O indiciamento: impossibilidade técnico jurídico nos crimes de menor potencial ofensivo.

07/02/2018 às 12:40
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O indiciamento é instituto exclusivo do Inquérito Policial (Auto de Prisão em Flagrante ou Portaria), por isso impossível diante de crime de menor potencial ofensivo.

 

A Lei 9.099/95, vulgarmente conhecida como Lei dos Juizados Especiais, no que concerne a atribuição policial, criou nova classificação para os crimes, abarcando em seu conteúdo o crime de "menor potencial ofensivo" (crime com pena máxima de até 01 ano), oferecendo princípios, instrumentos procedimentais e processuais penais e competência judicial  específicos para o tratamento hermenêutico e prático. Tal especificidade legal, verdadeira exclusividade no sistema juridico brasileiro, orientou toda a exegese e rotina da persecução penal dali (1995) pra frente.

A partir da edição da nóvel legislação, a doutrina e jurisprudência se esforçaram para harminizar sistematicamente as novas aspirações do legislador ao ordenamento juridico. 

Desejo que estas poucas linhas sirvam de aspiração para que os (as) colegas Delegados (as) e os que almejam a carreira aperfeiçoem a prática técnico-jurídica e produzam material acadêmico com o fim de prestar um serviço de excelência ao país.

Nos interessa abordar o assunto do ponto de vista da investigacão criminal conduzida pelo Delegado de Polícia (Lei 12.830/13).

Até o advento da Lei 9.099 de 1995, o Inquérito Policial, iniciado por Auto de Prisão em Flagrante ou Portaria, foi o repositório oficial da investigacão criminal policial, não importava o crime investigado. Com a nova lei, mudanças radicais na estrutura procedimental policial  e nos peradigmas que orientavam a exegese do intérprete  da Lai Penal e Processual Penal foram demandadas pelo legislador.

A Lei 9.099/95 previu, dentre outros,  a criação de delegacia especializada, integrante de uma Justica Especial Criminal, demonstrando a importância dada pelo legislador ao novo instituto ali criado, crime de menor potencial ofensivo. 

O legislador ofereceu novo instrumento de trabalho aos Delegados, o Termo Circunstanciado de Ocorrência, vulgarmente conhecido como "TCO". Tal instrumento investigativo é exclusivo para formalização dos fatos amparados pelo novo instituto, crime de menor potencial ofensivo. Portanto, a partir da nova legislação, o Delegado não mais instaura Inquérito através de Auto de Prisão em Flagrante no caso de crime de menor potencial ofensivo, mas, sim, Termo Circunstanciado de Ocorrência-TCO. 

O TCO é o procedimento e a peça inicial da investigação criminal de crimes de menor potencial ofensivo. O legislador não previu procedimento para obtenção de indícios de autoria e materialidade quando diante da crime de menor potencial ofensivo. Portanto, não está previsto em lei a instauração de "TCO não flagrancial" ou seja, inexiste procedimento de instauração de TCO via portaria ou outro instrumento qualquer.

A melhor hermenêutica sugere que a investigação criminal presidida pelo Delegado de Polícia  nos crimes de menor potencial ofensivo é realizada através do TCO. Isso decorre da interpretação sistemática do novo instituto com o restante do ordenamento jurídico voltado a persecução penal. 

O legislador ao idealizar o crime de menor potencial ofensivo optou politicamente por oferecer tratamento privilegiado ao suposto criminoso,  fornecendo princípios, privilégios em relação a prisões cautelares, impossibilidade de reincidencia e etc, fazendo com que a lupa hermenêutica utilizada para o tratamento prático das investigacões criminais fosse diferente daquela utilizada para os crimes de médio (pena mínima até 1 ano) e alto potencial ofensivo (pena máxima maior de 02 anos).

Diante de um eventual crime de menor potencial ofensivo o intérprete deve utilizar a lupa hermenêutica que permite a exegese correta do fato para melhor aplicação do direito a fim de garantir, na prática, os anseios do legislador. Para isso, o Delegado deve conhecer o espírito da nova lei e ser técnico ao ponto de não embaralhar institutos outros que não os oferecidos pelo legislador. Costumo dizer que a Lei 9.099  criou um "campo de força" onde o que nao for afeto à Justica Especial Criminal não penetra no Dome.

Partindo do raciocínio do "campo de forca", deduzimos que os institutos do Inquérito Policial não se aplicam à Justiça Especial da Lei 9.099/95, por isso ser equivocado, tecnicamente, o indiciamento em sede de TCO. Este é exclusivo das investigacoes de crimes de médio e alto potencial ofensivo, investigados por meio do Inquérito Policial e sob a presidencia do Delegado de Polícia.

A abstração legislativa não abarcou as situações nas quais os envolvidos e as circunstâncias do crime não são apresentadas ou não são possíveis de se precisar no momento em que a Autoridade Policial toma ciência do suposto fato. Nesse caso, temos observado equívocos técnicos provocados pela incorreta exegese da nova Lei e sua sistematização com o ordenamento juridico quando há instauração de Inquérito Policial para investigação de crime de menor potencial ofensivo e, pior, com proibição de indiciamento. Ora, o indiciamento e ato privativo do Delegado de Polícia e cabe somente a ele decidir sobre tal formalidade. Permitir a instauração de Inquérito Policial e proibir o indiciamento e afrontar uma prerrogativa insculpida na Lei 12.830 de 2013. Erra no momento de orientar pela instauração de Inquérito Policial para investigar crime de menor potencial ofensivo e por tabela erra ao proibir o indiciamento no caso de instauração de inquérito.

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Sugerimos nesses casos a instauração de Verificação Preliminar da Informação, vulgarmente conhecida como VPI, formalizando o TCO quando reunidas as suas condições legais, mantendo o sistema coeso e firmando o caráter técnico-jurídico das decisões e atos do (a) Delegado (a) de Policia.

 

 

 

 

 

 

Sobre o autor
Bruno Calandrini

Delegado de Polícia Federal Professor de Direito Penal

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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