Proibição a retenção de pagamento pelo Órgão Público por falta de regularidade fiscal

23/05/2018 às 15:20

Resumo:


  • A Lei nº 8.666/1993 exige a apresentação de certidões negativas de débitos ou positivas com efeito de negativas para a habilitação em licitações e também para compras diretas por dispensa ou inexigibilidade.

  • É lícito à Administração Pública exigir a regularidade fiscal e trabalhista tanto no momento da contratação quanto na fase de pagamento, porém a retenção do pagamento por serviços já prestados ou materiais fornecidos, devido à irregularidade fiscal da empresa, é considerada ilegal.

  • Decisões do Tribunal de Contas da União e do Superior Tribunal de Justiça reforçam que a retenção do pagamento em tais circunstâncias viola o princípio da legalidade e pode configurar enriquecimento ilícito por parte da Administração Pública.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Proibição a retenção de pagamento por falta de regularidade fiscal da empresa prestadora do serviço ou fornecedora de material, no caso de dispensa em razão do valor. Falta de amparo legal.

Primeiramente, a Lei nº 8.666/1993 prevê em seu art. 27 toda a documentação de habilitação necessária para apresentação nos certames licitatórios, esta documentação no que tange as certidões negativas de débitos e temos de lembrar da possibilidade das certidões positivas com efeitos de negativas, são obrigatórias também na realização de compras diretas por dispensa ou inexigibilidade.

 Sabe-se que a exigência de apresentação das certidões de regularidade fiscal e trabalhista é lícita à Administração, não só à época que se empenha e autoriza a compra ou serviço, mas da mesma forma quando se vai efetuar o pagamento.

Qualquer Órgão Público deve observar todos os ditames legais para a aquisição de materiais e/ou serviços. Quando se trata de uma compra prevista no art. 24, II da Lei nº 8.666/1998 deve seguir a regra contida no Tribunal de Contas da União, da seguinte maneira, primeiro é feito a identificação das necessidades junto ao Almoxarifado, o Gerente de Suprimentos e Patrimônio ou outro servidor que seja responsável elabora a devida solicitação com a criteriosa especificação do objeto, caracterizando o produto ou o serviço capaz de atender as necessidades, após, é realizada a pesquisa mercadológica enviando a solicitação de proposta de preço aos fornecedores, organizando os orçamentos no mapa comparativo de preço observando a Empresa que melhor/menor valor ofertou, para assim dar início ao devido trâmite da pretensa aquisição diretamente junto ao fornecedor que apresentou a proposta de melhor/menor preço.

Da mesma maneira deve ser verificado o limite de dispensa em razão do valor, justificando o correto enquadramento da compra direta nos casos de dispensa, em seguida é feito a análise de regularidade fiscal do fornecedor ofertante do menor valor, perante a Receita Federal, o FGTS, a Receita Estadual e a Justiça do Trabalho.

Ademais, é deve ser analisado junto ao setor de Contabilidade no sentido de informar a disponibilidade de dotação orçamentária para efetuar aquisição pretendida, sendo isto executado, o serviço ou a compra deverá ser Empenhado e Autorizado, seguindo assim inteiramente o manual de compras direta do Tribunal de Contas da União.

Ocorre que, depois de ter seguido todo o procedimento legal de compra direta por dispensa, no ato do pagamento pela aquisição de alguns serviços ou materiais, algumas Empresas demonstram situação irregular perante o Fisco. Estas Empresas devem ser devidamente informadas e notificadas sobre a pendência, solicitando a mais breve possível regularização para que de imediato a liquidação possa ser executada.

Com relação a esta situação o próprio Tribunal de Contas da União legisla sobre a matéria por ora discutida, defendendo a efetuação do pagamento, pois o serviço já foi executado em favor do Ente, como da mesma forma já houve a aquisição do material.

Em atenção ao princípio da legalidade a Administração Pública somente pode fazer o que a lei determina, sem qualquer desvio. Neste caso aqui discutido, também devemos observar o que tange ao enriquecimento sem causa.

Dito isso, a Lei 8.666/1993 dispõe em seu art. 87 as sanções a serem aplicadas no caso de inexecução contratual, que seria deixar de apresentar as certidões negativas, vejamos:

Art. 87.  Pela inexecução total ou parcial do contrato a Administração poderá, garantida a prévia defesa, aplicar ao contratado as seguintes sanções:

I - advertência;

II - multa, na forma prevista no instrumento convocatório ou no contrato;

III - suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração, por prazo não superior a 2 (dois) anos;

 

IV - declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública enquanto perdurarem os motivos determinantes da punição ou até que seja promovida a reabilitação perante a própria autoridade que aplicou a penalidade, que será concedida sempre que o contratado ressarcir a Administração pelos prejuízos resultantes e após decorrido o prazo da sanção aplicada com base no inciso anterior.

Observa-se que nenhuma das penalidades previstas em lei está à retenção do pagamento, que se caso for retido padece de vício de legalidade, portanto, inexigível as certidões negativas para pagamento de serviço já prestado ou de material já adquirido.

Podemos verificar o informativo 103/2012, do Tribunal de Contas da União em que manifestou o mesmo posicionamento:

A perda da regularidade fiscal no curso de contratos de execução continuada ou parcelada justifica a imposição de sanções à contratada, mas não autoriza a retenção de pagamentos por  serviços prestados (Acórdão n.º 964/2012-Plenário, TC 017.371/2011-2, rel. Min. Walton Alencar Rodrigues, 25.4.2012)(grifo nosso).

Estamos fazendo analogia ao procedimento licitatório, pois, apesar da compra/serviço se enquadrar em dispensa, segue-se grande parte dos mesmos procedimentos previstos legalmente.

Nesse diapasão, o Colendo Superior Tribunal de Justiça já decidiu que:

ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONTRATO. RESCISÃO. IRREGULARIDADE FISCAL. RETENÇÃO DE PAGAMENTO.

1. É necessária a comprovação de regularidade fiscal do licitante como requisito para sua habilitação, conforme preconizam os arts. 27 e 29 da Lei nº 8.666/93, exigência que encontra respaldo no art. 195§ 3º, da CF.

2. A exigência de regularidade fiscal deve permanecer durante toda a execução do contrato, a teor do art. 55XIII, da Lei nº 8.666/93, que dispõe ser "obrigação do contratado de manter, durante toda a execução do contrato, em compatibilidade com as obrigações por ele assumidas, todas as condições de habilitação e qualificação exigidas na licitação".

[...]

5. Pode a Administração rescindir o contrato em razão de descumprimento de uma de suas cláusulas e ainda imputar penalidade ao contratado descumpridor. Todavia a retenção do pagamento devido, por não constar do rol do art. 87 da Lei nº 8.666/93, ofende o princípio da legalidade, insculpido na Carta Magna.

6. Recurso ordinário em mandado de segurança provido em parte.” (RMS 24953/CE, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/03/2008, DJe 17/03/2008) (grifo nosso).

 

Tribunais de Justiça também vem reafirmando este mesmo posicionamento, in verbis:

ADMINISTRATIVO. CONTRATO REGULARIDADE FISCAL. CONDICIONAMENTO PARA O PAGAMENTO PELOS SERVIÇOS PRESTADOR POR PARTICULAR.  IMPOSSIBILIDADE. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. DECISÃO UNÂNIME. O ato impugnado pela ação constitucional foi praticado pelo Secretário de Estado da Defesa Social de Alagoas, o que torna evidente a competência da Justiça estadual para apreciar

 

a demanda. Não obstante o poder conferido à Administração de exigir a comprovação de regularidade fiscal durante toda a vigência do contrato, não pode proceder à retenção do pagamento pelos serviços comprovadamente prestados, sob pena de caracterizar enriquecimento ilícito.

(TJ-AL - AI: 08011231320168020000 AL 0801123-13.2016.8.02.0000, Relator: Des. Celyrio Adamastor Tenório Accioly, Data de Julgamento: 29/09/2016, 3ª Câmara Cível, Data de Publicação: 07/10/2016)

 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. TUTELA PROVISÓRIA. CONTRATO ADMINISTRATIVO. PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. RETENÇÃO DO PAGAMENTO ATÉ COMPROVAÇÃO DE REGULARIDADE FISCAL. FALTA DE AMPARO LEGAL. I. Não há amparo legal para que a Administração Pública condicione o pagamento de serviço prestado à comprovação da regularidade fiscal da empresa contratada que o executou. II. Recurso conhecido e provido.

(TJ-DF 07094592320178070000 DF 0709459-23.2017.8.07.0000, Relator: JAMES EDUARDO OLIVEIRA, Data de Julgamento: 21/03/2018, 4ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE : 06/04/2018 . Pág.: Sem Página Cadastrada.)

 

APELAÇÃO E REEXAME NECESSÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. DIREITO ADMINISTRATIVO. CONTRATO ADMINISTRATIVO. PAGAMENTO DE SERVIÇOS PRESTADOS. RETENÇÃO. APRESENTAÇÃO DE CERTIDÕES NEGATIVAS. INADMISSIBILIDADE. 1 – Ilegítima a exigência de apresentação de certidões negativas de débito, quando a empresa contratada efetivamente cumpriu com sua obrigação, sob pena de afronta ao princípio da legalidade e enriquecimento sem causa da Administração. 2 - A aplicação da penalidade de retenção de pagamentos não consta nas sanções elencadas no artigo 87 da Lei de Licitações. 3 – Recurso e remessa necessária desprovidos. Sentença mantida.

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(TJ-DF - APO: 20130111733715 DF 0009762-63.2013.8.07.0018, Relator: GILBERTO PEREIRA DE OLIVEIRA, Data de Julgamento: 03/09/2014, 3ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE: 11/09/2014. Pág.: 107)

 

Vejamos também, decisão do Superior Tribunal de Justiça, 2ª Turma, AgRg no REsp 1313659:

 

ADMINISTRATIVO. CONTRATO ADMINISTRATIVO. PAGAMENTO DE FATURAS. ILEGALIDADE DA PORTARIA 227/95, QUE CONDICIONA O PAGAMENTO À COMPROVAÇÃO DA REGULARIDADE FISCAL DA EMPRESA CONTRATADA. MATÉRIA PACIFICADA. 1. Discute-se nos presentes autos a legalidade da Portaria n. 227/95, que prevê a retenção de pagamento de valores referentes a parcela executada de contrato administrativo, na hipótese em que não comprovada a regularidade fiscal da contratada. 2. A pretensão recursal destoa da jurisprudência dominante nesta Corte no sentido da ilegalidade da retenção  ao pagamento devido a fornecedor em situação de irregularidade perante o Fisco, por extrapolar as normas previstas nos arts. 55 e 87 da Lei 8.666/93.Precedentes: REsp 633432 / MG, rel. Ministro Luiz Fux, DJ 20/6/2005;AgRg no REsp 1048984 / DF, rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJe 10/9/2009; RMS 24953 / CE, rel. Ministro Castro Meira,Segunda Turma, DJe 17/03/2008.3. Agravo regimental não provido.

(STJ - AgRg no REsp: 1313659 RR 2012/0049480-3, Relator: Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, Data de Julgamento: 23/10/2012, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 06/11/2012)

 

Além deste posicionamento, o nosso Tribunal de Contas da União nos traz um respaldo jurídico referente à dispensa da documentação prevista no art. 29, III, da Lei nº 8.666/1993, nos casos de contratações diretas, in verbis:

“(...)

A comprovação de regularidade com a Fazenda Federal, a que se refere o art. 29, III, da Lei nº 8.666/1993,  poderá ser dispensada nos casos de contratações realizadas mediante dispensa de licitação com fulcro no art. 24, incisos I e II, dessa mesma lei.'” (TCU. Acórdão nº 1.661/2011 – Plenário. Rel. Min. Weder de Oliveira. Julgado em: 22 jun. 2011).(grifo nosso)

 

Neste caso, se formos abranger esta fundamentação, a dispensa da documentação no caso previsto do art. 24, II, da Lei nº 8.666/1993, valoriza a intenção de abranger o custo-benefício na contratação requisitada, a fim de abster-se de dificuldades burocráticas desnecessárias para a execução do objeto requerido.

Resta configurado, por não haver previsão legal, não ser possível a retenção do pagamento de serviço prestado ou produto fornecido nos casos em que a contratada, autorizada, venha a se tornar inadimplente perante o Fisco. Restando à Administração Pública o dever de observar os procedimentos previstos em lei e desta forma efetuar o devido pagamento para não dar causa ao enriquecimento ilícito.

Sobre a autora
Jadielly Tavares

Advoagada OAB/AL, Servidora Pública Municipal

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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