A regulamentação do pagamento em ordem cronológica pelos municípios

Estudos do artigo 5º da lei de licitações

19/10/2018 às 11:30
Leia nesta página:

Defende um novo modelo para a regulamentação do pagamento em ordem cronológica pelos municípios

Os municípios estão se deparando com iniciativa dos tribunais de contas dos Estados, visando a efetiva regulamentação do artigo 5º, da Lei nº 8.666/1993, que prevê a obrigatoriedade dos pagamentos efetivados nas fazendas municipais, obedecerem ordem cronológica.

O artigo 5º tem o seguinte teor. É importante entendê-lo para que o deslinde das explicações fique claro:

"Art. 5o  Todos os valores, preços e custos utilizados nas licitações terão como expressão monetária a moeda corrente nacional, ressalvado o disposto no art. 42 desta Lei, devendo cada unidade da Administração, no pagamento das obrigações relativas ao fornecimento de bens, locações, realização de obras e prestação de serviços, obedecer, para cada fonte diferenciada de recursos, a estrita ordem cronológica das datas de suas exigibilidades, salvo quando presentes relevantes razões de interesse público e mediante prévia justificativa da autoridade competente, devidamente publicada."

Aqui destacamos alguns aspectos que merecem acolhida. O primeiro aspecto, a ordem cronológica restringe-se às hipóteses do artigo, que são "fornecimento de bens", "locações", "realização de obras" e "prestação de serviços". Excluídas as demais. 

A ordem cronológica não é de todos os pagamentos, devem ser separadas por fonte de recursos, ou seja, cada fonte de recursos tem sua lista. Não se misturam.

O não atendimento da ordem cronológica, pode ser objeto de justificativas, o próprio texto legal indica isso, com a ressalva de que as justificativas devem ser publicadas. Nas justificativas "relevantes" devem privilegiar "razões de interesse público". Como em todo ato administrativo, em primeiro lugar vem o interesse público.

Sobre a necessidade de regulamentação nos deparamos com estudo do Tribunal de Contas da União (TCU), que diz o seguinte:

As iniciativas com vistas à regulamentação do disposto no art. 5o da Lei 8.666/1993 apresentam-se como medidas essenciais para conferir efetividade à norma

Assim, a efetividade da norma, segundo o voto constante do Acórdão nº 551/2016 – TC 002.999/2015-3 – RELATOR Ministro Vital do Rego – TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO – TCU.

O mesmo TCU realizou, recentemente, inspeção em unidades federais com vistas a averiguar o atendimento aos requisitos do artigo 5º, não tendo detectado práticas adequadas ao mesmo.

No âmbito federal, o Ministério do Planejamento, regulamentou a matéria por intermédio da Instrução Normativa nº 2, de 6 de dezembro de 2016. Ela, in casu, tem sido replicada nos municípios sem qualquer aprofundamento ou análise das realidades locais, que são muito diferentes da União e de seus ministérios.

Sobre isso, paira em nosso entendimento, séria dificuldade, acerca dessa Instrução Normativa, quanto ao que prevê o seu artigo 3º. Ele trata do momento em que o credor entra na fila. A bem da verdade, para a Instrução Normativa, o credor entra na fila no ato do recebimento da nota fiscal ou fatura pela unidade administrativa responsável pela gestão do contrato.

Não vejo como melhor técnica esse aspecto, que é fundamental no deslinde das gestões municipais. Em que pese a sapiência do legislador que a elaborou, ela não espelha a realidade dos municípios brasileiros, mormente os pequenos, que nunca trabalharam, em sua maioria, com a obediência a preceitos de planejamento.

E explico os motivos. Ao admitir que o credor entra na fila no ato da entrega e atestação da nota fiscal, o gestor considera que de forma eficiente, os atestantes receberam todos os itens e conferiram a efetiva prestação do serviço ou entrega da obra. Porém, nem sempre é assim. Imagine você o exemplo de merenda escolar, que é entregue em diversas unidades escolares, mas apenas dois servidores atestam a nota fiscal (por previsão legal é assim). Não há garantia, para o gestor, que todos os que deveriam receber os produtos, estão satisfeitos e os mesmos foram entregues a contento. O mesmo pode ocorrer, in casu, nas prestações de serviços da área de saúde, exames e tantos outros.

Mais relevante que isso, é o atendimento, por parte do credor (fornecedor) dos requisitos para recebimento, quais sejam, comprovar adimplência fiscal, requisito que não será verificado nessa fase. Mas ele já estará atravancando a fila, correndo o risco de outros fornecedores em dia com os tributos, estarem sujeitos a esperar sua regularização. 

O texto da Instrução Normativa não é ruim, mas pode ser adaptado e melhor estudado, com análises quanto aos aspectos de cada ente que tome para sim a obrigação de regulamentar o artigo 5º da Lei de Licitações.

Note que o artigo 4º da Instrução Normativa também fixa prazos para pagamentos. Estes prazos levam em consideração a realidade do Governo Federal e seus ministérios, não leva em consideração a situação dos municípios, que, em sua quase totalidade, dependem de repasses e de verbas que ele não arrecada.

Os tribunais de contas agem com extremo rigor em relação a isso, o que integra seu papel e suas responsabilidades. Mas a lei não faz limites à regulamentação. Ela pertence ao ente público municipal. Os parâmetros são esses do artigo 5º da Lei de Licitações, não há nenhum outro.

Note-se que essa preocupação, até o momento não foi notada, nem observada por nossos legisladores, mesmo que vigentes desde 1993, quando foi sancionada a lei de licitações. Não é lei nova. E ela nunca foi exigida exatamente por nunca ter sido regulamentada, o que reconhece o TCU.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Quanto à obrigatoriedade de publicação das listas, ela não existe no artigo 5º da Lei nº 8.666/93, foi introduzida exatamente na Instrução Normativa. A lei federal exige apenas que sejam publicadas as justificativas para o descumprimento da ordem cronológica. Essas sim, necessitam de publicação. Já as listas, é ato novo.

Importante também, na regulamentação local, que sejam analisadas as hipóteses de quebra da ordem cronológica, que a IN inseriu em seu artigo 5º. Importante que seja conceituado, o que não ocorre na norma federal, o que são serviços necessários ao funcionamento dos sistemas estruturantes. No município, que serviços são classificados como estruturantes?

O TCE/RJ tem empreendido notificações aos ex e atuais prefeitos, cumprindo seu papel constitucional. Cabe aos prefeitos e suas assessorias jurídicas, cuidar com carinho desse problema que os afetará no mandato, até o dia 31 de dezembro de 2020. 

Sobre o autor
José Souto Tostes

Advogado especializado em licitações, palestrante na área de direito público e eleitoral. Responsável por treinamentos de empresários e equipes que trabalham com licitações públicas em diversas empresas. Procurador Municipal por 11 anos.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos