A Hora de Repensar o ECA

11/05/2018 às 12:30
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Passados quase 30 anos da introdução do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, em nossa legislação, parece-nos, à luz de todas as evidências indicativas, que está mais do que na hora de repensar esta inovadora, - mas ao mesmo tempo, absolutamente ineficaz -, normatização, no âmbito do escopo contextualizante dos próprios resultados negativos que foram observados (e, particularmente, verificados) até o presente momento.

Muito embora seja cediço reconhecer, - em destacado sentido opinativo reverso à presente proposta reflexiva -, a existência de um verdadeiro batalhão de juízes sociólogos, ardentes e apaixonados defensores do ECA, precisamos, urgentemente, todavia, nos afastar de toda a passionalidade que naturalmente envolve o assunto para, com maestria lógica, estabelecermos uma verdadeira e imparcial visão crítica (e também amadurecida) sobre o tema vertente, posto que não é difícil deduzir que, em grande medida, foi a ingênua tentativa de se implantar um “Código Suíço” em um País Tropical (em sinérgico desafio a nossa realidade efetiva), - mais do que qualquer outro fator isoladamente considerado -, que conduziu aos extremos absurdos que estamos sendo compelidos a vivenciar diuturnamente.

Nesse sentido, não faltam exemplos diários de absoluta impunidade envolvendo menores infratores, o que vem contribuindo, sobremaneira, para minar a já precária credibilidade do aparato estatal e incentivar, de forma simplesmente preocupante, um crescente número de cidadãos brasileiros a recorrerem ao denominado “Estado Paralelo”, (onde a menoridade do infrator é apenas um simplório dado estatístico), objetivando fazer valer, - ainda que por vias moralmente condenáveis (para não adentrarmos em considerações técnico-legais) -, os seus respectivos direitos inalienáveis à segurança pessoal e familiar.

Independentemente da existência dessa inequívoca realidade, é forçoso concluir, entretanto, que deve ser, urgentemente, encontrado, - através, sobretudo, do advento de uma legislação mais realista -, algum tipo de meio-termo entre a justiça (paralela) da barbárie e o atual modelo de justiça (oficial) da impunidade, posto que não parece razoável, - e minimamente aceitável -, que toda a coletividade tenha que se defrontar sistematicamente com o autêntico dilema estabelecido pela práxis social atual no que concerne à escolha entre estes dois extremos radicais.

Resta evidente que a Sociedade brasileira clama por uma solução definitiva para o problema, - no âmbito da proclamação de uma nova legislação -, que, em última análise, a proteja, efetivamente desses verdadeiros desafios titularizados, em grande parte, por pessoas que se presume erroneamente ainda em formação de caráter (sem uma suposta “compreensão plena” da natureza criminosa de sua conduta), até porque o Brasil, sob esse prisma analítico, se apresenta, ipso facto, como o único País do mundo que possui, em absurda e desafiadora lógica dissonante, uma Delegacia Policial cujo objetivo primordial, - expressamente consignado em lei -, é prioritariamente proteger o ofensor, em flagrante detrimento da vítima que, inclusive, pode ser também, vale lembrar, uma simples criança em seus primeiros anos de vida.

Sobre o autor
Reis Friede

Desembargador Federal, Presidente do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (biênio 2019/21), Mestre e Doutor em Direito e Professor Adjunto da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO). Graduação em Engenharia pela Universidade Santa Úrsula (1991), graduação em Ciências Econômicas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1985), graduação em Administração - Faculdades Integradas Cândido Mendes - Ipanema (1991), graduação em Direito pela Faculdade de Direito Cândido Mendes - Ipanema (1982), graduação em Arquitetura pela Universidade Santa Úrsula (1982), mestrado em Direito Político pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1988), mestrado em Direito pela Universidade Gama Filho (1989) e doutorado em Direito Político pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1991). Atualmente é professor permanente do Programa de Mestrado em Desenvolvimento Local - MDL do Centro Universitário Augusto Motta - UNISUAM, professor conferencista da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro, professor emérito da Escola de Comando e Estado Maior do Exército. Diretor do Centro Cultural da Justiça Federal (CCJF). Desembargador Federal do Tribunal Regional Federal da 2ª Região -, atuando principalmente nos seguintes temas: estado, soberania, defesa, CT&I, processo e meio ambiente.

Informações sobre o texto

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