Resumo: Tem-se por objetivo dissecar a atividade médica, em especial a responsabilidade médica nos casos de iatrogenia, de forma a identificar dentro dela a responsabilidade do profissional médico e a percepção do erro inescusável, da imperícia inadmissível, da negligência criminosa que impelem as pessoas à busca da reparação. Não obstante a acentuada evolução da ciência médica (que é também arte), máxime no campo do diagnóstico e da medicina curativa, com o desenvolvimento de aparelhos e alta tecnologia, ainda existe uma aura de romantismo em torno dessa profissão e o médico continua a ser visto como um sacerdote, ungido com o dom da cura. Porém, as vítimas, ainda, pouco procuram o Judiciário. A notória dificuldade de acesso a uma ordem jurídica justa, aliada à timidez de nossos pretórios ao estabelecerem a culpa do profissional da medicina, são as principais causas dessa hesitação em buscar a reparação dos danos advindos da incorreta conduta médica. A importância e a necessidade dos serviços dos profissionais da medicina fazem com que o Estado exija título reconhecido para o exercício dessa atividade, configurando o chamado monopólio médico.
Palavras-chaves: Ato médico. Erro. Responsabilidade civil.
ABSTRACT:Its purpose is to dissect medical activity, especially medical liability in cases of iatrogeny, in order to identify within it the responsibility of the medical professional and the perception of inexcusable error, impermissible impermissibility, criminal negligence that impel people to search for Repair. Nevertheless, the marked evolution of medical science (which is also art), especially in the field of diagnosis and curative medicine, with the development of apparatus and high technology, there is still an aura of romanticism around this profession and the doctor continues to be seen as a priest, anointed with the gift of healing. However, the victims still do not seek the Judiciary. The notorious difficulty of access to a just legal order, coupled with the timidity of our pretenses in establishing the guilt of the medical professional, are the main causes of this hesitation in seeking redress for damages arising from incorrect medical conduct. The importance and necessity of the services of medical professionals make the State require a recognized title for the exercise of this activity, forming the so-called medical monopoly.
Keywords: Medical act. Error. Civil responsability.
1 INTRODUÇÃO
Este trabalho tem por objetivo dissecar a atividade médica, em especial a responsabilidade médica nos casos de iatrogenia, de forma a identificar dentro dela a responsabilidade do profissional médico e a percepção do erro inescusável, da imperícia inadmissível, da negligência criminosa que impelem as pessoas à busca da reparação. A pesquisa será realizada com 75 pessoas portadoras ou não de necessidades especiais, sendo que 25 destes paciente será entrevistado na cidade Departamento de Amambay Paraguai e 25 brasileiros na cidade de Cuiabá Mato grosso Brasil realizaram procedimentos cirúrgico na cidade de Santa cruz de La Sierra Bolívia.
E sabido que o ser humano está sujeito à dor e às enfermidades. Para preservar sua saúde, evitar doenças, mantendo-se mental e fisicamente hígido, os homens recorrem ao médico. Enquanto profissão, a medicina visa a prevenir os males e à melhoria dos padrões de saúde e de vida da coletividade. Saúde, pois, não é apenas a ausência de enfermidade, mas sim o estado de completo bem-estar físico e psíquico da pessoa.
Não obstante, a acentuada evolução da ciência médica (que é também arte), máxime no campo do diagnóstico e da medicina curativa, com o desenvolvimento de aparelhos e alta tecnologia, ainda existe uma aura de romantismo em torno dessa profissão e o médico continua a ser visto como um sacerdote, ungido com o dom da cura. Porém, as vítimas, ainda, pouco procuram o Judiciário. A notória dificuldade de acesso a uma ordem jurídica justa, aliada à timidez de nossos pretórios ao estabelecerem a culpa do profissional da medicina, são as principais causas dessa hesitação em buscar a reparação dos danos advindos da incorreta conduta médica.
Não se deve olvidar, entretanto, que a atividade médica é de primordial interesse social. A proteção da saúde humana se impõe como atividade indispensável, e o Estado moderno se preocupa com a saúde do cidadão que por sua vez tem o direito de exigir do ente estatal a adoção de medidas visando a prevenção de doenças e ao respectivo tratamento. O direito à saúde é obrigação do Estado, decorre da força normativa da Constituição que se expande aos domínios da ordem social. A Lex Magna, evidentemente, não proíbe a medicina privada, mas deve instituir serviços públicos sanitários disponíveis a todas as pessoas.
A importância e a necessidade dos serviços dos profissionais da medicina fazem com que o Estado exija título reconhecido para o exercício dessa atividade, configurando o chamado monopólio médico. Tudo isso, no entanto, não torna o médico imune a responder pelos danos que praticas, preenchidos os requisitos legais.
É em razão disso importância que este trabalho buscará dissecar a atividade médica, de forma a se identificar dentro dela a responsabilidade do profissional médico.
A seriedade que exige está profissão é tamanha que não se pode nela atuar com deslinde e leviandade.
Os médicos, por sua vez, inclinam-se a fazer de sua responsabilidade uma questão de mera consciência, de foro íntimo, identificando na evolução da jurisprudência uma ameaça contra a liberdade científica e até mesmo contra a própria saúde pública.
No exercício profissional da medicina, uma falha pode ter conseqüências irremediáveis, porque a vida é irrecuperável. Por respeito à dignidade do ser humano, a relação contratual que se estabelece entre o médico e o paciente deverá estar sempre impregnada de humana consideração pelo semelhante e pelos valores espirituais que ele representa. Assim, a função médica encerra, muito mais que um ato de justiça social, um dever imposto pela fraternidade social, tornando mais suportáveis a dor e a morte.
Na realidade, o pagamento de vultosas indenizações, em casos de culpa médica, só é possível porque, nos países de Primeiro Mundo, hospitais e médicos mantêm seguro de responsabilidade civil por dano a terceiros. No Brasil, já podem o médico e os estabelecimento hospitalares recorrer ao mercado segurador, que dispõe de apólices apropriadas para a cobertura de responsabilidade civil profissional.
No entanto, esses seguros não podem nem devem, sob qualquer pretexto, ser feitos por empresas privadas. Deve sim se realizar por uma instituição estatal ou pela própria classe médica; como, por exemplo, sob a responsabilidade da Associação Médica Brasileira, como mutualizadora ou como concessionária exclusiva do Estado.
Os usuários de serviços médicos, em nossos dias, mesmo aqueles que provêm de camadas sociais menos afortunadas, principiam a ter uma idéia clara de seus direitos, enquanto pacientes. Não há, propriamente, mudança no comportamento das pessoas em relação aos médicos, que continuam a ser reverenciados, acatados e vistos como benfeitores. Vai-se consolidando, porém, a clara percepção do erro inescusável, da imperícia inadmissível, da negligência criminosa, que impelem as pessoas à busca da reparação.
Quando se suscita a questão da responsabilidade médica, invariavelmente surge a objeção centrada em que, antes, deve-se discutir a saúde do brasileiro que, como é sabido, encontra-se em fase terminal. Remuneram-se de modo ridículo os profissionais que atendem pelo Sistema Único de Saúde. Os recursos materiais inexistem. Exames complementares, que poderiam levar a um diagnóstico preciso, não são realizados: ou falta o aparelho, ou os materiais necessários ou o operador da máquina. As condições de trabalho, enfim, são extremamente adversas. Aos aplicadores da lei, em especial, incumbe considerar os justos queixumes dos médicos, quando tais fatores intervêm e condicionam a conduta médica.
Diante da grande dificuldade de se encontrar meios plausíveis de se responsabilizar o profissional médico que agiu de forma negligente é que surgiram as Associações de Vítimas de Erros Médicos – AVEM. Estas associações são fundadas pelas próprias vítimas, ou parentes destas, tendo como objetivo, além de não deixar a injustiça prosperar, fazer um trabalho de prevenção contra o erro médico.
2 ERRO MÉDICO – VISÃO GLOBALIZADA
Apesar de serem semelhantes em muitos países, não são uniformes em todos os países os critérios, em caso de erro médico, que os julgadores utilizam para as decisões. Na França, Itália, Portugal, Alemanha, Colômbia, Uruguai, Suíça, Argentina e Espanha aplica-se o critério de que tem que haver culpa no agir do médico para que seja responsabilizado. Principalmente, perquire-se, no processo judicial nestes países, se a negligência esteve presente no agir do médico. Se tudo ocorreu por conta do infortúnio, não há que se inculpar ao médico. E, o acusador deve provar a culpa do médico. Mas, não em todos os países, pois pode-se citar a Itália, onde, em casos de erro médico, a inversão do ônus da prova já é prevista legalmente. Cabe, na Itália, pois, ao médico provar que agiu sem culpa.
No Brasil, apesar de prevista a inversão do ônus da prova no Código de Defesa do Consumidor, esta só é determinada pelo julgador se for, a seu critério, verossímil a acusação ou que ele se convença da real hipossuficiência do autor da ação.
2.1 Relação médico-paciente
Por muito tempo houve divergência entre os doutrinadores sobre o caráter contratual ou não da relação médico/paciente, já que existia certa relutância em se aceitar que a responsabilidade médica fosse de caráter contratual, especialmente porque poderia recair sobre o médico a presunção da culpa pelo inadimplemento toda vez que o paciente reclamasse pelo não cumprimento ou do cumprimento defeituoso do contrato. 1
Atualmente, é predominante o entendimento doutrinário e jurisprudencial de que entre o médico e seu paciente existe um contrato de prestação de serviços, com todos os requisitos necessários previstos no Código de Defesa do Consumidor.
Sendo a contratual responsabilidade, esta decorrerá do descumprimento de uma obrigação à previamente firmada entre as partes. A falta de execução do contrato, ou seja, seu descumprimento, é que gerará o direito de recomposição pela parte prejudicada, no caso, o paciente.
2.2 O contrato médico-paciente
A relação médico e paciente inicia-se com a implementação do contrato, que ocorre no momento em que o paciente solicita e o médico aceita prestar seus serviços profissionais. Este acordo pode ser realizado de forma escrita ou oral. Não depende de forma especial, bastando a manifestação de vontades das partes, consoante prescreve o artigo 107 do Código Civil.
Com relação a este contrato firmado, o médico obriga-se a envidar todos os esforços necessários para alcançar seu objetivo que é a cura do paciente, devendo para tanto, utilizar-se de todas as técnicas disponíveis e conhecimento, com perícia e cuidado.
Maria Helena Diniz, leciona que o contrato entabulado entre o médico e o paciente contém, implicitamente, os seguintes deveres do médico:
1) de dar conselhos ao paciente; 2) cuidar do enfermo com zelo, diligência, utilizando todos os recursos de medicina; 3) de abster-se do abuso ou do desvio de poder. Segue também esta linha de pensamento o doutrinador Aguiar Dias; 4) usar medidas preventivas e de controle para impedir transmissão de doenças ao paciente; 5) dizer a verdade; 6) segredo e sigilo; 7) não usar a Medicina para atentar contra a dignidade do ser humano; 8) nem contra a dignidade de seu paciente; 9) assumir obrigação de resultado na cirurgia estética; 10) efetuar prontuário clínico de seus pacientes; 11) fornecer atestado médico quando necessário e; 12) evitar tratar de si mesmo, de amigo íntimo ou familiares. 2
O contrato firmado entre o médico e o paciente é intuito personae, isto é, um ato de confiança para as duas partes, principalmente do paciente que escolhe o médico. É, ainda, um contrato de trato sucessivo, bilateral, oneroso e pode ser rescindido por ambas as partes.
O médico, na concepção do Código de Defesa do Consumidor, é tido como um profissional liberal fornecedor de serviços, consoante dispõe o artigo 3º, uma vez que é pessoa física que desenvolve atividade de prestação de serviços.
Por sua vez, o paciente é considerado, pelo código retro mencionado, como um consumidor, previsto no artigo 2º, pois é uma pessoa física que utiliza os serviços do fornecedor. Nestes casos caberá a inversão do ônus da prova na responsabilidade civil do médico.
Tema cada vez mais incidente no Judiciário Brasileiro, a responsabilidade civil do médico, matéria de relevante importância social por tutelar direitos fundamentais consagrados na Constituição Federal de 1988, tais como a vida e a integridade física, vem trazendo a bojo questões controvertidas que movimentam os Tribunais pátrios e os estudos doutrinários mais reconhecidos do país.
1.3 O erro médico
A opinião pública e os meios de comunicação consagraram a expressão “erro médico” como um gênero a abarcar duas espécies, o que torna necessário discernir os erros em função do exercício da medicina. As duas espécies que podem ocorrer são: a) erro profissional ou de técnica, os quais não atraem a responsabilidade do profissional, eis que inerentes ao exercício da profissão; b) erro médico ou erro culposo, cometidos com culpa profissional e que ensejam a responsabilização e reparação. 3
Os erros ocorridos nos casos duvidosos ou controvertidos não podem, pura e simplesmente, ser colocados no rol dos cometidos por imperícia, imprudência ou negligência. O profissional, em tendo escolhido técnica que não se mostrou boa para aquele caso específico, e foi zeloso e criterioso na aplicação, terá cometido um erro profissional, não culposo, pois não poderia antecipar a reação do organismo do paciente, pelo qual não responde. 3
O erro profissional é escusável quando se trata de técnica conhecida, usual e aceita. Por outro lado, haverá imperícia quando a técnica é adequada, mas a aplicação for desastrosa ou deficiente.
Bittar, coloca com simplicidade e precisão que é consenso entre os médicos que se pode errar o diagnóstico, mas não a conduta. Para explicar o aparente paradoxo, vem a informação de que o diagnóstico de toda doença pode ter o aspecto: a) etiológico, se indicar a causa da doença; b) anatômico ou topográfico, se referir ao local, tecido, órgão ou segmento atingido; c) funcional, se concernente às alterações da função em decorrência da doença. 3
O procedimento correto, em ambos os casos, é cirúrgico. No caso, o médico, ao abrir o abdome, vai comprovar o erro de diagnóstico e operar corretamente; errou o diagnóstico e acertou a conduta. 3
O erro de diagnóstico não deve ser tal que revele uma ignorância ou imperícia grosseiras, mas sim aquele que poderia ser cometido por um profissional prudente, colocado na mesma posição. É preciso haver coerência entre o quadro clínico e a conduta prescrita a ser seguida, tudo devendo ser registrado pelo médico, no prontuário do paciente. Se houver alteração da evolução do quadro clínico, deve ser registrada com clareza e precisão, mas sem interpretação para que, se outro médico for chamado para o caso, possa entender as modificações ocorridas e tomar sua própria decisão. 3
A falência orgânica durante a execução técnica do tratamento ou do método exploratório põe um problema: há sempre um risco necessário. Jean Penneau adverte que a jurisprudência francesa tem consciência desse risco necessário, mas é rigorosa com qualquer imprudência ou negligência, que constituem culpa.
O dever do médico para com o paciente não é, tão-somente, prescrever o tratamento mais apropriado, mas, a despeito e independentemente de uma cura, que pode vir a não se concretizar, cuidar, tratar, assistir, consolar, tentar salvar, enfim. Se não desempenhar bem esse conjunto de atividades atrairá, inexoravelmente, a responsabilidade.
Maria Helena Diniz, ressalta dois pontos relevantes, que podem ocorrer no transcurso da relação médico/paciente, não geradores de responsabilidade civil médica, por ser inexistente o nexo de causalidade entre qualquer conduta do profissional e o dano infligido ao paciente. 5
1.3 O erro culposo
O erro médico supõe uma conduta profissional inadequada, associada à inobservância de regra técnica, potencialmente capaz de produzir dano à vida ou agravamento do estado de saúde de outrem, mediante imperícia, imprudência ou negligência. 6
Aqui aparece uma perplexidade, pois o juiz, um leigo em técnicas médicas, é o encarregado da difícil tarefa de apreciar e julgar as faltas técnicas que porventura cometa o médico no exercício da sua arte, dificuldade que vem aumentando com o progresso técnico da medicina e a especialização cada vez maior, tornando os temas mais herméticos. 3
Se o juiz é leigo, ele não tem condições e nem lhe cabe dizer se a técnica é boa ou má, se adequada ao caso prático ou não se existe outra melhor ou não, o que torna essencial distinguir entre erro profissional, ou técnico, e erro culposo, ou médico.
A propósito da culpa concernente à técnica é que se põe a comparação com um padrão, ou seja, o contraste entre o que teria de ser tecnicamente feito com o que foi efetivamente feito. E esse padrão impõe o conhecimento, das regras da arte médica acessíveis ao conhecimento, disponíveis e exeqüíveis na prática. 3
1.4 A negligência médica
Para Maria Helena Diniz, a negligência prende-se a um comportamento negativo por parte do facultativo, que não se empenha no tratamento, não observa os deveres exigidos pelas circunstâncias, não é diligente, não tem o cuidado solícito que a atenção ao paciente impõe. É não fazer o que deveria ser feito. A negligência pode se configurar num defeito da realização do ato ou mesmo sua omissão faz referência à representação iconográfica da negligência, como uma mulher com os cabelos em desalinho, roupas puídas e estendida junto a uma relógio caído. 7
A negligência em conjunto com a imprudência, pode ser assim exemplificada: submeter um paciente a tratamento com penicilina por via parenteral (imprudência) sem fazer previamente o teste para averiguar se o paciente era alérgico ao medicamento (negligência). Um outro didático exemplo jurisprudencial, colecionado por Miguel Kfouri, médico que, diante de caso grave, permanece deitado na sala dos médicos, limitando-se a prescrever medicamento, sem contato com o paciente, criança desidratada que veio a falecer. 8
1.5 A imperícia médica
A maior parcela da doutrina se posiciona no sentido de que não vence o arrazoado daqueles que entendem, em face do fato de o médico ser habilitado legalmente ao exercício da medicina, não ser possível aquele profissional cometer atos culposos por imperícia. Pergunta-se: quem se confiaria, em sã consciência, a um jovem, psicológica e tecnicamente despreparado, para sofrer pelas suas mãos uma cirurgia cardíaca de alto risco? A resposta sensata é baseada no simples fato que ele é ainda imperito naquela técnica, mesmo sendo tão médico quanto um outro que já é experiente e reconhecido na sua prática. 3
Se o médico não domina a técnica que usa, se pratica o ato sem saber o que, necessariamente, deveria conhecer, se deixa de observar normas técnicas da arte médica, age com imperícia. Ademais, o princípio ético estampado no art. 5º do Código de Ética Médica determina ao médico o contínuo aprimoramento de seus conhecimentos e implica indiretamente que, se não se aprimorar, não estará apto a usar o melhor do progresso científico, em benefício do paciente. 3
Que benefício poderá trazer para o paciente o médico ignorante e desatualizado nas regras modernas da arte médica? Certamente menos do que o paciente deseja e tem o direito de esperar. Por outro lado, é preciso prudência do juiz, pois, com a velocidade do desenvolvimento da ciência médica, não há como se exigir do médico um conhecimento universal, bem como não é de se cobrar de um jovem médico a experiência e perícia de um ancião. 3
O contrato firmado entre o médico e o paciente é intuito personae, isto é, um ato de confiança para as duas partes, principalmente do paciente que escolhe o médico. É, ainda, um contrato de trato sucessivo, bilateral, oneroso e pode ser rescindido por ambas as partes.
O médico, na concepção do Código de Defesa do Consumidor, é tido como um profissional liberal fornecedor de serviços, consoante dispõe o artigo 3º, uma vez que é pessoa física que desenvolve atividade de prestação de serviços.
Por sua vez, o paciente é considerado, pelo código retro mencionado, como um consumidor, previsto no artigo 2º, pois é uma pessoa física que utiliza os serviços do fornecedor. Nestes casos caberá a inversão do ônus da prova na responsabilidade civil do médico.
Tema cada vez mais incidente no Judiciário Brasileiro, a responsabilidade civil do médico, matéria de relevante importância social por tutelar direitos fundamentais consagrados na Constituição Federal de 1988, tais como a vida e a integridade física, vem trazendo a bojo questões controvertidas que movimentam os Tribunais pátrios e os estudos doutrinários mais reconhecidos do país.
Leciona o doutrinador Fabrício Zamprogna Matielo, que a existência de uma obrigação de meio é a única solução que pode justificar a liberdade de atuação do profissional de saúde, pois, se fosse ele vinculado a um resultado específico, fatalmente estaria derrubada até mesmo a teoria da contratualidade nas relações médicos/pacientes, haja vista o fato de que muitas doenças ainda são incuráveis e todo esforço contra elas despendido nada mais será do que mera tentativa de minimizar o sofrimento e melhorar a qualidade de vida durante o tempo que restar ao paciente. 9
Assim, a falta de utilização dos meios necessários ao tratamento do paciente, estando os mesmo disponíveis sem gravames pecuniários ou pessoais ao médico, leva à demonstração da culpabilidade de seu procedimento, caracterizando o erro e o dever de indenizar em caso de superveniência de resultado danoso. Provando que foi diligente e que observou todas as regras técnicas da profissão e as recomendações ditadas pela experiência comum, estará o médico afastado da possibilidade de sofrer reprimendas civis ou penais, porque dele nada mais se exige. 10
Nestas hipóteses, o profissional assume o dever específico e certo de atingir o objetivo, sendo que o que importa é o resultado final. Nessa modalidade de atividade com obrigação de resultado, podemos citar como exemplos as áreas de cirurgia plástica, análises clínicas, bioquímica, anestesiologia e radiologia, conforme entendimento majoritário da doutrina.
A obrigação de resultado nas cirurgias plásticas, para fins de estética, deriva da expectativa criada pelo profissional no sentido de que a aparência irá sofrer alterações positivas após a intervenção, destinando-se esta tão somente ao propósito embelezador. Já nas cirurgias plásticas corretivas, ou seja, aquelas que têm por finalidade corrigir deformidade física congênita ou traumática, a obrigação do médico continua sendo a de meio, uma vez que o médico não se compromete a um resultado determinado.
Sérgio Cavalieri Filho, aduz que mesmo nos casos em que a obrigação do médico é de resultado, prevalece a responsabilidade subjetiva, embora a culpa seja presumida. Assim, no caso de insucesso na cirurgia estética, por se tratar de obrigação de resultado, haverá presunção de culpa do médico que a realizou, cabendo-lhe elidir essa presunção mediante prova da ocorrência de fator imponderável capaz de afastar o seu dever de indenizar. 6
É importante ressaltar que muitas vezes o resultado lesivo é fruto exclusivo do paciente, que deixa de seguir as instruções, recomendações e exigências formuladas pelo profissional, direcionadas à sua recuperação. Neste caso, seria de todo injusto e ilegal creditar ao médico a piora do estado de saúde, a superveniência de agravação das condições originais ou o óbito do paciente, simplesmente porque este foi o resultado final que se contrapôs ao inicialmente estabelecido.