A polícia prende. Os juízes, também!

04/10/2017 às 19:00
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Após haver prestado concurso público de provas e títulos, assumi o cargo de juiz de direito no ano de 1995 e desde então ouço uma afirmação de todo equivocada e que muito me inquieta: “A polícia prende e os juízes soltam os bandidos”.

Essa frase é tão repetida que já faz parte do senso comum da sociedade, sendo tomada como  verdade.

Todavia, constitui uma grotesca inverdade.

A começar porque a única autoridade com o poder de decretar a prisão de qualquer pessoa no Brasil é o juiz de direito. Então, que fique muito claro: quem prende são os juízes! Em outras palavras, se o Brasil conta hoje com cerca de 700 mil pessoas presas e com outras 500 mil ordens de prisão aguardando cumprimento, isto se deve a decisões proferidas por juízes de direito.

É claro que os policiais, e mesmo qualquer cidadão, estão autorizados a prender em flagrante delito uma pessoa que esteja cometendo um crime ou que acaba de cometê-lo, mas a manutenção dessa pessoa presa (ou não) será decidida por um juiz dentro de 24 horas da prisão.

Tenho certeza que é justamente dessa circunstância que surgiu o equivocado dito popular.

Explico. No Brasil e na maior parte dos países democráticos do mundo vige o princípio da presunção de inocência, segundo o qual todo o indivíduo é considerado inocente até que se prove haver praticado um crime.

Exatamente por este motivo, como regra, as pessoas que respondem a um processo criminal o fazem em liberdade e somente cumprirão sua pena após a sentença, caso condenadas.

Então, muitas das pessoas que são presas em flagrante na prática de um crime pela polícia serão postas em liberdade pela justiça e responderão ao processo livres, até que haja uma condenação.

A prisão durante o processo constitui exceção guardada a crimes de extrema gravidade ou a acusados que cometem crimes reiteradamente. Então, haverá casos em que, efetivamente, a polícia prende e os juízes soltam, mas isto quando a legislação assim impuser e não houver risco à ordem pública a justificar a prisão antecipada, medida excepcional.

Entretanto, não se pode concluir disso que os juízes sejam coniventes com o crime ou não protejam as vítimas e a sociedade daqueles que praticam crimes. Ao contrário, transcorrido o processo e comprovada a prática de um crime, respeitados os direitos da acusação e da defesa do acusado, o juiz condenará o infrator em salvaguarda aos direitos da vítima e da sociedade que foram violados com o crime, o que ocorre diariamente na rotina das varas criminais.

Para que se possa ter uma ideia dessa afirmação, somente na Comarca de Pelotas, de janeiro a agosto deste ano de 2017, os juízes criminais proferiram 1.098 sentenças condenatórias.

Então, o que pretendo com esse artigo é deixar muito claro que os juízes brasileiros estão, sim, preocupados com a segurança pública, que asseguram os direitos das vítimas e protegem a sociedade do crime, julgando e condenando aqueles que violam a lei.

Espero que não mais se repita a afirmação leviana de que a polícia prende e os juízes soltam. Ao contrário, a verdade é que a polícia prende e os juízes também!

Sobre o autor
Marcelo Malizia Cabral

Juiz de Direito Diretor do Foro da Comarca de Pelotas, RS

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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