Mediação e conciliação: Meios alternativos na resolução de conflitos

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Resumo: A Conciliação e a Mediação perfazem institutos relativamente arcaicos em nosso ordenamento jurídico, contudo, ainda carecem de maior estudo por parte da doutrina sendo esta responsável pela concretização de tais instrumentos com a obtenção da necessária segurança jurídica tão almejada por seus defensores. Elas se dão como formas alternativas para a resolução de conflitos visando à maximização do acesso à justiça e o fortalecimento de princípios tais como os da celeridade e da economia processual. A Conciliação traz em sua natureza uma visão binaria comumente empregada em nosso ordenamento jurídico, onde há a polarização da relação e a intervenção de um terceiro que sugere e guia as partes para um resultado prático. Onde nem sempre ambas satisfazem-se, assim, a solução momentânea ocorre em detrimento das relações de onde advirão os dissídios. Já, a Mediação tem como embasamento uma linguagem ternaria buscando  o fortalecimento do vínculo de onde adjaz a demanda para que, haja por parte do terceiro uma orientação colaborativa onde o reconhecimento mutuo e humanitário é responsável pela resolução amigável através da exposição dos benefícios a ambos, buscando a satisfação multilateral. Desta forma, este estudo tem por objetivo conceituar e definir estes métodos alternativos na resolução dos conflitos sendo embasado em uma análise descritiva com abordagem qualitativa, por meio da pesquisa bibliográfica em obras, artigos e outros materiais impressos e virtuais.  

Palavras-chave: Mediação; Conciliação: Politicas Publicas; Diferenciação.

MEDIATION AND CONCILIATION: ALTERNATIVE WAYS IN THE RESOLUTION OF CONFLICTS

Abstract: The Conciliation and the Mediation constitute relatively archaic institutes in our ordainment, needing, however, bigger study by the doctrine, this one being the main responsible for the fulfilling of such instruments with the necessary legal certainty longed for its defenders. They are given in alternate ways for the resolution of conflicts, aiming the maximization of access to justice and the strengthening of principles such as the procedural economy and celerity. The Conciliation brings in its nature a binary vision commonly employed in our legal ordainment, where there is a polarization of the relations and the intervention of a third party that suggests and guides the parts through achieving a more practical result that does not always pleases both of them, thus, the momentary solution occurs in detriment of the relations from where the agreements may come. The Mediation is based on a ternary language, seeking the strengthening of the bond where the demand come from, so that the third party individual may express a collaborative guidance where the mutual and humanitarian acknowledgement is achieved, being the main responsible for the friendly resolution towards the presentation of benefits for both sides, fetching multilateral satisfaction, and achieving the elaboration of all terms of agreements. Thus, remain clear the discrepancies regarding the procedures lacking biggest elucidation for the lay population and, in many cases, by the operators of law that should draw attention to the exponential growth of such alternative ways of achieving common satisfaction.                                                       

Key words: Mediation; Conciliation; Public Policies; Differentiation.


1 INTRODUÇÃO

A resolução amigável dos conflitos é uma vertente que vem se expandido a longos passos nos últimos tempos, ganhando força com as inovações em nosso ordenamento jurídico. Sua regulamentação vem adjunta a Constituição Federal, que traz em seu inciso LXXVIII do artigo 5º da Constituição Federal (Emenda Constitucional n° 45, de 2004), o preceito de que a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação. Fundando assim, uma tendência á extrajudicialização que visa o descongestionamento do Poder Judiciário e uma busca pela maior celeridade procedimental em casos que a matéria comporta.

Esta tendência nidificasse com o advento do Novo Código de Processo Civil que, vem a concretizar os procedimentos e a instrumentalizar sua aplicação pratica em detrimento dos arcaicos métodos empregados pelo poder judiciário, tal fato comprovasse em números pelo fato de que, em relação a Conciliação, tem-se menção a está 33 vezes, destinando-se também 22 menções á Mediação, retratando-se assim o real e exponencial crescimento desta tão importante linha de pensamento.

A importância do estudo dos Institutos alternativos de resolução pautasse sob o enorme congestionamento nas vias judiciais tradicionalmente utilizadas, ora, segundo o relatório de 2016 do CNJ, há Tribunais com 83,5 % de congestionamento, sendo assim completamente inviável a manutenção do acesso à justiça.

Elucidada a importância dada aos institutos, tem-se como fundamental que se conceitue e se diferencie ambos com enfoque em suas peculiaridades sendo este o real foco do presente artigo. Incipiente, comecemos pelo instituto da Mediação que se dá na transação entre duas partes que deixam de chegar a termo pela falta de comunicação ou quando esta se faz dificultada por fatores pré-determinados, extinguindo-se a comumente empregada polarização entre “vencedor” e “perdedor” como se vê na Conciliação, onde denotasse a impossibilidade de se reestabelecer o vínculo anterior e buscasse um resultado adversativamente satisfatório, ainda que somente para uma das partes. Assim, para o presente estudo foi voltado a conceptualização doutrinaria através de uma análise descritiva da bibliografia disponível, assim como estudos e estáticas pré-existentes.


2 DA ORIGEM PRINCIPIOLÓGICA

Incipiente, é oportuno estudar a matriz logica de onde adveio os conceitos recentemente valorados dos meios alternativos na resolução de conflitos, sendo esta profundamente embasada e alicerçada em princípios constitucionais, estando presente dês de os primórdios da sociedade, estendendo-se pelo decorrer das gerações sendo remetido á culturas judaicas, cristãs, islâmicas, hinduístas, budistas e outras diversas mais, todas com menções honrosas a utilização de métodos amigáveis para solução de demandas comumente enfrentadas por seus adeptos, ou como ressaltado por Rozane da Rosa Cachapuz em sua obra Mediação nos conflitos e Direito de Família, “sua existência remonta aos idos de 3000 a.c, na Grécia, bem como no Egito, Kheta, Assíria e Babilônia, nos casos entre as Cidades-Estados”.

Vala lembrar que, nem sempre houve o monopólio da jurisdição pelo estado, sendo fortemente presente nas culturas passadas a resolução unipessoal de conflitos, independente da força impostora de um terceiro como o Estado, sendo irrefutavelmente favorável quaisquer meio onde a solução seria de agrado a ambos, com oneração e benefícios recíprocos, conforme elucida Fabiana Marion Spengler em:

Aliás, é de importante lembrança que a jurisdição, como atualmente conhecida e experimentada no atual contexto histórico-social vivenciado pela sociedade, é fruto de uma longa e importante mudança cultural e histórica. Inexistia no passado o monopólio da tutela jurisdicional, no qual o Estado intervinha nas relações interpessoais privadas, a fim de restabelecer a paz social e dizer o direito. Se hodiernamente a função jurisdicional é responsabilidade do Estado, que a exerce em caráter exclusivo e indelegável11, no passado a resolução dos conflitos era distribuída de forma nada unânime, de acordo com a cultura local e de suas tradições, através de intervenção de mediadores ou árbitros. (SPENGLER, SPENGLER, 2010 p. 18)

Havendo seguimento desta crescente tendência nos alicerces do Direito, ora, suas disposições se alicerçaram na essência do Direito Romano, sendo este matriz para o Direito Moderno, onde já havia a distinção entre “in iudicio” e “in iure” sendo o primeiro juízo na presença de um terceiro mediador e e neutro e o segundo na presença de um juiz togado. Sendo portanto, gradual a expansão deste conceito com uma valoração exponencial nas últimas duas décadas sendo os Estados Unidos o primeiro pais a estruturar no Direito moderno a utilização de meios alternativos tais como a Mediação, conforme sabiamente exposto ainda por Petrônio Calmon, não é de se espantar que, em um pais onde a cultura liberal prevalece, haja o exponencial fortalecimento de meios individuais de resolução, assim descrevendo em sua obra:

Coerente com a cultura liberal (que domina não só a política, a economia e a sociedade, mas também o direito), em um país onde não se aceitam facilmente barreiras à liberdade de contratar, não surgiram fortes obstáculos ou oposição política à prática dos mecanismos de solução extrajudicial dos conflitos. (CALMON, 2007 p. 174)

        Ainda, sobre a matriz principiológica e conceitual desta vertente temos que, há amparo no Princípio da maximização do acesso a justiça amplamente difundido pelos estados, a citar o Brasil, onde em sua Carta Magna é facilmente identificado através de seus dispositivos que tutelam a Efetividade Jurisdicional e a Eficácia Material uma tendência á difusão dos direitos entre os que antes não tinham fácil acesso, vezes por falta de informação, vezes por descrença no sistema amplamente burocrático e oneroso, sendo assim exposto por Fabiana Marion Spengler:

Nesse contexto de crise, evidencia-se a preocupação com a efetividade/qualidade da prestação jurisdicional cujo modelo conflitual se caracteriza pela oposição de interesses entre as partes, que esperam pelo Estado (terceiro autônomo, neutro e imparcial) que deve dizer a quem pertence o direito. Atualmente, a tarefa de “dizer o direito” encontra limites na precariedade da jurisdição moderna, incapaz de responder às demandas contemporâneas produzidas por uma sociedade que avança tecnologicamente, permitindo o aumento da exploração econômica, caracterizada pela capacidade de produzir riscos sociais e pela incapacidade de oferecer-lhes respostas a partir dos parâmetros tradicionais. (SPENGLER, SPENGLER, p. 14)

Ao mesmo passo, tem-se o disposto no artigo 98 de nossa constituição federal que tutela o “Juízo de Paz” abrindo alas para a lei dos Juizados Especiais que veio como uma tendência inovadora no ordenamento, trazendo celeridade e desafogamento nas vias tradicionalmente empregadas, conduzindo as partes á uma audiência previa de conciliação conduzida por um juiz leigo, ou como nas palavras de Ilza de Fatima Wagner Lopez e Fernando Silveira Melo Plentz Miranda no artigo “A conciliação nos Juizados Especiais Cíveis”:

A Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995 do Juizado Especial Cível e Criminal é particularmente voltada à conciliação como meio de solução de conflitos, dando a ela especial destaque ao instituir uma verdadeira fase conciliatória no procedimento que disciplina: só se passa à instrução e julgamento da causa se, após toda a tentativa, não tiver sido obtida a conciliação dos litigantes nem a instituição do juízo arbitral (artigos 21 a 26). Trata-se de uma maneira nova, ágil e extraordinariamente diferenciada de prestar-se a jurisdição, conduzindo as partes para uma audiência; e na presença do conciliador, as partes conversarão entre si e farão a proposta. Se aceita, a proposta é homologada no mesmo dia pelo juiz, pondo fim a demanda, sem que haja recurso ou qualquer tipo de burocracia. (LOPEZ e PLENTZ, 2010, p.13)

Amplamente congestionado o sistema jurisdicional contemporâneo, faz-se de suma importância os meios alternativos de resolução, sendo assim evidenciados e tutelados gradualmente pelo juristas e legalistas, acompanhados da doutrina que se faz cada vez menos esparsa, ora, nítido tornou-se o arcaísmo no Judiciário tradicional conforme continua Fabiana Marion Spengler “De outro lado, o Judiciário foi organizado para atuar dentro de determinados limites estruturais, tecnológicos, pragmáticos e metodológicos, muito aquém da complexidade conflitiva que lhe acorre.”. A ineficácia tornou-se inerente ao sistema judiciário, onerando as maquinas estatais responsáveis por tal atribuição, ora, o engessamento das entidades por normas arcaicas e de difícil retificação, carecendo de um conjunto de atos sequenciados de diversos órgãos, tornando quase inatingível uma adequação do regime preestabelecido, sendo assim exposto por:

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Segundo o relatório Justiça em Números do Conselho Nacional de Justiça, a cada ano, para cada dez novas demandas propostas no Poder Judiciário brasileiro, apenas três demandas antigas são resolvidas. Some‑se a este preocupante dado que se encontram pendentes cerca de 93 milhões de feitos. Sem dúvida, vivemos sério problema de déficit operacional. (AZEVEDO, 2010, p. 09)

Realidade devidamente demonstrada, a ineficácia do sistema comumente empregado decorre no crescimento aos olhos dos leigos e dos profissionais da área para quaisquer forma alternativa, tomando como as mais importantes a Mediação, a Conciliação, tratadas neste artigo e por derradeiro, mas não menos importante, a Arbitragem, que ganhou grande força com o advento do Código de Processo Civil de 2015, onde foi atribuída força de Sentença á decisão arbitral, cabendo execução nos moldes voltados a sentença judicial.


3 CARACTERÍSTICAS

3.1 Conciliação

A Conciliação perfaz um instituto intrínseco a natureza humana estando presente nas mais diversas sociedades que já guarneceram nosso planeta terra, sendo utilizada por quase todos os povos civilizados e por vezes, anteriormente, pelos povos bárbaros. Delineando uma matriz palpável ao direito moderno tem-se sua aplicação no Direito Romano, onde o Pretor tinha a função delegada de promover a conciliação em conflitos onde esta coubesse.

Ainda pertinente á este instituto, tem-se que sua aplicabilidade é encontrada em quase uma totalidade dos ordenamentos jurídicos atuais, tendo sua importância ressaltada e elevada com o advento da Constituição Federal de 1988, posteriormente com a institucionalização dos Juizados especiais, e mais recentemente, com a implementação do Código de Processo Civil de 2015 valendo transcrever seu artigo 334 que descreve o procedimento após o recebimento da exordial, deixando claro a busca por métodos alternativos antes do prosseguimento do litigio conforme se vê:

Art. 334.  Se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for o caso de improcedência liminar do pedido, o juiz designará audiência de conciliação ou de mediação com antecedência mínima de 30 (trinta) dias, devendo ser citado o réu com pelo menos 20 (vinte) dias de antecedência.

 § 1o O conciliador ou mediador, onde houver, atuará necessariamente na audiência de conciliação ou de mediação, observando o disposto neste Código, bem como as disposições da lei de organização judiciária.

 § 2o Poderá haver mais de uma sessão destinada à conciliação e à mediação, não podendo exceder a 2 (dois) meses da data de realização da primeira sessão, desde que necessárias à composição das partes.

 § 3o A intimação do autor para a audiência será feita na pessoa de seu advogado.

§ 4o A audiência não será realizada:

 I - se ambas as partes manifestarem, expressamente, desinteresse na composição consensual;

 II - quando não se admitir a autocomposição.

 § 5o O autor deverá indicar, na petição inicial, seu desinteresse na autocomposição, e o réu deverá fazê-lo, por petição, apresentada com 10 (dez) dias de antecedência, contados da data da audiência.

 § 6o Havendo litisconsórcio, o desinteresse na realização da audiência deve ser manifestado por todos os litisconsortes.

 § 7o A audiência de conciliação ou de mediação pode realizar-se por meio eletrônico, nos termos da lei.

 § 8o O não comparecimento injustificado do autor ou do réu à audiência de conciliação é considerado ato atentatório à dignidade da justiça e será sancionado com multa de até dois por cento da vantagem econômica pretendida ou do valor da causa, revertida em favor da União ou do Estado.

 § 9o As partes devem estar acompanhadas por seus advogados ou defensores públicos.

 § 10.  A parte poderá constituir representante, por meio de procuração específica, com poderes para negociar e transigir.

 § 11.  A autocomposição obtida será reduzida a termo e homologada por sentença.

 § 12.  A pauta das audiências de conciliação ou de mediação será organizada de modo a respeitar o intervalo mínimo de 20 (vinte) minutos entre o início de uma e o início da seguinte.

Devidamente demonstrada sua importância, passamos a conceituar o instituto para posteriormente caracteriza-lo e diferencia-lo da Mediação, segundo tópico a ser explanado, sendo assim definido pelo CNJ na obra publicada Manual de Mediação Judicial por André Gomma Azevedo:

A conciliação pode ser definida como um processo autocompositivo breve no qual as partes ou os interessados são auxiliados por um terceiro, neutro ao conflito, ou por um painel de pessoas sem interesse na causa, para assisti‑las, por meio de técnicas adequadas, a chegar a uma solução ou a um acordo. (AZEVEDO, 2016 p. 31)

A conciliação se dá na interlocução entre duas partes que deixam de transigir por uma causa preexistente onde não há vinculo pessoal, havendo a polarização entre os integrantes do litigio para que com o auxílio de profissional conciliador, se atinja um resultado que nem sempre será satisfatório á ambos ou equitativo, contudo, balanceia os diversos fatores adversos para chegar á um resultado possível sem a jurisdição de um Magistrado, sendo assim bem definida por Ilza de Fatima Wagner Lopez e Fernando Silveira Melo Plentz Miranda no artigo supracitado:

A conciliação é um procedimento mais célere e, na maioria dos casos, restringe-se a uma reunião entre as partes e o conciliador. Trata-se de mecanismo muito eficaz para conflitos em que inexiste entre as partes relacionamento significativo no passado ou contínuo a futuro, portanto preferem buscar um acordo de forma imediata para pôr fim à controvérsia ou ao processo judicial. Está mais fortemente ligada ao Judiciário, pois, na maioria dos países latinos, a conciliação tem previsões legais contidas nas leis processuais. A conciliação é tratada como método de resolução de conflitos e não uma simples audiência, para reduzir a pauta dos juízes. (LOPEZ; PLENTZ, 2010, p. 05)

Sua eficácia é inerente á sua modalidade, sendo uma dos maiores e mais consolidados métodos alternativos para resolução de conflitos. Sua aplicabilidade pode se dar dentro da demanda judicial, sendo facultada em audiência própria, como já exposto acima, ou a qualquer tempo da demanda por acordo bilateral, ou ainda pode ser identificada extra processualmente, uma forma pré-processual, onde chagasse a termo de forma predominantemente informal.

Importante frisar que, para que haja a concretização da conciliação, na forma endoprocessual, é necessária intervenção de um terceiro neutro, completamente desligado do caso em tela, sendo sua atribuição a fomentação de um resultado possível para que as partes anuam com o obtido. Tal intervenção carece de capacitação e idoneidade, ora, quaisquer propensão para uma das partes não encarada como justa pela outra, desacreditará o método decorrendo na demanda judicial. Isto posto, resta claro que o papel do Conciliador é de conduzir as partes para que estas desenvolver seu próprio termo em suas próprias condições, sendo assim exposto por Érica Barbosa Silva em sua obra Conciliação Judicial em:

Por tudo isso, o instituto da conciliação deve ser definido como meio de resolução de conflitos, cuja composição é triangular pela atuação de um terceiro, neutro e imparcial, que investiga os interesses e necessidades das partes, pela facilitação da comunicação entre elas com vistas à compreensão do conflito e pela aplicação de técnicas relacionadas à sua adequada transformação, com orientação facilitativa e sem objetivar o acordo, enfocando a relação intersubjetiva, quando necessário, sendo mais afeta aos conflitos unidimensionais. (SILVA, 2013 p. 186)

Assim, resta clara a conceptualização do instituto da conciliação, sendo facilmente identificada em nosso ordenamento jurídico, sendo clara sua importância nos dias atuais, onde cada vez mais cresce exponencialmente o número de demandas judiciais, congestionando a máquina estatal e perpetuando injustiças contra os desprovidos de recursos para independerem dos litígios corriqueiros, ou até dos suficientemente preparados, que sofrem pela longa demora em obter seus direitos.

3.2 Mediação

Dando seguimento à parte conceitual do presente artigo, partimos para o próximo método alternativo para solução dos dissídios, a Mediação, sendo este um dos mais delicados métodos da atualidade, porém, sua aplicação também antecede o Direito Moderno e remonta ás mais antigas civilizações.

Esmiuçando o Direito Moderno nacional, encontramos como ponta pé inicial á mediação o Projeto de Lei nº 4.827/98 criado pela Deputada Zulaiê Cobra que foi aprovado na Câmara dos Deputados no ano de 2002, sendo enviado ao Senado onde permaneceu inerte até meados de 2010, momento em que o CNJ, movido pela crescente tendência da Justiça Colaborativa editou a resolução 125/2010 que trazia a seguinte premissa “[...] a necessidade de se consolidar uma política pública permanente de incentivo e aperfeiçoamento dos mecanismos consensuais de solução de litígios” definindo ainda que “[...] a conciliação e a mediação são instrumentos efetivos de pacificação social, solução e prevenção de litígios, e que a sua apropriada disciplina em programas já implementados no país tem reduzido a excessiva judicialização dos conflitos de interesses, a quantidade de recursos e de execução de sentenças”.

A doutrina ficou encarregada de versar sobre as peculiaridades deste instituto até o ano de 2015 quando finalmente foi implementada a Lei 13.140/15 destinada exclusivamente a Mediação, institucionalizando esta via alternativa e elucidando o real papel do Mediador, dada a sua devida importância. Ao mesmo passo, tem-se a implementação da lei 13.105/15 que institui o Código de Processo Civil vigente que veio dar a última e mais expressiva importância á Mediação, a citar a presença de 22 dispositivos voltados a este instituto, sendo a Seção V do Capitulo III inteiramente destinada á ela e a Conciliação, valendo transcrever o artigo 165 que traz em seu escopo a determinação legal para que os Tribunais instalem Camarás voltadas á perpetuação destes institutos como se vê:

Art. 165.  Os tribunais criarão centros judiciários de solução consensual de conflitos, responsáveis pela realização de sessões e audiências de conciliação e mediação e pelo desenvolvimento de programas destinados a auxiliar, orientar e estimular a auto composição.

Assim, sua importância se mostra acentuada e alicerçada no atual código, refletindo a tendência do ordenamento como um todo, elevando a segurança jurídica contida na Justiça Colaborativa.

Em consonância, carece de uma definição pratica ainda que haja estupenda complexidade em tal instituto, sendo expresso como o Método onde não há a tradicional polarização bilateral entre as partes, dando luz á um método inovador onde a linguagem se faz de forma ternária com a intervenção de um terceiro capacitado á atual imparcialmente, contudo, sendo familiar á demanda, ou como exposto no Manual de Mediação publicado pelo Conselho Nacional de Justiça:

A mediação pode ser definida como uma negociação facilitada ou catalisada por um terceiro. Alguns autores preferem definições mais completas sugerindo que a mediação um processo autocompositivo segundo o qual as partes em disputa são auxiliadas por uma terceira parte neutra ao conflito ou por um painel de pessoas sem interesse na causa, para se chegar a uma composição. Trata‑se de um método de resolução de disputas no qual se desenvolve um processo composto por vários atos procedimentais pelos quais o(s) terceiro(s) imparcial(is) facilita(m) a negociação entre as pessoas em conflito, habilitando‑as a melhor compreender suas posições e a encontrar soluções que se compatibilizam aos seus interesses e necessidades. (AZEVEDO, p. 20)

Desta forma, o terceiro intervém demonstrando os benefícios de se obter um resultado satisfatório para ambos, aplicando uma serie de métodos descritos no Manual publicado pelo CNJ e pela Lei concernente a fim de se desconstruir a cultura ocidental binaria onde sempre há um perdedor e um vencedor, como elucida Aguida Arruda Barbosa:

A Mediação é impulsionada pela inclusão de um terceiro numa relação polarizada, permitindo uma mudança de dinâmica para fazer nascer uma solução que nunca esteve presente enquanto a linguagem era binária. Em síntese, ao permitir a entrada do mediador, os mediandos já estão procedendo a uma abertura, viabilizando a criação de uma outra solução antes impossível. A função do mediador é catalisadora e independente. A arte da Mediação está em despolarizar a postura binária existente entre os litigantes, instalando uma posição ternária, deslocando as resistências dos protagonistas. (BARBOSA, 2006  p. 135).

A mediação é destinada a conflitos onde haja a necessidade e/ou vontade de reestabelecer o vínculo de onde adveio o litigo, sendo este o grande benefício e diferencial deste método, ora, em grande parte das demandas o problema discutido tornasse irrisório perante a quebra do vínculo entre as partes sendo muito mais vantajoso um acordo onde, ainda que não haja resultados equitativos a curto prazo, estes se projetem positivamente á médio e longo prazo.

A mediação foge ao sistema cartesiano que rege nosso ordenamento jurídico, onde visando a segurança jurídica, buscasse uma decisão sólida, pautada em leis, normas ou em jurisprudências, assim, deixando a flexibilidade necessária para resolver alguns casos, que por vezes se dão de forma complexa e interdisciplinar como traz o trecho transcrito por Theobaldo Spengler Neto:

Não se trata de legislar a propósito do bem ou do mal, não se trata de fazer respeitar uma justiça abstrata; trata-se de preservar a segurança do grupo afastando a vingança, de preferência com uma reconciliação baseada na composição ou em qualquer outra que resulte possível, mediante um encontro predisposto de modo tal que a violência não volte a ocorrer. Tal encontro se desenvolverá em campo fechado, de forma regulada entre adversários bem determinados. (SPENGLER, SPENGLER NETO, 2010, p. 21)

Sua importância é acentuada quando partimos ao Direito de Família, onde muitas vezes a demanda em si é o menor dos problemas e por vezes o sistema judiciário é utilizado como uma máquina de vingança, movida por problemas preexistentes que culminam com o ajuizamento da demanda. Nestes casos, o simples conhecimento jurídico não basta para que haja uma solução fática satisfatória carecendo de Profissionais devidamente qualificados nas demais áreas de conhecimento humano, tais como Psicólogos, Sociólogos, Assistentes Sociais e outros, para que o entorno ao dissidio não pague com a ira desvairada de alguém que busca sua própria justiça e não a justiça em si, perfazendo assim um dos mais completos e indicados métodos alternativos para resolução de conflitos.

3.3 Diferenciação

Devidamente elencadas as características de ambos os métodos resolutivos, faz-se necessária à diferenciação de ambos, ainda que esta reste elucidada pela leitura de suas peculiaridades. Independentemente de suas semelhanças quanto á sua raiz principiológica, há distinções fundamentais a serem observadas quando forem serem empregadas.

Incipiente, cabe frisar a que a natureza de ambos institutos se distinguem quanto a composição do litigio, ora, quando versamos sobre Conciliação temos uma natureza binaria onde as partes entram em conflito diretamente, havendo sempre a busca entre um Vencedor e um Perdedor, ainda que a conciliação beire a equidade, ela nunca será plenamente satisfatória, havendo a resolução da demanda, mas não a retratação entre os interessados, neste contexto, vemos o reflexo da cultura ocidental de “certo” e “errado” como bem descrito por Aguida Arruda Barbosa:

O pensamento binário é frequente na cultura ocidental. Na França, por exemplo, é comum trocarem-se a qualificação cartesiano, para dizer que são nutridos por pensamentos como de Descartes, raciocínio matemático, ou das ciências exatas: ou é certo, ou é errado; ou é sim, ou é não. Enfim, é um raciocínio que apresenta só uma alternativa, portanto, restringe a criatividade humana. O princípio binário é expressão pelo terceiro excluído. É o princípio da alternativa lógica, complementar ao princípio da contradição, do ponto de vista ontológico. Este pensamento torna-se cada vez mais presente em função da eficiência da informática, um exemplo de linguagem binária por excelência. O sistema jurídico também é de linguagem binária, pois, a atividade de julgar só apresenta uma alternativa, culpado ou inocente, procedente ou improcedente, excluindo a terceira solução, ou seja, a regida e pela escola clássica, que contempla o terceiro excluído, que caracteriza a relação binária. (BARBOSA, 2006 p. 135).

Na análise   da Mediação, depara-se com uma realidade completamente diferente, onde o terceiro integra o litigia por ter conhecimento do fato, ou capacitação para interagir nesta qualidade e sugere decisões palpáveis, agindo ativamente para que através de alternativas propostas em uma linguagem ternaria se chegue á um acordo justo e célere.

Desta forma, não á a polarização entre as partes, evitando-se a rigidez do Ordenamento jurídico que em sua quase totalidade se faz objetivo para lidar com demandas por vezes extremamente subjetivas. Tratando-se de relações pessoais, os fatores adversos vão muito além do que o texto elaborado pelo legislador pode contemplar, devendo porquanto haver um estudo individualizado, como bem exposto na mesma obra supracitada:

O pensamento ternário é próprio do mundo oriental, por influência da cultura, da religião, dos usos e costumes. Admite a criatividade humana, que é infinita, portanto, abre-se a possibilidade de muitas alternativas, para uma determinada situação, de acordo com os recursos pessoais dos protagonistas. A superioridade do pensamento ternário é evidente, pois, muito mais afeito à atividade humana. Portanto, seu exercício humaniza o homem. Essa distinção entre o pensamento binário e ternário é de conteúdo filosófico, comportando um estudo profundo que, conquanto interessante, evade ao âmbito desta pesquisa. (BARBOSA, 2006 p. 135)

Assim, resta nítida a diferença entre os institutos, devendo sua aplicação ser guiada pela demanda existente ante ao estudo detalhado do caso, para que assim, haja a efetivação da justiça e a satisfação dos interessados, independentemente dos interesses dos terceiros que conduziram os procedimentos.


4 CONCLUSÃO

Em movimento conclusivo, tem-se que os métodos alternativos para a resolução de conflitos tem ganhado grande espaço em nosso ordenamento jurídico, tomando maiores proporções com o advento do Código de Processo Civil de 2015, onde houve exponencial valoração as alternativas empregadas que descongestionem a máquina judiciária.

Devidamente expostos, sintetizasse: a Conciliação perfaz uma forma resolutiva em que, seguindo o pensamento cartesiano ocidental, há a polarização entre vencedor e perdedor, ainda que o resultado seja obtido mediante o uso deste instituto. Já a Mediação reflete uma forma mais sutil e culturalmente inovadora, onde se abre espaço para uma linguagem ternária em que um terceiro ingressa na relação sugerindo resultados possíveis, onde se busca o reestabelecimento da relação pré-existente.

Independentemente de suas distinções, ambos perfazem importantes avanços para o Ordenamento Jurídico nacional e devem ser valorados como tal, fortalecendo as relações amigáveis e escoando a congestionada burocracia que enfrentamos hoje ao pleitear nossos direitos.


REFERÊNCIAS

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Sobre os autores
Luiz Roberto Prandi

Doutor em Ciências da Educação-UFPE Mestre em Ciências da Educação-UNG Especialista em: Metodologia do Ensino Superior Metodologia do Ensino de Filosofia e Sociologia Gestão Educacional Gestão e Educação Ambiental Educação Especial: Atendimento às Necessidades Especiais Educação Especial: Com Ênfase na Deficiência Múltipla Educação do Campo Gênero e Diversidade Escolar Professor Titular/Universidade Paranaense - UNIPAR

Bruno Martins Neves Accdrolli

Acadêmico do curso de Direito da Universidade Paranaense - UNIPAR

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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