A distinção entre os institutos da meação e da herança, na esfera do direito das sucessões, é tanto objeto de confusões teóricas quanto de debates sobre sua aplicação em contextos de casamento e união estável, especialmente após a decisão do Supremo Tribunal Federal nos autos do Recurso Especial n. º 646.721.
Prima facie, os dois conceitos diferenciam-se funcionalmente. Isso pois a meação é direito relativo aos relacionamentos, seja em casamento ou em união estável, enquanto que o direito à herança advém do evento morte, engendrando uma cadeia sucessória.
Assim sendo, a meação, modulada pelo regime de bens escolhido, independe da morte do cônjuge ou companheiro, produzindo efeitos desde o início da relação jurídica. Destarte, a partir do momento em que é celebrado o casamento ou daquele em que se verifica o affectio maritalis e a convivência more uxorio[2], há direito à meação.
Sob essa ótica, “o que se quer dizer é que ambos os cônjuges possuem, na constância do matrimônio [e da união estável], a propriedade total dos bens e direitos que integram a união, sendo estes considerados como uma só universalidade. Assim, ambos são proprietários do mesmo todo, que somente será individualizado por meio da partilha, se e quando houver dissolução da sociedade conjugal" [3].
Por essa razão, sobre o patrimônio amealhado não incide imposto, pois a a meação é direito automaticamente concedido a partir do início da relação jurídica. Não é o que ocorre na herança.
A herança, conforme mencionado, é direito sucessório, que só exsurge do falecimento de outrem. Nesse caso, haverá taxação por ITCMD (Imposto de Transmissão por Causa Mortis) ou ITBI (Imposto de Transmissão de Bens Imóveis), a depender da natureza do bem a ser transmitido por herança.
Isso porque, nesse caso, apesar de transmitir-se a herança aos herdeiros legítimos e testamentários logo após a abertura da sucessão, pelo princípio de Saisine (art. 1.784, Código Civil), a propriedade do bem haverá de ser transferida. Na meação, por outro lado, não há transferência propriamente dita, mas sim — e se houver — partilha da universalidade dos bens que constavam na união.
[1] “Comunhão de vidas, no sentido material e imaterial, em situação similar à de pessoas casadas. Envolve a mútua assistência material, moral e espiritual, a troca e soma de interesses da vida em conjunto, atenção e gestos de carinho, enfim, a somatória de componentes materiais e espirituais que alicerçam as relações afetivas inerentes à entidade familiar” (GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: direito de família. Vol. 6, Ed. 11. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 410).
[2] “Ânimo ou objetivo de constituir família. O elemento subjetivo é essencial para a configuração da união estável. Além de outros requisitos, é absolutamente necessário que haja entre os conviventes, além do afeto, o elemento espiritual caracterizado pelo ânimo, a intenção, o firme propósito de constituir uma família” (GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: direito de família. Vol. 6, Ed. 11. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 412).
[3] CANHEU, Gustavo Casagrande. Da partilha de desigual de bens na separação ou divórcio. Incidência de ITBI ou ITCMD? Colégio Notarial do Brasil: Conselho Federal, 2015. Disponível em: <http://www.notariado.org.br/index.php?pG=X19leGliZV9ub3RpY2lhcw%3D%3D&in=NTUwNg%3D%3D>. Acesso em 15 dez. 2017.