Desde a sua criação, a Justiça eleitoral objetiva coibir ilícitos na seara eleitoral, na verdade, desde a época do Império, buscava se evitar as fraudes eleitorais.
Por conta do princípio da especialidade e unicidade, os crimes eleitorais tem legislação própria. Tais dispositivos se justificam visto que a cada eleição novos ilícitos são praticados.
Como qualquer crime em nosso ordenamento jurídico, os crimes eleitorais tem previsão no artigo 5º XXXIX da Constituição Federal, onde se diz ¨Não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal¨.
Com a internet cada dia mais presente na propaganda eleitoral novos crimes são praticados, daí a necessidade da constante mutação nos tipos penais, além daqueles já existentes e outros que remontam a época do Império.
Os códigos anteriores dispunham sobre a legislação penal:
Código eleitoral de 1932: arts 107 a 109
Código eleitoral de 1935: arts 183 a 184
Lei Agamenon Magalhães (19455): art 123
Código eleitoral 1950: art. 175.
Uma sistematização mais uniforme seria de grande valia, porém para tanto é necessário uma reforma eleitoral abrangente e eficaz que dificilmente acontecerá uma vez que tal reforma colide com interesses dos partidos políticos.
Ainda assim tais ilícitos devem e são coibidos no âmbito eleitoral a fim de que os princípios da lisura nas eleições e a alternância prevaleçam e a democracia reste cada vez mais fortalecida.
A Constituição Federal de 1984 organizou a Justiça Eleitoral em sua instância: Tribunal Superior Eleitoral, Tribunal Regional Eleitoral, Juízes e Juntas Eleitorais.
Sabe-se da especificidade da Justiça Eleitoral, que exerce funções consultivas, administrativas e normativas e que, ao exercer seu poder de polícia alcança em regra todos os crimes eleitorais, havendo poucas exceções como veremos.
Os crimes podem ser comuns e de responsabilidade. O crime eleitoral é um crime comum segunda a maioria da doutrina.
O crime eleitoral é uma espécie de crime comum. O código eleitoral dispôs sobre a competência dos crimes eleitorais: Cabe ao Juiz eleitoral julgar os crimes eleitorais e o comuns que lhe forem conexos em regra.
A justiça eleitoral atrai a competência porém tem-se duas exceções:
Caso o crime eleitoral seja praticado por um menor de idade a competência será do ECA.
Se houver conexão de um crime eleitoral conexo com crime doloso contra a vida quem julga é o Tribunal do Júri. São casos de desmembramento do processo.
É possível classificar os crimes eleitorais em relação ao modo do cometimento, assim como o momento do processo eleitoral em que ocorrem.
Com relação a fonte normativa o critério é outro: temos crimes codificados e crimes eleitorais esparsos.
Para Suzana de Camargo os crimes eleitorais são classificados em:
Crimes concernentes à formação do corpo eleitoral.
Crimes concernentes à formação e funcionamento dos partidos políticos.
Crimes relativos à inelegibilidade.
Crimes relativos à propaganda eleitoral.
Crimes relativos à votação.
Crimes relativos à garantia do resultado legítimo.
Crimes concernentes à organização e funcionamento dos serviços eleitorais.
Crimes relativos à fé pública eleitoral.
Todos os crimes eleitorais são dolosos, não abarcando a figura culposa, em regra exigem o ¨dolo específico¨, a finalidade de interferis ou influenciar, de algum modo, nas campanhas e no resultado. Essa intenção é que permite distinguir entre um crime eleitoral e um crime comum, especialmente os crimes eleitorais impróprios ou inespecíficos. É o que ocorre por exemplo, nos crimes de calúnia, injúria, e difamação, previsto tanto no Código Eleitoral, quando no Código Penal. (GONÇALVES, 2016).
O artigo 289 do Código Eleitoral, trata da inscrição fraudulenta do eleitor, A inscrição é obrigatória para os brasileiros alfabetizados maiores de 18 anos e menores que 70 anos. Trata-se de crime doloso, material, de mão própria, comissivo, de maior potencial ofensivo e cuja pena é de reclusão até 5 anos e pagamento de 5 a 15 dias-multa.
Ainda que as penas do crimes tipificados no artigo 289 e 350 sejam idênticas e que o artigo 289 trate de inscrição e transferência da mesma forma não há que se falar em princípio da consunção.
¨A realização de inscrição fraudulenta como eleitor, por meio de documentos falsos, é vedada pelo tribunal penal incerto no artigo 289 do Código Eleitoral, não havendo ainda que se falar em consunção pelo crime de uso de documento falso, eis que os delitos ofendem bens juridicamente distintos¨. (TER/PR- POOC. 9.943 Rel. Andrea Saboga de melo, DJ 31.8.2012).
Ressalta-se aqui que a hipótese prevista no artigo 350 do Código Eleitoral, qual seja, inserção de declaração falsa em documento público ou particular, enquadra-se na categoria ¨crime-meio, ¨ pela qual se objetiva alcançar um resultado, também ilícito, e, portanto, tipificando como crime, que no caso dos autos, revela-se pela conduta prevista no artigo 289, ou seja inscrição fraudulenta.
Embora haja um conflito aparente de normas entre este tipo penal e o crime de falsidade ideológica no artigo 350 do Código Eleitoral pois o agente faz inserir no documento público informação falsa, soluciona-se a questão com a utilização da especialidade, neste caso o presente tipo, por ser mais especifico, destinado a fase especifica do processo eleitoral que é o alistamento eleitoral prevista no artigo 289 se sobrepõe ao tipo do 350 do Código Eleitoral.
O ato de inscrição engloba tanto a inscrição em sentido estrito, como a transferência, na qual o eleitor já inscrito intenta a mudança do domicilio eleitoral.
O artigo 299, trata da corrupção eleitoral, ou seja, a mercantilização do voto, que traz sérios prejuízos ao processo democrático, bastante para a configuração da conduta apenas um dos verbos que compõe o tipo penal. Sabe-se que qualquer pessoa pode ser sujeito ativo da modalidade da corrupção ativa, já o sujeito passivo é o eleitor apto a votar. O objeto material do delito e dinheiro, ou qualquer outra vantagem.
O artigo 302 do Código Eleitoral trata da concentração ilegal de eleitores e diz que o dolo é especifico e consiste na consciência e vontade de impedir, embaraçar ou fraudar o exercício do voto. Não havendo finalidade eleitoral o fato é atípico.
O artigo 309 do Código Eleitoral, trata do crime ¨votar mais de uma vez, cuja pena é de reclusa ode 1 a 3 anos, aqui a objetividade jurídica é a lisura no processo eleitoral e a legitimidade das eleições diferentemente do artigo 311 do código eleitor que projete organização da justiça eleitoral e regularidade da votação, não há que se falar em conexão visto que os tipos penais protegem bens distintos de forma intrínseca, protegendo de forma geral a igualdade nas eleições.
O artigo 312 do Código Eleitoral, trata da tentativa ou da violação do sigilo do a pena é de detenção de quinze dias voto, ressalto que com a adoção do sistema eletrônico de votação reduziram-se drasticamente as violações ao sigilo do voto. Em se consumando, a pena é detenção de quinze dias.
O artigo 317 do Código Penal, trata da violação do sigilo da urna ou dos invólucros e nesse artigo o legislador equiparou os efeitos da tentativa ao crime consumado, por óbvio que a configuração do delito pressupõe que o eleitor inicie o procedimento do voto.
O artigo 324, trata da calúnia eleitoral, imputação falsa de fato definido como crime, como se sabe a ação pública incondicionada ainda que se trate de crime contra a honra que, na legislação penal é comum e de ação privada.
Trata-se de opção do legislador tendo em consideração a necessidade dos padrões mínimos de respeito na propaganda eleitoral.
Destaca-se que a calúnia eleitoral se distingue da calúnia tipificada no código penal na necessidade de que o ato seja praticado durante a propaganda eleitoral e ainda, por se tratar de crime que se apura mediante ação penal pública incondicionada, a retração do autor da calunia não o isenta de pena. (GONÇALVES,2016).
O artigo 325 do Código Eleitoral, trata da difamação eleitoral e a trata como sendo a imputação de fato ofensivo à reputação. Necessário nesse crime é que o fato seja especifico, não bastando a mera atribuição de qualidade negativa, hipótese em que se caracteriza a injúria.
O artigo 326 do Código Eleitoral, trata da injúria que consiste na ofensa a dignidade ou decoro à pessoa violando primordialmente o sentimento de decoro, a auto estima, a consideração própria do ofendido.
O artigo 347 do Código Eleitoral, trata da desobediência e da resistência eleitoral, aqui também a conduta difere da conduta do código penal (artigo 330 cp). Enquanto aqui a norma limita a incriminar a conduta de desobedecer à ordem legal de funcionário público, a desobediência eleitoral é mais ampla, pois são tipificadas as condutas de recusar a ordem e ou opor embaraços à sua execução.
Ressalta-se aqui, que a jurisprudência eleitoral é pacifica no que se refere ao comportamento do agente, pois uma vez que tal comportamento não for orientado para produzir algum efeito eleitoral, ainda que indireto, sequer se reconhecerá a competência da Justiça Eleitoral.
Dessa forma o objetivo ao coibir os crimes eleitorais é proteger a lei, o livre exercício do voto, a lisura nas eleições.
O crime de corrupção eleitoral é um crime formal de ação múltipla e para sua caracterização, basta a promessa de vantagem, e essa não precisa ser aceita, para sua consumação independe do resultado das eleições entretanto, para que haja o crime é necessário que a solicitação ou recebimento da dádiva se vincule a promessa de voto.
O artigo 299 do Código Eleitoral criminaliza a corrupção eleitoral, ou seja, a grosso modo, a mercantilização do voto que traz sérios prejuízos, essa condita com algumas poucas modificações configura também o ilícito do 41- A da Lei 9.504/97.
O artigo 344 do Código Eleitoral, objetiva resguardar a lei, os serviços e o andamento dos processos próprios da Justiça eleitoral. Tal crime, hoje, não é tão comum visto que hoje o quadro de funcionários da Justiça Eleitoral aumentou consideralvemente,assim como a consciência cívica do cidadão e ainda com o advento da urna eletrônica. Crime comissivo, unissubsistente e formal que se consuma com a recusa ou o ato de abandonar.
No tipo penal, as sanções cabíveis são a pena privativa de liberdade e a multa de natureza criminal, no ilícito civil cabem a cassação do registro ou do diploma e a multa civil. Em regra dada a independência da esfera civil e penal o julgamento da ação penal não interfere no desfecho da ação civil e vice-versa.
O artigo 347 do Código Eleitoral está tipificado como um crime comum, omissivo de menor potencial ofensivo, de mera conduta, é também crime unissubjetivo, visto que é individual, protege-se os serviços e andamento dos processos próprios dos órgãos o da Justiça Eleitoral.
Trata-se de crime formal ou de mera conduta que que se concretiza com a simples atividade o comportamento do agente independente dos efeitos ou consequências de ordem naturalística no mundo exterior, isto é, externos à própria ação.
O artigo 350 do Código Eleitoral objetiva proteger a fé pública eleitoral e a autenticidade dos documentos públicos, particulares que tem relevância para as atividades da justiça eleitoral.
Os crimes de propaganda podem ser praticados por qualquer pessoa, ainda que sem vinculações partidárias. Alcança quem divulgar a propaganda produzida por terceiros. São crimes dolosos e materiais, mas não exigem o convencimento do eleitor ou a obtenção do voto, cuja sanção é detenção (ou prestação de serviços à comunidade) pelo período de seis meses a um ano.Não há que se falar em insignificância na seara eleitoral.
O princípio da insignificância deve ser entendido como uma forma por meio da qual será afastada a ocorrência do crime, uma vez que não será observada tão-somente a subsunção de conduta à descrição legal do crime(GONÇALVES,6).
Ressalta-se que as violações as normas de direito eleitoral por si só implicam algo grave, visto que tutelam o sistema democrático, são normas que condensam questões de alto grau de interesse público, de aplicação cogente e que estão intrinsecamente ligadas a normas fundamentais à conformação do estado Democrático de Direito(CÂNDIDO,39).
Bibliografia:
CÂNDIDO, Joel J. Direito Eleitoral Brasileiro. São Paulo edipro, 2016
GONÇALVES, Luiz Carlos dos Santos, Crimes eleitorais e Processo Penal Eleitoral, São Paulo, 2016.
MEDEIROS, Marcilio Nunes, Legislação Eleitoral. Juspodivim 2016