No dia 15 do mês de setembro de 2017, foi iniciado uma grande movimentação nas redes sociais e meios de comunicação, acerca da manipulação midiática equivocada, em relação a decisão judicial do Juiz Federal da 14ª vara da cidade de Brasilia-DF, nos autos da Ação Popular nº1011189-79.2017.4.01.3400.
A referida decisão concedeu uma liminar, em caso concreto especifico, determinando a melhor interpretação a Resolução 001/99 do Conselho Federal de Psicologia. Consigna-se que, não houve suspenção ou afronta à referida resolução; em verdade, nasceu uma interpretação que PODE servir de suporte para outras decisões.
A ação popular mencionada, foi proposta contra o Conselho Federal de Psicologia – C.F.P, objetivando suspender os efeitos da resolução 001/1999, que estabeleceu normas de atuação para psicólogos, em relação as questões de orientação sexual.
Os autores da ação, alegam que a referida resolução serve como um ato de censura, impedindo os psicólogos de desenvolver estudos, atendimentos e pesquisas cientificas, acerca dos comportamentos ou praticas homoeróticas, constituindo assim, um ato lesivo ao patrimônio cultural e cientifico do país; pois restringe a liberdade de pesquisa cientifica assegurada aos psicólogos.
Motivo pelo qual trouxe justa causa para ação popular proposta. A propósito, considerando que o presente texto busca a mais variada margem de leitores, bem como tem o condão informativo; importa traçar breves comentários quanto aos aspectos jurídicos da Ação Popular.
A constituição Federal descreve a ação popular (lei 4.717 de 1965) como instrumento destinado à anulação de atos lesivos ao patrimônio publico, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural. Os mestres doutrinadores Hely Lopes Meirelles e Alexandre de Moraes, afirmam que a ação popular visa proteger direitos difusos e coletivos; assim, de modo geral, toda a população é beneficiada.
Pois bem, considerando dispositivo do Novo Código de Processo Civil, foi designado audiência de justificativa prévia, para esclarecer questionamentos ainda existente. Entre as pendências, foram questionados para esclarecimento, o que se permite ao psicólogo estudar ou clinicar sem contrariar a resolução 001/99 da C.F.P, no campo científico da sexualidade.
O debate acerca do que o psicólogo pode estudar ou clinicar no campo científico da sexualidade, traz notável preocupação relativa a interpretação da resolução 001/99 da C.F.P, ao magistrado.
Com efeito, em interpretação cabível e de competência daquele juízo, foi compreendido por aquele magistrado, que alguns dos dispositivos contidos na resolução 001/1999 da C.F.P, conflitam, quando mal interpretados, com a Constituição Federal.
Vejam, não houve suspensão da referida resolução. Em verdade, aquele magistrado, em interpretação legal, considerou ilegal ou, conflitante com a Constituição Federal, ALGUNS dos dispositivos da resolução 001/1999 da C.F.P.
De acordo com conceito jurídico, segundo Kelsen, a Constituição é a norma que ocupa o nível mais alto no âmbito normativo estatal. Dessa forma, a Constituição Federal serve de parâmetro para validar as outras normas do ordenamento jurídico.
Assim sendo as portarias e resoluções (como ocorreu no caso concreto em comento) somente serão validadas, quando respeitado o Texto Constitucional. Em caso de conflito, prevalece o que está previsto na CF/88!
Desse modo, a decisão liminar proferida pelo juiz Federal do DF, por considerar violadora da Constituição Federal a resolução mencionada, apenas proibiu a INTERPRETAÇÃO INCORRETA de determinados dispositivos. A saber, considerando presente os motivos autorizadores para a concessão da liminar, o juiz deferiu parte do pedido para, SEM SUSPENDER OS EFEITOS DA resolução 001/99 da C.F.P, determinar ao conselho, para que não interprete a referida resolução, de modo a impedir os psicólogos de promover estudos ou atendimento profissional, de forma reservada, pertinente a (re)orientação sexual, garantindo aos psicólogos e profissionais competentes, a liberdade cientifica acerca da matéria em comento, sem qualquer censura ou necessidade de licença previa do Conselho Federal de Psicologia.
Houve grande repercussão a referida decisão, pelo contexto histórico do processo, o que deve ser compreendido, antes de qualquer critica à decisão do juiz. A informação lançada pela mídia está tendenciosa e equivocada. A justiça não determinou que psicólogos tratem a homossexualidade como doença. Na verdade, foi determinado pela “justiça”, o fim da censura à estudos e atendimentos de (re) orientação sexual.
O contexto histórico da ação popular mencionada, tem como autora, entre outros, Rozangela Justino, a qual sofreu pena de censura pelo C.F.P, precisamente por propagar a suposta possibilidade de se mudar a orientação sexual das pessoas, por “terapia” psicológica. Daí a expressão na mídia e nas redes sociais da: “cura gay”, ou que a “homossexualidade é doença”.
Aproposito, por curiosidade, o que muitos desconhecem, é que o nome "cura gay" foi dado, de forma pejorativa, a um projeto proposto pelo então deputado Ezequiel Teixeira (PTN-RJ).
Veja, de acordo com o contexto histórico do processo, a senhora Rosangela Justino sofreu censura pelo C.F.P, por interpretação desses, em relação a resolução 001/99. E esse foi o entendimento do Juiz Federal ao proferir a liminar!
Em momento algum a “cura gay” é abordada na liminar do magistrado. A decisão busca evitar interpretações que restrinjam a liberdade de pesquisa cientifica inerente ao exercício da profissão.
Ora, não se deve generalizar ou fazer interpretações diversas, quanto a decisão no nobre magistrado. A decisão em momento nenhum fala sobre a “cura gay”. Na verdade, a decisão é muito clara quanto aos seus termos!
Em norte outro, a revolta mobilizada nas redes sociais e na mídia, foi compreensível e justificável, posto que o magistrado autoriza o “os psicólogos de promover estudos ou atendimento profissional, de forma reservada, pertinente a (re) orientação sexual”. Desse modo, alguns intérpretes entendem que a consequência prática da decisão é a “cura gay” por terapias ou, que o magistrado se refere a patoligização da homossexualidade.
O que não é verdade. Explico: na decisão supramencionada, o juiz aplica a melhor hermenêutica aquela resolução do Conselho Federal de Psicologia; assegurando os psicólogos de promover estudos ou atendimento profissional, de forma reservada, pertinente a (re)orientação sexual. E mais, a resolução não é anulada, apenas deve observar uma melhor interpretação de acordo com o texto constitucional, ao menos na interpretação daquele magistrado, pelos artigos mencionados na decisão. A interpretação foi necessária, para que os psicólogos possam clinicar, estudar ou, de qualquer forma, obter a liberdade cientifica sem censuras, sobre o tema mencionado.
A resolução do Conselho Federal de Psicologia não fere expressamente os estudos ou atendimento profissional referente a orientação sexual. No entanto, atos de cesura publica, como ocorreu com a senhora Rosangela Justino, fere a liberdade de expressão, a liberdade cientifica e, ofende a voluntariedade daqueles que VOLUNTARIAMENTE buscam orientação ou reorientação sexual.
No entanto, trata-se de decisão liminar, podendo ser reformada, cassada ou retratada, considerando o teor do caso concreto e aplicação correta da norma constitucional. A propósito, existe entendimento diverso em situação semelhante, pelo Egrégio Tribunal Regional Federal da 2ª Região na ação civil pública n.º 18794-17.2011.4.02.5101.
O debate existente em relação ao tema é razoável e esperado. Na verdade, aqueles que defendem que a liminar foi injusta ou ilegal, pois seria o caso da “cura gay”, apenas fez interpretação diversa do que resta claro na decisão. Porém, na prática, razão assiste à esses interpretes, pois certamente haverá interpretações no sentido da patologização da homossexualidade; o que não se coaduna com o teor da nota constante na CID-10 F.66. A homossexualidade não é doença e esse entendimento foi formulado por estudiosos da área!
Preconiza o Conselho Federal de Psicologia que, por razões técnicas e éticas, cabe ao Psicólogo, com seu mister, fortalecer o entendimento de que todos são livres para viver sua sexualidade, e não propor, a priori, o que se convencionou chamar de “cura gay”, contribuindo com a manutenção de preconceitos e estigmas seculares contra pessoas em razão apenas da sua orientação sexual.
O magistrado em nenhum momento foi homofobico ou afrontou os direitos homossexuais, pelo contrario, resguardou o direito da liberdade cientifica e autonomia privada. O inciso IV do art. 5º da Constituição Federal assegura ser livre a manifestação do pensamento, vedado o anonimato; ainda, assevera o art. 170, que a ordem econômica do país funda-se na livre iniciativa, sendo livre o exercício da atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.
Importante ler e entender a decisão liminar do magistrado ( https://d2f17dr7ourrh3.cloudfront.net/wp-content/uploads/2017/09/ATA-DE-AUDI%C3%8ANCIA.pdf ). É claro, interpretações das mais diversas naturezas será existente por longo período, tanto da decisão liminar; quanto da discursão acerca da censura ou limitações de estudo ou liberdade cientifica; real tema abordado na decisão.
A errônea interpretação da decisão, partiu de grupos adeptos do sensacionalismo que desejam criar polêmicas e disseminar notícias fantasiosas para induzir a erro toda a sociedade. Como já foi mencionado, na decisão, não houve qualquer indicação a “ cura gay”, bem como, não foi suspensa a eficácia da resolução 001/90 do Conselho Federal de Psicologia. O magistrado apenas garantiu aos psicólogos o direito da plena liberdade de estudo científico relacionado ao tema, sem censura ou necessidade de licença do Conselho e, ainda, permitiu à aqueles que desejam por livre e espontânea vontade, procurar os psicólogos para fazer consultas reservadas e se orientarem, tendo como base, o posicionamento da Organização Mundial da Saúde.
Sem julgamento de mérito, quanto à Ação mencionada, torna-se precoce qualquer comentário extremado da decisão. O magistrado utilizou de fundamentações constitucionais para basear a liminar deferida e em nenhum momento, mencionou acerca da “cura gay”.