Segurança pública: reflexões sobre a repressão ao tráfico ilícito de crack como política pública fundamental na diminuição de crimes patrimoniais

12/09/2018 às 11:58
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O presente artigo visa investigar sobre o crack, o uso e o tráfico ilícito desta substância, ainda, relacioná-lo a crimes contra o patrimônio, sobretudo o furto de pequena monta, na tentativa de elucidar um perfil de política pública e sua eficácia.

RESUMO

            O presente artigo visa investigar sobre o crack, o uso e o tráfico ilícito desta substância, ainda, relacioná-lo a crimes contra o patrimônio, sobretudo o furto de pequena monta, na tentativa de elucidar um perfil de política pública e sua eficácia. A exegese inicia-se na espécie de droga investigada, passando à pessoa que dela é refém (usuário), e chegando à sua conexão com crimes patrimoniais. Em dialética, vislumbra-se a presente investigação à análise de algumas medidas de tratamento de viciados, análise da oferta/procura, bem como o debruçar sobre a resposta estatal através de programas e destinação de recursos, no intuito de se chegar a um apontamento eficaz, válido e eficiente de um paradigma dentro da seara da segurança pública.

PALAVRAS-CHAVES: crack; vício; tratamento; criminalidade.

INTRODUÇÃO

           

O presente artigo aborda questões envolvendo a sistemática do uso de drogas (crack), relacionando-o em seu contexto social, tal seja, usuários, traficantes, compra, venda, uso, recursos financeiros; desaguando na lógica atual de atuação estatal frente esta problemática da segurança pública, analisando possíveis alterações de destinação de esforços para atingimento de metas legais já delineadas. Para tanto, a pesquisa terá o caminho de investigação teórica. O objetivo geral é refletir sobre as atuações estatais através de suas políticas públicas na seara da segurança pública e sua atuação quanto ao tráfico ilícito de crack, traçando um paralelo com as intenções legislativas e, ainda, a intrínseca relação deste com crimes patrimoniais. A problematização se galga em identificar políticas públicas apontadas pela legislação sobre o tema investigado, verificar as medidas para concretização destas por parte do Estado, e analisar se há uma preterição da repressão pelas forças policias quando da destinação dos recursos estatais; ainda, verificar uma possível correlação entre o tráfico ilícito de crack com crimes patrimoniais. Por fim, vislumbra-se uma investigação firmada, e com atenção, em políticas públicas, sobretudo do contexto da segurança pública, gerando, neste aspecto, valorosa colaboração com a sociedade de maneira geral, a qual capta cotidianamente os efeitos negativos do tráfico ilícito de drogas já há algumas décadas. Assim, a pesquisa se justifica diante das pretensões firmadas em lei sobre o assunto e da avaliação de sua eficácia dentro do contexto da segurança pública.

DESENVOLVIMENTO

O crack

            Entre as espécies de drogas vislumbra-se a substância conhecida popularmente como crack, a qual encontra-se inserida nas substâncias psicoativas sintéticas. Tem-se que “o crack é uma droga de coloração branca, que obteve essa denominação devido ao som gerado no momento em que o produto entra em contato com o fogo”. (ESCOHOTADO, 1997, p. 156). Assim, devido o ruído produzido pela porção petrificada dessa substância quando de sua incineração, ela foi apelidada e identificada como “crack”, sendo mais comumente encontrada em porções esbranquiçadas tendentes ao amarelo.

            Tem-se que para a sua produção há o pisoteio de folhas de coca misturadas com querosene, as quais, maceradas em ácido sulfúrico diluído, chega-se à pasta-base de cocaína. Desta pasta, adiciona-se bicarbonato de sódio, chegando-se ao crack. Neste ponto, observe-se que o crack advém de um mesmo processo no qual a cocaína é produzida, sendo que em algum ponto da produção se guina para esta ou para aquela substância, não sendo o crack o resto de uma produção de cocaína. Quanto ao uso, temos que “as formas mais comuns de uso do crack são a queima da substância juntamente com cinzas de cigarro ou mesmo com maconha (...) cachimbos de vidro, ou pipas improvisadas”. (ALBURQUEQUE, p. 20, 2010) São também conhecidas como “maricas” os cachimbos improvisados confeccionados pelos usuários.

            Ainda sobre o uso, há defensores de um certo ritual para o usuário desta substância, advindo a ideia de que “o ritual que antecede o uso parece fazer parte do prazer oferecido pela droga. O preparo do cachimbo, onde é utilizado material caseiro, (...) é uma fase importante na busca do prazer”. (NAPPO, 1999, p. 2019).

            Na busca desse prazer, o usuário desta substância, tal seja, o crack, experimenta a construção de uma dependência química, tendo fator relevante o elemento da fissura. Tem-se que “a satisfação não aceita prazos, nem substituição de objetos. A falta a ser não parece provocada por um objeto não nomeável e irrecuperável, mas por um artifício, que, sobre o invólucro do objeto da demanda, mascara o sujeito do desejo”. (LEITE, 1999, p.16)

            A fissura, conforme aventado cientificamente acima, detém um prisma de significado na cultura do usuário de crack, é a vontade exacerbada de uso da droga novamente, uma espécie de vontade fisiológica, como se fosse propriamente uma “necessidade fisiológica”. Desta forma, é perceptível a alteração comportamental dos usuários neste estágio de fissura, gerando amplas ações, criminais ou não.

            Ao longo dos anos a relação do consumidor de drogas com o vendedor traficante varejista veio se adequando a realidades de repressão ou de ausência dela. O Brasil, dada a longa fronteira e a proximidade com países produtores de coca, viu o uso do crack assolar os municípios com vendas comumente verificadas de preços que variam de cinco a dez reais a unidade (pedra/lasca).

Como parâmetro, encontramos na literatura menções de que no Japão, na década de 90, o quilograma da cocaína era vendido no mercado escuso pelo valor de cem mil dólares, na Espanha por trinta mil dólares e, em Miami, dado o avanço Colombiano sobre aquele território, treze mil dólares. (CAMPOS, 2014)

            Ressalta-se que a América Latina detém os três maiores produtores de folhas de coca do mundo: Peru, Bolívia e Colômbia, todos próximos ao Brasil, o qual detém uma larga malha viária e aérea que possibilita grande consumo e, ainda, ser rota para Europa e Ásia.

O usuário de crack

            A quantidade de droga que um indivíduo viciado em determinada substância utiliza por dia é ponto de partida para a identificação da sua conduta típica, por exemplo, quando um cidadão é encontrado pelas forças policiais portando substância proscrita.

            Para verificação da importância em delimitar determinadas substâncias proscritas, tem-se a importante contribuição a informação de que, por exemplo, no Estado do Paraná, a “maconha e cocaína, seja esta última na forma de sal ou de crack, correspondem a 97,86% das apreensões”. (GOMES, 2014)

Neste sentido, de acordo com a Pesquisa Nacional sobre o Uso do Crack realizada por meio de parceria entre a SENAD/MJ e a Fundação Oswaldo Cruz – FIOCRUZ, o uso diário de um indivíduo viciado em crack é de 11 até 16 pedras. (GOMES, 2014)

A referida pesquisa destaca, no entanto, que não há como definir de forma minimamente precisa o peso em gramas e o conteúdo do que cada usuário denomina “pedra”. Desse modo, há uma subjetividade intrínseca às definições

utilizadas pelos próprios usuários. Inobstante a ressalva feita pela pesquisa, a Informação Técnica nº 023/2013 SETEC/SR/DPF/RS, constata que cada pedra de crack pode variar de 0,1 a 1,5 gramas. (GOMES, 2014)

            Adiante, considerando o exposto acima, temos que, em um dia de vida, o indivíduo viciado no crack detém um gasto diário de R$110,00 (cento e dez reais) a R$160,00 (cento e sessenta reais), gerando, ao fim de um mês, um valor entre R$3.300,00 (três mil e trezentos reais) a R$4.800,00 (quatro mil e oitocentos reais). Nota-se, nesta esteira de pensamento que o valor de custeio do vício é de quase 5 vezes o salário mínimo atual, o qual é de R$954,00 (novecentos e cinquenta e quatro reais). (MINISTÉRIO DO TRABALHO, 2018)

            Observa-se até este ponto, que a demonstração em linhas do acima evidenciado em um gráfico x e y não tem ponto de interceptação, pois temos uma necessidade do usuário muito além da condição de vida de um brasileiro médio. Em escala de quase cinco para um, a necessidade vence a realidade mínima em uma consideração de mundo ideal onde o sujeito sob enfoque detém um emprego e aufere como rendimentos um salário mínimo por mês, sem nenhum desconto de alimentação, ou seja, uma tópica ideal, apenas para parâmetro da presente investigação.

            Considerando que 78.68% dos usuários de crack são homens, ainda, que 31,32% tem idade entre 18 a 24 anos, que 57,60% estudaram da 4ª a 8ª do ensino fundamental, que 19,55% foram apenas alfabetizados, e que apenas 2% dos usuários de crack detém curso superior, conforme estudo da Fundação Oswaldo Cruz realizado no ano de 2014 (ICICT/FIOCRUZ, 2014), estamos, na verdade, com uma realidade muito aquém da delineada hipoteticamente no parágrafo anterior. Ainda, temos números de 39,04% do total de usuários de crack residindo nas ruas, o que descreve uma situação de penumbra e completa incapacidade financeira.

            Em desenvolvimento à ideia lançada alhures, progride-se à investigação, ou levantamento, de qual a fonte de renda aferida por esses usuários de crack, ou, stricto sensu, de onde provém a poder de compra dos usuários, ou de parte deles? Neste sentido, a Fundação FIOCRUZ produziu interessante enfoque em sua pesquisa, vejamos:

           

Atividades ilícitas, como o tráfico de drogas e furtos/roubos e afins, foram relatados por uma minoria dos usuários entrevistados, 6,42% (IC95%:4,28-9,53) e 9,04% (IC95%:7,11-11,42), respectivamente. Mesmo assim, não se observou serem essas a fonte de renda principal dos usuários de crack e/ou similares, segundo o informado. Cabe aqui ressaltar que provavelmente existe aqui uma subenumeração dessas atividades ilícitas, embora não seja possível estimar em que medida isso ocorreria. (FIOCRUZ, p. 56, 2014)

            Observe que, mesmo sendo uma subnumeração conforme citada acima, temos que cerca de 15 por cento dos usuários admitiram atividades ilícitas para adquirir dinheiro direta e indiretamente para a compra de drogas, fato que já denota um número expressivo em um contexto de análise fria de dados estatísticos. Outro dado para indicar a subnumeração é que a mesma pesquisa aponta que 48,80% dos usuários de crack já foram presos alguma vez na vida. (FIOCRUZ, p. 65, 2014). Desses 48,80%, apenas 39,83% foram presos por crimes patrimoniais, o que já elevaria a quase 20 por cento dos usuários totais com envolvimentos diretos (já com passagens policiais) por crimes contra o patrimônio, o que comprova, como já dito, a subnumeração.

            Adiante, necessita-se averiguar o enlace construído pelas drogas e pela violência, ou seja, o que esta simbiose produz no plano fático social.

A droga e a violência

A relação drogas/violência referenciada por GOLDSTEIN (1985) estipula três vertentes: a primeira decorre dos efeitos psicofarmacológicos das drogas, sendo que em razão destes efeitos alguns indivíduos podem se tornar irracionais a ponto de agirem com violência. A segunda insere-se na formação da compulsão econômica, enquadrando aqui nosso recorte de pesquisa, envolvendo o potencial que a dependência da droga tem na incidência de crimes contra o patrimônio. A terceira, por fim, é a violência sistêmica, relacionada à dinâmica do comércio de drogas, vendas, controle de territórios entre outros aspectos.

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Neste ponto, ressalta-se que alguns usuários de drogas acabam por seguirem em alistamento a atividades criminosas para angariarem fundos para a compra de drogas. Preferimos, neste viés, o entendimento de aquisição de bens para troca por dinheiro para a compra de drogas, ou a troca direta de bens pela droga, e não o entendimento de que se trata de um crime para o “sustento”, pois não será a ausência da droga que fará o indivíduo perder o seu vício nela, sendo, na verdade, um crime para o gozo do vício, e não para o sustento dele.

A Secretaria Nacional de Políticas Sobre Drogas

            No âmbito do Ministério da Justiça, ligado ao executivo federal, houve a criação da Secretaria Nacional de Políticas Sobre Drogas (SENAD), criada originalmente pela Medida Provisória 1669, de 1998, e depois transferida para a estrutura do ministério em 2011. Entre suas atribuições, entre outras, constam as seguintes:

(...) articular e coordenar as atividades de prevenção do uso indevido, a atenção e a reinserção social de usuários e de dependentes de drogas e as atividades de capacitação e treinamento dos agentes do Sistema Nacional de Políticas sobre Drogas; apoiar as ações de cuidado e de tratamento de usuários e dependentes de drogas, em consonância com as políticas do Sistema Único de Saúde e do Sistema Único de Assistência Social; desenvolver e coordenar atividades relativas à definição, à elaboração, ao planejamento, ao acompanhamento, à avaliação e à atualização de planos, programas, procedimentos e políticas públicas sobre drogas; (...) (BRASIL, 2007)

            Neste passo, como política pública, há anos a atenção vem sendo dada no setor de prevenção e tratamento, sendo que o SENAD viabilizou o Programa Crack, o qual tem em seu bojo, o compêndio de informações sobre a droga e seus efeitos, a prevenção, superação e o tratamento. Nota-se que a repressão sequer é aventada no principal programa sobre drogas e saúde pública do Brasil.

            O SENAD então, mesmo estando no Ministério da Justiça, é apoiado por órgãos da saúde e da assistência social, mas não há, nenhum desenho macro no sentido da repressão.

            Pelo Sistema Único de Saúde, tem-se as Unidades Básicas de Saúde/centros de saúde, que “oferecem atendimento médico, e/ou de outros profissionais que farão uma primeira avaliação do usuário para que ele inicie o tratamento na própria unidade ou seja encaminhado para o serviço especializado” (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2018). Tem-se os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), onde há um “serviço especializado de atenção aos usuários que oferece atendimento médico psiquiátrico, psicológico e de outros profissionais, distribuição de medicação e apoio para as famílias” (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2018). Ainda, há o Consultório na Rua, que oferecem “atendimento aos dependentes químicos ocorre um ambulatório móvel por equipe formada por médicos, psiquiatras, enfermeiros, assistentes sociais, psicólogos e pedagogos” (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2018).

            Ainda no Sistema Único de Saúde tem-se o Programa de Redução de Danos, com “ações preventivas e de acolhimento, como avaliação, atendimento e encaminhamento para rede de saúde e de assistência social” (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2018); o Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF), com “equipes compostas por profissionais de diferentes áreas de conhecimento, que atuam junto aos profissionais das equipes de Saúde da Família” (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2018); o Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas III (CAPS ad 24 horas), que aponta um “serviço específico para o cuidado, atenção integral e continuada às pessoas com necessidades em decorrência do uso de álcool, crack e outras drogas” (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2018); ainda, o Centro de Atenção Psicossocial para Infância e Adolescência (CAPSi), com o “serviço que acolhe crianças, adolescentes e jovens até 25 anos de idade, com transtornos mentais e/ou com problemas em decorrência do uso de álcool, crack e outras drogas, observando as orientações do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)” (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2018); as Enfermarias Especializadas, as Unidades de Acolhimento Adulto (UAA), Unidades de Acolhimento Infanto-juvenil (UAI) e, por fim, as Comunidades Terapêuticas, as quais “oferecem atenção e cuidado aos adultos, de ambos os sexos, com necessidades em decorrência do uso de álcool, crack e outras drogas, que apresentem quadro clínico estável” (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2018) .

            Junto ao Sistema Único de Assistência Social, temos os Centros de Referência de Assistência Social e os Centros de Referências Especializada de Assistência Social.

            Pois bem, analisemos outra faceta do mesmo prisma, ou seja, de onde vem recursos para a sustentabilidade dos programas de atenção aos usuários de drogas, o FUNAD.

            O Fundo Nacional Antidrogas é gerido pela SENAD, e tem seus recursos constituídos de dotações do orçamento da União, de doações, de recursos de qualquer bem de valor econômico, apreendido em decorrência do tráfico de drogas de abuso ou utilizado em atividades ilícitas de produção ou comercialização de drogas, após decisão judicial ou administrativa tomada em caráter definitivo.

            Nesta ótica, tem-se que os recursos deste fundo são aptos a ações, programas e atividades de repressão (grifo nosso), tratamento, recuperação e reinserção social de dependentes de substâncias psicoativas. Temos autores que entendem o inverso, que a “rede pública de saúde gasta milhões e milhões de reais com dependentes de droga, mas seu consumo não colaborou com nenhum centavo aos cofres públicos”. (CAMPOS, 2014, p.125)

            Continuando a investigação, temos junto ao Portal da Transparência do Governo Federal que no ano de 2017, 39% (trinta e nove por cento) dos contratos/convênios do FUNAD foram celebrados com Entidades Sem Fins Lucrativos, 9% (nove por cento) celebrados com Organismos Internacionais, e 7% (sete por cento) com Fundo Público. Ainda, temos apenas 22% (vinte e dois por cento) de recursos contratados com a administração pública estadual, e destes, temos que entre as 10 (dez) maiores recebedoras de recursos são unidades de Secretarias de Saúdes (estaduais), demonstrando de sobremaneira que existe uma preponderância da prevenção e tratamento na destinação de recursos para o enfrentamento às drogas.

            Em contrapartida a essa política pública, observou-se em 2005, no II Levantamento Domiciliar sobre Uso de Drogas Psicotrópicas no Brasil, houve o apontamento de que 0,7% dos entrevistados usaram crack uma vez na vida, e 0,1% dos entrevistados usaram crack no último mês/e no último ano. Em 2012, conforme Pesquisa Nacional Sobre o Uso do Crack, 0,81% da população nas capitais informaram o uso de Crack.

A Segurança Pública           

            Temos que a Segurança Pública que tem um objeto definido, qual seja: a manutenção da ordem pública. Para tanto, os órgãos encarregados de exercê-las, tais sejam, Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Polícia Ferroviária Federal, Policias Civis, Polícias Militares e Corpo de Bombeiros Militares, atuam para preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio. No tocante à segurança, temos que esta “tem em vista a convivência pacífica e harmoniosa da população, fundando-se em valores jurídicos e éticos, imprescindíveis à existência de uma comunidade”. (CARVALHO, 2011, p. 1227).

            Dentro deste sistema de segurança pública, faz-se menção o trabalho das polícias judiciárias, ou seja, as polícias que atuam na atividade repressiva, tais sejam: Polícias Civis e Polícia Federal.

            Observe-se como exemplo o Estado do Tocantins, a Polícia Civil do Estado do Tocantins detém uma Delegacia Especializada no Combate ao Narcotráfico – DENARC/Palmas, sendo que os cerca de 270 mil quilômetros quadrados de extensão e os 139 municípios são atendidos por apenas uma unidade especializada que conta com apenas um Delegado de Polícia, conforme informações contidas no sítio eletrônico da Secretaria de Segurança Pública do Tocantins. (SECRETARIA DA SEGURANÇA PÚBLICA DO ESTADO DO TOCANTINS, 2018)

            Outro exemplo, o Estado de Minas Gerais, a Polícia Civil do Estado de Minas Gerais detém um Departamento Especializado de Combate ao Narcotráfico, composto de seis delegacias de polícia que atuam na capital do Estado. Não há nenhuma outra unidade avançada, sendo que Minas Gerais detém 853 municípios e 586 mil quilômetros quadrados. (POLÍCIA CIVIL DO ESTADO DE MINAS GERAIS, 2018)

            Esses parcos recursos disponibilizados pelo Estado na repressão acabam por propiciar uma forte condição para o tráfico ilícito de drogas organizado no Brasil, gerando uma base de construção para os narcotraficantes:

Diversas razões fizeram do Brasil um local propício às atividades de trânsito e exportação; entre eles: falta de uma política séria e eficaz no combate a esse tipo de crime (...) insuficientes condições de policiamento, com um efetivo muito baixo para vigiar fronteiras, portos e aeroportos; falta de pessoal especializado e de equipamentos adequados, e outros. “grifo nosso” (STEIMAN, apud CAMPOS, 2014, p. 129)

            Frisa-se que a repressão é tratada como aspecto subalterno, mas a redução de oferta se tratava desde o início da consolidação das políticas públicas sobre o tema como a principal proa. A Resolução n.3, de 27 de outubro de 2005, do CONAD, aprovou sua Política Nacional sobre Drogas, e a respeito da redução da oferta de drogas dispôs:

As ações contínuas de repressão devem ser promovidas para a reduzir a oferta das drogas ilegais e/ou de abuso, pela erradicação e apreensão permanentes destas produzidas no país, pelo bloqueio do ingresso das oriundas do exterior, destinadas ao consumo interno ou ao mercado internacional pela identificação e desmantelamento das organizações criminosas. (MARCÃO, 2009, p. 10)

            A Lei 11343 de 2006, conhecida como Lei de Drogas, trouxe nova roupagem legal para o enfrentamento de drogas no país, avançando em diversos aspectos com relação ao diploma legal anterior. Com a nova lei, houve toda uma nova sistemática para a SENAD, bem como para o FUNAD, considerado, assim, um marco de atuação do problema do tráfico ilícito de drogas.

            Mesmo assim, no Brasil não temos, por exemplo, uma DEA (Drug Enforcement Administration) dos Estados Unidos da América, ou seja, não há uma polícia específica para a investigação das organizações voltadas ao narcotráfico, mas, sim, unidades especializadas dentro de cada corporação investigativa, que, como demonstrado acima, sofrem sem conseguir atingir objetivos devido a ausência de destinação de recursos.

CONCLUSÃO

            No decorrer deste trabalho partimos, a priori, em analisar o crack, conceituando-o, identificando-o e o parametrizando, vez que se trata de denominação social dada a uma substância advinda da cocaína. Após, debruçamos sobre o usuário do crack e sobre a fissura criada com o vício nesta substância, chegando até o efeito financeiro, ou seja, vinculamos o uso do crack e o usuário do crack, apontando os contornos econômicos gerados por esta simbiótica relação.

            Adiante, a pesquisa guiou-se pela relação entre a violência e as drogas, estipulando alicerces para, em conjunto com a demonstração estatística, demonstrar a relação de crimes patrimoniais e a atuação do usuário de crack,

      Em terceiro tempo, analisamos o enfrentamento governamental deste problema de segurança pública junto à Secretaria Nacional de Políticas Antidrogas, averiguando a destinação de recursos e a proa de atividade dos órgãos ligados.

            Em quarto momento, direcionamos a análise sobre a Segurança Pública, envolvendo os seus órgãos e o sucateamento de órgãos importantes dentro do sistema proposto legalmente.

Desta forma, no decorrer desta investigação se demonstrou que a atuação estatal com suas políticas públicas detém a proa de ação em três vertentes quando frente às drogas: repressão, prevenção e tratamento.

 Observamos, no processo de análise, que a grande fatia orçamentária é destinada a ações governamentais de tratamento e prevenção, sendo destinado pequena monta à ações repressivas.

  Após, chegamos à informação de que, em que pese as ações de tratamento e prevenção serem a base de ação estatal, esta não conseguiu frear o crescimento de usuários de drogas, sobretudo do crack, usado como parâmetro em parte do trabalho.

   Continuamos a análise sobre as polícias investigativas e sobre a terrível realidade que as assola em níveis estruturais, de pessoal e de equipamentos, atuando de forma mísera em relação ao objeto drogas.

            Nesta convicção, chega-se a resolução de que o aumento de destinação de recursos para combate ao tráfico ilícito de drogas através de suas forças policiais se trata de medida urgente a ser tomada como política pública.

A própria lei estabelece um tripé formado pela prevenção, tratamento e repressão, sendo que nenhuma destas metas pode conseguir chegar ao objeto de redução dos efeitos sociais nocivos se manejados separadamente, e, dois deles também não serão capazes. Assim, somente com a atuação maciça dos três prismas (prevenção, tratamento e repressão) ter-se-á uma alteração da realidade social.

            A destinação de recursos específicos para as unidades que reprimem o tráfico ilícito de drogas é medida que incidirá diretamente na redução de crimes patrimoniais, conforme investigado, sendo, então, caminho trilhado para o sucesso a implementação de medidas que favoreçam esse espectro.

            As policiais investigativas sofrem devido a parcos investimentos que acabam impossibilitando uma derrogada de oferta de drogas, gerando o sentimento comumente conhecido como “enxugar gelo” entre os policiais. Como não há uma polícia específica para o enfrentamento do narcotráfico, dotar as unidades de cada polícia investigativa de suprimentos, pessoal, diárias, equipamentos, veículos é função primordial para atuação a contento.

            Diante do exposto, conclui-se que as políticas públicas no tocante à Segurança Pública não podem ser suprimidas por ações de tratamento e prevenção, devendo ser destinado, também, em números páreos, a ações de repressão qualificada.

REFERÊNCIAS

ALBURQUEQUE, Bernado Starling. Idade doida da pedra: configurações históricas e antropológicas do crack na contemporaneidade. In: SAPORI, Luis Flavio; MEDEIROS, Regina (Org.). CRACK: um desafio social. Belo Horizonte: Ed. PUC Minas, 2010.

BRASIL. Decreto n. 6.061, de 15 de mar. de 2007. Aprova a Estrutura Regimental e o Quadro Demonstrativo dos Cargos em Comissão e das Funções Gratificadas do Ministério da Justiça e dá outras providências. Brasília/DF, mar 2007.

CAMPOS, Rui Ribeiro. Geografia política das drogas ilegais. Leme: Editora JHMIZUNO, 2014.

CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional. 17. Ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2011.

ESCOHOTADO, Antônio. O livro das drogas: usos e abusos, desafios e preconceitos. São Paulo: Dynamis Editorial, 1997.

GOLDSTEIN, P. The drugs/violence nexus: a tripartite conceptual framework. Journal of drugs, v. 14, 1985. Disponível em < http://journals.sagepub.com/doi/abs/10.1177/002204268501500406>. Acesso em: 22 ago. 2018.

GOMES, Maria Tereza Uille. Estudo técnico para sistematização de dados sobre informações do requisito objetivo da Lei 11.343/2006. Secretaria de Estado da Justiça, Cidadania e Direitos Humanos, Curitiba, 2014.

LEITE, M. Cocaína e crack: dos fundamentos ao tratamento. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1999.

MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. Políticas Sobre Drogas: tratamento. Disponível em <http://www.justica.gov.br/sua-protecao/politicas-sobre-drogas/programa-crack-1/tratamento>. Acesso em 22 de jul. 2018.

MINISTÉRIO DO TRABALHO. Salário mínimo. Disponível em <trabalho.gov.br/salario-minimo>. Acesso em 25 de ago. 2018.

NAPPO, Solange Aparecida. Análise qualitativa do uso de cocaína: um estudo em São Paulo. IN: LEITE, Marcos da Costa; ANDRADE, Arthur Guerra. Cocaína e crack: dos fundamentos ao tratamento. Porto Alegre: Artmed, 1999.

II Levantamento Domiciliar sobre Uso de Drogas Psicotrópicas no Brasil – 2005. Coordenação: José Carlos F. Galduroz – São Paulo: Páginas & Letras Editora, 2006.

Pesquisa Nacional Sobre o Uso de crack: quem são os usuários de crack e/ou similares do Brasil? Quantos são nas capitais brasileiras? / Organizadores: Francisco Inacio Bastos, Neilane Bertoni. – Rio de Janeiro: Editora ICICT/FIOCRUZ, 2014.

POLÍCIA CIVIL DO ESTADO DE MINAS GERAIS. Unidades. Disponível em <https://www.policiacivil.mg.gov.br/delegacia/exibir> . Acesso em 28 de ago. 2018.

PORTAL DA TRASNPARÊNCIA. Governo Federal. Disponível em <http://www.portaldatransparencia.gov.br/orgaos/30912?ano=2017>. Acesso em 22 de jul. de 2018.

SECRETARIA DE SEGURANÇA PÚBLICA DO ESTADO DO TOCANTINS. Polícia Civil. Disponível em <https://www.ssp.to.gov.br/>. Acesso em 22 de jul. 2018.

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