O PREPARO E O PRINCÍPIO DA NÃO SURPRESA

13/04/2018 às 14:54
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O ARTIGO DISCUTE OS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E DA NÃO SURPRESA NO CPC DE 2015 E CASO CONCRETO JULGADO PELO STJ EM MATÉRIA DE PREPARO PARA RECURSO.

O PREPARO E O PRINCÍPIO DA NÃO SURPRESA

Rogério Tadeu Romano

I - OS ARTIGOS 9º E 10º DO CPC DE 2015 E A DEMOCRACIA NO PROCESSO 

Os artigos 9º e 10 do CPC de 2015 introduziram no processo civil brasileiro o princípio da não surpresa.

“O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício.”

Adota-se no CPC de 2015 a democracia como base e fundamento do processo.

Não há democracia no processo se o Estado surpreende as partes, agindo de forma sorrateira e inadvertida. Não há cooperação assim.

Tal princípio está atrelado ao do contraditório, principio constitucional previsto no artigo5º, incisos LIV e ainda LV da Constituição Federal. Ademais, não se pode perder de vista a menção para o princípio da segurança jurídica, fundamental ao processo.

Os processualistas, aliás, informam que o direito de defesa deriva da garantia do contraditório e da garantia da defesa decorre o contraditório, de sorte que não se pode imaginar a existência de um sem o outro, como ensinou Fernando da Costa Tourinho(Processo penal, volume II, pág. 456).

Carnelutti(Direito e processo) entendia que o princípio do contraditório seria a própria igualdade entre as partes. A igualdade de oportunidades de participação no processo diz respeito diretamente ao contraditório. Por sua vez, Gimeno Sendra opinouque o princípio do contraditório deve complementado pelo princípio da igualdade das partes no processo, como se lê in Fundamentos del derecho procesal, pág. 183.

O contraditório traduz-se no binômio informação-reação, sendo relevante a informação de que a primeira é sempre necessária, sob pena de provocar nulidade dos atos e termos do processo e tornar ilegítimo o provimento final e a segunda apenas possível, como afirmou Candido Rangel Dinamarco(Princípios e garantia no processo). 

Cássio Scarpinella Bueno(Manual de Direito Processual Civil, São Paulo; Saraiva, 2015, p. 89) versa que "O art. 10, aplicando (e desenvolvendo) o que se pode extrair do art. 9º, quer evitar o proferimento das chamadas ‘decisões-surpresa’, isto é, aquelas decisões proferidas pelo magistrado sem que tenha permitido previamente às partes a oportunidade de influenciar sua decisão e, mais do que isso, sem permitir a elas que tivessem conhecimento de que decisão como aquela poderia vir a ser proferida."

O princípio da não surpresa é calcado, do mesmo modo, no princípio ou garantia de influência sobre as decisões do magistrado ou de sua possibilidade de participação preventiva sobre o diálogo processual surgiu na Alemanha (Einwirkungs-möglichkeit)em 1976 no inciso III do art. 278 do ZPO.

Posteriormente, na Itália em seu art. 183 do Código de Processo Civil, conferia-se ao juiz o poder-dever de indicar às partes as questões examináveis de ofício das quais entende oportuno tratar. Os mesmos parâmetros foram sedimentados nas legislações do Velho Continente, como França, Portugal e Áustria.

 Nos termos mencionados por Nelson Nery Júnior(Código de Processo Civil Comentado. Ed. RT. 2015. Pag. 213) a proibição de haver a decisão surpresa no processo, decorrência da garantia instituída pelo princípio constitucional do contraditório, enseja ao juiz o poder-dever de ouvir as partes sobre todos os pontos do processo, incluídos os que possivelmente poderão ser decididos por ele seja a requerimento da parte ou do interessado ex officio.

Ainda aplicando o CPC de 2015 o STJ entendeu:

Considerando as peculiaridades da hipótese, deveria ter sido, ao menos, dada oportunidade às partes para juntarem os documentos pertinentes, antes de se concluir pelo não conhecimento da apelação. 9. Recurso especial provido. (REsp 1.178.562/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, DJe 23/09/2013, sem grifos no original).

II - A PARTICIPAÇÃO E O PRINCÍPIO DA NÃO SURPRESA PROCESSUAL 

O CPC de 2015 está permeado por esse princípio a impor conduta democrática entre o juiz e as partes.

 O art. 357 do CPC – que trata do saneamento e da organização do processo – está perfeitamente alinhado com o referido princípio, ao obrigar o Juiz a definir – antes  da sentença – quais as questões de fato e de direito relevantes para a decisão de mérito. Decisão de mérito essa que hoje deve ser prestigiada (princípio da primazia do julgamento do mérito – arts. 4º e 6º, do CPC).

As questões de fato devem ser definidas antes para que as partes possam sobre elas produzir as suas provas. As questões de direito – que em regra não precisam ser objeto de prova (art. 376 do CPC) – precisam ser definidas com antecedência para que possa haver debate (contraditório) sobre elas.

No dia 1º de Agosto corrente foi publicado o Acórdão unânime da 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que acabou por limitar a conformação do princípio da vedação das decisões-surpresa, conforme se extraí de trecho da ementa do julgado:

"O 'fundamento' ao qual se refere o art. 10 do CPC/2015 é o fundamento jurídico- circunstância de fato qualificada pelo direito, em que se baseia a pretensão ou a defesa, ou que possa ter influência no julgamento, mesmo que superveniente ao ajuizamento da ação - não se confundindo com o fundamento legal (dispositivo de lei regente da matéria). A aplicação do princípio da não surpresa não impõe, portanto, ao julgador que informe previamente às partes quais os dispositivos legais passíveis de aplicação para o exame da causa. O conhecimento geral da lei é presunção jure et de jure"(Embargos de Declaração no RESP nº 1.280.825-RJ).

 o Superior Tribunal de Justiça entrelaçou o princípio em análise à boa fé objetiva, mesmo, no atual sistema processual civil, confira-se:

PROCESSUAL CIVIL. TEMPESTIVIDADE DA APELAÇÃO. SUSPENSÃO DO PROCESSO. HOMOLOGAÇÃO ANTES DE SER PUBLICADA A DECISÃO RECORRIDA.IMPOSSIBILIDADE DA PRÁTICA DE ATO ENQUANTO PARALISADA A MARCHA PROCESSUAL. HIPÓTESE QUE NÃO SE CONFUNDE COM A ALEGADA MODIFICAÇÃO DE PRAZO PEREMPTÓRIO. BOA-FÉ DO JURISDICIONADO. SEGURANÇA JURÍDICA E DEVIDO PROCESSO LEGAL. NEMO POTEST VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM.1. O objeto do presente recurso é o juízo negativo de admissibilidade da Apelação proferido pelo Tribunal de Justiça, que admitiu o início da contagem de prazo recursal de decisão publicada enquanto o processo se encontra suspenso, por expressa homologação do juízo de 1° grau.2. Cuida-se, na origem, de Ação Declaratória ajuizada pela recorrente contra o Município de Porto Alegre, tendo como objetivo a declaração de nulidade de processo administrativo que culminou na aplicação de penalidades pela instalação irregular de duas Estações Rádio Base (ERBs) naquela municipalidade.3. O Tribunal a quo não conheceu da Apelação da ora recorrente, porquanto concluiu que se trata de recurso intempestivo, sob o fundamento de que a suspensão do processo teria provocado indevida modificação de prazo recursal peremptório.4. Com base nos fatos delineados no acórdão recorrido, tem-se que: a) após a interposição dos Embargos de Declaração contra a sentença de mérito, as partes convencionaram a suspensão do processo pelo prazo de 90 (noventa) dias; b) o juízo de 1° grau homologou a convenção em 12.9.2007 (fl. 343, e-STJ); c) posteriormente, em 2.10.2007, foi publicada a sentença dos aclaratórios; d) a Apelação foi interposta em 7.1.2008.5. Antes mesmo de publicada a sentença contra a qual foi interposta a Apelação, o juízo de 1° grau já havia homologado requerimento de suspensão do processo pelo prazo de 90 (noventa) dias, situação em que se encontrava o feito naquele momento, conforme autorizado pelo art. 265, II, § 3°, do CPC.6. Não se trata, portanto, de indevida alteração de prazo peremptório (art. 182 do CPC). A convenção não teve como objeto o prazo para a interposição da Apelação, tampouco este já se encontrava em curso quando requerida e homologada a suspensão do processo.7. Nessa situação, o art. 266 do CPC veda a prática de qualquer ato processual, com a ressalva dos urgentes a fim de evitar dano irreparável. A lei processual não permite, desse modo, que seja publicada decisão durante a suspensão do feito, não se podendo cogitar, por conseguinte, do início da contagem do prazo recursal enquanto paralisada a marca do processo.8. É imperiosa a proteção da boa-fé objetiva das partes da relação jurídico-processual, em atenção aos princípios da segurança jurídica, do devido processo legal e seus corolários -  princípios da confiança e da não surpresa - valores muito caros ao nosso ordenamento jurídico.9. Ao homologar a convenção pela suspensão do processo, o Poder Judiciário criou nos jurisdicionados a legítima expectativa de que o processo só voltaria a tramitar após o termo final do prazo convencionado. Por óbvio, não se pode admitir que, logo em seguida, seja praticado ato processual de ofício - publicação de decisão - e, ademais, considerá-lo como termo inicial do prazo recursal.10. Está caracterizada a prática de atos contraditórios justamente pelo sujeito da relação processual responsável por conduzir o procedimento com vistas à concretização do princípio do devido processo legal. Assim agindo, o Poder Judiciário feriu a máxima nemo potest venire contra factum proprium, reconhecidamente aplicável no âmbito processual. Precedentes do STJ.11. Recurso Especial provido.(REsp 1306463/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/09/2012, DJe 11/09/2012)

Dierle Nunes (Curso de direito processual civil: fundamentação e aplicação. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 83) aduz sobre a garantia de não surpresa propiciada pelo princípio do contraditório, a qual “impõe ao juiz o dever de provocar o debate acerca de todas as questões, inclusive as de conhecimento oficioso, impedindo que em “solitária onipotência” aplique normas ou embase a decisão sobre fatos completamente estranhos à dialética defensiva de uma ou de ambas as partes.”

Dessa forma, a não surpresa traduz-se em possibilitar às partes o debate prévio de quaisquer questões processuais que vierem à tona no processo, dando-lhes a oportunidade de argumentar, arguir elementos comprobatórios ou refutá-los, visto que é defeso ao juiz motivar suas decisões com base em argumentos não suscitados pelas partes.

Como disse Laíse Nunes Mariz Leça(O princípio do contraditório como garantia de inluência  e não surpresa no Projeto do novo Código de processo civil,), a garantia de não surpresa encontra guarida no artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal e no artigo 131 do Código de Processo Civil, que preconizam a necessidade de fundamentação das decisões judiciais, literis:

Art. 93. (...)

IX - todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação.

Art. 131. O juiz apreciará livremente a prova, atendendo aos fatos e circunstâncias constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes; mas deverá indicar, na sentença, os motivos que lhe formaram o convencimento.”

Essa garantia se aplica até mesmo às decisões tomadas de ofício pelo magistrado, já que, enquanto aumenta-se o poder do julgador, “impõe-se a este o dever de informar às partes as iniciativas que pretende exercer, de modo a permitir a elas um espaço de discussão em contraditório, devendo haver a expansão e a institucionalização do dever de esclarecimento judicial” (NUNES, 2011, p. 82).

Lebre de Freitas ( Introdução ao processo civil: conceito e princípios gerais à luz do código revisto. Coimbra: Coimbra Editora, 1996) nos ensina que

“a proibição da chamada decisão-surpresa tem sobretudo interesse para as questões, de direito material ou de direito processual, de que o tribunal pode conhecer oficiosamente: se nenhuma das partes as tiver suscitado, com concessão à parte contrária do direito de resposta, o juiz – ou o relator do tribunal de recurso – que nelas entenda dever basear a decisão, seja mediante o conhecimento do mérito seja no plano meramente processual, deve previamente convidar ambas as partes a sobre elas tomarem posição, só estando dispensado de o fazer em casos de manifesta desnecessidade.” 

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Sobre o assunto, Fredie Didier Junior (Curso de Direito Processual Civil: Teoria Geral do Processo e Processo de Conhecimento. Salvador: JusPodivm, 2008,p. 78) o correlaciona com o princípio da cooperação entre o Poder Judiciário e partes, o qual impõe ao órgão jurisdicional o dever de esclarecer, o de  consultar e o de prevenir.

O dever de esclarecimento impõe que quaisquer dúvidas do magistrado sobre argumentos, provas e pedidos trazidos pelas partes devem ser por elas esclarecidas (DIDIER JÚNIOR, 2008, p. 78).

O segundo dever relaciona-se com a obrigação do juiz de “consultar as partes sobre esta questão não  alvitrada no processo, e por isso não posta em contraditório, antes de decidir” (DIDIER JÚNIOR, 2008, p. 78).

E o dever de prevenir obriga o magistrado a “apontar as deficiências das postulações das partes, para que possam ser supridas” (DIDIER JÚNIOR, 2008, p. 79).

Zaneti Júnior (Processo constitucional: o modelo  constitucional do processo civil brasileiro. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2007) considera:

“correta a lição que afirma ser o  direito de participação e influência no processo um limite ao poder do juiz e, como seu fenômeno correlato, a existência de um dever de debate por parte deste juiz, mesmo nos casos em que seja possível e recomendável a sua atuação de ofício”.

Dierle Nunes(obra citada) também explica que a adoção do contraditório dinâmico não atrapalha a busca pela eficiência e, ao contrário, a fortalece. Concordamos com esse posicionamento, uma vez que o contraditório pleno possibilita ao magistrado julgar com excelência, já que possuirá todos os elementos cognitivos bem delineados, diminuindo a possibilidade de arguição de nulidades ou interposição de recursos.

O autor aduz que, com o contraditório dinâmico, “diminui-se o tempo do processo, eis que se diminuem os recursos, ou se reduz consideravelmente a chance de seu acatamento, viabilizando-se a utilização de decisões com executividade imediata” (NUNES, 2011, p. 84).

Ademais, destacamos que deve ser declarada a nulidade da decisão de surpresa, uma vez que vai de encontro ao princípio do contraditório.

No âmbito doutrinário, merece referência a seguinte passagem de obra coordenada por Teresa Arruda Alvim Wambier e outros: 

“O dispositivo em exame também trata do princípio do contraditório, destacando um de seus pilares: a vedação das decisões surpresa. Como examinado no item 15, supra, um dos aspectos mais sensíveis do contraditório é aquele que assegura às partes o direito de manifestação sobre todas as questões de fato e/ou de direito postas no processo, incluídas aquelas apreciáveis de ofício pelo juiz. É inerente ao contraditório o direito de as partes influenciarem nas decisões judiciais, as quais deverão enfrentar todos os fundamentos apresentados pelas partes.

 A inovação do dispositivo em exame se põe justamente na obrigação de oportunizar às partes que se manifestem previamente à decisão judicial, seja para aquelas questões conhecíveis de ofício, seja para aqueles fundamentos extraídos das provas constantes dos autos e que as partes não debateram.

E a intervenção das partes não se restringe a uma simples manifestação, engloba, também, a de requerer e produzir provas dentro de um tempo compatível com o exercício pleno deste direito, sem o qual não existirá o pleno exercício do contraditório estabelecido no art. 5.º, LV, da CF, que deverá ser observado pelo magistrado, também por força do art. 1.º, do novo Código de Processo Civil (item 2,supra).

Este entendimento é derivado dos cânones do Estado Democrático de Direito, que deve propiciar a maior e mais ampla participação dos jurisdicionados nas esferas decisórias da administração pública, da qual o Judiciário não se exclui. Ressalte-se, por fim, que a consequência da inobservância da norma encampada neste dispositivo é a nulidade da decisão surpresa, também denominada “decisão de terceira via”, mesmo que não cominada expressamente. E a penalidade justifica-se pelo simples fato de que ela contraria norma fundamental do novo Código de Processo Civil e da própria Constituição Federal. (CARNEIRO, Paulo C. P. Decisão surpresa. in: Breves comentários ao novo código de processo civil. [livro eletrônico]. 3ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, comentários ao art. 10 do CPC/2015).”

A razoabilidade deve ser aliada do Poder Judiciário nessa tarefa, de forma que se alcance efetiva distribuição de Justiça. Não se deve, portanto, impor surpresas processuais , pois estas só prejudicam a parte que tem razão no mérito da disputa" (Resp 963.977/RS).

III - O PREPARO PARA O RECURSO  E A NÃO SURPRESA PROCESSUAL 

Recentemente esse princípio da não surpresa processual foi objeto de discussão pelo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.725.225, em que foi relator o ministro Paulo de Tarso Sanseverino.

Tratava-se de caso de deserção por falta de preparo, requisito extrínseco do recurso.

Segundo o site do STJ, edição de 13 de abril de 2018, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reformou decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que havia considerado deserta uma apelação porque a complementação do preparo (recolhimento das despesas relativas ao processamento do recurso) foi feita sem correção monetária. No entendimento do colegiado, o fato de não ter havido menção à necessidade de atualização monetária no despacho que determinou a complementação da taxa judiciária configurou surpresa processual.

Para o relator do recurso no STJ, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, o princípio da não surpresa, contemplado no artigo 10 do Código de Processo Civil de 2015, justifica a reforma da decisão do TJSP para afastar a deserção e conceder à parte nova oportunidade de complementação do preparo, ainda que o caso tenha ocorrido sob o CPC de 1973.

“Embora o artigo 10 do CPC/2015 não tenha correspondente no CPC/1973, o princípio da não surpresa era possível de ser extraído daquele ordenamento processual, embora não com tamanha magnitude”, explicou o ministro, citando precedente da corte.

O ministro ressaltou que a boa-fé processual recomenda mencionar expressamente no despacho a necessidade, se houver, de atualização monetária do valor a ser complementado, a fim de respeitar o princípio da não surpresa. “Não tendo havido essa cautela no tribunal de origem, descabe aplicar a deserção, que configura verdadeira surpresa processual, na medida em que se decide a controvérsia acerca da complementação do preparo com base em critério não revelado anteriormente à parte prejudicada pela decisão”, disse.

Em 2010, ao entrar com a apelação, uma das partes do processo recolheu valor inferior ao total do preparo devido. Em 2013, o relator no TJSP emitiu despacho determinando a complementação da taxa judiciária, sob pena de deserção, mas nada disse sobre a necessidade de atualização monetária. A diferença foi saldada pela parte, sem correção.

O tribunal julgou deserta a apelação, nos termos do artigo 511, parágrafo 2º, do CPC/1973, por entender que a complementação foi insuficiente, já que não havia sido incluída a atualização monetária do período, e uma segunda oportunidade de complementação não seria viável.

Atrelados aos princípios da confiança, contraditório substancial e segurança jurídica tão caros ao sistema de garantias do direito processual/constitucional pátrio, salvo nas hipóteses, dentre outras, mencionadas no presente texto, é vedado ao magistrado prolatar decisões surpresa (leia-se em seu sentido lato sensu) tudo como corolário a colaboração e diálogo processual 

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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