EM QUE CONTEXTO SURGIU O REGIME DIFERENCIADO DE CONTRATAÇÕES - RDC E QUAIS SUAS CARACTERÍSTICAS E INOVAÇÕES?

RDC E QUAIS SUAS CARACTERÍSTICAS E INOVAÇÕES

08/08/2018 às 19:04
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Trata-se, este estudo, de uma análise e entendimento bibliográfico da situação contextual em que se deu o surgimento do RDC, com ênfase as suas inovações.

1 - INTRODUÇÃO

A inserção da Lei nº 12.462/2011, denominada Lei do Regime Diferenciado de Contratações - RDC, apareceu gerando amplos debates no meio jurídico, intercalando com o tema das licitações públicas, sem restrições ao grupo acadêmico ou a profissionais de Direito. Quando surgiu, foram mostrados flagrantes inconstitucionais na lei, veio então constantes e calóricos debates sobre os receios do modo correto de sua aplicação, de suas inovações e o receio maior da possibilidade de descontrole das verbas públicas.

Terminada a euforia, notou-se procedente críticas geradas por alguns juristas, no entanto também se observou que a novel legislação trouxe importantes e esperadas soluções para a Administração Pública desenvolver o mister da atividade administrativa relacionada às aquisições públicas.

O modo desafiador e interrogativo trazidos pela RDC ainda sim em pleno 2018 encontra-se para muitos em fase inicial de enfrentamento. Cabendo assim a reflexiva crítica, não deixando de levar em consideração o péssimo ambiente administrativo no qual o Regime Diferenciado de Contratações - RDC será aplicado, pelas pessoas envolvidas em sua aplicabilidade, seja o legislador, intérprete, os acadêmicos do Direito, o particular licitante e contratado, visando o aperfeiçoamento da norma.

Este trabalho tem como objetivo mostrar as principais características acopladas pela lei em foco.

A pesquisa está sustentada em uma metodologia que se enveredou em pesquisas bibliográficas, de caráter qualitativo revistas e artigos científicos de autores específicos, tendo como principal fonte de pesquisa a análise do entendimento jurisprudencial acerca do tema em ênfase.

2 - NO AMBITO DAS PRINCIPAIS CARACTERISTICAAS E INOVAÇÔES DO RDC - REGIME DIFERENCIADO DE CONTRATAÇÕES.

2.1 O fator aplicabilidade do RDC

A aplicação do Regime Diferenciado de Contratações só torna-se possível no momento em que passe a se inserir em determinadas possibilidades constantes de rol exaustivo constante no art. 1º da Lei nº 12.462, no entanto sua aplicação é facultativa, entretanto, podendo ser aplicada de acordo com a decisão proferida pelo gestor público.

Caso não haja uma inserção de acordo com uma licitação dentro das normas acima descritas veda a aplicabilidade do Regime Diferenciado de Contratações. No entanto, enquadrando-se concretamente nos parâmetros da lei torna-se a possível o seu uso. Porém não obrigatória. Nota-se ao analisar que estas hipóteses davam a entender que o Regime Diferenciado de Contratações fosse apenas uma solução temporária, com aplicabilidade restrita aos eventos esportivos com marco temporal definido, e que com o passar do tempo sumiria com a finalização dos mesmos.

Entretanto, com o passar do tempo incluiu-se novos incisos ao art.1º, ampliando as hipóteses de aplicação do Regime Diferenciado e eliminando esta delimitação temporal de sua aplicação, transformando sua natureza e trazendo à tona a discussão se o novo regime vem, aos poucos, a substituir o regime tradicional trazido pela Lei nº 8.666/93.

O RDC tem aplicabilidade anterior a licitações, deixando a disciplina contratual em segundo plano. Já suas regras para a fase preparatória da licitação anterior à elaboração do edital são de suma importância, uma vez que devem ser obedecidas no caso de contratação direta, a exemplo de uma contratação integrada que não admite licitação, que encontrará suporte na Lei nº 12.462 no caso do preenchimento dos pressupostos do art. 1º.

Com a ressalva que o Regime Diferenciado pode ser aplicado pelos diversos órgãos federativos, embora se espera sempre uma maior aplicação pela União. Asseverando o art. 1º da referida lei, temos: Art. 1o É instituído o Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC), aplicável exclusivamente às licitações e contratos necessários à realização: I - dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, constantes da Carteira de Projetos Olímpicos a ser definida pela Autoridade Pública Olímpica (APO); e II - da Copa das Confederações da Federação Internacional de Futebol Associação - Fifa 2013 e da Copa do Mundo Fifa 2014, definidos pelo Grupo Executivo - Gecopa 2014 do Comitê Gestor instituído para definir, aprovar e supervisionar as ações previstas no Plano Estratégico das Ações do Governo Brasileiro para a realização da Copa do Mundo Fifa 2014 - CGCOPA 2014, restringindo-se, no caso de obras públicas, às constantes da matriz de responsabilidades celebrada entre a União, Estados, Distrito Federal e Municípios; III - de obras de infraestrutura e de contratação de serviços para os aeroportos das capitais dos Estados da Federação distantes até 350 km (trezentos e cinquenta quilômetros) das cidades sedes dos mundiais referidos nos incisos I e II. IV - das ações integrantes do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) (Incluído pela Lei nº 12.688, de 2012); V - das obras e serviços de engenharia no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS. (Incluído pela Lei nº 12.745, de 2012); VI - das obras e serviços de engenharia para construção, ampliação e reforma de estabelecimentos penais e unidades de atendimento socioeducativo. (Incluído pela Lei nº 12.980, de 2014) (MOTTA e BICALHO, 2012 p.70)

§ 1o O Regime Diferenciado tem por objetivos: I - ampliar a eficiência nas contratações públicas e a competitividade entre os licitantes; II - promover a troca de experiências e tecnologias em busca da melhor relação entre custos e benefícios para o setor público; III - incentivar a inovação tecnológica; e IV - assegurar tratamento isonômico entre os licitantes e a seleção da proposta mais vantajosa para a administração pública.

§ 2o A opção pelo RDC deverá constar de forma expressa do instrumento convocatório e resultará no afastamento das normas contidas na Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993, exceto nos casos expressamente previstos nesta Lei.

§ 3o Além das hipóteses previstas no caput, o RDC também é aplicável às licitações e contratos necessários à realização de obras e serviços de engenharia no âmbito dos sistemas públicos de ensino. (Incluído pela Lei nº 12.722, de 2012)

2.2 Situações de aplicabilidade do Regime Diferenciado Complementar- RDC objetivando disciplinar a licitação e a contratação que se fizeram necessários nos eventos esportivos realizados no Brasil.

Serviços e compras necessários aos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016 (inciso I), desde que constantes da Carteira de Projetos Olímpicos, constituída, de acordo com a Lei nº 12.396, de conjunto de obras e serviços selecionados pela Autoridade Pública Olímpica - APO como essenciais à realização dos Jogos.

Serviços e compras necessários à realização da Copa das Confederações de 2013 e da Copa do Mundo de 2014 (inciso II), competições de futebol organizadas pela “Fédération Internationale de Football Association” - FIFA , definidos pelo Comitê Gestor da Copa do Mundo FIFA 2014 - CGCOPA, no caso de obras públicas restringindo-se às constantes da matriz de responsabilidade celebrada entre os entes federativos, que trata das obras prioritárias de infraestrutura das 12 cidades-sede, a exemplo de aeroportos, obras de mobilidade urbana, estádios etc. (MOTTA e BICALHO, 2012 p.71)

Pode-se depreender do inciso II do art. 2º da lei que os demais contratos pertinentes aos referidos eventos podem ser subordinados ao RDC sem estarem inclusos na matriz de responsabilidades, desde que haja manifestação do GECOPA6 de que estes contratos sejam imprescindíveis à realização dos eventos.

O grupo executivo GECOPA, coordenado pelo representante do Ministério do Esporte e formado por membros representantes da Casa Civil da Presidência da República e de vários ministérios conta com equipe constituída pela Advocacia Geral da União - AGU que presta auxílio jurídico aos órgãos e entidades que executaram o Plano Estratégico das Ações do Governo Brasileiro para a realização da Copa do Mundo FIFA 2014. (MOTTA e BICALHO, 2012 p.71)

Contratos para obras de infraestrutura e de serviços para aeroportos das capitais dos estados distantes em até 350 km das cidades-sede dos eventos referidos anteriormente (inciso III), presentes nos dois primeiros incisos, previsão esta presente na lei, uma vez que se supõe a utilização de aeroportos próximos para os deslocamentos de pessoas e bens, utilizandose critério puramente geográfico, não sendo necessário então que estas obras estejam na matriz de responsabilidades ou sejam classificadas como projeto olímpico.

Contratações do Programa de Aceleração do Crescimento - PAC (inciso IV), previsão esta incluída no art. 1º pela Lei nº 12.688/2012, o que, como dito acima, promoveu uma mudança radical no RDC, modificando sua natureza temporária. O PAC é um programa de governo criado em 2007 através do Decreto Federal nº 6.025, que, de acordo com seu art. 1º, é "constituído de medidas de estímulo ao investimento privado, ampliação dos investimentos públicos em infraestrutura e voltadas à melhoria da qualidade do gasto público e ao controle da expansão dos gastos correntes no âmbito da Administração Pública Federal." De acordo com a redação da Lei nº 12.462, as contratações pertinentes ao PAC podem ser subordinadas ao RDC, não se restringindo somente às obras de infraestrutura. (MOTTA e BICALHO, 2012 p.72)

Contratações de engenharia para o Sistema Único de Saúde, construção, ampliação e reforma de estabelecimentos penais e unidades de atendimento socioeducativo e sistemas públicos de ensino (incisos V e VI e § 3º, respectivamente), mais três hipóteses que expressam a tendência de generalização do RDC trazidas pelas Leis nºs 12.745 e 12.722, de 2012, e 12.980, de 2014, que limitam o pressuposto de aplicação do regime às contratações de obras e serviços de engenharia, não abrigando outras espécies de compras, que continuarão a ser submetidas ao regime comum da Lei nº 8.666/93. As leis não trouxeram nenhuma exigência formal ou temporal para a aplicação do RDC nestes casos; logo, infere-se que a modificação pode ser aplicada para obras e serviços de engenharia para o SUS, sistema público de ensino e sistema penal em todos os entes federativos, bastando ser pertinentes a estes. (MOTTA e BICALHO, 2012 p.72)

2.3. Objetivos do Regime Diferenciado Complementar- RDC

O art. 1º da Lei do RDC traz os objetivos do regime em seu § 1º, que se traduzem nos fins buscados especificamente no âmbito do Regime Diferenciado Complementar - RDC, pelo qual toda e qualquer licitação que utilize o novo regime deve obrigatoriamente orientar-se para a realização destes objetivos, não se admitindo qualquer ato concreto que se mostre contrário a estes.

Traduz-se em verdadeiro dever da autoridade administrativa em realizá-los, afastando qualquer margem de discricionariedade em se adotar medidas concretas que não sejam aptas a prover a concretização dos objetivos. Envolve inovações em relação à disciplina geral contida nas leis anteriores, apesar de ter também, como finalidades, as já inerentes à atividade licitatória, como a busca pela eficiência, a promoção da competitividade, o asseguramento da isonomia e a seleção da proposta mais vantajosa, dentre outras, aplicando-se ao RDC as finalidades da licitação do regime comum.

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A distinção com o regime tradicional não reside nas finalidades que dirigem a Lei n.º 12.462, e sim em como atingi-las. Nas palavras de l Justen Filho, “o RDC é uma solução técnico-jurídica diferenciada para promover fins buscados em todo e qualquer procedimento de contratação administrativa” (JUSTEN FILHO,2012)

Para o autor, a inovação contemplada no RDC reflete a intenção de obter resultados específicos e diferenciados, que não eram satisfatoriamente realizados na aplicação dos regimes licitatórios anteriores.

O primeiro objetivo trazido pela lei em seu art. 1º, § 1º, inciso I, é a ampliação da eficiência administrativa e da competitividade entre os licitantes. Como ampliação da eficiência, entende-se que se deve realizar uma elevação no nível qualitativo de desempenho administrativo comparado ao exigido pela legislação anterior, uma vez que esta não assegurava satisfatoriamente a eficiência administrativa. (JUSTEN FILHO,2012)

A promoção da eficiência pode-se traduzir na redução de custos administrativos (custos indiretos, envolvendo pessoal, insumos etc.), redução de tempo (pretende-se que a licitação se desenvolva em tempo inferior comparado ao regime tradicional) e ampliação de vantagens (a avaliação econômica deve ser realizada em face de todos os aspectos, a exemplo da manutenção, que pode ser utilizada como parâmetro para se estabelecer o menor preço). Este aumento de eficiência não deve ser aferido apenas em curto prazo, e sua avaliação deve ser aferida segundos critérios objetivos. (MEIRELLES,2012)

A ampliação da competitividade trazida pelo mesmo inciso tem íntima relação com a ampliação da eficiência, não causando estranheza, portanto, o fato de estarem juntas no mesmo dispositivo legal. Uma maior competição entre os licitantes, integrantes da iniciativa privada e que trazem maior conhecimento sobre o objeto a ser licitado que a Administração Pública, é instrumento importantíssimo para a obtenção da melhor solução, uma vez que se promove a escolha desta mediante o embate das experiências anteriores, conhecimentos práticos e teóricos, além de recursos econômicos. (REZENDE,2014)

Ou seja, a realização do objetivo do particular em licitar (o lucro) vai ao encontro do objetivo da Administração em obter a solução mais vantajosa possível, uma vez que aquele deverá formular a melhor proposta possível com a menor vantagem possível para si para consagrar-se vencedor do certame. Sem competição não se limita o ganho a ser obtido pelo particular, além deste não se interessar em oferecer a melhor solução técnica para a necessidade da Administração.

A competição promove a oferta pelos licitantes da solução mais eficiente, podendo esta ter sido ou não identificada pelo Poder Público. Deve-se buscar uma competitividade justa e equilibrada, através da observância de regras mínimas e o preenchimento de exigências indispensáveis a prevenir riscos de condutas indesejáveis por parte dos licitantes, sempre com foco na proporcionalidade dos requisitos e limites, não sendo válidas exigências ou restrições inadequadas e desnecessárias.

O segundo objetivo (inciso II) consiste na troca de experiências e tecnologias, a fim de promover maior eficiência e qualidade nas contratações do Poder Público. É fato notório a segregação entre os diversos órgãos administrativos, que guardam para si as experiências positivas e negativas com contratações públicas, além de boas práticas desenvolvidas internamente, não se compartilhando com os demais as conquistas alcançadas. Desta forma, este objetivo tem como perspectiva a troca de experiências para que dificuldades comuns sejam combatidas em conjunto, e que boas práticas sejam difundidas, o que traz inegável avanço na condução das contratações públicas. (REZENDE,2014)

Já como terceiro objetivo (inciso III), temos o incentivo à inovação tecnológica, que deve ser entendida do ponto de vista interno, com a promoção da inovação tecnológica da atividade administrativa, e sob o ponto de vista externo como a promoção do desenvolvimento tecnológico da iniciativa privada. Finalmente tem-se o quarto objetivo (inciso IV), que é a promoção da isonomia e da vantajosidade. Com este objetivo, pode-se depreender que a promoção dos demais objetivos não autoriza a mitigação da isonomia, nem autoriza contratações destituídas de vantajosidade para a Administração Pública. (MEIRELLES,2012)

2.4 O Regime Diferenciado Complementar- RDC e os princípios norteadores do procedimento licitatório

A lei que trouxe o Regime Diferenciado de Contratações ao ordenamento jurídico brasileiro apresenta em seu art. 3º diversos princípios com grande semelhança aos já trazidos pela Lei n.º 8.666 e demais leis que versam sobre procedimento licitatório e contratações públicas. Os princípios são idênticos, com as diferenças relacionando-se basicamente às soluções técnicas licitatórias.

Uma diferença que pode ser apontada é que os princípios presentes no art. 3º da Lei nº 8.666/93 referem-se à licitação, enquanto que os presentes no art.3º da Lei nº 12.462/11 disciplinam tanto a licitação quanto os contratos administrativos.

Tal diferença pode, à primeira vista, ser vista como irrelevante, porém a inclusão dos contratos administrativos pela Lei do RDC mostra vontade legislativa no sentido de garantir que a atividade administrativa envolvida no processo licitatório produza resultados concretos mais satisfatórios à sociedade brasileira, uma vez que é o contrato e sua execução que trazem benefícios para todos, e não o meio para se conseguir este produto - o procedimento licitatório isolado, que por si só não produz efeito algum de satisfação dos interesses públicos ou privados. (MOTTA e BICALHO, 2012 p.74)

O art. 3º traz um rol de princípios que devem ser compatibilizados por meio da proporcionalidade (ou razoabilidade), que regra a realização conjunta, harmônica e concomitante destes, e que se desenvolve sob três elementos: a) a medida deve ser apropriada para o atingimento do objetivo (elemento de idoneidade ou adequação); b) a medida deve ser necessária, ou seja, não existe medida menos restritiva disponível (elemento de necessidade); e Conforme lecionam Motta e Bicalho (2012), "sua previsão no âmbito do RDC ratifica o esforço estatal e legislativo na busca da autos sustentabilidade tecnológica e industrial do país, (...) a propósito do Programa Complexo Industrial da Saúde, cujo objetivo é capacitar laboratórios públicos nacionais a produzirem os medicamentos considerados essenciais pelo Ministério da Saúde (...)"(MOTTA e BICALHO, 2012 p.74)

c) as restrições decorrentes da medida devem ser proporcionais ao objetivo (elemento da proporcionalidade strictu sensu).

Apesar do princípio da proporcionalidade não estar explícito no texto constitucional nem na Lei do RDC, não se pode olvidar de sua importância, sendo princípio instrumental que norteia e controla a aplicação e a interpretação do Direito, trazendo como consequência a supremacia dos valores e princípios fundamentais. Pode-se afirmar que o procedimento licitatório objetiva a seleção de proposta de contratação de um particular pela Administração Pública, orientado à consecução de duas finalidades essenciais: a concretização do princípio da isonomia e a obtenção da proposta mais vantajosa. (MOTTA,2012)

Daí retira-se a grande importância da isonomia e da eficiência econômica. A isonomia, ou igualdade, está prevista em vários dispositivos da Constituição Federal, a exemplo do art. 5º, caput, e do art. 19, inciso III, com previsão específica de sua aplicação, no âmbito das licitações, no art. 37 inciso XXI. A isonomia se faz de grande importância na contratação de terceiros pela Administração Pública, devido à sua finalidade de evitar a discriminação arbitrária produto de preferências pessoais do administrador, sendo a licitação instrumento para se concretizá-la.

Traduz-se no tratamento igual para situações iguais, e na distinção na medida das diferenças, o que traz a noção de que nem todas as discriminações acabarão por ferir a isonomia, uma vez que o ordenamento jurídico as admite desde que sejam adequadas e necessárias a obter um resultado compatível com os valores tutelados por este. Há que se lembrar de que estas discriminações devem ser de ordem objetiva, devem ser jurídicas, devem ter um critério proporcional, com adequação de fim e meio, e devem ser adequadas e necessárias em vista dos valores jurídicos. (MOTTA,2012)

A isonomia pode ser traduzida, na ótica da tutela aos interesses individuais dos particulares, como o livre acesso de todo e qualquer interessado à disputa pela contratação administrativa, sendo vedada à Administração a escolha de um particular sem a observância do procedimento seletivo adequado e prévio com exigências objetivas e proporcionais.

Já sob o enfoque da tutela aos interesses coletivos, configura-se como a multiplicação de ofertas e aprimoramento da competição entre os particulares, que como consequência produz contratações mais vantajosas à Administração, através da redução de preços e da elevação da qualidade.

No âmbito do Regime Diferenciado Complementar- RDC, em dois momentos a isonomia se mostra presente: na elaboração do ato convocatório e ao longo do procedimento licitatório. Na primeira fase, quando a Administração adota critérios de diferenciação para a convocação dos licitantes, dever-se-á utilizar critérios compatíveis com o ordenamento jurídico pátrio, sob o enfoque da proposta vantajosa e para utilização da licitação para promoção de finalidades sociais, a exemplo do tratamento diferenciado para microempresas e empresas de pequeno porte trazido pela Lei Complementar nº 123. Exemplos de violação da igualdade pelo instrumento convocatório são: discriminação desvinculada do objeto da licitação; exigência que não tem vínculo com vantagem para a Administração; imposição de requisitos desproporcionais etc. (MOTTA,2012)

Já na segunda fase (fase externa do procedimento licitatório) exige-se o tratamento igualitário, na qual todos os participantes tenham tratamento isonômico. A eficiência econômica se traduz na seleção da proposta mais vantajosa e na execução contratual norteada na eficiência e economicidade.

Vantagem neste caso consiste na satisfação adequada do interesse público através da execução contratual, sendo que ela é maximizada quando se atinge a maior relação custo benefício, ou seja, o menor custo e maior benefício para a Administração.

Pode ser observada sob o enfoque econômico, que desencadeará na avaliação da eficiência, uma vez que o Estado possui recursos limitados para a consecução de todas as suas necessidades, e desta forma, se mostra maior vantagem para o Estado quando a solução mostra maiores benefícios para a aplicação de seus recursos econômicos financeiros, onde a utilização mais eficiente de recursos para o atendimento de uma necessidade traz maiores possibilidades de outras necessidades terem recursos para serem satisfeitas. (MOTTA,2012)

Porém o enfoque econômico não é o único possível, podendo-se vislumbrar também outros, como por exemplo, o enfoque na defesa do meio ambiente. Caso se tenham duas propostas com preços diversos para o atendimento de uma necessidade, e a de menor preço seja mais nociva à natureza, há de se pesar os valores envolvidos, justificando, por exemplo, a contratação com o participante que apresentou o maior preço desde que se mostre mais vantajosa do ponto de vista ecológico.

Tratando do rol de princípios expostos no art. 3º, temos primeiramente o da legalidade. Este princípio traz a noção de que o processo licitatório deve necessariamente se sujeitar ao ordenamento jurídico, vinculando o administrador ao conteúdo legal e ao ato convocatório. É vedado à autoridade administrativa adotar providências ou restrições sem autorização legal, não sendo suficiente somente a compatibilidade de seus atos com a ordem jurídica, mas necessitando de uma autorização legislativa específica, mesmo que implícita.

A aplicabilidade das normas em matéria de licitação envolve interpretação sistemática destas, sendo a interpretação literal ou gramatical apenas a primeira etapa. Nem se pode exigir que a lei dispusesse sobre todas as situações fáticas de forma detalhada, o que seria impossível.

O que existem são leis que instituem competências vinculadas (a norma legal disciplina, mesmo que de modo implícito, a conduta a ser adotada pelo agente) ou discricionárias (existe uma margem de escolha para o agente na solução do caso concreto), sendo estas últimas predominantes na Lei nº 12.462, uma vez que o processo licitatório não poderia ser integralmente vinculado à lei, sob pena de inviabilizá-lo, já que seria impossível disciplinar todos os tipos de licitação previamente, atrapalhando inclusive o aperfeiçoamento da contratação administrativa.

Neste sentido, se impõe limites gerais ao administrador, atribuindo-lhes competências para escolher dentro destes parâmetros previamente determinados. Já o princípio da impessoalidade dita que todas as decisões relativas à licitação devem ser tomadas sem levar em consideração a identidade do particular ou a preferência subjetiva da autoridade responsável, sendo vedadas suas preferências ou reservas relacionadas à identidade ou atributos dos participantes da licitação ou contratados.

A resolução do certame não pode se basear em características pessoais dos licitantes, a não ser que haja indicação em lei ou indicação no edital como necessidades para contratação. Podendo tomar como impessoal uma decisão que derive racionalmente de fatores alheios à vontade do tomador de decisões, ou seja, implica que a decisão independa da identidade deste, traduzindo-se em um julgamento imparcial, neutro e objetivo.

3. CONCLUSÃO

O presente trabalho mostrou as principais características, inovações e alguns entraves que geram discussões acerca do Regime Diferenciado de Contratações, que, após sua inserção constatou-se a não aceitação. Porem depois com o tempo mesmo inserido de problemas e virtudes, ampliou-se aos poucos, conquistando assim seu espaço de aplicação em razão da visível necessidade da Administração Pública brasileira de dota-se de maior celeridade aos processos de licitação.

As diversas alterações legislativas acometidas pela Lei nº 8.666/93, conjunto com as críticas a ela inseridas, foram fatores determinantes na necessidade de novos parâmetros licitatórios e contratuais, objetivando a reversão da burocratização do processo licitatório existente, consequência do grande índice de formalidades.

Mesmo que a Lei nº 8.666/93 cerque as licitações e contratações públicas, diariamente tem sua utilização diminuída favoráveis dos sistemas que concernem uma maior agilidade e eficiência a este âmbito administrativo, demostrando claríssima tendência de sua substituição em favor do cenário no qual se destaca o Regime Diferenciado de Contratações -RDC.

O Regime Diferenciado de Contratações –RDC, por sua vez, é eficaz, sendo célere e amplamente competitivo com seus fatores, muitos deles parecidos aos existentes no setor privado.

REFERÊNCIAS

FIUZA, Eduardo P. S. O Regime Diferenciado de Contratações públicas e a Agenda Perdida das Compras Públicas. Radar: Tecnologia, Produção e Comércio Exterior, IPEA. n º 19. Brasília, 2012.

JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 15ª ed. São Paulo: Dialética, 2012.

______________________. Comentários ao RDC: (Lei 12.462/11 e Decreto 7.581/11). 1ª ed. São Paulo: Dialética, 2013.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 38ª ed. São Paulo: Malheiros, 2012.

MOTTA, Carlos Pinto Coelho; BICALHO, Alécia Paolucci Nogueira. RDC: Contratações para as copas e jogos olímpicos: Lei nº12.462/2011, Decreto nº7.581/2011. Belo Horizonte: Fórum,2012.

REZENDE, Renato Monteiro de. O Regime Diferenciado de Contratações Públicas: Comentários à Lei nº 12.462, de 2011. Senado Federal, Núcleo de Estudos e Pesquisa do Senado. Agosto/2011. Acesso em 02 de novembro de 2014

Sobre o autor
Luiz Fellipe Maia Bonfim

* Pós - graduado em Direito Constitucional e Administrativo - CENTRO UNIVERSITÁRIO CESMAC * Consultor Jurídico - Regime Geral de Previdência Social - RGPS; • Especialista na lei 8.666/93 (lei de Licitações); * Especialista na Lei Geral da Micro e Pequena Empresa (Lei Complementar Federal 123/2006); • Especialista em Planejamento e coordenação de fóruns, seminários e workshops; • Atividades de representação institucional; • Participação em Grupo de desenvolvimento de Políticas Públicas e Marcos Legais para o Terceiro Setor.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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