Análise deontológica da função arbitral

05/09/2017 às 09:28
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É na dedicação do árbitro na condução do procedimento, cumprindo os prazos, legais ou estipulados pelas partes, que repousa a tranqüilidade destas quando optam pela arbitragem como alternativa às dificuldades proporcionada pela jurisdição estatal.

Arbitragem é o instituto jurídico pelo qual torna-se possível a prática da Justiça pelos particulares, isto é, sem a intervenção do Estado, na figura do Juiz. Ou seja, isto significa resolver um determinado problema jurídico, sem que seja necessário se dirigir ao Poder Judiciário para que o Juiz profira uma sentença e, então, resolva a questão. Com a arbitragem, um particular resolve a lide, da maneira que as partes envolvidas desejarem, como se fosse um acordo extrajudicial.

Porém, neste caso, vale como uma sentença judicial e pode até ser executada judicialmente. Essa possibilidade foi criada pela Lei n.º 9.307, de 23 de setembro de 1996, denominada Lei de Arbitragem, cujo art. 1.º determina que “as pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis.”

Importante verificar, desde logo, entretanto, que a arbitragem somente pode ser utilizada para solução de litígios que envolvam “direitos patrimoniais disponíveis” e, também, que as partes envolvidas sejam pessoas capazes de contratar. Superados esses requisitos, importa analisar que o art. 13 da LA (Lei de Arbitragem) dispõe que “pode ser árbitro qualquer pessoa capaz e que tenha a confiança das partes”, portanto, particulares (não o Estado) podem ser árbitros, desde que tenham conquistado a confiança das partes envolvidas, satisfeitas as condições do art. 1º da Lei.

O art. 2.º da LA estabelece a forma de execução da arbitragem, pela qual pode ela ser de direito (de iure) ou de eqüidade, significando que pode o árbitro atuar como um Juiz, fazendo a subsunção do caso concreto à lei e, neste caso, não podendo decidir contra legem, ou decidir pelo que considera “mais justo”, sem se preocupar com o conteúdo da lei.

Assim, podemos dizer que a arbitragem é uma função, cuja natureza jurídica é jurisdicional. Portanto, pode-se dizer que o árbitro exerce jurisdição. Este é o entendimento do ilustre doutrinador e processualista renomado Nelson Nery Junior, que assim se expressa a respeito do assunto: “A natureza jurídica da arbitragem é de jurisdição. O árbitro exerce jurisdição porque aplica o direito ao caso concreto e coloca fim à lide que existia entre as partes. A arbitragem é instrumento de pacificação social. Sua decisão é exteriorizada por meio de “sentença”, que tem qualidade de título executivo judicial (CPC 584 III), não havendo necessidade de ser homologada pela jurisdição estatal. A execução da sentença arbitral é aparelhada por título judicial, sendo passível de embargos do devedor com fundamento no CPC 741 (título judicial), segundo a LArb 33 § 3.º” (In, Código de Processo Civil Comentado, 4ª ed., RT, pág. 1.733).

Quando as partes nada pactuarem sobre a forma de arbitragem, o árbitro estará obrigado a proceder a arbitragem de direito, isto porque, na exegese do art. 127 do Código de Processo Civil, cumulado com o art. 2.º da LA, somente quando autorizado pelas partes pode praticar a eqüidade, devendo, a contrario senso, aplicar a lei, pois é curial no direito brasileiro que na jurisdição de direito é vedado o julgamento contra legem.

Entretanto, quando as partes pactuarem que a arbitragem seja por eqüidade (LA 2º), o árbitro mitiga a lei, isto é, pode até julgar contra legem, desde que seja a sentença fundamentada de acordo com o art. 26 da LA, inclusive do ponto de vista do direito, deixando explícito no Laudo Arbitral (ou Sentença Arbitral) que o julgamento foi feito por eqüidade.

Assim entende Nelson Nery Junior: “Jurisdição de eqüidade. Caso as partes estabeleçam expressamente a possibilidade de o árbitro decidir por eqüidade, na decisão da causa ele pode até decidir contra legem, pois julgamento por eqüidade significa julgamento pelo mais justo. Nem tudo que é legal é justo, cabendo ao árbitro que tem poderes para decidir por eqüidade, dar a solução que lhe pareça mais justa, sem se preocupar com a legalidade. Em nosso sistema processual o julgamento por eqüidade somente pode ocorrer por expressa autorização legal (CPC 127), como, por exemplo, nos casos de jurisdição voluntária (CPC 1109)” (In, Código de Processo Civil Comentado, 4ª ed., RT, pág. 1.728).

Assim, a eqüidade é uma forma de contornar a contradição que existe entre o Direito e a Justiça, aliás, um dilema enfrentado na rotina jurídica pelos aplicadores do direito.

A Função Arbitral exige do árbitro responsabilidade, competência e moral. Esta é a conclusão deontológica. Agir em desacordo com os preceitos da Lei de Arbitragem pode levar à nulidade do Laudo Arbitral e tal circunstância prejudica não apenas o próprio árbitro, como também, a entidade que representa e a credibilidade do instituto da arbitragem.

A preparação do árbitro circunda aspectos técnicos para decidir por eqüidade, conhecimento do fato e do direito em qualquer caso, bem como habilidade para redigir a sentença fundamentada. O árbitro deve ser um acadêmico, deve conhecer o procedimento arbitral, o regimento do Tribunal para o qual atua, a Constituição Federal, o Código Civil e o Código de Processo Civil e reciclar-se sempre, participando de palestras, cursos, simpósios, seminários, etc., tanto quanto possível, de forma que possa estar em constante aperfeiçoamento técnico.

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É na dedicação do árbitro na conduta do procedimento, cumprindo os prazos legais ou os estipulados pelas partes, que repousa a tranqüilidade destas quando optam pela arbitragem como alternativa às dificuldades proporcionada pela jurisdição estatal.

Sobre o autor
Jovi Barboza

Advogado, Mestre em Direito; Professor Universitário pela FCV-Faculdade Cidade Verde – Maringá-PR; FGV-Fundação Getúlio Vargas, pela TRECSON; Palestrante; Instrutor e Consultor pelo SEBRAE e pelo CRC-SP; autor das seguintes obras: A Roda da Vida, São Paulo:RCR Editora, 1995; Como Formar o Preço de Venda, Maringá:Projus, 2004; Dano Moral, o problema do quantum debeatur nas reparações por dano moral, Curitiba:Juruá, 2006; Do Plano Diretor, Maringá:Projus, 2007; e Arbitragem no Brasil – Solução amigável de conflitos, Maringá:Projus, 2009.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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