Os efeitos oriundos das penalidades administrativas suspensão e impedimento de licitar nos contratos em curso

Leia nesta página:

Efeitos da penalidade suspensão temporária e impedimento de licitar e contratar na prorrogação de contratos administrativos.

01. INDAGAÇÃO SOBRE O TEMA EM TESTILHA:

Uma interpretação impetuosa sobre o tema poderia suscitar uma interpretação de que, uma vez que um Contratado da Administração Pública fosse apenado com a penalidade de suspensão temporária ou impedimento de participar de licitações e/ou contratos públicos, todos os seus contratos em curso deveriam ser rescindidos unilateralmente pela Administração Pública.

02. FUNDAMENTOS:

Tal interpretação restaria equivocada e poderia implicar na descontinuidade de serviços públicos relevantes para o país. Por esse motivo, o Superior Tribunal de Justiça – STJ [1] já reconheceu que, mesmo a aplicação da mais grave penalidade, que é a declaração de inidoneidade, suscitaria efeitos apenas a partir do momento da aplicação dessa mesma penalidade. Tal produção de efeito é conhecido no mundo jurídico como “ex nunc”, não interferindo nos contratos já existentes e em andamento. Para o Egrégio Tribunal de Contas – TCU [2], por exemplo, o único caso em que a rescisão seria obrigatória seria o do próprio contrato administrativo inadimplido ou amparado em licitação viciada, nada mais.

Vale lembrar que há casos em que a aplicação de suspensão temporária ou impedimento de licitar e contratar, significa que, no mínimo, irregularidades relativamente graves foram praticadas no âmbito de determinado procedimento licitatório ou na execução contratual, momento em que certamente a extinção da contratação será cogente, como um desdobramento lógico da rescisão unilateral por inadimplemento ou da declaração de nulidade da licitação/contratação.

03. OS EFEITOS DAS PENALIDADES NA SIMPLES PRORROGAÇÃO CONTRATUAL:

Questão importante concerne aos efeitos da penalidade suspensão temporária e impedimento de licitar e contratar na prorrogação de contratos administrativos. Passa-se as regras.

Quando a prorrogação decorre de uma ampliação dos prazos de etapas de execução, conclusão e entrega ou da devolução do prazo por força de um impedimento, paralisação ou sustação, é forçoso reconhecer que não estará havendo nova contratação, mas apenas uma alteração no cronograma da contratação com reflexos jurídicos no prazo de vigência contratual. Tais prorrogações não restam impedidas pela aplicação das sanções de suspensão temporária ou impedimento de participar de licitações e contratações, pois nem o objeto da contratação se exauriu, tampouco há formalização de ajuste equivalente a uma nova contratação. A prorrogação representa aqui uma mera extensão de cronograma por força de circunstâncias de interesse da Administração Pública ou estranhas à vontade das partes. É por essa razão que os casos que motivam essa prorrogação normalmente decorrem de situações que ensejam mutabilidade contratual, como alteração unilateral, fato do príncipe, fato da administração e álea econômica, sendo desnecessária a concordância do particular com a ampliação do prazo, para que essa seja determinada e surta seus efeitos.

Verifica-se que a alteração do contrato administrativo se dá por acordo nas seguintes hipóteses: substituição de garantia, alteração do regime de execução, alteração da forma de fornecimento ou alteração de cláusulas.

Por outro lado, quando a prorrogação representa uma verdadeira “renovação da contratação”, situação semelhante a uma “nova contratação”, há de se concluir que restaria vedada pela legislação, sob pena da Administração Pública estar firmando ato equivalente a novo contrato com empresa suspensa ou impedida de participar de licitações.

Por exemplo, no caso da prorrogação do art. 57, II, da Lei n° 8.666/93 (contratos de natureza continua), a literatura aponta [3] que não se está diante de uma “prorrogação propriamente dita dos prazos”, como a do art. 57, §1º, mas de uma verdadeira “renovação da contratação”, pois há a necessária presença do elemento volitivo de ambas as partes para que a prorrogação se torne juridicamente válida.

04. CONCLUSÃO:

Há de se concluir, então, que a suspensão temporária e o impedimento de licitar e contratar não impossibilitam a prorrogação da vigência contratual fundada nos arts. 57, § 1º [4], e 79, § 5º [5], da Lei nº 8.666/93, pois a ampliação do prazo de vigência da contratação prevista nesses dispositivos não se qualifica como hipótese equivalente a uma “renovação da contratação”.

Felipe Furtado Morais é advogado especializado em Direito Administrativo do Escritório Morais & D’Ornellas Advogados Associados.

[1] STJ, Mandado de Segurança nº 13101-DF, relatora Ministra Eliana Calmon:

“ADMINISTRATIVO - LICITAÇÃO – INIDONEIDADE DECRETADA PELA CONTROLADORIA GERAL DA UNIÃO – ATO IMPUGNADO VIA MANDADO DE SEGURANÇA.
1. Empresa que, em processo administrativo regular, teve decretada a
sua inidoneidade para licitar e contratar com o Poder Público, com base em fatos concretos.

2. Constitucionalidade da sanção aplicada com respaldo na Lei de Licitações, Lei 8.666/93 (arts. 87 e 88).
3. Legalidade do ato administrativo sancionador que observou o devido processo legal, o contraditório e o princípio da proporcionalidade.

4. Inidoneidade que, como sanção, só produz efeito para o futuro (efeito ex nunc), sem interferir nos contratos já existentes e em andamento.
5. Segurança denegada”.

[2] TCU, Acórdão nº 1.262/2009 – Plenário: “Com amparo na ‘moderna jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça – STJ e do Tribunal Regional Federal da 1a Região – TRF-1’, o relator concluiu que ‘a declaração de inidoneidade não dá ensejo à imediata rescisão de todos os contratos firmados entre as empresas sancionadas e a administração pública federal. Isso porque a declaração de inidoneidade apenas produz efeitos ex nunc, não autorizando que sejam desfeitos todos os atos pretéritos ao momento de sua

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proclamação’. Em seu voto, o relator ponderou que a rescisão de todos os contratos anteriormente celebrados pela empresa declarada inidônea nem sempre se mostra a solução mais adequada, pois, dependendo da natureza dos serviços pactuados, os quais, em algumas situações, não podem sofrer solução de continuidade, ‘não seria vantajoso para a administração rescindir contratos cuja execução estivesse adequada para celebrar contratos emergenciais, no geral mais onerosos e com nível de prestação de serviços diverso, qualitativamente, daquele que seria obtido no regular procedimento licitatório’”.

[3] JUSTEN FILHO. Marçal. Comentários a Lei de Licitação e Contratos Administrativos. São Paulo. Dialética. 2009. p. 700. “Na disciplina original do inc. II do art. 57, não existia problema de alteração do prazo originalmente fixado. Afinal, dispositivo facultava que contratação fosse pactuada desde logo por um prazo mais longo, sem qualquer referência alteração do prazo de sua vigência. Como visto, alterou-se a disciplina original  e determinou-se que o contrato poderia ser pactuado por um certo prazo, o qual poderia ser alterado posteriormente (...) Ora, disciplina do art. 57, inc. II, não consiste propriamente numa prorrogação de prazo. Trata-se, muito mais, de uma renovação contratual. Assim se passa porque "prorrogação" exige concordância de ambas as partes, surgindo alternativa para qualquer uma delas rejeitar extensão da vigência por outro período de tempo.”

[4] Art. 57, § 1º: “Os prazos de início de etapas de execução, de conclusão e de entrega admitem prorrogação, mantidas as demais cláusulas do contrato e assegurada a manutenção de seu equilíbrio econômico-financeiro, desde que ocorra algum dos seguintes motivos, devidamente autuados em processo:

I - alteração do projeto ou especificações, pela Administração;

II - superveniência de fato excepcional ou imprevisível, estranho à vontade das partes, que altere fundamentalmente as condições de execução do contrato;

III - interrupção da execução do contrato ou diminuição do ritmo de trabalho por ordem e no interesse da Administração;

IV - aumento das quantidades inicialmente previstas no contrato, nos limites permitidos por esta Lei;

V - impedimento de execução do contrato por fato ou ato de terceiro reconhecido pela Administração em documento contemporâneo à sua ocorrência”.

[5] Art. 79, § 5º:“Ocorrendo impedimento, paralisação ou sustação do contrato, o cronograma de execução será prorrogado automaticamente por igual tempo”.

Sobre os autores
Felipe Furtado Morais

– Bacharel em Direito pela Universidade Cândido Mendes – Centro; – Pós Graduado em Direito Público pela Universidade Gama Filho; – Pós-Graduado em MBA Executivo – Gestão de Negócios – IBMEC; – Idiomas: Inglês e Espanhol; – OAB/RJ nº 142.387 e Cédula Profissional de Advogado Português nº 54915P.

Vivian Valle D'Ornellas

– Bacharel em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ; – Pós Graduada em Direito Público pela Universidade Gama Filho; – Curso de Extensão – Contratos: Teoria e Prática – PUC-RIO; – Idioma: Inglês e Espanhol; – OAB/RJ nº 150.002.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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