Abandono material e suas consequências: breves considerações jurídicas

21/02/2018 às 18:00
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Abandono material é um assunto sério que gera consequências de natureza física e psicológica para muitas pessoas porque envolve não somente a questão financeira como também a emocional. O delito em questão também é considerado como abandono familiar ou ainda sentimental, não devendo ser confundido com abandono afetivo.

O artigo 244 do Código Penal descreve o abandono material, que consiste na recusa de forma injustificada daquele que deve pagar, ou seja, de prover materialmente com o necessário para a subsistência da vítima, como deixar de pagar pensão alimentícia judicialmente acordada ou fixada, ou deixar de socorrer ascendente (Pais) ou descendente (Filho) sem justa causa, sendo que a vítima pode ser cônjuge, convivente, ascendente portador de necessidade especial ou maior de sessenta anos, sem excetuarmos o filho menor de dezoito anos ou inapto para o trabalho. A conduta do autor deve ser reiterada e a observação recai no elemento normativo ”sem justa causa”. Não se poderia incriminar um filho maior e capaz que é presente na vida dos pais mas não possui muitos recursos financeiros capazes de ajudar-lhes.

Já a pensão alimentícia compreende a alimentação, vestuário, lazer, remédios, materiais escolares e deve ser estipulada analisando o chamado binômio: necessidade de quem a pleiteia e possibilidade de quem vai pagá-la. É, porém, importante mencionar que, quando judicialmente acordada, deve ser paga para que não haja a tipificação no 244 do Código Penal, quando de forma injustificada e reiterada o devedor não a cumpre.

Existem três ações nucleares que são: frustrar o pagamento da pensão alimentícia, não socorrer ascendente ou descendente gravemente enfermo ou ainda injustificadamente deixar de prover a subsistência da vítima. O delito é omissivo próprio e não admite a conatus, ou seja a tentativa.

O dolo é o elemento subjetivo, significa que a pessoa autora age de forma intencional. A questão ainda é mais séria porque envolve sentimentos da vítima e os efeitos acabam por refletir na estima, saúde física e mental da mesma, sem excetuarmos o quão horrendo é o fato em sí. Imaginemos um filho maior e capaz e tendo condições financeiras, não acudir o pai idoso e portador de doença degenerativa como o Alzheimer, não levá-lo ao médico, não comprar remédio!

E quanta falta de consideração quando o devedor de pensão frustra propositadamente a mesma no que se refere ao filho menor! Alguns devedores largam o emprego só para não pagá-la.

Indubitavelmente todos esses fatos abalam a autoestima e declaram a olhos vistos que o respeito, o carinho, a gratidão por vezes não tem muito espaço na vida do autor do fato delituoso em questão.

As consequências para a vítima podem ser: uso de remédio para curar depressão, crise de ansiedade, psicoterapias para auxiliar no tratamento da insegurança, baixa autoestima.

Já para os ascendentes, em sua maioria, a sensação de descaso e falta de amor é a grande colaboradora para a inexistência da vontade de viver, falta de apetite, desânimo e tristeza infindável.

A pena para o abandono material é de um a quatro anos e multa de uma a dez vezes o maior salário mínimo vigente no país, não se tratando, pois, de crime de menor potencial ofensivo. Informalmente espera-se a cobrança por parte da consciência do sujeito ativo do delito em questão.

No que concerne ao Direito Civil, não pagar a pensão alimentícia judicialmente acordada ou fixada enseja prisão por até 90 dias do devedor inadimplente, negativação do nome e bloqueio em conta através de ordem judicial. Trata-se de não cumprimento de obrigação de dar, que é civilista e também configura descumprimento a ordem judicial.

O abandono afetivo difere do material. Exemplo: muitas vezes o devedor paga a pensão mas não é presente na vida do descendente; em outro caso, o filho maior e capaz paga pensão aos pais porém não participa da vida dos mesmos.

Seja qual for a espécie de abandono, é importante esclarecer que valores morais estão muito além dos financeiros, que ajudam a sobreviver, óbvio, mas não se sobrepõem aos primeiros, por não proporcionarem às pessoas nobres sentimentos tais quais: amor, companheirismo e gratidão!

Sobre a autora
Kelly Moura Oliveira Lisita

Advogada.Membro da Comissão de Direito das Famílias da OAB GO.Docente Universitára nas áreas de Direito Penal e Direito Civil.Tutora em EAD.Articulista.

Informações sobre o texto

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