A história do direito

01/07/2018 às 21:56

Resumo:


  • Amanda Cabral Fidalgo aborda a relação intrínseca entre História e Direito, destacando como o Direito reflete as mudanças sociais e a importância de estudar a História do Direito para compreender a evolução da ciência jurídica.

  • O texto discute a diversidade de sistemas jurídicos, ressaltando que cada um é resultado de sua sociedade e época, e que não se deve julgar sistemas antigos com base em critérios modernos.

  • Conclui-se que a origem dos sistemas jurídicos está nas relações humanas e que a eficácia de um sistema deve ser avaliada de acordo com sua capacidade de regular as relações sociais em seu contexto histórico.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Devido esse fato intrínseco à ciência do Direito, é que a História, na condição de disciplina integrante da grade curricular, é considerada de importância fundamental para a formação dos futuros operadores do Direito, dado que a História impregna o Direito.

INTRODUÇÃO

O Direito e a História possuem uma relação acentuadamente estreita, de tal sorte que esta, no que diz respeito aos fatos registrados no decurso da evolução da ciência jurídica, integra a grade curricular dos inúmeros cursos desta área do conhecimento da legalidade espalhados pelo Brasil, mostrando a influência que uma exerce sobre o outro. Nesse sentido, a História do Direito acompanha par e passo a História da Humanidade, e são muitas as ocasiões em que a primeira se transforma na segunda, em função de que mudanças constatadas na sociedade são, na verdade, mudanças ocorridas no Direito, mostrando a íntima ligação entre História e Direito.

Devido esse fato intrínseco à ciência do Direito, é que a História, na condição de disciplina integrante da grade curricular, é considerada de importância fundamental para a formação dos futuros operadores do Direito, dado que a História impregna o Direito de fatos que lhe são inerentes, com os quais cria um relacionamento dialético, levando ao entendimento de que a compreensão do Direito perpassa pelo conhecimento das circunstâncias sociais que existiam à época em que foi elaborado.

O estudo e o entendimento da ciência jurídica têm como motor essencial a História do Direito, devido buscar compreender o processo evolutivo e as alterações constantes registradas no seio das civilizações humanas no decurso da história dos diversos povos e, por consequência, das diversas culturas, do ponto de vista jurídico, razão pela qual o direito se pode definir o Direito como sendo a ciência do conviver.

A História do Direito necessita, concomitante ao exame da legislação mais antiga, realize diligências sobre os documentos históricos do mesmo período, recorrendo a fontes jurídicas possíveis, tais como contratos, sentenças judiciais, obras doutrinárias, além de fontes não jurídicas propriamente ditas, cartas e outros documentos, em razão de, conforme já registrado, ser o Direito fruto da sociedade, o que enseja que as produções sociais sirvam de elementos para que a História do Direito seja transmitida ao longo do tempo.

Reafirmando conceito já emitido, refere-se que o direito tem origem paralela à civilização, isto é, surge no exato momento em que um grupo de seres humanos se formou, vivenciando esse mesmo espaço, dizendo-se, dessa forma, que o direito é dependente do relacionamento humano, e, ao mesmo tempo, regula estas relações.

2 DESENVOLVIMENTO

Em termos generalistas, não há como se falar em História do Direito, particularizando a questão, considerando que a expressão que deve ser usada seria histórias dos direitos, haja vista que cada forma de direito manifestada possui uma história, a qual é diversificada e distinta em cada núcleo social, desvelando e retratando as estruturas basilares da mesma. (NASCIMENTO, 2008).

Segundo estudos realizados sobre a história sócio-antropológica e mesmo historiográfica do Direito, encontram-se tradições culturais inseparavelmente ligadas e particulares de cada núcleo social, registrando exercícios rituais aplicados à solução de conflitos, e de regulação das relações sociais e das relações das pessoas com os elementos essenciais da estrutura social, sem levar em conta a priori, o aspecto formal, ou seja, se codificadas ou não, se escritas ou não. (AZEVEDO, 2005)

Segundo Pedrosa (2006), o que existe em termos de História não é universal, mas sim, a retratação das diferentes histórias das civilizações e povos que já habitaram a Terra, cada uma contada da maneira particular de cada povo, além de possuir modo próprio de registrar a história dos outros, o que leva à conclusão de que, se a História do Direito tem íntima relação com a História da Humanidade, tem-se condições de afirmar a não existência de uma História do Direito, mas vertentes diversificadas que tratam as diferentes Histórias do Direito.

Assim, a História do Direito pode ficar limitada a disposições nacionais ou regionais, situação em que contem registros históricos de povos que se identificam pela mesma linguagem ou tradições culturais, circunstância que tornaria mais fácil o estudo da História desse Direito, em razão da existência de elementos semelhantes que permitiriam aprofundar esse estudo. Esta assertiva pode ser exemplificada com a referência à História do Direito Romano e suas instituições, ou, ainda, do Direito Português, de formas de aplicação do Direito como a common-law , do Direito Brasileiro, abordando o Direito por intermédio de correntes de pensamentos ou de ideias.

A importância significativa da História do Direito romano e de suas instituições pode ser visualizada ao se estudar a tradição europeia continental, o que, também, é possível perceber em relação ao Direito Latino Americano. Entretanto, no que diz respeito ao Direito Norte Americano, sente-se com mais ênfase a tradição anglo-americana da common-law. Da mesma forma, ao se pesquisar as Histórias do Direito dos povos de tradição islâmica, apreende-se que não levam em conta as tradições já referenciadas, sentindo-se que entre eles tem prevalência estreita relação com a História da Religião, o que é compreensível, dado que, também a religião, da mesma maneira que o Direito, tem sua origem radicada nas relações humanas. (CASTRO, 2007).

Comparando-se as diferentes escolas jurídicas, constata-se que estas influenciam cada sociedade ou região, o que leva à conclusão de não haver possibilidade de se atribuir classificação como arcaico, incompleto ou retrógrado, a nenhum sistema jurídico, haja vista que cada um deles é resultante do grupo social que o criou ou adotou, significando que esse ordenamento é o que melhor soluciona os conflitos e regula as relações naquela comunidade, num dado momento. (AGUIAR e MACIEL, 2007)

Assim sendo, pode-se considerar como erro o exame da História de um sistema jurídico em que se toma por base uma sociedade anterior, ou posterior, à aquela em que o ensinamento jurídico vigia, ou era aceito, dado que cada sociedade cria os regulamentos e leis mais convenientes naquele momento histórico vivenciado, indicando não ser recomendável que se interprete esse ordenamento tendo em conta circunstâncias de outro momento, o que pode ensejar conclusões errôneas e preconceituosas. (AGUIAR e MACIEL, 2007).

Analisando-se o Direito como resultado das interações entre os seres humanos, chega-se à conclusão de que, no momento em que houver um contato mais próximo entre os componentes de um dado grupo social, ai serão utilizadas normas de convivência, que são o germe do Direito, haja vista não ser possível se conceber ciência jurídica, direito, costume, sem que o substrato básico desse pensamento sejam as relações entre seres humanos.

Classificar um ordenamento jurídico levando em conta atualidade (moderno) ou antiguidade (arcaico), requer a reflexão e o estudo sobre a eficiência de tal sistema para sociedade que o elaborou e o colocava em prática. Nessas circunstâncias, se pode considerar que ordenamento seja arcaico se, na época em que se originou, e no grupo social em que foi criado, não alcançou eficiência nem efetividade, não tendo cumprido o papel básico de qualquer sistema jurídico, qual seja o de regular as relações sociais do seu tempo.

Mas, não se pode, também, ignorar que muitos sistemas jurídicos criados há muito tempo atrás na História da Humanidade, ainda hoje tem seus regramentos e instituições utilizados para embasar a definição de legislação mais atual, forma pela qual, sua vida foi estendida.

A definição da lei se verifica no âmbito do Direito positivo, personificado na linguagem e dotado de poder absoluto. Assim sendo, o direito do povo antecede à formalização da lei, haja vista ser esse direito o seu conteúdo, conferindo-lhe eficácia e eficiência. Assim, entende-se que a lei se configura no órgão do direito do povo, entendimento confirmado pela concepção de Savigny quando afirma que o jurista tem como objeto de ocupação a convicção comum do povo, isto é, o “espírito do povo”, fonte de onde se origina o Direito, atribuindo sentido histórico ao Direito, evidenciando como Direito e sociedade evoluem juntos, em uma relação mútua de influência e transformação, um refletindo o anseio do outro.

Conhecer o surgimento de um sistema jurídico constitui-se em trabalho dos mais complexos, sendo ainda mais dificultoso quando se considera as sociedades que não conheciam nem dominavam a escrita, circunstância que indica não terem deixado registros escritos que possam ser considerados como marco inicial do Direito. Entretanto, se constata facilmente que mesmo o mais simplório dos agrupamentos humanos, possuía regras de convivência, tanto entre os seus membros, como deste com membros de outros grupos. (CASTRO, 2007).

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Ainda que houvesse grupo social no qual o mais forte era quem detinha o poder, neste havia, também, uma norma que regulava, e até condenava as relações então existentes, demonstrando, dessa forma, que o Direito, ou um sistema jurídico, não é algo isolado, característica que direciona para uma relação complexa com outras ciências e com os mais diversos elementos que compõem o corpo social, posicionamento esse que se harmoniza com a manifestação de Wolkmer (2006), quando afirma:

Trata-se de pensar a historicidade do direito, no que se refere à sua evolução histórica, suas ideias e suas instituições, a partir de uma reinterpretação das fontes do passado sob o viés da interdisciplinaridade (social, econômico e político) e de uma reordenação metodológica, em que o fenômeno jurídico seja descrito sob uma perspectiva desmistificadora.

Permeando o relacionamento entre o Direito e a História, interpõem-se duas questões primárias que devem ser levadas em conta, antes de se buscar aprofundar o conhecimento sobre a origem do Direito. A primeira delas configura-se na conceituação do Direito, atividade que se mostra quase impossível, frente a existência de várias definições do que seria o Direito, haja vista que a doutrina predominante não conseguiu chegar a um denominador comum, ora conceituando-o como norma, ora como faculdade de agir, ora, ainda, como ramo do conhecimento, além de como ciência, e, também, como ideal de justiça. Nesse sentido, e com base nas explanações feitas até aqui, entende-se que a definição que mais se coaduna com o nascimento do Direito é a que o define como norma de controle das relações entre os homens. (IHERING, 2009).

A segunda questão é mais simples, configurada no questionamento sobre a possibilidade de se estudar o Direito sem conhecer as suas origens. Nesse caso, considera-se patente que, para se estudar o Direito, é fundamental que se conheça sua origem e evolução ao longo do tempo, forma pela qual se pode chegar a compreender o estágio atual. Mas, para se evitar incorrer no erro corriqueiro de pensar o Direito tão somente como norma positivada ou codificada, eis que ele está inserto nas relações humanas, independentemente delas serem mais ou menos complexas. Assim sendo, Direito não é apenas norma escrita, sendo qualquer regra de convívio que pauta a relação entre indivíduos.

Assim, a partir das considerações tecidas, chega-se à conclusão de que a origem dos sistemas jurídicos são as relações entre os indivíduos, cuja complexidade depende da complexidade das interações sociais que ocorriam, entendimento alicerçado na assertiva de Wolkmer (2006, p. 2) de que: “Certamente que cada povo e cada organização social dispõem de um sistema jurídico que traduz a especialidade de um grau de evolução e complexidade.”

Concluindo, considera-se que não se deve classificar um sistema jurídico de arcaico, devido este não dispor sobre relações complexas, ou, por não ter uma complexidade no seu conteúdo, dado que ele é reflexo de uma sociedade, por isso não poderia refletir ou prever algo que, socialmente, não existia. Nesse sentido, não é possível se conceber um sistema de leis não consubstanciado nas relações sociais, pois o direito antes de tudo é norma para regular a relação entre os indivíduos, e destes com os elementos naturais.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Do que foi explanado, entende-se que a História do Direito, na condição de fonte de informação, deve abranger não só as leis escritas, ou sistemas jurídicos que tiverem uma positivação, não devendo, nem mesmo, fazer um certo juízo de valor a respeito dos conjuntos de leis mais antigas, que foram reflexo do seu tempo e da complexidade que a sociedade que as gerou ou adotou atingiu, constituindo-se, portanto, em soluções e regramentos para as suas relações. Dessa forma, não deve sofrer uma valoração, mas sim, serem estudadas com o afã de se buscar as relações sociais inerentes a todo o direito.

Portanto, a História do Direito deve incumbir-se de “ler” o Direito, distinguindo e correlacionando suas mudanças com as transformações sofridas pela sociedade, estando alerta para os seus elementos formadores, e como eles interferem e influenciam o mundo jurídico, buscando perceber se os ordenamentos passados foram suficientes, ou melhor, se as premissas postas por estes ordenamentos contemplavam a complexidade de suas sociedades.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AGUIAR, Renan; MACIEL, José Fábio Rodrigues. (2007). História do Direito. (Coleção Roteiros Jurídicos). São Paulo: Saraiva.

AZEVEDO, Luis Carlos de (2005). Introdução à História do Direito. São Paulo: Revista dos Tribunais.

CASTRO, Flávia Lages de Castro. (2007). História do Direito Geral e Brasil. 4ª. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris.

IHERING, Rudolf Von. (2009). A luta pelo Direito: Texto Integral. Tradução João de Vasconcelos. 1ª edição. São Paulo: Martin Claret.

NASCIMENTO, Walter Vieira do. (2008). Lições de História do Direito. Rio de Janeiro: Forense.

PEDROSA, Ronaldo Leite. (2006). Direito em História. 5ª. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris.

WOLKMER, Antonio Carlos (Organizador). (2006). Fundamentos de História do Direito. 3ª. ed. Belo Horizonte, Del Rey.

Sobre a autora
Amanda Cabral Fidalgo

Orientadora, formação acadêmica: Bacharelado em Direito. FACI- Faculdade Ideal, conclusão em 2010, Especialista em Processo Civil, Trabalhista, Penal, Administrativo e Constitucional - Uninassau, concluído em Junho de 2013., Mestra em Direito Processual Constitucional- Universidade Nacional Lomas de Zamora concluído em Dezembro de 2014, Defesa realizada em 12/07/2017, e Revalidado pela UFRN PPG Nº 000471, Assessora Fazendária da SEFA/ PARÁ Até 08/01/19, Organizadora de Eventos, Palestras, Seminários, Workshop, Congressos, Simpósios e afins. EXPERIÊNCIAS PROFISSIONAIS: 2005 até 2016 - A Grello Advocacia e Imobiliário / Cargo: Assessora Jurídica. Principais atividades: Analise e realização de processos, acompanhamento de processos on line e no fórum, nas áreas comercial, cível, tributária, trabalhista. Em 2006 á 2008- Trabalhou no Fundo Ver-o-Sol como Estágiária no Jurídico, desenvolvia o acompanhamento de Contratos e Convênios, Trâmites Administrativos, feitura de documentos oficias, estudos de casos de munícipes. Em 2008 á 2009- Trabalhou ao Politica Partido PTB, no cargo de Assessora Jurídica, onde desenvolvia analise de processos, acompanhamento de julgamentos, atualização processual, protocolo e feitura de ações. Em 2009-2011,trabalhou na PMB BELÉM -Gabinete do Prefeito- Janeiro de 2009 á Dezembro de 2009 Setor: contratos e Convênios Principais e de 2009-2013 a PMB/SEHAB Setor: NAJ- Núcleo Jurídico, desenvolvendo emissão de pareceres singulares ou relato de pareceres coletivos, solicitados nos processos que lhe forem encaminhados. Em 2013 a Junho de 2014 Atuou como Docente ma UNIP - Universidade Paulista, ministrando aulas para os cursos de bacharelado em Administração, Ciências Contábeis e os Cursos Tecnológicos de Gestão Empresarial, Pedagogia, Processos Gerenciais. Em 2013 a 2017, atuou como Docente da Escola de Governança do Estado do Pará como Prestadora de Serviços, na capacitação de funcionários públicos municipais e estaduais, mediante mini cursos, com disciplinas da área jurídica, com duração de 60h. Em 2014 a 2018, atuou como Docente na Faculdade Mauricio de Nassau - Belém, onde ministrava aula para os Cursos de Gestão de Recursos Humanos, Gestão Comercial, Ciências Contábeis, Administração, Serviço Social e Direito, com carga horária de 20h semanais, nas disciplinas de Direito Previdenciário, Direito Trabalhista, Direito e Legislação Tributária, Direito Empresarial , Direito Empresarial III,Direito Empresarial I e III. Direito do Consumidor, Hermenêutica Jurídica, Empreendedorismo, Introdução ao Estudo de Direito, Filosofia, ética e Cidadania,Direito e Legislação Social,bem como atuou ao Cursos de Pós Graduação na UNINASSAU nas disciplinas: Metodologia Científica e Mediação e Arbitragem. Atualmente é Advogada OAB/PA 28.158, atuante nas Áreas do Consumidor, Civil, D.Público, Trabalhista, Empresarial, Eleitoral, Administrativo, e Coaching Profissional e para Exame de Ordem, bem como orientadora de mestrado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

UNIVERSIDAD FEDERAL DE LOMAS DE ZAMORA - BUENOS AIRES-AR, FACULDAD DE DERECHO, MESTRADO EM DIREITO PROCESSUAL CONSTITUCIONAL

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