Tutela jurídica dos direitos dos animais: Efetividade das normas júridicas à vedação aos maus-tratos

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RESUMO:O presente trabalho aborda os maus-tratos, proteção animal e direitos dos animais. O tema tem sido bastante discutido, visto que os direitos dos animais vêm sendo violados há séculos, como consequência da insistência do homem em prosseguir com a prática de maus-tratos contra animais. Este tema se revela de grande importância, pois os animais são passíveis de direitos, tendo em vista que são seres vivos e têm sensações físicas e emocionais parecidas às humanas. Para tanto, serão abordadas normas nacionais e internacionais de maior relevo, as quais regulam as condutas de maus-tratos e estabelecem as punições aos infratores. Neste contexto, busca-se discutir se as penalidades impostas são adequadas. O estudo em questão traz uma análise da tutela penal do direito ambiental para, após situado o ramo jurídico em que se insere a proteção dos animais, bem como seu histórico, abordar a proteção, a fiscalização e a efetividade de seus recursos jurídicos. Observando se o ordenamento jurídico brasileiro tem efetividade na vedação aos maus-tratos aos animais. Esses e outros questionamentos são abordados ao longo do trabalho, demonstrando o longo caminho que ainda há de se percorrer em prol da efetividade do direito dos animais. 

Palavras-Chave: Direitos dos Animais; Maus-Tratos; Legislação.

ABSTRACT:This paper addresses maltreatment, animal protection and animal rights. The issue has been much discussed, since animal rights have been violated for centuries, as a consequence of man's insistence on continuing to abuse animals. This theme is of great importance because animals are entitled to rights, since they are living beings and have physical and emotional sensations similar to human. To this end, national and international standards of greater importance will be addressed, which regulate maltreatment and punish offenders. In this context, it is sought to discuss whether the penalties imposed are adequate. The study in question provides an analysis of the criminal protection of environmental law to address the protection, supervision and effectiveness of its legal resources, after establishing the legal branch in which the protection of animals, as well as its history, take place. Observing whether the Brazilian legal system is effective in preventing animal abuse. These and other questions are addressed throughout the work, demonstrating the long path still to be taken in favor of the effectiveness of animal rights.

Key Words: Animal Rights; Mistreating; Legislation.

SUMÁRIO: 1. Introdução – 2. Direito dos animais: 2.1 Declaração universal dos direitos dos animais; 2.2 Evolução Histórica das normas infraconstitucionais de proteção ao direito dos animais no ordenamento jurídico brasileiro; 2.3 Direito dos animais na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 3. Maus-tratos, Fiscalização e penalidades: 3.1 Maus-tratos; 3.2 Fiscalização; 3.3 Penalidades. 4. Considerações finais. 5. Referências.


INTRODUÇÃO

O animal sempre foi visto como um instrumento ou objeto ao qual o homem encontrava meios de usufruir, desde a primitiva caça para subsistência, à domesticação de algumas espécies tanto para proteção como para próprio aperfeiçoamento da caçada, posteriormente moldando nesse contexto o uso do animal como objeto de uso contínuo, para roupas, alimentos, trabalhos laborais e conseguinte recurso financeiros como moeda de valor.

Na relação do ser humano com os animais, observa-se que com o avanço da história surge uma moderação no pensamento coletivo da necessidade do uso do animal somente para servir aos homens, tornando-se importante a mudança de compreensão e atitudes com relação a esses seres vivos, através da conscientização de que os animais possuem alma, sentimento e estímulos físicos como frio, calor e fome. Em meio a tantos debates com relação a vida pregressa e atual dos animais o que se discute, é se estes seres têm, ou não, amparo legal de modo a garantir de modo satisfatório os seus direitos, mesmo sendo animais irracionais, porém, com sensações tão semelhantes a dos humanos, protegidos pela legislação.

O conceito de dignidade humana engloba além da vida humana, estendendo-se aos animais, como direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Protegendo os animais principalmente no que diz respeito à temática dos maus-tratos como forma de resguardar não apenas o meio ambiente, sendo a vida humana mantida diretamente ligada à ele. Em relação a visão do direto ambiental, o direito dos animais surge como uma nova temática a ser estudada, a preocupação com o meio ambiente demonstrada pela Constituição Federal, lhes conferiu natureza difusa e coletiva, um bem a ser protegido no interesse de toda a humanidade.

Com a estruturação desse pensamento aos poucos construído, caminha-se no campo jurídico em uma visão de positivar esse entendimento, garantindo de forma legal a proteção e o cuidado para com a vida animal, bem como, com o reconhecimento destes como seres sencientes. Essa vertente pode ser observada com a criação da Declaração Internacional dos Direitos dos Animais de 1978 pela UNESCO, como também no ordenamento jurídico brasileiro que além da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, conta com Decretos e Leis que versam sobre o tema de proteção dos direitos dos animais. Outro exemplo é a Lei de Crimes Ambientais, Lei n.º 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, que tipifica como criminosa ao praticar abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, doméstico ou domesticado, nativo ou exótico, prevendo pena de detenção de três meses a um ano e multa.

Inobstante conter no ordenamento jurídico brasileiro normas de proteção e respeito ao meio ambiente e especificamente aos animais, a vedação de maus-tratos, se percebe que tais normas têm caráter mais educacional que punitivo, e tal posicionamento gera uma violação não rara desses direitos reconhecidos, uma vez que tem a sociedade em seu âmbito uma visão antropocêntrica que ainda vê o homem como o centro e o animal como um bem de uso a ser explorado.

Categoricamente, apesar de não poder dizer que os animais são titulares de direitos fundamentais devido à falta expressa de uma norma, vistos pela perspectiva centrada no ser humano, poderiam ser, portanto caracterizados de forma semelhante como sujeitos de direitos tutelados pela Constituição Federal. Ao fazer uma analogia de tais direitos inseridos na Constituição em relação à dignidade dos animais e do direito ao meio ambiente equilibrado, constituindo bens de valores jurídicos a serem protegidos pelo fato de serem seres vivos, percebe-se a necessidade legal do Estado em criminalizar a crueldade contra os animais.


DIREITOS DOS ANIMAIS

Em tese, diversos são os instrumentos normativos aos quais preconizam a proteção ao bem-estar animal, objetivando um direito básico deste. Nesse aspecto o ordenamento jurídico brasileiro tem um amplo conjunto de normas, destacando-se a Declaração Universal dos Direitos dos Animais (1978), a própria Constituição da República Federativa do Brasil (1988), bem como um aparato de Leis e Decretos nacionais que juntos constituem uma legislação que em regra garante uma proteção mínima aos animais.

Essa proteção legislativa gira entorno de resguardar os animais contra a crueldade, proibindo ou minimizando a exposição destes a procedimentos e atos cruéis e capazes de lhes proporcionem sofrimento, algumas cuidam de certos grupos e espécies de animais específicos, enquanto outras o fazem de modo mais amplo. Fato é, que todo animal, sendo ele silvestre, doméstico, domesticado ou exótico é tido sob a proteção jurídica.

Os animais silvestres são aqueles pertencentes às espécies nativas, migratórias e quaisquer outras, aquáticas ou terrestres, que tenham a sua vida ou parte dela ocorrendo naturalmente dentro dos limites do Território Brasileiro. Os exóticos são aqueles cuja distribuição geográfica não inclui o Território Brasileiro, as espécies ou subespécies introduzidas pelo homem, inclusive domésticas, em estado selvagem, também são consideradas exóticas, bem como as espécies que tenham sido introduzidas fora das fronteiras brasileiras e suas águas jurisdicionais e que tenham entrado espontaneamente em Território Brasileiro. Os animais domésticos são aqueles que através de processos tradicionais e sistematizados de manejo e melhoramento zootécnico tornaram-se domésticos, possuindo características biológicas e comportamentais em estreita dependência do homem, podendo inclusive apresentar aparência diferente da espécie silvestre que os originou. Definição essa segundo o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis.

2.1 Declaração Universal dos Direitos dos Animais

Trata-se de um documento de caráter normativo proclamado pela UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) em 27 de janeiro de 1978, Bruxelas – Bélgica, para fins de orientar as nações sobre a imperiosa necessidade de leis protetivas à fauna em sua ampla diversidade. Alertando que os países signatários como o Brasil, por exemplo, devem editar leis e princípios que concedam direito à vida animal afastada do sofrimento ou quaisquer tipos de maus-tratos e crueldade.

Aborda em seu preâmbulo que todo o animal possui direito, e que o desconhecimento e desprezo destes direitos têm levado o homem a cometer crimes contra os animais e a natureza, como também que o reconhecimento pela espécie humana do direito à existência das outras espécies animais constitui o fundamento da coexistência das outras espécies no mundo. Traz o biocídio (um crime contra a vida, com morte do animal sem necessidade), e o genocídio (morte de um grande número de animais selvagens, um crime contra a espécie) que são perpetrados pelo homem, e o receio de que ele continue a perpetrá-los. Bem como considerando que o respeito dos homens pelos animais está ligado ao respeito dos homens pelo seu semelhante e esse ensinamento deve ser tratado na Educação, que deve ensinar desde a infância a observar, a compreender, a respeitar e a amar os animais.

Garante em seu rol todo um aparato que visa de fato o bem-estar do animal não humano de modo amplo. Inicia-se o texto já com a ideia de que todo animal deve ser respeitado, e sendo o homem também espécie animal, deve velar pelos outros e não violar este direito. Incumbindo ao homem cuidar e proteger e veda a submissão do animal a práticas de maus-tratos e atos cruéis e que nos casos em que seja necessária a morte de um animal, que seja do modo instantâneo, que não lhe cause dor, tampouco angústia.

Traz especificamente aos animais selvagens seu direito de viver e reproduzir em seu ambiente próprio natural, seja ele aéreo, terrestre ou aquático. Quando se trata do meio ambiente do homem, onde o animal já se encontra tradicionalmente familiarizado, tem o animal o direito de crescer ao ritmo e condições de vida e de liberdade que lhe são próprias de sua espécie, ferindo esse direito qualquer modificação desse ritmo e destas condições com fins mercantis.

Afirma que é de responsabilidade do homem a plena duração de vida natural do animal que ele escolheu para ter como companheiro, é ato cruel e degradante o seu abandono, pois é dever do homem cuidar deste. E no caso de animal de trabalho, tem ele direito de uma duração e intensidade de jornada de trabalho razoável, com alimentação reparadora e repouso.

Declara em seus artigos a dignidade do animal, razão essa que assevera o respeito ao animal vivo e morto. Reconhece os animais como seres sencientes. Fortalecendo o posicionamento de sempre evitar o sofrimento, dor e exploração dos animais de modo desnecessário em vários campos, como experiências, trabalho físico, comercial e entretenimento, pois são práticas não compatíveis com a dignidade do animal. E dispõe que o direito dos animais deve ser defendido pela lei como os direitos dos homens, e que os organismos de proteção e de salvaguarda dos animais devem estar presentados a nível governamental.

Porém, apesar de ser uma conquista valiosa no que tange aos direitos dos animais com um rol destes direitos, infelizmente, não traz nenhuma segurança, garantia, sanção ou penalidade a quem praticar os atos classificados como maus-tratos ou crueldade aos animais.

2.2 Evolução Histórica das Normas Infraconstitucionais de Proteção ao Direito dos Animais no Ordenamento Jurídico Brasileiro

Vale salientar o então revogado Decreto n° 24.645, de 10 de julho de 1934, que tratava das Medidas de Proteção aos Animais, este aludia a Constituição Federal de 1988, pois colocava sob a tutela do Estado “todos os animais existentes no país” e atribuía ao Ministério Público a função de substituto legal dos mesmos, com capacidade, assim como os membros das Sociedades Protetoras dos Animais, de assisti-los em juízo. Ainda que não tenha havido reconhecimento do novo status quo como sujeitos de direito a despeito do disposto nos primeiros artigos do Decreto n° 24.645/34, a norma atribuía aos animais uma espécie de personificação, fazendo deles, sujeitos de direitos dos quais podem gozar e obter a tutela jurisdicional em caso de violação. (RODRIGUES. 2008, p. 66).

A interpretação do Decreto n° 24.645 de 1934, conduzia à conclusão de que o Ministério Público era qualificado como substituto processual, ao considera-lo possuir legitimidade para substituir as partes para as quais atua em nome próprio, na qualidade de autor ou réu, de pessoas físicas ou jurídicas a quem são atribuídas personalizações, o legislador, mediante o Decreto, não só conferia nova função relevantíssima ao Ministério Público, mas também reconhecia que os animais não são meramente coisas como se abstrai do Código Civil. (RODRIGUES. 2008, p.125).

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Com enfoco no artigo 3º do Decreto, enumeravam-se trinta e uma situações consideradas maus-tratos, e passiveis de penalidades previstas no artigo 2º. Dentre os incisos do artigo 3º dispunha situações como: abandonar ou deixar de prestar socorro ao animal; abater para o consumo ou fazê-los trabalhar em período adiantado de gestação; engordar aves mecanicamente, despelar ou depenar animais vivos ou entregá-los vivos a alimentação de outros; exercitar tiro ao alvo sobre patos ou qualquer animal selvagem ou sobre pombos; realizar ou promover lutas entre animais; touradas e simulacros mesmo que em lugar privado; arrojar aves e outros animais nas casas de espetáculos e exibi-los; transportar, negociar ou caçar, em qualquer época do ano, aves insetívoras, pássaros canoros, beija-flores, e outras aves de pequeno porte.

Muito embora nenhuma outra legislação vigente defina claramente o que considera maus-tratos, o que por si só demonstra o valor que pairava sobre o Decreto n° 24.645, havendo apenas a Lei 9.605, de 12/02/1998, conhecida como Lei dos Crimes Ambientais, vem a considerar, mas não definir, crimes os maus-tratos aos animais.

O Decreto-Lei n° 3.688, de 03 outubro de1941, Lei de Contravenções Penais, apesar do seu propósito não ser voltado exclusivamente à proteção dos direitos animais nem a uma vedação direta de maus-tratos, traz em seu artigo 64 especificamente que “tratar animal com crueldade ou submetê-lo a trabalho excessivo, acarreta em pena de prisão simples, de dez dias a um mês, ou multa.” Inicialmente dar-se a entender que proíbe a crueldade contra os animais, entretanto, nos demais dispositivos, apesar de ter foco aos atos cruéis com animais em local e exibição pública, mesmo que com fins didáticos ou de entretenimento, veem apenas a evitar que ocorram excessos a crueldade, porém não tipificando ou explicando o que se considera como definido excesso ou atos de crueldade, não sendo possível assim mensurar quando ocorre o ato cruel, possibilitando que isto ocorra sem punição.

O Decreto n° 5.197, de 03 de janeiro de 1967, que dispõe sobre a Proteção à Fauna, em seu primeiro artigo define toda a fauna silvestre, bem como a coloca sob manto do Estado, ao qual dita que quaisquer espécies, em qualquer fase de seu desenvolvimento e que viva naturalmente fora do cativeiro, assim como seus ninhos, abrigos e criadouros, são propriedade do Estado, proibindo a sua utilização, destruição, perseguição, caça ou apanha.

Porém, a mesma lei descreve situações em que tais atividades são permitidas, inclusive a caça amadora, reduzindo seu impacto efetivo. Apesar de proibir a caça “com visgos, atiradeiras, fundas, bodoques, veneno, incêndio ou armadilhas que maltratem a caça”, autoriza a sua prática, desde que com menor dor e dano ao animal, todavia, tais práticas de caça, podem os animais escapar com sequelas que lhe causem um longo período de dor e em outros casos à morte. Tal permissão nos dias atuais é ilógica e sem temperança e questionável dos pontos de vista moral e ético.

Disciplina a Lei n° 7.173, de 14 de dezembro de 1983, sobre os procedimentos a serem adotados para o funcionamento de estabelecimentos que mantenham animais silvestres vivos em cativeiro ou semiliberdade para a visitação pública, os zoológicos, conforme definidos no artigo 1° Lei. Vale salientar seu artigo 7º, que exige que sejam cumpridas determinadas condições de “habitabilidade, sanidade e segurança para cada espécie mantida”, de acordo com suas necessidades específicas para condição mínima de vida do espécime, “atendendo suas necessidades ecológicas”, supostamente tendo os animais como foco determinante das condições. Contudo, observando o restante do artigo que aborda “do manejo e do tratamento indispensáveis à proteção e conforto do público visitante”, verifica-se que o objetivo último de ser protegido e mantido confortavelmente não são os animais ali inseridos, e sim o ser humano.

O artigo 3°, bem como em certa medida o artigo 16°, faz menção ao que dispõe a Lei nº 5.197, de 03 janeiro de 1967, que narra que os animais da fauna nativa, ou indígena, são propriedade do Estado e não podem ser objeto de comercialização, contudo, abrindo-se uma exceção para os espécimes nascidos em cativeiro. Há uma certa incongruência, pois dá à entender que o animal não pode ser comercializado, sendo que sua estadia gera justamente um retorno econômico ao estabelecimento que o mantém, bem como perde o animal o direito a proteção ao nascer em cativeiro. E ainda é possível interpretar que não se estende a proteção aos animais advindos de fauna externa a nacional, o que é maioria nos zoológicos.

Em teor semelhante de exposição ao público, há o caso dos animais circenses. Encontra-se em discussão no Congresso Nacional o Projeto de Lei n° 7.291, de 05 de janeiro de 2006, do Senador Federal Álvaro Dias do PSDB/PR, que visa o fim do uso de animais em circos em todo o território brasileiro, para que os Estados e Municípios que ainda não instituíram normas neste sentido se utilizem desta para proibir que espetáculos com animais continuem ocorrendo nesses lugares.

Revogando o Decreto n° 221 de 1967 que regularizava a pesca e industrialização de cetáceos, a Lei n° 7.643, de 18 de dezembro de 1987, vem proibir sem exceção, a pesca ou mesmo o molestamento intencional de todas as espécies de cetáceos nas águas territoriais brasileiras, cominando pena de dois a cinco anos de reclusão e multa, com possibilidade de perda da embarcação em caso de reincidência. Consequentemente proporcionou trabalhos de pesquisa e organizações governamentais aos quais se dedicam ao desenvolvimento destes, e consequentemente o reaparecimento de várias espécies até então sob risco de extinção no litoral nacional.

A conhecida Lei dos Crimes Ambientais, a Lei n° 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, traz um conjunto de nove artigos referentes aos crimes contra a fauna. Tem como crimes inafiançáveis os atentados contra os animais silvestres nativos ou em rota migratória. Porém, os atentados contra os animais domésticos e exóticos configuram-se como contravenções.

O artigo 29° define como crime “matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória”, e dita que são espécies da fauna silvestre todos aqueles pertencentes às espécies nativas, migratória e quaisquer outras, aquáticas ou terrestres, que tenham todo ou parte do seu ciclo de vida dentro dos limites do território ou águas jurisdicionais brasileiras. Ainda menciona atos lesivos aos animais como o tráfico, comércio hediondo que comum é a morte do animal em sua transição no mercado negro. Tendo como elemento subjetivo o dolo, tais verbos, tão somente se praticados “sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida”. Ou seja, se permitido pelo Estado, mediante autorização, essas práticas são legais e não passíveis de qualquer punição.

Entretanto, dispõe o artigo 29° no parágrafo 2º que “no caso de guarda doméstica de espécie silvestre não considerada ameaçada de extinção, pode o juiz, considerando as circunstâncias, deixar de aplicar a pena”, deixando assim uma situação de invulnerabilidade do animal, pois a Lei já tem penalidades irrisórias quando almeja punir, e ainda deixa mecanismos que vêm a deixar uma possível impunidade em casos concretos.

O artigo 32° da Lei dos Crimes Ambientais proíbe a prática de ato abusivo, de maus-tratos, de ferir ou de mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos, prática não rara ocasionado aos animais com os quais convive o ser humano. Caso venha a ocorrer o crime a pena é de detenção de três meses a um ano e multa, sendo ambas irrisórias. Em seu parágrafo 1º aponta que incorre nas mesmas penas quem realiza experiência dolorosa ou cruel em animal vivo, mesmo que para fins didáticos ou científicos quando existentes recursos alternativos, confirmando o status de sencientes aos animais, pois evidencia a importância da adequada compreensão dos mecanismos dolorosos e de sofrimento dos animais. O que parece ser ignorado, quando se há outra norma no ordenamento jurídico, que disciplina a vivissecção, caso da Lei Arouca, tratada a seguir. Certo é que a prática de crueldade contra animais é vedada na Constituição Federal de 1988 (artigo 225°, § 1º, VII) e pelo supracitado artigo 32° da Lei de Crimes Ambientais. (MEDEIROS. 2013, p. 60 e 61).

No caput do artigo 35° da Lei de Crimes Ambientais, define que a partir de 1969, não será permitido adoção de livros escolares que não contenham textos sobre a proteção da fauna, aprovados pelo Conselho Federal de Educação, o mesmo artigo ainda determina aos programas de ensino dos níveis primário e médio o oferecimento de ao menos duas aulas anuais sobre o tema. Enquanto o parágrafo 2º diz que os programas de rádio e televisão deverão incluir textos e dispositivos do mesmo modo, o que é supracitado pela Constituição Federal de 1988, em seu artigo 225°, parágrafo 1°, inciso VI, que esposa que deve ser promovido a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio. Todavia, tal determinação se encontra frustrada, uma vez que não ocorre sua realização.

A Lei n° 10.519, de 17 de julho de 2002, veio para tratar quanto a promoção e a fiscalização da defesa sanitária animal quando da realização de rodeio, não sendo nada compatível com o movimento dos direitos dos animais, permitindo a realização da atividade que inegavelmente é fonte de estresse e sofrimento aos animais. O respectivo diploma apenas minimizar tais efeitos sem, entretanto, alcançar plenamente seus objetivos. O evento nada mais trata do que entretenimento para o homem advindo da destreza sobre o animal.

Afirma a Lei n° 10.519, que o animal não poderá ser molestado e deve seguir-se meios que os protejam, inclusive com assistência de médico veterinário que resguarde e fiscalize o bem-estar do animal. Todavia, em caso de descumprimento a multa pecuniária é ínfima e as outras infrações que podem levar até a suspensão definitiva do rodeio, não estabelece a gradação, deixando para as legislações estaduais sua aplicação e fiscalização (MEDEIROS. 2013 p. 64). Ficam assim os animais a mercê de uma legislação que permite uma atividade brutal, que diz que não deve o atleta sujeitar o animal à crueldade, mas em caso de fazê-lo, acarretará apenas multa de valor meramente simbólico considerando o teor econômico que a referida atividade gera, ou suspensão, sendo o intuito da Lei, apenas manter o exercício do rodeio, restando desprotegido o animal.

A regulamentação da utilização de animais em atividades de ensino e pesquisa científica se dá pela Lei n° 11.794, de 08 de outubro de 2008, conhecida como Lei Arouca, que revogou a Lei n° 6.638/79, a qual proibia esta prática. Dispõe ela Lei que a utilização de animais em atividades educacionais fica restrita a estabelecimentos de ensino superior e de educação profissional técnica de nível médio da área biomédica para atividades de pesquisas científicas relacionadas com ciência básica, ciência aplicada, desenvolvimento tecnológico, produção e controle da qualidade de drogas, medicamentos, alimentos, imunobiológicos, instrumentos, ou quaisquer outros testados em animais. É tida como uma lei de retrocesso ao que tange aos direitos dos animais.

Esta determina a criação de um Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal – CONCEA, para fiscalização, não na seara da proteção animal, mas das atividades, econômicas ou não, nas instituições. Ficando evidente o utilitarismo dos animais, já que a Lei dispõe que os experimentos permitidos são procedimentos efetuados em animais vivos, visando à elucidação de fenômenos fisiológicos ou patológicos, mediante técnicas específicas e preestabelecidas e morte por meios humanitários: a morte de um animal em condições que envolvam, segundo as espécies, um mínimo de sofrimento físico ou mental. Indo em desacordo com posicionamento do ordenamento jurídico brasileiro que proibi tratamento cruel para com animais não humanos.

2.3 Direito dos Animais na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988

No Brasil, a atual Constituição Federal é primeira a proteger de modo deliberado a questão do meio ambiente, mas vale ressaltar que “não há como vendar os olhos apara o avanço gradativo da proteção constitucional ao ambiente, mesmo que de início tenha sido, exclusivamente, sob o viés econômico” (MEDEIROS. 2013, p. 49). Ou seja, não ocorria proteção aos animais nem mesmo à flora, o intuito ao longo das Constituições caminhava em meio à proteção dos bens e recursos ligados à natureza, desenvolvendo e enraizando o antropocentrismo.

Após a Constituição Federal de 1988 a legislação brasileira deu um grande passo, assunto que não era abordado nas anteriores, que apesar de ainda não ser o pensamento inteiramente correto, foi uma amostra de que o Poder Legislativo começava a se interessar pelo bem-estar animal, ao passar a caracterizar crimes inafiançáveis os atentados aos animais silvestres nativos, com a alteração dos artigos 27° e 28° da Lei Federal n° 5.197/67, dentro do “Programa Nossa Natureza”. Ainda no Brasil a tutela jurídica do ambiente nasceu e foi se transformando e aprimorando ao longo do tempo, assim como ia se transformando à sociedade a qual servia. (MEDEIROS, 2013, p. 46). Assim, a atual Constituição Federal é umas das constituições em que mais se pode notar a preocupação com o meio ambiente.

Merece destaque sobre o meio ambiente na Constituição o Capítulo VI do Título VIII, que disciplina sobre a proteção ambiental, incluindo proteção à flora e fauna nativa, em consonância com o disposto na Declaração da Conferência das Nações Unidas. No que pertence à tutela constitucional dos direitos animais, o artigo 23° da Constituição Federal de modo amplo esposa que “É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: VII – preservar as florestas, a fauna e a flora.” Como também dispõe no caput do artigo 225 que “todos têm o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para presentes e futuras gerações”.

Fato é que apesar de trazer essa proteção valiosa, o caput do referente artigo solidifica um posicionamento antropocêntrico, no qual ratifica o homem como centro do benefício dessa proteção, sendo o meio ambiente de todos, erga omnes, e devendo este ser protegido e cuidado a fim de ser usufruído ser pelo ser humano no presente e por suas futuras gerações, para uma plena e digna existência dos mesmos, tipificando um direito de terceira geração ou novíssima dimensão, como lembra Medeiros (2013, p. 49 e 50).

O parágrafo 1° do artigo 225 expõe em seus incisos ao que incumbe ao poder público, esposando ser seu dever: preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético; definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção; promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente; proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.

Expondo continuamente o artigo 225 da Constituição Federal, é abordado uma visão mais biocêntrica, com intuito de harmonizar e integrar o ser humano com o biota, já que no ponto de vista de ecológico há de se haver uma ligação direta na conservação da propriedade e das funções naturais de modo que permite a existência, evolução e desenvolvimento dos seres vivos, uma interação entre o animal humano e a natureza. Vale lembrar que a proteção ao meio ambiente projeta-se no domínio dos direitos fundamentais, sendo ligado direto a coletividade, como também no dever fundamental de proteção, por parte do Estado, é possível observar a obrigatoriedade de proteção do meio ambiente pelo poder público, ou seja, a tutela constitucional. Fato é que os animais são objetos de proteção ampla em nível constitucional, com interesses próprios.

Vem se construindo pelos Tribunais com base no referido artigo, um posicionamento que ratifica a proteção aos direitos dos animais. No Recurso Extraordinário n° 153.531-8, o Supremo Tribunal Federal, julgou o evento popular da região sul, mais especificamente em Santa Catarina, conhecido como farra do boi, vindo a resolver um empasse nacional no âmbito do choque Constitucional entre a manifestação cultural versus a submissão dos animais a atos de crueldade, ambos direitos esposados em nossa Constituição. Citando o ministro Francisco Rezek:

Há coisas repulsivas aqui narradas por pessoas da sociedade catarinense, narradas por sacerdotes de Santa Catarina e por instituições comprometidas com primado da constituição no que se refere a proibição da crueldade para com os animais. Não posso ver como juridicamente correta a ideia de que em prática dessa natureza a Constituição não é alvejada. Não há aqui uma manifestação cultural com abusos avulsos; há uma prática abertamente violenta e cruel para com animais, e a Constituição não deseja isso. (1997, p. 400)

O ministro Marco Aurélio manifestou em seu voto o ponto de vista que o tribunal apoia a manifestação cultural, mas com ressalvas e tem hodiernamente buscado vedar condutas cruéis, “a manifestação cultural deve ser estimulada, mas não a pratica cruel” (1997, p. 414). E ainda reforçou:

Entendo que a prática chegou a um ponto a atrair, realmente, a incidência do disposto no inciso VII do artigo 225 da Constituição Federal. Não se trata, no caso, de uma manifestação cultural que mereça o agasalho da Carta da República. Como disse no início de meu voto, cuida-se de uma prática cuja crueldade é ímpar e decorre das circunstâncias de pessoas envolvidas por paixões condenáveis buscarem, a todo custo, o sacrifício do animal. (1997, p. 414)

Bem como se posiciona o ministro Néri da Silveira que é impossível ignorar o contido no referente inciso citado acima do artigo 225° da nossa Constituição, que é dever do Estado coibir práticas as quais submetem os animais a crueldade. Salienta ainda o ministro que os princípios e os valores da Constituição apontam que tais práticas devem ser impedidas, não apenas refreando a danificação do meio ambiente, mas também de prejuízo à fauna e a flora, bem como que provoquem a extinção de especiais e a submissão dos animais a atos de crueldade. Sendo preceito constitucional ao qual a própria constituição o fez. Sendo assim, no caso de não ser razoável a conciliação das práticas, devem estas se tornarem vedadas. (SILVEIRA, 1997 p.418).

Outro caso de repercussão julgado pelo Supremo Tribunal Federal, é a Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 1.856-6, ao qual o respectivo tribunal declarou a inconstitucionalidade da Lei 2.895/98, do Estado do Rio de Janeiro, ao qual autorização em determinadas condições a realização de competições conhecida como rinha de galos.

Ementa: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - BRIGA DE GALOS (LEI FLUMINENSE Nº 2.895 /98)- LEGISLAÇÃO ESTADUAL QUE, PERTINENTE A EXPOSIÇÕES E A COMPETIÇÕES ENTRE AVES DAS RAÇAS COMBATENTES, FAVORECE ESSA PRÁTICA CRIMINOSA - DIPLOMA LEGISLATIVO QUE ESTIMULA O COMETIMENTO DE ATOS DE CRUELDADE CONTRA GALOS DE BRIGA - CRIME AMBIENTAL (LEI Nº 9.605 /98, ART. 32 )- MEIO AMBIENTE - DIREITO À PRESERVAÇÃO DE SUA INTEGRIDADE ( CF , ART. 225 )- PRERROGATIVA QUALIFICADA POR SEU CARÁTER DE METAINDIVIDUALIDADE - DIREITO DE TERCEIRA GERAÇÃO (OU DE NOVÍSSIMA DIMENSÃO) QUE CONSAGRA O POSTULADO DA SOLIDARIEDADE - PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL DA FAUNA ( CF , ART. 225 , § 1º , VII )- DESCARACTERIZAÇÃO DA BRIGA DE GALO COMO MANIFESTAÇÃO CULTURAL - RECONHECIMENTO DA INCONSTITUIONALIDADE DA LEI ESTADUAL IMPUGNADA - AÇÃO DIRETA PROCEDENTE.

Dispõe o relator ministro Celso de Mello que o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é um dos direitos de terceira geração e isso bem garante englobado o dever de não incidir em práticas cruéis contra os animais pois deriva da necessidade que o ser humano tem de manter equilibrado o meio ambiente no qual está inserido. Solidificando suas afirmações em posicionamentos de doutrinadores e juristas brasileiros (MELLO, 2011, p. 301).

Faz ainda o relator menção ao caso acima abordado:

Entendo, por isso mesmo, Senhor Presidente, que a Lei n° 2.985, de 20/03/98, editada pelo Estado do Rio de Janeiro – de teor essencialmente idêntico ao da Lei catarinense n° 11.366/2000, declarada inconstitucional pelo Plenário desta Corte, no julgamento da ADI 2.514/SC, Rel. Min. EROS GRAU -, está em situação de conflito ostensivo com a norma inscrita no art. 225, § 1° VII, da Constituição da República, que, insista-se, veda a pratica de crueldade contra animais e que tem, na Lei n° 9.605/98 (art. 32), o seu preceito incriminador, eis que pune, a título de crime ambiental, a inflição de maus-tratos contra animais. (MELLO, 2011, p. 308)

O ministro Ayres Britto, valendo-se da explicação civilista tradicional, afirmou no mesmo julgamento que esse tipo de prática deve ser combatida, pois “da tortura de um galo para a tortura de um ser humano é um passo” (2011, p. 326). Mencionou o ministro Ricardo Lewandowski a proibição das touradas em Barcelona, onde busca a Europa resguardar o bem-estar animal e manifestou-se: “(...) está em jogo exatamente esse princípio básico da dignidade da pessoa humana. Quando se trata cruelmente ou de forma degradante um animal, na verdade está se ofendendo o próprio cerne da dignidade humana” (2011, p. 336).

Vale ressaltar um julgado do Superior Tribunal de Justiça que julgou o Recurso Especial, RESP n° 1.115.916-MG, interposto pelo Município de Belo Horizonte contra decisão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, que havia determinado o sacrifício de cães e gatos vadios por meio de gás asfixiante era medida cruel que não deveria ser realizada. Foi negado de forma unânime o provimento ao recurso, com fundamentando suas alegações em que os animais não eram simples coisas e que o Poder Público não poderia exterminá-los como lhe aprouvesse, devendo matá-los somente quando constituíssem ameaças à saúde humana e, nesta situação, com uso do meio menos cruel à disposição, como injeções letais precedidas de anestesia, por exemplo.

O relator, além de reconhecer os direitos de proteção esposados na Constituição, reconheceu em julgado os animais como seres sencientes de fato, nas palavras do relator Humberto Martins:

Não há como se entender que seres, como cães e gatos, que possuem um sistema nervoso desenvolvido e que por isso sentem dor, que demonstram ter afeto (...) possam ser considerados como coisas, como objetos materiais desprovidos de sinais vitais. (...) A condenação dos atos cruéis não possui origem na necessidade do equilíbrio ambiental, mas sim no reconhecimento de que animais são dotados de uma estrutura orgânica que lhes permite sofrer e sentir dor. A rejeição a tais atos aflora, na verdade, dos sentimentos de justiça, de compaixão, de piedade, que orientam o ser humano a repelir toda e qualquer forma de mal radical, evitável e sem justificativa razoável. (2009, p. 11)

O relator foi além ao se posicionar frente a decisão que vem lançar um manto de proteção maior aos animais. O dever da sociedade para com os animais deve ser de justiça, sua proteção exercida pelo homem não por mera compaixão, mas por direito, seus direitos independem dos sentimentos humanos, estaríamos obrigados a protegê-los mesmo se assim não o gostássemos. Resta claro que vem de fato sendo um posicionamento jurídico que almeja resguardar os direitos e o bem-estar dos animais, mas na seara do Ativismo Judicial, não sendo as condutas do Judiciário resultado direto das leis do ordenamento jurídico brasileiro infraconstitucional.

Antagonicamente ao posicionamento construído pelos tribunais, surge a Emenda Constitucional n° 96, de 06 de junho de2017, que dispõe que “para fins do disposto na parte final do inciso VII do parágrafo 1º deste artigo, não se consideram cruéis as práticas desportivas que utilizem animais, desde que sejam manifestações culturais, conforme o parágrafo 1º do artigo 215° desta Constituição Federal, registradas como bem de natureza imaterial integrante do patrimônio cultural brasileiro, devendo ser regulamentadas por lei específica que assegure o bem-estar dos animais envolvidos”, foi fortemente criticada e atacada, pois a mesma vem a permitir a prática da vaquejada, prática que gerou grande polemica à nível nacional. Fato é que o Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 5728), no Supremo Tribunal Federal, questionando a Emenda, que considera como não cruéis as práticas desportivas que utilizem animais, desde que sejam manifestações culturais.

Durante sua tramitação no Congresso Nacional, a proposta ficou conhecida como a PEC da Vaquejada. De acordo com a entidade, a Emenda questionada teve por motivação contornar a declaração de inconstitucionalidade de lei do Ceará que legalizava a prática da vaquejada, em decisão proferida pelo STF em outubro de 2016. A norma a viabilizou novamente, uma vez a Emenda elevou a prática à condição de manifestação cultural. Assim, na ação, a entidade alegou que a EC 96/2017 afrontou o núcleo essencial do direito ao meio ambiente equilibrado, na modalidade da proibição de submissão de animais a tratamento cruel, previsto no artigo 225°, em seu parágrafo 1º, inciso VII, da Constituição Federal. Sustentou ainda que a norma ofende também o artigo 60°, parágrafo 4º, inciso IV, segundo a qual não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir cláusulas pétreas, entre as quais, conforme sustenta, se encontra o direito fundamental de proteção aos animais.

As decisões do STF que julgaram inconstitucionais leis sobre brigas de galo e vaquejada foram citadas como precedentes importantes sobre o tema, consideradas pela Corte atividades intrinsecamente violentas e cruéis com os animais. O Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal pediu a concessão de liminar para suspender à eficácia da norma e no mérito a inconstitucionalidade da EC 96/2017. O caso está sob relatoria do ministro Dias Toffoli, que aplicou o procedimento do artigo 12 da Lei 9.868/99, a fim de que a decisão seja tomada em caráter definitivo, sem prévia análise de liminar, em razão da relevância da matéria.

Sobre os autores
Karine Alves Gonçalves Mota

Professora do Curso de Direito da Faculdade Católica do Tocantins; mestre em Direito pela Universidade de Marília e doutoranda em Tecnologia Nuclear IPEN/USP.

Kessy Jhonnes Monteiro Rodrigues

Faculdade Católica do Tocantins. Bacharelando em Direito.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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