Assistência, o salvamento e outros institutos do direito marítimo

22/10/2018 às 17:23

Resumo:


  • A assistência e salvamento no direito marítimo referem-se ao socorro a navios ou bens em perigo no mar, com a Convenção de Bruxelas de 1910 não estabelecendo distinção clara entre ambos os conceitos, mas diferenciando-se principalmente pela natureza da prestação e pelo estado de perigo do navio assistido.

  • O ordenamento jurídico brasileiro, por meio da Lei 7.203/84, regula a assistência e salvamento, atribuindo ao Comando da Marinha a coordenação dessas atividades e estabelecendo que qualquer ato que resulte útil confere direito a remuneração, não excedendo o valor do salvo, e que a competência para julgar questões decorrentes é de tribunais brasileiros quando envolver embarcações nacionais.

  • A praticagem é um serviço auxiliar da navegação, regulamentado pelo Decreto 2.596/98, que visa garantir a segurança em trechos de difícil acesso, sendo realizada por profissionais especializados e sujeitos a penalidades em caso de infrações, com a praticagem podendo ser obrigatória ou facultativa conforme determinação da Autoridade Marítima.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

O artigo discute sobre alguns temas de direito privado de navegação.

ASSISTÊNCIA, O SALVAMENTO E OUTROS INSTITUTOS DO DIREITO MARÍTIMO

Rogério Tadeu Romano

I – CONCEITO DE ASSISTÊNCIA E SALVAMENTO

A Convenção de Bruxelas de 1910 não estabeleceu distinção entre os institutos (artigo 1º), acompanhando o direito inglês na matéria, para quem a expressão salvage vem a significar uma e outra coisa. Para o direito francês, holandês, alemão, português, espanhol, assistência é o socorro ao navio em perigo, ficando a expressão salvamento no sentido de  “por a salvo os restos do navio”.

Para Sampaio de Lacerda(Curso de Direito Privado de Navegação, volume I, 2º edição, pág. 254) que a diversidade entre os dois institutos consiste na qualidade da prestação do navio que socorre independentemente do estado de perigo, pelas várias condições em que se encontra o navio a socorrer.
Independente do estado de perigo, porque pode suceder que um navio, abandonado por toda a equipagem, esteja – à vista das condições meteorológicas e do mar favorável – em estado de menor perigo que outro navio, com possibilidade de manobrar e completamente equipada.

No primeiro caso, estar-se-á numa hipótese típica de salvamento e no segundo numa hipótese normal de assistência. Na assistência, segundo se tem da lição de Gaeta(In tema de pericolo dela nave soccorsa e di determinazione del compenso di assistenza, 1943), há um assistente e um assistido que colaboram entre si na execução dos serviços. No salvamento, há apenas o trabalho exclusivo do salvador, permanecendo inerte e passivo o veículo socorrido. Essa a linha que foi adotada pelo Código de Navegação Italiano.

O artigo 732 do Código Comercial, no Brasil, engloba os dois termos, quando se refere ao navio naufragado ou em perigo de naufragar.

Geralmente, nessas situações, o proprietário oferece o navio em arresto por contas das dívidas. Há, com isso, o surgimento da disputa marítima, termo que foi delineado pela Convenção de Arresto de 1999, que o Brasil não ratificou.

Aliás, as fontes marítimas sobre arresto no direito marítimo, são: Código Comercial, Convenção de Bruxelas para a Unificação de Certas  Regras Relativas à Alienações e Hipotecas Marítimas de 1926 e o CPC de 2015. 

O Brasil não ratificou nenhuma convenção que trate de forma específica sobre o tema de arresto(embargo, medida cautelar nominada de cunho patrimonial,  medida de urgência,uma forma de pré-penhora) de embarcações, mas não se pode deixar de mencionar a Convenção de Bruxelas, de 1926, que foi promulgada no país por meio do Decreto 350, de 1 de outubro de 1935. A esse respeito, observe-se o artigo segundo da referida Convenção: 

ARTICLE 2.

La limitation de responsabilité édictée par iarticle précédent ne s'aplique pas:

1º Aux obligations résultant de faits ou fautes du propriétaire du navire;

2º A Iune des obligations dont il sagit au nº 8 de Iarticle 1er, lorsque le propriétaire a spécialement autorisé ou ratifié cette obligation;

3º Aux obligations résultant pour le propriétaire de Pengagement de l'équipage et des autres personnes au service du navire.

Si le propriétaire ou le copropriétaire du navire est en même temps le capitaine, il ne peut invoquer la limitation de sa responsabilité pour ses fautes autres que ses fautes nautiques et les fautes des personnes au service du navire.


II – NATUREZA JURÍDICA E LEGISLAÇÃO

Brunetti(citado por Lacerda de Almeida, obra citada, pág. 255) conclui que com relação ás pessoas, deriva de uma obrigação ex lege, mas tendo em vista as coisas de bordo, o frete e o preço da passagem, é necessário que se faça uma distinção:
a) Se a assistência derivou de um apelo de socorro mediante sinais óticos, acústicos ou radiotelegráficos, a relação será contratual;
b) Se ao contrário, a assistência for espontânea, trata-se de uma verdadeira gestão de negócios.

A Lei 7.203, de 3 de julho de 1985, dispõe sobre assistência e salvamento de embarcação, coisa ou bem em perigo no mar, nos portos e nas vias navegáveis interiores.

Dita o artigo 1º da Lei 7.203/84:
Art. 1º A assistência e salvamento de embarcações, coisas ou bem em perigo no mar, nos portos e nas vias navegáveis interiores, bem como os danos causados a terceiros e ao meio ambiente decorrentes dessa situação de perigo, são submetidos às disposições desta Lei.
§ 1º - Para efeitos desta Lei, a expressão “assistência e salvamento” significa todo o ato ou atividade efetuado para assistir e salvar uma embarcação, coisa ou bem em perigo no mar, nos portos e nas vias navegáveis interiores.
§ 2º - Para efeitos desta Lei, a palavra “salvamento”, quando empregada isoladamente, tem o mesmo significado que a expressão assistência e salvamento”.
§ 3º - Para efeitos desta Lei, a expressão “salvador” significa todo aquele que presta, prestou ou irá prestar serviço de assistência e salvamento.

Competirá ao Comando da Marinha, que poderá delegar tais atribuições, na forma do parágrafo único, do artigo 2º, a coordenação e o controle das atividades de assistência e salvamento de embarcação, coisa ou bem em perigo no mar, nos portos e nas vias navegáveis interiores.

É facultado ao armador ou ao proprietário do navio o direito de escolha do salvador, ressalvado o disposto no artigo 9º da Lei 7.203/84, que determina: Art. 9º - A autoridade naval poderá intervir em operações de assistência e salvamento, ou providenciá-la, quando necessário, para prevenir, controlar ou evitar danos a propriedade de terceiros ou ao meio ambiente.
§ 1º - A intervenção independe de solicitação ou da vontade expressa dos responsáveis pela embarcação assistida.
§ 2º A intervenção não isenta o proprietário ou armador da embarcação assistida da responsabilidade por danos a terceiros ou ao meio ambiente.
Acordo entre as parte irá definir a remuneração devida pelo serviço, mas qualquer ato de assistência e salvamento que tenha resultado útil, dará direito a uma remuneração equitativa, que não poderá exceder o valor da embarcação, coisas ou bens salvos. Nos casos em que, mesmo não havendo resultado útil do ato de assistência e salvamento, resultar terem sido evitados danos a terceiros ou ao meio ambiente, ao salvador será sempre devido o reembolso das despesas decorrentes, inclusive as perdas e danos.
Dita o artigo 9º:
Art. 9º - A autoridade naval poderá intervir em operações de assistência e salvamento, ou providenciá-la, quando necessário, para prevenir, controlar ou evitar danos a propriedade de terceiros ou ao meio ambiente.
§ 1º - A intervenção independe de solicitação ou da vontade expressa dos responsáveis pela embarcação assistida.
§ 2º A intervenção não isenta o proprietário ou armador da embarcação assistida da responsabilidade por danos a terceiros ou ao meio ambiente.

Quando a assistência e salvamento ocorrerem em águas sob jurisdição nacional e existir envolvimento de embarcação brasileira nessa operação, a competência para julgar questões pertinentes ou decorrentes desse salvamento é da responsabilidade de tribunal brasileiro. A teor do artigo 11 da Lei em discussão a  remuneração devida por prestação de serviços de assistência e salvamento será cumulativa com aquela  devida por operação de reboque se, durante esta faina, acorrer uma situação de perigo para a embarcação rebocada, por motivo de acidente ou fato de navegação não decorrente de culpa da embarcação rebocadora, que torne necessária, para salvamento da embarcação em perigo, a prestação de serviços de assistência e salvamento não previstos no contrato de reboque.

Quanto a prescrição a matéria é regida pelo artigo 12, lembrando-se que se trata de lei especial que deve ser aplicada no conflito com outra lei:
Art. 12 Prescreve em 2 (dois) anos a ação de qualquer salvador para exigir a remuneração pelos serviços prestados, contados do dia em que terminarem as operações de assistência e salvamento.
§ 1º - São causas de interrupção de prescrição:
I - a apresentação de medida cautelar visando a embargar a movimentação da embarcação assistida ou a disposição das coisas que se encontrem a bordo;
II - o requerimento, em Juízo, de Vistoria Judicial para fixação do valor das coisas salvas.
§ 2º - A prescrição será interrompida:

No Brasil, a Portaria DPC n. 250/16, alterou o Capítulo 01 da NORMAM – 03/DPC para remanejar o tema “assistência e salvamento de embarcação”, que antes se encontrava no item 0112 para o item 0110. O texto, porém, foi mantido na íntegra.
Diga-se que a NORMAM – 03, item 0110, regulamenta as ações que devem ou não serem tomadas pelo salvador e ou pelo salvado em casos de assistência e salvamento de embarcação que se encontre em situação de perigo no mar.

Destaque-se, na matéria, a atuação da OMI.

A OMI foi criada em 1948, como um organismo especializado na estrutura da  Organização das  Nações Unidas (ONU) com os seguintes propósitos: promover mecanismos de cooperação; segurança marítima e a prevenção da poluição; remoção dos óbices ao tráfego marítimo.

 A OMI tem sede em Londres, Inglaterra, conta com 169 Estados Membros e três Membros  Associados. Sua Convenção foi ratificada pelo Brasil em 17 de março de 1957.

 A OMI é compreendida por:

Uma Assembleia, constituída por todos os Estados Membros da OMI, que é o mais alto órgão da Organização;

Um Conselho,integrado por quarenta Membros eleitos pela Assembléia, que é o órgão executivo da Organização; e

Comitês e Sub-comitês, que são os órgãos técnicos da Organização.
 
Destaca-se que o principal órgão técnico da OMI é Comitê de Segurança Marítima (MSC) e seus Sub-comitês, a quem compete examinar todas as questões que seja da competência da OMI com relação aos auxílios à navegação, construção e equipamentos de navios, dotação de material do ponto de vista da segurança, regras para evitar colisão, manuseio de cargas perigosas, procedimentos e exigências relativos à segurança marítima, informações hidrográficas, diários e registros de navegação, investigação de acidentes marítimos, socorro e salvamento, e quaisquer outras questões que afetem diretamente a segurança marítima. Para as atividades ligadas a  hidrografia, cartografia e de auxílios à navegação, conta com a assessoria técnica da OHI e IALA, respectivamente.
 
A Convenção Internacional para Salvaguarda da Vida Humana no Mar (SOLAS) é a mais importante e mais antiga que a própria  organização, haja vista que existem países que ratificaram esta Convenção mais que não fazem parte da OMI. É composta de doze capítulos.
O Brasil como Estado Membro da OMI e tendo ratificado as suas Convenções, em especial a SOLAS, possui compromissos e obrigações com a comunidade marítima internacional. Tais como, produção de cartas  e de publicação  náuticas; elaboração e divulgação de avisos-rádio náuticos, avisos-rádio SAR e METEOROMARINHA; estabelecimento e manutenção dos auxílios à navegação, entre outros.

Dentre importantes convenções e protocolos publicados pela CMI(Comité Marítimo Internacional) destacam-se na matéria: diretrizes em danos causados por poluição por óleo, implementação da Convenção Internacional sobre Salvamento(1989). 

Na matéria, em termos de direito internacional público, destaco:

Protocolo de Emenda à Convenção para a Unificação de Certas Regras em Matéria de Assistência e Salvamento Marítimos de 1910 - 27/05/1967 -  Promulgação: Decreto 87.975 - 22/12/1982;

Convenção Internacional sobre Responsabilidade Civil em Danos Causados por Poluição por Óleo, 1969 (CLC-69) - Promulgação:  Decreto 79.437 -  28/03/1977;

Convenção sobre o Regulamento Internacional para Evitar Abalroamento no Mar, 1972. (COLREG-72) e (RIPEAM-72) 20/10/1972 -  Promulgação: Decreto 80.068 - 02/08/1977;

Convenção Internacional para a Salvaguarda da Vida Humana no Mar, 1974. (SOLAS-74) 01/11/1974  - Promulgação: Decreto 87.186 -  18/05/1982;

Convenção Internacional sobre Busca e Salvamento Marítimos,
1979. (SAR-79) 27/04/1979- Promulgação:  Decreto  85 - 11/04/1991;

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Emendas ao Código Internacional para a Construção e o Equipamento de Navios que Transportem Gases Liquefeitos a Granel. Convenção SOLAS-74. Código IGC — Resolução
MSC 30 (61) 11/12/1992. 

A Convenção Internacional para Prevenção da Poluição por Navios(MARPOL) é conhecida como a principal convenção internacional relacionada à prevenção de poluição ambiental marinha por navios decorrente de causas ambientais e acidentais. Trata-se de uma combinação de dois tratados adotados em 1973 e 1978. A MARPOL foi adotada pela iMO em 2 de dezembro de 1973. O Protocolo de 1978 adesivo à MARPOL de 1973 foi adotado na Conferência de Segurança de Navios - Tanque e Prevenção de Poluição em fevereiro de 1978. O Decreto 2.508, de 4 de março de 1998, promulgou a Convenção Internacional para Prevenção da Poluição Causada por Navios, concluída em Londres, em 2 de novembro de 1973, seu Protocolo, concluído na mesma cidade em 17 de fevereiro de 1978, suas Emendas de 1984 e seus Anexos Opcionais I, II, III, IV, V e VI. Assim é importante a vistoria continua em navios, limitação de descarga de óleo ou misturas oleosas no mar, obrigatoriedade de possuir livro de registro do óleo, dentre outras providências. 

A Intervention 69 estabelece o direito de o Estado Costeiro tomar, em alto-mar, as medidas necessárias para prevenir, atenuar ou eliminar os perigos graves e iminentes que apresentem, para suas costas ou interesses conexos, uma poluição ou ameaça de poluição ds águas do mar por óleo, resultante de um acidente marítimo. Essa Convenção foi adotada em Bruxelas, assinada pelo Brasil na data de sua adoção, mas sua vigência no ordenamento juridico pátrio somente teve início em 10 de junho de 2009 com a publicação do Decreto 6.478/2008. 

III - ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DA ASSISTÊNCIA

a) Seja realizada de navio para navio, quer se trate de embarcações marítimas, fluviais ou lacustres. Por certo, a assistência pode ser prestada a qualquer aeronave(mais comum hidroaviões) em perigo;
b) Necessidade de estar o navio em perigo: informe-se que o perigo deve ser imediato, bastando a possibilidade de perigo iminente ou imediato, como explicou Berio(Per uma costruzione giuridica del raporto di assistenza marítima, in Riv. Del Dir. dela Navig. 1935);
c) Não haja vinculo precedente impondo o socorro, como se se verificar o perigo no momento em que o prático executa seu trabalho, ou quando o navio, para manobras, já esteja se servindo de reboque contratado.

IV – OBRIGATORIEDADE DA ASSISTÊNCIA


A Convenção de Bruxelas de 1910 obriga a todo capitão, desde que não haja perigo sério para o seu navio, sua equipagem ou seus passageiros, a prestar assistência a toda pessoa, mesmo inimiga, encontrada no mar em perigo de se perder(artigo 11). A assistência é obrigatória quando se tratar de salvar vida humana e, assim mesmo, condicionada a sorte do perigo para o assistente. Não pode o capitão salvar algumas vidas humanas e arriscar a vida de inúmeras outras pessoas que se encontram a bordo de sua embarcação. Assim cabe prudência ao capitão no momento em que houver tais fatos.

Destaca-se, no direito marítimo, que a cobertura da Assistência e Salvamento refere-se: a) à remuneração ou recompensa devida pelo Segurado a quem atuando por iniciativa própria ou mediante acordo firmado em termos usualmente aceitos pelos seguradores tenha salvado ou participado de salvamento da embarcação ou do projeto segurado quando em situação de grave perigo real de ser perder totalmente ou quando na iminência de sofrer ou gerar outros prejuízos indenizáveis sob apólice pactuado; b) às despesas razoáveis e necessárias, inerentes a tais operações, bem como aos danos por elas causado à embarcação ou objeto segurado. 
 
V – DO REBOQUE

Considera-se reboque o trabalho prestado por um navio(rebocador) a outro navio, impossibilitado  não de usar de sua força motriz ou a um flutuante qualquer desprovido, como tal, de força motriz própria, como ensinou Sampaio de  Lacerda(Curso de Direito Privado de Navegação, volume I, 2º edição, pág. 215).

A origem do contrato de reboque data da navegação a vapor. A matéria não foi  originariamente regulamentada pelo Código Comercial de 1850.

O Código de Navegação da Itália não situa o contrato de reboque de forma unitária, não sendo considerado como contrato típico. Ao reboque-transporte manda que se aplique em caso de omissão, as normas pertinentes do transporte marítimo de água, consoante o artigo 105.

A mais antiga das companhias que fazia o reboque era a Cia de Reboques e Salvamentos, fundada em 1864, no Havre.
O contrato de reboque é a convenção pela qual o armador de um navio se obriga a fazer andar um outro navio ou qualquer flutuante mediante certa remuneração, durante tempo determinado ou em algum porto. Ás vezes, servirá para dar assistência a um navio em perigo.

Dois serviços são observados pelos autores:
1. O de auxílio ao navio para entrar e sair do porto, quando há contrato de locação de serviços ou de empreitada;
2. O que se realiza como verdadeiro trem, com embarcações que não são navios, quando há transporte.

Para alguns autores (Huc, Abello) trata-se da existência de um transporte; para outros, uma locação de serviço ou ainda uma empreitada(Wahl, Solveni, Vivante, Brunetti, Mazeaud, dentre outros).

A finalidade do reboque é de fornecer a força motriz; o rebocador nunca fornece espaço, nem se responsabiliza pela guarda da carga, mas apenas o serviço de tração e de seu pessoal.
Assim não há para o rebocador a obrigação de conservar a carga durante a viagem, nem de entrega-la ao destino, nem de observar a estivação. Mesmo na hipótese de trem de embarcações, o transportador realizou com o carregador um contrato de transporte, mas com o armador do rebocador o contrato realizado é de empreitada, como alertou Sampaio de Lacerda(obra citada, pág. 218).

Mas, às vezes, no trem de embarcações, os barcos poderão estar vazios ou carregados de mercadorias. Ora, se vazios, não se irá caracterizar um contrato de transporte. Mas, se os barcos estiverem carregados, será necessário apurar se a carga está ou não sob custódia do rebocador. Aí, haveria a caracterização de um contrato de empreitada, pois o rebocador se despreocupa com a carga que viaja nos barcos rebocados, sob o cuidado que é exclusivo do próprio remetente.

Disse bem Sampaio de Lacerda(obra citada, pág. 218):
“Mas, na primeira hipótese, o problema difere, não porque desapareça o contrato de reboque como conjuntamente com esse contrato, o rebocador assumiu a obrigação de transportar as mercadorias que lotam as embarcações rebocadas. São, portanto, dois contratos: a) o do reboque e o de transporte, realizados pelo próprio rebocador. Se entretanto as embarcações rebocadas que carregam as mercadorias, pertencerem ao próprio dono do rebocador, não haverá, então, aí nenhum contrato de reboque e tão-somente um contrato de transporte entre o proprietário das embarcações(rebocador e rebocada) e o dono da carga.".

O reboque pode ser realizado com cabos de reboque que são conectados no rebocador e no navio rebocado, por meio dos quais é exercida a força de tração. 

O reboque pode ser realizado através da atividade de empurrar, sistema muito utiilizado no transporte fluvial. 

A doutrina considera que classifica-se os serviços de reboque como: 

a) rebocadores para auxílio de manobras, ou reboque-manobra; e 

b) rebocadores para reboque propriamente dito de embarcações ou reboque-transporte. 


VI – PRATICAGEM

Diverso é  o serviço de praticagem.

A praticagem é um dos serviços auxiliares da navegação, sendo regulamentada pelo Decreto 2.596/98. A contratação dos serviços de praticagem tem como objetivo a garantia da segurança da navegação em trechos perigosos ou de difícil acesso, visto que estes profissionais são especializados na realização de manobras em tais áreas. Nas palavras de Sampaio de Lacerda:
“Ás vezes, dirigindo-se o navio para certas regiões em que a navegação exige maiores cuidados, torna-se necessária a existência, a bordo, de alguém que, melhor conhecendo aqueles lugares, possa indicar com mais segurança o percurso a fazer. [...] na entrada e saída dos portos, nos percursos realizados em estreitos e canai ou em águas fluviais, precisam os navios de tomar a bordo indivíduos mais treinados e mais habituados à navegação nesses trechos, mesmo porque constitui serviço feito sempre por pessoas especializadas destinadas a esse fim: os prático”, como ensinou Sampaio de Lacerda (obra citada).

Dentre as atribuições dadas ao agente maritimo está a contratação de prático, rebocadores, atracação, desatracação e suprimento, gestão de terminais, dentre outras, como de operador portuário.  

O Serviço de Praticagem encontra-se regulamentado pela NORMAM 12/2003,item 0218, aprovada pela Portaria n.48/DPC (Diretoria de Portos e Costas), fiscalizado pela Marinha do Brasil,e aduz o Capítulo I da regra supracitada que: “Consiste no conjunto de atividades profissionais de assessoria ao Comandante, requeridos por força de peculiaridades locais, que dificultem a livre e segura movimentação da embarcação e é constituído do Prático, da Lancha de Prático e da Atalaia (Estação de Praticagem).”
Existe ainda a Lei 9.357/97, a chamada Lei de Segurança do Tráfego Aquaviário ou LESTA, que em seu artigo 12 define o Serviço de Praticagem como: “o conjunto de atividades profissionais de assessoria ao comandante, requerido por força de peculiaridades locais, que dificultam a livre e segura movimentação de embarcação”.

Pode-se dizer que o Serviço de Praticagem apresenta como características mundialmente consagradas: o caráter local, a ausência de vínculo empregatício e o controle efetuado pelo Estado. O Serviço de Praticagem foi privatizado em 1961 por dcisão do Ministério da Marinha.

Podemos definir a praticagem em três categorias:
a)Praticagem de mar ou de costa;b)Praticagem de barra ou de porto;c)Praticagem fluvial. A praticagem de mar é um serviço de assessoramento aos capitães que navegam em zonas perigosas ou muito trafegadas, tais como o Mar do Norte, o Canal da Mancha, o Mar Báltico e outras.A praticagem de mar estava quase extinta, teve um renascimento com o advento dos grandes navios. São serviços privados, portanto, não regulamentados por quaisquer dos Estados ribeirinhos a essas regiões. Desta maneira, não é obrigatório aos capitães servirem-se desses serviços. No serviço de praticagem de porto e fluvial, os práticos auxiliam os comandantes na navegação e na manobra dentro dos portos ou dos rios. Os práticos devem ter perfeito conhecimento das particularidades dos locais de navegação, manobras e marés e correntes de marés, perigos, profundidades ,movimentação de bancos etc.

Praticagem, consoante se lê do Reg. Cap. Dos Portos(Dec. 5.798, de 1940, artigo 498) é a pilotagem dos navios e embarcações em zonas das vias aquáticas nacionais cujas condições peculiares à navegação exijam conhecimentos particulares, de modo a garantir com segurança, o tráfico, a vida humana e propriedade marítima. O Decreto 18.846, de 11 de junho de 1945, artigo primeiro, declarava que “navegação de praticagem ou simplesmente praticagem é a navegação que exige de quem dirige perfeito conhecimento adquirido pela prática de particulares locais ou regionais, que dificultam a livre e segura movimentação das embarcações”, esclarecendo, em seguida, no artigo segundo, que “praticagem é também, por extensão, o nome dado à organização incumbida de fazer navegação de praticagem aos longo dos trechos da costa, em barras, em portos, em lagoas e rios, onde tais particulares ocorrem.

Carolina Martinez Pula(Do serviço de praticagem no Brasil) assim disse:
“O capítulo I, Seção II da NORMAM 12/2003 define prático. Afirma a lei que: “É o profissional aquaviário não-tripulante que presta serviço de praticagem embarcado.”
Por faina de praticagem compreendem-se as ações e manobras realizadas durante a execução do serviço de praticagem.
Os práticos, ao ingressarem na carreira recebem um rigoroso treinamento das suas atividades, a fim de conhecer de forma minuciosa a Zona de Praticagem(ZP) na qual atuarão.
O ingresso na carreira é feito através de concurso público a ser prestado perante as autoridades da Diretoria de Portos e Costas na Capitania dos Portos da respectiva Zona de Praticagem.
Além disso, a NORMAM 12, em seu item 0201 estabelece alguns requisitos indispensáveis para os interessados no processo seletivo para Praticante de Prático(PRP) , tais como: ser brasileiro com idade mínima de 21 anos;possuir diploma de graduação de nível superior ou habilitação profissional correspondente; ser aquaviário na seção de convés ou máquinas de nível igual ou superior a quatro ou pertencer a grupos de amadores, no mínimo na categoria de Mestre-amador;gozar de perfeita saúde;não ser militar reformado por invalidez definitiva ou civil aposentado por invalidez permanente;estar quite com as obrigações eleitorais; efetuar o pagamento de taxa para o exame. “

De  acordo com o que prevê o art.25 do Decreto nº 2596/98 que regulamenta a Lei 9537/97, os práticos estão sujeitos a penalidades. De acordo com o que nos informa o texto legal:
“São infrações imputáveis ao prático: I – recusar-se à prestação do serviço de praticagem:Penalidade: suspensão do Certificado de Habilitação até doze meses, em caso de reincidência o cancelamento;II – deixar de cumprir as normas da Autoridade Marítima sobre o Serviço de Praticagem: Penalidade: suspensão do certificado de Habilitação por até cento e vinte dias.”

O procedimento administrativo se inicia pela elaboração do Auto de Infração, sendo assegurado ao autor do fato o contraditório e a ampla defesa. Uma vez prolatada a decisão pela Autoridade Marítima, se esta implicar numa aplicação de penalidade,caberá recurso no prazo de trinta dias dirigido à Autoridade Marítima superior.

Quando se tratar de acidentes e fatos da navegação, estes serão apurados através de inquérito administrativo, instaurado pela Capitania dos Portos para posterior julgamento no Tribunal Marítimo.

A praticagem pode ser livre ou obrigatória conforme exigirem a segurança da navegação e a defesa nacional. Quando livre a embarcação está dispensada de tonar prático. Mas naquelas de mais de 200 toneladas de registro que se movimentarem sem o concurso de prático, em zona de praticagem obrigatória, pagarão os preços dos serviços que seriam executados pelo prático escalado ou contratado sem prejuízo das sanções regulamentares(artigo 5º, parágrafo segundo).
Será o Comandante  da Marinha quem irá definir as zonas de praticagem obrigatória, por proposta da Diretoria de Portos e Costas e após audiência da Diretoria de Hidrografia e Navegação(artigo terceiro, parágrafo único). 

A praticagem envolve um contrato de prestação de serviços. O capitão que demandar a barra e desejar utilizar-se da praticagem, mandará fazer, pelo Código Internacional, os sinais de chamada de prático e do calado do navio, aguardando ao largo, fundeado ou sob máquinas, que o prático chegue a bordo.

O prático é conhecido como um conselheiro técnico, indicando ao capitão a rota a seguir, informando sobre as condições do local.

Mas, a função de dirigir o navio é do capitão, que se torna responsável por qualquer acidente que derive do erro técnico de navegação não fundado nas sugestões formuladas pelo prático. Durante os serviços de praticagem compete ao capitão informar ao prático sobre a facilidade de manobra do navio, fornecendo-lhe todos os elementos materiais necessários para o desempenho do serviço, bem como superintender a maneira pela qual esteja sendo feita a praticagem, assumindo a direção da manobra quando convencido de que o pratico dirige de forma errada e perigosa e as circunstâncias de tempo e local não permitam substituí-lo, recusando o prático que se apresente embriagado a bordo.

Ensinou Matusalém Gonçalves Pimenta(Responsabilidade Civil do Prático, 2007, primeira edição pág. 135) que "o comandante é responsável pelos acidentes e fatos da navegação causados por erro técnico genérico de navegação ou manobra, ainda que seu navio esteja sendo orientado por um prático, vez que ele, como gestor náutico e autoridade máxima a bordo, deve dispensar a assessoria do prático, ao perceber que este compromete a segurança do navio". 

Os práticos são responsáveis administrativamente pelos erros ou omissões de sua profissão, sem prejuízo da responsabilidade criminal em que incorram. 

Há, anote-se, corrente majoritária no sentido de que o prático não poderia ser responsabilizado civilmente, mas apenas administrativamente e criminalmente. A esse respeito, cita-se decisão do Tribunal Marítimo, no caso em que houve a colisão, no cais CADAM, RIo Jari, Pará, do N/M "SANKO REJOICE" com o cais, com danos materiais e sem vítimas, quando se julgou pela impericia do prático e negligência do comandante. 

VII - PRESCRIÇÃO NO DIREITO MARÍTIMO

Não se aplicam ao direito marítimo os prazos prescricionais previstos no CDC. Não cabia ao Código de Processo Civil estabelecer dispositivo na matéria, pois tal seria heterotópico. A matéria é de direito material e não de processo.

Por outro lado, a matéria deve ser objeto de solução por lei especial, no conflito de normas, pois aí se derroga lei geral. Aplica-se a lição de Norberto Bobbio(Teoria do Ordenamento Jurídico, tradução Maria Celeste Cordeiro Leite dos Santos,  4ª edição, Editora Universidade de Brasília, pág. 92) onde disse:

O chamado critério dito justamente da lex specialis é aquele pelo qual, de duas normas incompatíveis, uma geral e uma especial (ou excepcional), prevalece a segunda: lex specialis derogat generali. Isso porque a lei especial é aquela que anula uma lei mais geral, ou que subtrai de uma norma uma parte de sua matéria para submetê-la a uma regulamentação diferente (contrária ou contraditória).

Na matéria, trago lição de Godrofredo Mendes Vianna(Direito Marítimo, FGV):

"O prazo prescricional para ajuizamento da Ação Indenizatória com vistas ao ressarcimento, pelo embarcador ou consignatário, dos prejuízos sofridos em virtude de falta ou avaria de mercadorias decorrentes do transporte marítimo ainda é debatido na doutrina e jurisprudência brasileira.

O Código Comercial Brasileiro estabelecia o prazo prescricional de um ano em seu Art. 449, o qual foi revogado pela Lei no 10.406/ 2002, O Código de Processo Civil, que não estipulou prazo específico.

Por essa razão, parte da doutrina sustenta que o prazo prescricional seria
de 3 anos, seguindo o prazo do art. 206, §3° do Código Civil, prazo estipulado
para a pretensão de reparação civil em geral.

No entanto, a legislação especial continua a regulamentar o prazo prescricional
de um ano para tais ações, como disposto no Decreto-Lei n° 116/1967,a Lei de Transporte Multimodal (Lei 9611/98), a Lei de Transporte Rodoviário (Lei 11.442/07) e a Súmula 151 do STF."

Anote-se, para efeito de observação, que o  transporte multimodalidade é a articulação entre vários modos de transporte, de forma a tornar mais rápidas e eficazes as operações de transbordo. O transporte multimodal é aquele em que serão necessários mais de um tipo de veículo para conduzir a mercadoria até ao seu destino final, deste modo serão utilizados desde caminhões, navios, aviões ou outro tipo de condução necessário para a entrega.  Assim para a mercadoria chegar até ao seu destino final, ela necessitará de passar por mais de um tipo de transporte. Pode-se contratar uma empresa que faça essas mudanças, sem que o importador ou exportador se envolva nessas trocas.

A multimodalidade, apesar de defendida pelos ambientalistas e alguns especialistas de transporte de mercadorias, implica a acumulação de custos pela utilização de interfaces modais, tais como, transbordo, handling entre outros, como explicitou João Carlos Quaresma - Logística Global e Macrologística. Lisboa: Edições Sílabo. 2005. ISBN 978-972-618-369-3 p. 210. .

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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