acompanhamento nem a participação da população local. Existe muita fragilidade. A vida que é extinta na área de mineração também é extinta no seu entorno, como aduzem os ambientalistas.

De acordo com depoimento do geólogo Breno Augusto dos Santos, que vivenciou o processo que levou à criação da RENCA, o interesse pela área surgiu em 1969, quando a empresa Codim, após a descoberta de Carajás e o fracasso dos trabalhos na zona do Bacajá, desloca-se para a região Jari-Paru, onde o geólogo Décio Meyer descobriu o complexo alcalino-ultramáfico do Maraconaí.

A área discutida é de ambição de grandes imprensas multinacionais.

Noticia-se que, no site Brasil mineral, que em 1994, quando foi secretário de Minas no MME, Breno dos Santos solicitou às consultorias jurídicas do Ministério e do DNPM que verificassem a situação legal da RENCA, para ver a possibilidade de acabar com a mesma. E descobriu, surpreso, que quando a RENCA havia sido criada não tinham sido indeferidos os pedidos existentes, a maioria em nome da Vale. “Por razões ética, decidi deixar como estava”, diz.

Na matéria em discussão há questionamentos: Há estudos ambientais e antropológicos suficientes para a discussão de liberação da mineração na região?

"A extinção não afasta a aplicação de legislação específica sobre a vegetação nativa, unidades e conservação da natureza, terra indígenas e áreas em faixa de fronteira", diz o Decreto nº 9.142.

A lavra não pode ser realizada em área de preservação ambiental e, ainda, em áreas chamadas de bloqueio.

São consideradas áreas de bloqueio:

  1. Gasodutos, linhas de transmissão e hidrelétricas: Nestes casos admite-se a outorga do título, por prazo determinado e a juízo do DNPM, devendo o interessado no processo minerário interferente com a área de objeto do pedido de bloqueio apresentar “termo de renúncia”.

  2. Reserva extrativista, caverna, sítio paleontológico, conselho nuclear, sítios arqueológicos, área militar, unidade de conservação integral e países limítrofes: Caso a área de interesse esteja localizada em apenas uma porção das áreas referidas, será dado o procedimento de retirada de interferência; caso contrário, o requerimento será indeferido.

  3. Áreas urbanas: No caso da poligonal de interesse estar localizada em áreas urbanas, é necessário o assentimento do Município, através da Prefeitura local.

Como observou Geraldo de Azevedo Maia Neto(Mineração em unidades de conservação, Ius Navigandi) "Quanto à Reserva Extrativista (Resex), a questão foi expressamente enfrentada e resolvida pela Lei n. 9.985/2000, com a proibição expressa da "exploração de recursos minerais" (art. 18, § 6º). Essa vedação expressa exclusiva para as Resex é utilizada, em interpretação a contrario sensu, pelos defensores da possibilidade de exploração dos recursos minerais nas demais categorias de unidades de uso sustentável. Entretanto, como já mencionado, o que deve guiar a interpretação sobre essa temática é a compatibilidade ou não da referida atividade com o regime jurídico de cada uma dessas categorias."

Disse ainda Geraldo de Azevedo Maria Neto, obra citada: "Nessa linha, não é de ser admitida a mineração na Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN), porque esta é uma categoria de uso sustentável sui generis, que não permite efetivamente o uso direto dos seus recursos naturais, ou seja, não permite justamente o uso sustentável. Isso ocorre em virtude do veto presidencial ao art. 21, § 2º, III, da Lei do SNUC, que previa e autorizava a extração de recursos minerais nas RPPNs. O referido veto, na verdade, operou a migração da RPPN para o grupo das unidades de proteção integral, nas quais se permite apenas o uso indireto. Assim, aplicam-se às RPPNs as vedações das unidades de proteção integral, razão pela qual é vedada a atividade minerária dentro do seu perímetro."

Lembre-se que as atividades de mineração são proibidas em unidades de conservação ambiental classificadas como de proteção integral. Dentre as áreas protegidas da Renca, a única atividade permitida é a atividade mineral em um trecho classificado como de uso sustentável da Floresta Estadual do Paru.

Há o entendimento de que apenas 31% da Reserva Nacional do Cobre e Associados (Renca) está disponível para a atividade mineral, o restante está em território indígena ou reservas ambientais.

Há evidentes efeitos indesejáveis na medida em que devem ser estudados com profundidade: explosão demográfica, desmatamento, comprometimento de recursos hídricos, perda da biodiversidade, acirramento de conflitos fundiários e uma clara ameaça a povos indígenas e a populações tradicionais.

A Renca engloba nove áreas protegidas: o Parque Nacional Montanhas do Tumucumaque, as Florestas Estaduais do Paru e do Amapá, a Reserva Biológica de Maicuru, a Estação Ecológica do Jari, a Reserva Extrativista Rio Cajari, a Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Rio Iratapuru e as Terras Indígenas Waiâpi e Rio Paru d’ Este.

Haverá uma verdadeira corrida do ouro, no coração da Amazônia, com sérias e graves consequências para o meio ambiente, às culturas ali existentes, ao patrimônio natural brasileiro.

Haverá critério para isso?

Na área ambiental, o presidente Michel Temer tem conduzido um retrocesso assustador. Já é o pior na questão ambiental de todos os governos desde a redemocratização. E agora superou até o governo militar ao arrancar do mapa da conservação da Amazônia 47 mil Km2 que haviam sido protegidos há 30 anos no governo do presidente João Figueiredo.

É bom que se acautele o país para os crimes ambientais que serão cometidos nessa região com a propalada extração.

Há 33 anos, em 1984, a ecologia era um tema valorizado apenas por pequenos grupos e a questão climática ainda engatinhava. Só em 1987, três anos depois, foi publicado o Relatório Brundtland “Nosso Futuro Comum”. Só em 1992 ocorreu a Cúpula da Terra no Rio, que inaugurou as negociações globais para um Acordo do Clima. E, mesmo antes de tudo isso, Figueiredo criou essa reserva entre o Pará e o Amapá e proibiu a mineração no local. Desfazer isso hoje, depois de tudo o que se sabe, é um retrocesso inacreditável e que cai sobre o país na forma autoritária de um decreto.

Luiz Jardim Wanderley, pesquisador da Uerj e membro do Comitê Nacional em Defesa dos Territórios Frente à Mineração, afirma que a extinção tem, antes de mais nada, impacto político. "Coloca mais pressão sobre essas terras indígenas e UCs, abrindo mais uma área de interesse ao setor mineral. É um indicativo de que o governo Temer vai flexibilizar áreas que tinham alguma restrição", diz.

Segundo Marcelo Oliveira, do WWF-Brasil, oito espécies foram investigadas: piranha-preta, trairão, piranha-amarela, mandubé, pintado, pirarara, cachorra e pirapucu. Cinco espécies tinham mais de 50% dos indivíduos com níveis de mercúrio superiores a 0,5 mg/kg –limite de tolerabilidade da OMS (Organização Mundial da Saúde) para consumo humano.

As cinco espécies encontradas com níveis de mercúrio acima do indicado pela OMS são piranha-preta, trairão, pintado, cachorra e pirapucu.

"São espécies consumidas pela população da região e obtivemos esses números alarmantes. É um problema de saúde pública", diz Oliveira. "Se começar a juntar os pontos, você vê que o cenário é bastante preocupante."

Paulo Basta afirma que "o mercúrio é um metal pesado com fácil difusão no corpo e que altera o metabolismo celular. O sistema nervoso central, principalmente, é vulnerável à substância".

Não houve discussão com a sociedade sobre a utilização da área, não houve preocupação com os princípios da precaução e da prevenção, que são basilares no trato da matéria ambiental. A decisão saiu por decreto.

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O princípio da precaução, formulado na Conferência de Bergen para a Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, realizada de 8 a 16 de maio de 1990, determina que diante de ameaça séria ou irresistível ao meio ambiente, a ausência absoluta de certeza científica não deve servir de pretexto para a demora na adoção de medidas para prevenir a degradação ambiental.

O objetivo do Princípio da Prevenção é o de impedir que ocorram danos ao meio ambiente, concretizando-se, portanto, pela adoção de cautelas, antes da efetiva execução de atividades potencialmente poluidoras e/ou utilizadoras de recursos naturais.

O Princípio da Precaução, por seu turno, possui âmbito de aplicação diverso, embora o objetivo seja idêntico ao do Princípio da Prevenção, qual seja, antecipar-se à ocorrência das agressões ambientais.

Enquanto o Princípio da Prevenção impõe medidas acautelatórias para aquelas atividades cujos riscos são conhecidos e previsíveis, o Princípio da Precaução encontra terreno fértil nas hipóteses em que os riscos são desconhecidos e imprevisíveis, impondo à Administração Pública um comportamento muito mais restritivo quanto às atribuições de fiscalização e de licenciamento das atividades potencialmente poluidoras e utilizadoras de recursos naturais.

O Princípio da Precaução (vorsorgeprinzip) surgiu no Direito Alemão, na década de 1970, mas somente foi consagrado internacionalmente na “Declaração do Rio Janeiro”, oriunda da Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, realizada em 1992, encontrando-se presente no Princípio 15 daquela, no sentido de que “de modo a proteger o meio ambiente, o princípio da precaução deve ser amplamente observado pelos Estados, de acordo com suas capacidades” e que “quando houve ameaça de danos sérios ou irreversíveis, a ausência de absoluta certeza científica não deve ser utilizada como razão para postergar medidas eficazes e economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental”.

Também foi o Princípio da Precaução expressamente previsto na Convenção da Diversidade Biológica e na Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança Climática.

O Princípio da Precaução está claramente presente no art. 225, §1º, I, IV, V, da Constituição Federal resguardando o objetivo primordial do texto constitucional, qual seja, manter o meio ambiente ecologicamente equilibrado, salvaguardando a sadia qualidade de vida (ao Ser Humano). O fim maior da Carta Constitucional é preservar a dignidade humana, portanto, mantendo o meio ambiente ecologicamente equilibrado isto se torna possível.

Deve ser ainda protegida o entorno da área como é o caso da chamada zona de amortecimento.

A Lei nº 6.938/81 prescreve que se observará como princípios a proteção dos ecossistemas, com a preservação de áreas representativas e a proteção das ameaçadas de desagregação. Por certo, como acentua Paulo Affonso Leme Machado (Direito Ambiental Brasileiro, 12ª edição, São Paulo, Malheiros, pág. 75), a preservação não é estática, de modo que é mister que se atualize e se faça reavaliações para poder influenciar a formulação das novas políticas ambientais, das ações dos empreendedores e das atividades da Administração Pública, dos legisladores e do Judiciário.

A zona de amortecimento fica sujeita a restrições administrativas. Como tal, não podem ser concedidas novas licenças. As licenças anteriores deverão ser cassadas. Fica, assim, reconhecida zona de proteção ao redor da biota.

Quem sofre é o Brasil, e as grandes empresas estrangeiras lá irão se instalar.

É mais uma obra do governo que elegeu o Estado mínimo como seu plano diretor e não tem compromisso com os direitos das minorias, com o meio ambiente, mas, sim, com o grande capital nacional e estrangeiro. É o neocolonialismo se instalando.

Além disso a Amazônia é um patrimônio nacional e não pode ser tratada dessa maneira.

É mais uma decisão errática do governo comprometido com os grandes interesses da capital.

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Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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