Julgamento de Capitu

16/12/2017 às 19:53
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Capitu não era dissimulada. Dissimulada era a linda Sofia

                  Julgamento de Capitu

            Capitolina, ou melhor, Capitu, figura central do romance Dom Casmurro, do grande romancista Machado de Assis, é condenada pelos seus leitores por ter traído seu marido, Bentinho, Dom Casmurro. A frase machadiana é uma “Denúncia”: “Momento houve em que os olhos de Capitu fitaram o defunto, quais os da viúva”. Entretanto, não chegaremos à esta conclusão, se forem analisadas as vidas de Escobar, Bentinho, Capitu e Sancha . Bentinho foi metido no Seminário, não por vocação, e sim para satisfazer os caprichos de sua mãe, sob alegação que havia feito uma promessa a Deus por uma graça alcançada e sob as benções do Padre Cabral.   Mas, o Seminário de Bentinho era Capitu, morena, “ olhos de cigana oblíqua e dissimulada”, apelido dado por José Dias, o agregado, que a família de Bentinho o adotou em agradecimento a um favor recebido, tornou-se o   conselheiro da família,  era imponente, falava superlativos e sentia uma pessoa importante, quando na verdade, era um parasitário, contentando-se com roupas recebidas, cama e mesa. O namoro de Capitu e Bentinho era acobertado por ele. Bentinho no Seminário ficou conhecendo o paraense    Escobar, cuja amizade despertava atenção de seus colegas do seminário, pela maneira afetuosa como se comunicavam, chegando ao ponto de um dos padres repreende-los por tais atitudes.

Casaram-se Bentinho e Capitu. Escobar e Sancha. Os casais eram mais do que amigos. Amizade de sala, quarto, cozinha e quintal. Escobar e  Sacha tiveram uma filha que ‘familiarmente’ era chamada de  Capituzinha. Mais tarde, Capitu e Bentinho tiveram um filho que puseram o nome Ezequiel em homenagem a Escobar.  Ezequiel a cada dia parecia com Escobar, seu papel carbono. Escobar era tão irresponsável que chegou a imaginar o casamento dos dois pupilos, o que configuraria incesto.  Ora, Capitu nunca foi “dissimulada” os seus olhos grandes e claros indicavam a sua personalidade, desde criança era sensual, irrequieta, travessa, capaz de arquitetar todo tipo de aventura, inclusive com Escobar, e com o consentimento implícito de Bentinho, que o conhecia muito bem seu amigo.

“ Dissimulada” era a “linda Sofia”, mulher de Cristiano de Almeida Palha, que com os seus lindos braços seduziu Rubião, apropriando-se de presentes que o levaram à miséria e   à loucura. Numa ocasião, Sofia convidou suas amigas para uma reunião para apresentar Rubião : “ o ricaço de Minas.” Quando Rubião já estava na miséria e no grau máximo da loucura, Sofia a ser perguntada se Rubião era rico, ela respondeu simplesmente:  dizem que ele possuía alguma coisa, mas como era descontrolado ficou pobre e doente, e o Palha está providenciando sua internação... (Romance Quincas Borba) Voltando a estória de Capitu, quando  Escobar morreu afogado numa aventura pelo mar, e ao ser velado, Bentinho constatou que Capitu chorou lagrimas de viúva diante do cadáver de Escobar.  Bentinho ficou desesperado.  Atribui-se que seu distúrbio mental que o acompanhou por toda vida, se referia ao fato da semelhança de Ezequiel com Escobar, mas o seu sentimento vai muito além disto: a perda de seu dileto amigo desde os tempos do Seminário. Portanto, a meu ver, não houve traição por parte de Capitu, porque o seu olhar nunca foi dissimulado, e sempre foi dirigido por ele em todas as suas atitudes, principalmente com relação a Escobar, com as bênçãos de Bentinho. Da mesma forma, a “linda Sofia”, embora além das evidências,   tem o testemunho do dr. Falcão, médico de Rubião que a recrimina, mas o seu marido sabia perfeitamente, que os presentes caríssimos eram dados pelo Rubião, os quais levaram-no à miséria e à demência. Portanto, a “ linda Sofia”e Capitu  devem ser absolvidas.       

  

Sobre o autor
José Edson de Andrade Neves

Advogado militante em Belo Horizonte, graduado pela Faculdade de Direito da UFMG, em Belo Horizonte, pos graduado em Ciências Penais, pela Faculdade Gama filho

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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