PRISÃO POR DÉBITOS TRIBUTÁRIOS - CRIME POR FALTA DE PAGAMENTO DO ICMS DECLARADO - DECISÕES CONFLITANTES

DECISÕES CONFLITANTES NOS TRIBUNAIS SUPERIORES

Leia nesta página:

As Decisões conflitantes criam uma instabilidade jurídica. O STF declarou a inconstitucionalidade da lei que instituiu o depositário infiel de valor pertencente à Fazenda Pública e o STJ, por sua vez, tipificou como crime o não pagamento do ICMS declarado

Entendemos que a Decisão do STF, na ADI 1055, que trata do depositário infiel de valor pertencente à Fazenda Pública, prevalece e não invalida a Decisão do STJ que tipificou como crime o não pagamento do ICMS declarado.

Expressamos, em recente trabalho intitulado: PAGAMENTO DO TRIBUTO SONEGADO EXTINGUE A PUNIBILIDADE que o contribuinte que suprime, reduz, se apropria ou sonega tributos sujeita-se à punição criminal, caso deixe de pagar o valor devido ao fisco.

Entretanto, se antes do recebimento da denúncia o contribuinte efetua o pagamento devido ficará livre da punição criminal, extinguindo-se, assim, a punibilidade.

O STJ esposa essa assertiva e ainda decidiu que mesmo a quitação posterior ao trânsito em julgado pode beneficiar o agente, porque a Lei nº 10.684/03 (que dispõe sobre parcelamento de débitos junto à Secretaria da Receita Federal, à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e ao Instituto Nacional do Seguro Social) não estabelece marco temporal, e não cabe ao Judiciário decidir lastreado em limites inexistentes (HC 362.478/SP, DJe20/09/2017).

O ímpeto arrecadatório do Estado visa incentivar o devedor a efetuar o pagamento do que puni-lo criminalmente pela sonegação, possibilitando, assim, a efetividade da arrecadação estatal, por ser mais vantajosa para o Estado, do que acionar o sonegador criminalmente.

O STJ dá uma guinada e decide por sua 3ª Seção que agora é crime não pagar o ICMS declarado.

Em artigo publicado no JurisWay sob o título: NÃO É CRIME FISCAL DEIXAR DE PAGAR O ICMS DECLARADO PELA EMPRESA SEM O DESCONTO OU A COBRANÇA DO IMPOSTO, apresentamos uma posição diametralmente oposta, sob o enfoque de uma Decisão da Quinta Turma daquele Tribunal Superior ao considerar que “aquele que declara o ICMS devido pela própria empresa, porém deixa de recolher os valores aos cofres públicos, e cujo inadimplemento foi descoberto quando da análise dos lançamentos realizados nos livros fiscais, não incide na figura típica do artigo 2º, inciso II, da Lei n. 8.137/90, porquanto o tipo penal exige o desconto ou a cobrança do imposto.”

Fonte: https://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=19939

Por força daquele julgamento, os sócios foram considerados inadimplentes e absolvidos da acusação de crime fiscal.

Ora, agora vem a 3ª Seção do STJ, em caso idêntico diverge e tipifica como crime fiscal a falta de pagamento do ICMS declarado, criando, data vênia, uma instabilidade que compromete seriamente a segurança jurídica que deveria imperar nas Cortes Superiores.

Notadamente essa divergência de decisões na área criminal proferidas pelo Superior Tribunal de Justiça – STJ revela, no mínimo, uma desarmonia que é flagrantemente prejudicial ao sistema.

Urge, em nome da estabilidade e segurança jurídica, a uniformização de alguns temas pela Colenda Corte Superior.

O Professor da USP, Maurício Stegemann Diete, em artigo publicado sob o tema assim se expresso

“Mas o STJ (Superior Tribunal de Justiça), ao decidir o Habeas Corpus n. 399.109/SC, entendeu ser possível prender quem deixa de transferir ao fisco o ICMS cobrado dos consumidores.

Segundo o voto do ministro relator, a prática configuraria a chamada “apropriação indébita tributária”, uma analogia imperfeita entre a conduta descrita no artigo 2°, inciso II da Lei 8.137/90 e o crime do art. 168 do Código Penal.

Trata-se de grave equívoco e inaceitável retrocesso.

Primeiro, porque ignora a distinção entre ilícito administrativo e penal. Ao abrir mão da demonstração de fraude, converte a sonegação em simples prisão por dívida. Ignora a incidência das normas internacionais e constitucionais sobre o assunto, fulminando a mínima segurança jurídica.

Segundo, porque a interpretação do STJ estende o âmbito de aplicação de lei penal. Não se pode trabalhar com analogia no direito penal. O Tribunal viola, dessa forma, o princípio da legalidade, pilar do Direito Penal no Estado Democrático de Direito.

O que o Superior Tribunal de Justiça fez foi criar um conflito de deveres. Caso o contribuinte não disponha de recursos para realizar o pagamento imediato de ICMS, este terá duas opções: ou apresenta declaração contendo informações imprecisas, praticando, assim, o crime de sonegação, ou apresenta declaração verdadeira, em ato equiparado à confissão de um crime, estando igualmente sujeito à responsabilização criminal.” (grifos da transcrição).

Fonte: http://www.fenafisco.org.br/noticias-fenafisco/item/3276-opiniao-stj-cria-a-extorsao-do-icms-ao-criminalizar-nao-pagamento-do-imposto

Esclarecemos que aquela Decisão do STF foi julgada pelo Plenário em 15/12/2016 e transitou em julgado, em 09/08/2017, tendo sido publicada a Certidão de Trânsito em Julgado em 18/10/2018. (ver Portal do STF: http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=1584564 )

O acesso à referida Decisão do STF e à Certidão do seu trânsito em julgado pode ser feito através dos seguintes links, respectivamente: http://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=312309228&ext=.pdf e http://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=15338848929&ext=.pdf

Assim as Decisões, em tela, foram proferidas por Tribunas distintos. A do STF declarou a inconstitucionalidade da Lei nº 8.866 de 11 de abril de 1994, que dispunha sobre o depositário infiel de valor pertencente à Fazenda Pública e a do STJ tipificou como crime fiscal a falta de pagamento do ICMS declarado.

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Portanto, a nosso juízo, a Decisão recente do STJ, embora, como visto, conflitante, contrariando normas constitucionais e internacionais sobre esse tema, nesse primeiro momento, não seria anulada e nem invalidada pela do STF, a não ser que tal matéria, ou seja, “a falta de pagamento do ICMS declarado”, seja levada ao Supremo, para análise à luz da Constituição.


 


 


 


 


 

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