FASCISMO EM CONTA-GOTAS

mas é alopático e contagiante - altamente

06/10/2018 às 18:51
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Vizinhos da rua de baixo fecharam o trânsito, ao som de Beatles, numa boa festa. E eu escrevendo sobre fascismo...

Um dos primeiros traços do fascismo é a criação do medo, por meio da intimidação constante. Por isso, muitos deixam até de escrever em defesa da democracia.
Só que eu não sou um desses. Aprendi com meu pai a ter educação e respeito, mas medo não. Na pior das condições, também posso processar. Sou bom nisso também.
Dito isso, vamos ao que interessa: combater o fascismo.
Fascismo apologético e apoplético
Parece que sempre fomos de índole fascista: racista, machista, homofóbica, xenófoba, obscurantista, elitista.
Porém, o Golpe de 2016 abriu a porteira – como diz o povo.
O fascismo de hoje é e não é semelhante ao do passado italiano de Benito Mussolini (1919).
Não temos um único partido, por exemplo. Mas temos as varas da justiça (ou injustiça) apontando para só um dos lados.
Também temos uma Lei de Segurança Nacional, que deveria estar soterrada com a Constituição Federal de 1988.
O que mais assusta, no entanto, nesse pós ou proto-fascismo (que não morre), é o crescimento do obscurantismo, de seitas religiosas sem outra ambição que não seja o dinheiro, da indiferença em saber o que é real ou mentiroso na política.
Aliás, duvida-se da Ciência – caso não venha respaldada nas famosas páginas do Facebook.
Somando-se isto ao analfabetismo disfuncional, vemos surgirem crenças vazias, salvadores insanos e a pregação do ódio e da violência.
Ressurgiu no Brasil de 2018, em outro caso concreto, uma verdadeira apologia criminosa à tortura, à violação explícita de direitos dos trabalhadores e das mulheres.
Como a miscigenação "esconde" o racismo, muitos também defendem o trabalho análogo à escravidão. Isto é possível crescer na mentalidade arcaica e doentia porque a miscigenação foi feita, exatamente, sob o estupro de indígenas e de negras por seus “donos brancos”.
O fascismo nacional, portanto, tem componentes diferentes de outros países, começando com a naturalização da violência contra a mulher a partir da escravidão e da outrora legalização do estupro.
Não é à toa, então, que Capitães do Mato continuem caçando e matando os jovens Capitães de Areia (diria Jorge Amado).
Na ordem da cultura, esse elitismo tem outras consequências que se replicam século após século: negros e pobres são feitos para os trabalhos forçados ou para alimentar os presídios. Temos a terceira população carcerária do planeta.
A lei, como se sabe, ora lei.
A Constituição é tida como retalho de papel sem significado moral e institucional. Daí que já se defende o direito de qualquer um ter armas em casa (o “homem de bem” não precisa provar sanidade mental). E acenam que devemos partir para a criação de outra Constituição – mas, dessa vez, sem a participação do povo.
Nosso fascismo, altamente lucrativo para bancos e rentistas, entende que "ordem e progresso" só virão com a anulação de direitos sociais para os pobres.
Então, sem trabalho e direitos assegurados, para que aposentadoria?
Tira isso também. É o chamado Custo Brasil.
A lista não termina, mas o fascismo reticente não quer que jovens pensem por si, o que leva aos projetos de se retirar sociologia, história e filosofia da educação pública.
A alfabetização poderá ser feita em EAD: educação à distância. Realmente, à distância do bom senso e da previsão do ridículo.
A cultura, dizem os fascistas com ações repulsivas, deve ser vigiada. E assim já queimam ou rasgam livros em bibliotecas de Universidades Públicas.
Com ódio e ignorância crescente, não há tolerância. Avança o anti-intelectualismo.
Professores são perseguidos, denunciados, chantageados e respondem a processos criminais por insistirem na educação pública de qualidade, crítica, emancipatória.
Afinal, para que pensar se o salvador mitológico veio para nos salvar?
Não é melhor esperar pela ordem unida dos generais de pijama, mas de plantão?
O problema é saber quem nos salvará desse salvador, quando se revelar de vez como um príncipe das trevas.
Confesso que jamais imaginei descrever nossa miséria humana, neste buraco escuro, em 2018.
Vinício Carrilho Martinez
Professor Associado da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar/PPGCTS/Ded

Sobre o autor
Vinício Carrilho Martinez

Pós-Doutor em Ciência Política e em Direito. Coordenador do Curso de Licenciatura em Pedagogia, da UFSCar. Professor Associado II da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar. Departamento de Educação- Ded/CECH. Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade/PPGCTS/UFSCar Head of BRaS Research Group – Constitucional Studies and BRaS Academic Committee Member. Advogado (OAB/108390).

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