Não há, no Direito Processual do Trabalho, unanimidade quanto aos princípios aplicados. Seguem, em regra, os princípios gerais do processo, havendo, porém, princípios voltados diretamente ao processo trabalhista.
Prestam-se para orientar o legislador na elaboração da norma jurídica e auxiliam o operador na interpretação da lei, inclusive integrando-a aos casos concretos quando ocorre alguma lacuna ou omissão no texto legal.
Na CLT, encontram fundamento no caput artigo 8º:
Art. 8º - As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por equidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público.
Dentro desse contexto, para melhor compreensão dos princípios aplicáveis ao processo do trabalho, passamos a dividi-los em princípios gerais do processo, englobando os princípios constitucionais e os princípios do processo civil aplicados ao processo do trabalho e os princípios peculiares ao processo do trabalho.
Oportuno esclarecer que o rol a seguir apresentado é exemplificativo, não englobando todos os princípios existentes, em especial os que regulam recursos e produção de provas, devendo ser estudados com amparo na doutrina, legislação e jurisprudência.
Princípios gerais do processo
Princípio do devido processo legal
Está previsto no artigo 5º, inciso LIV da Constituição Federal[1], servindo como base para todo o ordenamento jurídico. Significa que o processo deve correr dentro dos ditames legais, previamente estabelecidos. Segundo MAURO SCHIAVI, “pelo princípio do devido processo legal, ao cidadão deve ser concedido um conjunto prévio de regras processuais, previstas em lei, a fim de que ele possa postular sua pretensão em juízo e o réu possa apresentar seu direito de defesa, valendo-se dos instrumentos processuais previstos em lei, não podendo ser surpreendido pela arbitrariedade do julgador.” (2015, pág. 88)
Princípio da instrumentalidade
O processo serve de instrumento para a efetivação da justiça, da distribuição da tutela jurisdicional, da aplicação do direito material. Como exemplo deste princípio, temos os artigos 188[2] e 277[3] do NCPC.
Princípio do contraditório e da ampla defesa
Regra fundamental para preservação do Estado Democrático de Direito, o contraditório e a ampla defesa encontram abrigo no texto constitucional, mais precisamente do artigo 5º, inciso LV[4]. Com efeito, não haverá justiça se apenas uma das partes for ouvida. A isonomia estabelece tratamento equivalente entre as partes litigantes, não podendo ser tolhido esse direito alçado à qualidade de cláusula pétrea. Contudo, existem exceções previstas em lei, como aquela do artigo 332 do NCPC[5], cuja aplicabilidade na Justiça do Trabalho não é pacífica.
O NCPC também privilegiou este princípio, conforme se verifica pela leitura do artigo 10º: “Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício.”
Princípio do juiz natural
Determina que nenhum processo será julgado sem a existência de um juízo previamente constituído. Visa proibir os chamados “tribunais de exceção”, ocasionalmente criados para fins políticos ou autoritários para controle do Estado sobre os jurisdicionados. Encontra amparo no artigo 5º, inciso XXXVII, da Constituição Federal[6].
Por outro lado, estabelece que o julgamento somente poderá ocorrer por juiz competente (art. 5, LIII, CF/88[7]).
Na CLT pode ser notado nos artigos 714, “a”[8], e 783[9].
Princípio da isonomia
Representa a igualdade entre as partes. Está prevista no caput do artigo 5º da CF[10]. É conhecida a frase de Aristóteles de que “devemos tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de sua desigualdade”.
Oportuno destacar que os prazos elastecidos do Ministério Público e Fazenda Pública (Federal, Estadual e Municipal), não violam o princípio da isonomia, visto o interesse público prevalecer sobre o privado.
Princípio da publicidade
Os atos processuais devem ser públicos para que seja possível conferir-lhes credibilidade. A regra consta do artigo 5º, inciso LX[11], e 93, IX[12] (princípio da motivação das decisões judiciais), da CF. Na CLT, está expresso nos artigos 770[13] e 813[14].
Encontra óbice nos processos que tramitam em segredo de justiça, contudo, há previsão legal para essas hipóteses.
Princípio do livre convencimento do juiz
Está previsto no artigo 371 do CPC: “O juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento”.
Princípio da inafastabilidade da jurisdição
Trata-se de princípio constitucional estabelecido no artigo 5º, inciso XXXV, da Carta Magna[15]. É uma das garantias mais importantes do jurisdicionado, garantindo o amplo acesso ao Judiciário.
Com efeito, segundo artigo 4º do NCPC, “as partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa.”
Para o doutrinador MAURO SCHIAVI, “mesmo nos casos em que a parte não preencha as condições da ação, desaguando na extinção do processo sem resolução de mérito, terá havido o direito de ação e, portanto, não há ofensa ao princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição na decisão que não aprecia o mérito da causa.” (2015, pág. 93)
Princípio da Imediatidade
Ainda que se trate de princípio geral, é de grande importância na Justiça do Trabalho, em especial por ocasião das audiências de prosseguimento (instrução). Por este princípio se privilegia o contato próximo do julgador com a parte, as testemunhas, peritos, entre outras pessoas que de uma forma ou de outra tenham participado do processo. Esse contato próximo auxilia na formação de seu convencimento quanto a matéria posta em debate.
Princípio do duplo grau de jurisdição
Significa que todas as decisões poderão ser submetidas à instância superior para revisão. Visa garantir segurança jurídica ao jurisdicionado. Não se trata, porém, de garantia constitucional, como alguns acreditam, visto que a legislação infraconstitucional, por diversas vezes, estabelece uma instância única. Como exemplo temos: (a) os dissídios de alçada (art. 2º, parágrafos 3º e 4º, da Lei 5.584/70[16]); (b) impossibilidade de reexame necessário em decisões proferidas contra a Fazenda Pública nas hipóteses do artigo 496, parágrafo 3º e 4º, NCPC[17], e (c) ações de competência originária do STF, estas, irrecorríveis. (BITTENCOURT, 2015, pág. 49)
Na Justiça do Trabalho pode ser observado no artigo 893 e seguintes da CLT (Recursos), assim como na Súmula 303, TST:
SUM-303 FAZENDA PÚBLICA. DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO (incorporadas as Orientações Jurisprudenciais nºs 9, 71, 72 e 73 da SBDI-1) - Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005
I - Em dissídio individual, está sujeita ao duplo grau de jurisdição, mesmo na vigência da CF/1988, decisão contrária à Fazenda Pública, salvo:
a) quando a condenação não ultrapassar o valor correspondente a 60 (sessenta) salários mínimos;
b) quando a decisão estiver em consonância com decisão plenária do Supremo Tribunal Federal ou com súmula ou orientação jurisprudencial do Tribunal Superior do Trabalho. (ex-Súmula nº 303 - alterada pela Res. 121/2003, DJ 21.11.2003)
II - Em ação rescisória, a decisão proferida pelo juízo de primeiro grau está sujeita ao duplo grau de jurisdição obrigatório quando desfavorável ao ente público, exceto nas hipóteses das alíneas "a" e "b" do inciso anterior. (ex-OJ nº 71 da SBDI-1 - inserida em 03.06.1996)
III - Em mandado de segurança, somente cabe remessa "ex officio" se, na relação processual, figurar pessoa jurídica de direito público como parte prejudicada pela concessão da ordem. Tal situação não ocorre na hipótese de figurar no feito como impetrante e terceiro interessado pessoa de direito privado, ressalvada a hipótese de matéria administrativa. (ex-OJs nºs 72 e 73 da SBDI-1 – inseridas, respectivamente, em 25.11.1996 e 03.06.1996)
Princípio da preclusão
Na forma do artigo 507, NCPC, “é vedado à parte discutir no curso do processo as questões já decididas a cujo respeito se operou a preclusão”. A preclusão, portanto, representa a perda do direito à prática de determinado ato processual, podendo ocorrer de forma temporal (expiração de prazo), lógica (incompatível com outro ato já praticado, v.g. requerer produção de prova em processo já conciliado) e consumativa (renovar ato já praticado). Na CLT, o artigo 795[18], por exemplo, apresenta regra de preclusão. (BITTENCOURT, 2015, pág. 49)
Princípio de eventualidade
Encontra abrigo no artigo 336 do NCPC[19], devendo o reclamado apresentar em sua resposta toda a tese defensiva, abrangendo todos os argumentos que possam influenciar a decisão final, apresentando preliminares, prejudiciais de mérito, exceções, assim como a defesa de mérito.
Princípios peculiares do Direito Processual do Trabalho
Princípio da oralidade
Na Justiça do Trabalho o princípio da oralidade tem grande importância, acelerando a solução dos conflitos e entrega da prestação jurisdicional. Com efeito, versa a CLT que a petição inicial pode ser apresentada de maneira verbal (art. 840, parágrafo 2º, CLT), o mesmo ocorrendo com a defesa igualmente, em audiência (art. 847, caput, CLT), as razões finais são verbais (art. 850, CLT), os protestos em audiência são verbais (art. 795, CLT). Ainda que lavrados a termo, a oralidade traduz dinamismo ao processo trabalhista, tornando-o ágil e célere.
Para o doutrinador MAURO SCHIAVI, “sob a ótica do processo do trabalho, o princípio da oralidade constitui um conjunto de regras destinadas a simplificar o procedimento, priorizando a palavra falada, concentração dos atos processuais, com um significativo aumento dos poderes do juiz na direção do processo, imprimindo maior celeridade ao procedimento e efetividade da jurisdição, destacando o caráter publicista do processo.” (2015, pág. 130).
Princípio da concentração dos atos processuais
Busca o Direito Processual do Trabalho concentrar os atos do processo em eventos únicos, acelerando sua tramitação. Em uma única audiência, por exemplo, é possível termos a apresentação de defesa, manifestação da parte contrária, oitiva das partes e das testemunhas, razões finais e, inclusive, prolação de sentença.
Essa rapidez vem sendo buscada pelo Novo CPC, que em vários tópicos baseou-se do Processo Trabalhista para tornar mais célere o processo civil.
Princípio da proteção ou tutela
Bastante utilizado no Processo Trabalhista, procura reduzir as desigualdades existentes entre o trabalhador e o poderio econômico do empregador. Assim como no direito material do Trabalho, o processual também confere maior proteção ao empregado, partes hipossuficientes da relação laboral. Exemplo disso é a (a) gratuidade judiciária concedida ao reclamante, (b) a possibilidade de arquivamento da ação caso este não compareça na primeira audiência (empregador é considerado revel – art. 844, caput, CLT), (c) a exigência de depósito recursal somente à empregadora, (d) possibilidade de petição verbal, (e) o jus postulandi (art. 791, CLT), (f) a competência territorial em razão do local da prestação de serviços (art. 651, CLT), (g) a possibilidade de impulso ex officio da execução trabalhista caso as partes não estejam representadas por advogado (art. 878, CLT, com nova redação pela Lei 13.467/17), e o (h) poder normativo da Justiça do Trabalho no âmbito coletivo, apenas para citar alguns.
Ratificando esse princípio, o TST editou a Súmula 212, a seguir transcrita:
SUM-212 DESPEDIMENTO. ÔNUS DA PROVA (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003
O ônus de provar o término do contrato de trabalho, quando negados a prestação de serviço e o despedimento, é do empregador, pois o princípio da continuidade da relação de emprego constitui presunção favorável ao empregado.
Princípio da informalidade
Ao contrário do processo civil, o trabalhista não se atém de forma engessada às formas. A informalidade e simplicidade estão arraigadas ao processo do trabalho, bastando que a causa de pedir, por exemplo, seja compreensiva e não impossibilite o direito de defesa. Essa informalidade, porém, não dispensa uma compreensão lógica das peças processuais, conforme já decidiu a jurisprudência:
DA AUSÊNCIA DE PEDIDO EXPRESSO - INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL - COMPREENSÃO DO OBJETO DO PLEITO - INVIABILIDADE - Não se desconhece que o processo do trabalho prima pelo princípio da informalidade, não se exigindo, para a petição inicial, os rigorosos requisitos do Processo Comum. No entanto, o caput e o parágrafo primeiro do art. 840 da CLT, assim como o art. 282 do Código de Processo Civil, enumeram como requisito indispensável da petição inicial a existência de pedido. Inobstante a informalidade que singulariza o processo do trabalho, não há como prescindir das regras básicas, como aquelas que asseguram o exercício do direito ao contraditório à parte contrária, até mesmo porque o direito de defesa emana da atual Constituição da República. Ademais, a ausência de pedido expresso inviabiliza ao juiz e à parte contrária a exata compreensão do objeto do pleito. Por isso, a informalidade que vigora no Processo do Trabalho não pode chegar ao extremo de admitir causa de pedir sem pedido correlato. (TRT-03ª R. - RO 00609/2014-004-03-00.1 - Rel. Des. Joao Bosco Pinto Lara - DJe 12.02.2016 - p. 362)
Princípio da irrecorribilidade imediata das decisões interlocutórias
Ao contrário do que ocorre no processo civil, as decisões interlocutórias proferidas no processo do trabalho somente são atacadas por meio de recurso da decisão final. Essa é a regra geral, ressalvada a exceção prevista na Súmula 214, TST[20].
Há previsão expressa nesse sentido no artigo 893, parágrafo 1º, da CLT:
Art. 893 - Das decisões são admissíveis os seguintes recursos:
§ 1º - Os incidentes do processo são resolvidos pelo próprio Juízo ou Tribunal, admitindo-se a apreciação do merecimento das decisões interlocutórias somente em recursos da decisão definitiva.
Princípio da conciliação
A Justiça Trabalhista tem como princípio basilar a busca constante pela conciliação, escolhida como a mais adequada para a solução célere dos conflitos. O próprio texto consolidado exige a proposta de conciliação antes do recebimento da defesa (art. 846, CLT) e após as razões finais (art. 850, CLT), sob pena de nulidade.
Princípio da majoração dos poderes do juiz do trabalho na condução do processo
Não se pode esperar do magistrado uma postura fraca, inerte e insegura. Deve ele conduzir o processo almejando alcançar o julgamento de mérito e distribuir a Justiça na forma do seu convencimento, conforme as provas produzidas no decorrer da instrução processual. Para tanto, na esfera trabalhista, goza de poderes amplos, observando o caráter social da Justiça do Trabalho e a dinâmica do direito processual trabalhista. Assim, segundo palavras de MAURO SCHIAVI, “o artigo 765 da CLT possibilita ao juiz do trabalho maiores poderes na direção do processo, podendo, ex officio, determinar qualquer diligência processual para formar seu convencimento em busca da verdade, inclusive são amplos os poderes instrutórios do Juiz do Trabalho.” (2015, pág. 134)
Pode o juiz trabalhista, portanto, inverter a ordem natural da oitiva de testemunhas, desmembrar a audiência trabalhista, converter reclamatórias submetidas ao rito sumaríssimo para rito ordinário, entre outras providências.
Não devemos, porém, deixar que arbitrariedades dominem o processo trabalhista. Conforme dito pelo filósofo grego Platão, “o juiz não é nomeado para fazer favores com a justiça, mas para julgar segundo as leis”.
Princípio do “JUS POSTULANDI”
Princípio de grande importância para o Direito processual do trabalho, o jus postulandi está previsto no artigo 791 da CLT, correspondendo à possibilidade do empregado e empregador atuarem no processo sem a companhia de advogado.
GUSTAVO CISNEIROS, porém, destaca em sua obra que “o jus postulandi trabalhista não encontra limitação no valor da causa, mas o TST, no ano de 2010, mediante a Súmula 425, mitigou seu alcance, afastando-o do mandado de segurança, da ação cautelar, da ação rescisória e de toda e qualquer ação ou recurso de competência do TST” (pág. 28).
Vale dizer, portanto, que a parte pode acompanhar seu processo até o final, atuando nas instâncias ordinárias (varas do trabalho e TRT’s), mas devendo constituir advogado caso deseje atua na instância extraordinária (TST/STF).