Prezados (as): A Súmula 228 do STJ não guarda relação com a tutela específica do artigo 105 da Lei Autoral de nº 9610/1998
A vista de algumas decisões judiciais negando a tutela específica do artigo 105 da Lei de nº 9610/98, com fundamento na Súmula 228 do STJ, este subscritor se viu na obrigação de escrever a respeito de dois institutos que não guardam relação, mas que em matéria autoral algumas vezes são confundidos, quais sejam, a tutela possessória na figura do interdito proibitório, e a tutela específica, neste caso, a tutela inibitória e de remoção do ilícito.
A Súmula 228 do STJ assim preconiza: “É inadmissível a interdito proibitório para a proteção do direito autoral.”.
Citada Súmula fora editada em 08/09/1999, pedindo vênia para colacionar trechos dos votos de alguns Eminentes Ministros, e os seus fundamentos, iniciando com o saudoso Ministro Carlos Alberto Menezes Direito no Recurso Especial de nº 67.478-MG (95.277239), precedente: “Não há nenhum sentido, não tem apoio nenhum, já a essa altura da vida processual brasileira, com a disponibilidade de outros meios próprios, em usar a ação possessória para a defesa dos direitos autorais.”.
O Eminente Ministro Ruy Rosado de Aguiar em seu voto nos autos do Recurso Especial de nº N. 89.171-MS (96.118345), também precedente para a edição da Súmula, assim discorreu: “Com estas considerações, estou em conhecer do recurso, pela divergência, mas lhe negar provimento, julgando incabível o uso do interdito proibitório, pois o direito do autor, por não recair sobre coisa corpórea, não pode ser turbado ou esbulhado, apenas exercido indevidamente por outros, em simples concorrência, o que constitui ofensa à exclusividade ou monopólio, - porquanto só o titular pode beneficiar-se economicamente com ele, - mas defensável através das outras vias que o sistema concede à defesa dos direitos.”.
Em comum nos votos colacionados acima se extrai a menção aos demais instrumentos de proteção existentes em nosso sistema processual e material. Também há a menção, em outros votos dos demais precedentes, acerca da impossibilidade, tanto do exercício da posse quanto da ocorrência de esbulho e turbação. Assim fica claro que a Súmula 228 do STJ fora editada sob o fundamento da inexistência da ocorrência de esbulho e turbação, assim como na existência de outros meios existentes em nosso ordenamento jurídico. Nítido também que a tutela específica do artigo 105 da Lei Autoral, instrumentalizada pelo artigo 497 do CPC, não guarda qualquer relação com a citada Súmula 228, que não possui o condão de afastar a proteção à lesão dos direitos autorais de execução pública musical.
A tutela autoral é autoexplicativa, sem qualquer grau de similitude com a tutela possessória do interdito proibitório: “A transmissão e a retransmissão, por qualquer meio ou processo, e a comunicação ao público de obras artísticas, literárias e científicas, de interpretações e de fonogramas, realizadas mediante violação aos direitos de seus titulares, deverão ser imediatamente suspensas ou interrompidas pela autoridade judicial competente, sem prejuízo da multa diária pelo descumprimento e das demais indenizações cabíveis, independentemente das sanções penais aplicáveis; caso se comprove que o infrator é reincidente na violação aos direitos dos titulares de direitos de autor e conexos, o valor da multa poderá ser aumentado até o dobro.”.
Onde está a natureza possessória na proteção acima? Então por qual motivo alguns Julgados fundamentam-se na Súmula 228 do STJ para negar a proteção?
Vejamos trecho do voto proferido nos autos da Apelação Cível de nº APELAÇÃO Nº: 0063250-34.2011.8.26.0224 – TJ/SP: Em relação ao pedido de tutela inibitória, previsto no 105 da Lei dos Direitos Autorais, não assiste razão ao apelante Isto porque, o Colendo Superior Tribunal de Justiça já pacificou entendimento consubstanciado na Súmula n° 228, que assim estabelece: “é inadmissível o interdito proibitório para a proteção do direito autoral”.
Como sobredito, aplica-se súmula que trata de questão possessória para afastar proteção autoral específica, o que não foi, absolutamente (bastando uma breve leitura nos precedentes) o que objetivou o C. Superior Tribunal de Justiça quando da edição da Súmula 228.
Felizmente, a confusão encontra-se em extinção, tanto nos Tribunais Estaduais, quanto no C. Superior Tribunal de Justiça que efetivam a tutela do artigo 105 nas suas r. Decisões, cabendo citar:
“RECURSO ESPECIAL Nº 1.731.273 - RS (2018/0065406-2)
RELATOR : MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE
RECORRENTE : ESCRITÓRIO CENTRAL DE ARRECADAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO ECAD ADVOGADA : KARINA HELENA CALLAI - DF011620
RECORRIDO : HOTEL ALPENHOF LTDA - ME REPR. POR : PATRICIA TISOTT ADVOGADOS : EVANDRO JOÃO MOSCHEM - RS080017 GABRIEL SPARRENBERGER E OUTRO(S) - RS085039
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. DIREITOS AUTORAIS. 1. OMISSÃO DA DECISÃO. OCORRÊNCIA. APLICAÇÃO DO ART. 1.025 DO CPC/2015. 2. TUTELA INIBITÓRIA DO ART. 105 DA LEI 9.610/1998. SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DE OBRAS MUSICAIS, LITEROMUSICAIS, AUDIOVISUAIS E FONOGRÁFICAS SEM AUTORIZAÇÃO PERANTE O ECAD. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. 3. RECURSO PROVIDO”.
RECURSO ESPECIAL Nº 1.655.767 - RS (2017/0037159-0)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : ESCRITÓRIO CENTRAL DE ARRECADAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO ECAD ADVOGADO : GELSA PINTO SERRANO - RS025174 ADVOGADOS : KARINA HELENA CALLAI E OUTRO(S) - DF011620 FRANCISCO DA SILVA NETO E OUTRO(S) - RS054694
RECORRIDO : ANTUNES E THOMAZI LTDA - ME ADVOGADOS : MARCELA QUADROS ANTUNES - RS088307 NATANI BEFFART DO NASCIMENTO E OUTRO(S) - RS089366
RECURSO ESPECIAL. DIREITO AUTORAL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. ECAD. NÃO PAGAMENTO DOS DIREITOS AUTORAIS. PRETENSÃO INIBITÓRIA. SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DE OBRAS MUSICAIS. ART. 105 DA LEI DE DIREITOS AUTORAIS. TUTELA ESPECÍFICA. VIABILIDADE.
Conclui-se que a Súmula 228 do STJ não pode ser utilizada para afastar a tutela do artigo 105 da Lei Autoral, atentando-se que os Eminentes Ministros em seus votos quando da edição da Súmula, já reconheciam os meios materiais e instrumentais de proteção dos direitos autorais, não havendo qualquer óbice para a sua aplicação.
Luciano Oliveira Delgado – advogado