PROGRESSÃO E REGRESSÃO DE REGIME DA PENA DIANTE DE PROPOSTA APRESENTADA
ROGÉRIO TADEU ROMANO
Uma das propostas que foram apresentadas na campanha do presidente eleito nas eleições de 2018, com chances altas de serem questionadas são os planos de acabar coma progressão de penas de condenados.
O presidente eleito Bolsonaro quer reduzir a progressão de regime, as saídas temporárias do semiaberto e trancafiar em penitenciária de segurança máxima autores de crimes hediondos.
É possível extinguir o regime semiaberto por meio de projeto de lei, mas o fim da progressão para o cumprimento de pena é considerada inconstitucional e só poderia ser modificada com a instalação de nova Assembleia Constituinte.
— A Lei de Execução Penal prevê a individualização da pena, que trata da forma como cada apenado se comporta, como é sua conduta, se ele trabalha ou estuda. O princípio da individualização da pena está previsto na Constituição como cláusula pétrea — explica Luiz Fernando Calil de Freitas, procurador de Justiça, coordenador da Procuradoria de Recursos do Ministério Público Estadual e também professor de Direito Constitucional na Fundação Escola Superior do Ministério Público.
A proposta apresentada afronta o princípio constitucional de individualização da pena.
O princípio constitucional da individualização da pena, previsto no art. 5º, inciso XLVI, da Constituição da República Federativa do Brasil, garante aos indivíduos no momento de uma condenação em um processo penal, que a sua pena seja individualizada, isto é, levando em conta as peculiaridades aplicadas para cada caso em concreto. A aplicação do princípio da individualização da pena pode ser dividida em três etapas diferentes. O primeiro momento é uma etapa que se chama de fase in abstrato. O legislador faz a aplicação deste princípio para elaboração do tipo penal incriminador, com a determinação das penas em abstrato estabelecendo os patamares mínimo e máximo de pena que poderá ser aplicado pelo juiz a cada caso concreto. A segunda fase, a individualização judiciária, é o momento em que o juiz faz a aplicação do tipo penal ao ato que o acusado cometeu, verificando qual será a pena mais adequada, levando em conta as características pessoais de cada réu. E a última fase, quanto à aplicação da sanção, é aquela em que o magistrado responsável pela execução da pena do apenado vai determinar o cumprimento individualizado da sanção aplicada.
Na matéria, observe-se o que determina o artigo 5º, XLVI, da Constituição Federal quando prescreve:
A lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes:
a) privação ou restrição da liberdade;
b) perda de bens;
c) multa;
d) prestação social alternativa;
e) suspensão ou interdição de direitos;
A Lei de Execução Penal brasileira (Lei nº 7210/84) possui como objetivo favorecer/articular, por meio da aplicação da pena, a ressocialização do condenado, para que este possa voltar à sociedade e conviver nesta sem cometer atos ilícitos novamente, prevenindo assim, a reincidência criminal.
De acordo com o artigo 112 da Lei de Execução Penal, "a pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e ostentar bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a progressão".
Nos casos de condenados por crimes hediondos, estes, terão que cumprir 2/5 da pena, se primários, e 3/5, se reincidentes, para ter o benefício da progressão, segundo o artigo 2º, § 2º da Lei dos Crimes Hediondos (Lei nº 8.072/90). No caso de crimes contra a administração pública, como a corrupção, o condenado é beneficiado com a progressão de regime se, além de cumprir 1/6 da pena e ter bom comportamento, reparar os prejuízos causados aos cofres públicos.
São três os regimes de cumprimento da pena: fechado, semiaberto e aberto.
Se ao condenado, ainda que não reincidente, for aplicada a pena igual ou superior a oito ano, o regime inicial de cumprimento da pena será o fechado. Poderá o regime semiaberto ser aplicado quando a pena aplicada não for superior a oito e inferior a quatro ano e o apenado não for reincidente. Poderá ser aplicado o regime aberto quando não reincidente o preso e a pena não for superior a quatro anos.
O regime fechado é cumprido em estabelecimento de segurança máxima ou média, que é a penitenciária(artigo 87 da LEP). O regime semiaberto em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar(artigo 91 da LEP); o regime aberto será cumprido em prisão albergue, em casa de albergado ou estabelecimento adequado(artigo 93 da LEP).
O Supremo Tribunal Federal no HC 69.975, decidiu que “a fração de um sexto deve recair sobre o total e não sobre o restante da pena”.
No julgamento do HC 104.174, bem disse o ministro Ayres Britto:
“Com efeito, não se pode perder de vista o caráter individual dos
direitos subjetivo-constitucionais em matéria penal; notadamente porque o indivíduo é sempre uma realidade única ou insimilar, irrepetível mesmo na sua condição de microcosmo ou de um universo à parte. Por isso é que todo instituto de direito penal – crime, pena, prisão, progressão de regime penitenciário, liberdade provisória, conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos, por exemplo – há de ostentar o timbre da estrita personalização, quando de sua concreta aplicabilidade. Quero dizer: tudo tem que ser personalizado na empírica aplicação do direito constitucional-penal, porque a própria Constituição é que se deseja assim orteguianamente aplicada (na linha do “Eu sou eu e minhas circunstâncias ”, como insuperavelmente sentenciou Ortega Y Gasset). O que transluz da precedente lembrança do acórdão proferido no HC 82.959/SP (julg. cit.), em cuja ementa se lê:
“PENA – REGIME DE CUMPRIMENTO – PROGRESSÃO – RAZÃO DE SER. A progressão no regime de cumprimento da pena, nas espécies fechado, semi-aberto e aberto, tem como razão maior a ressocialização do preso que, mais dia ou menos dia, voltará ao convívio social.
PENA – CRIMES HEDIONDOS – REGIME DE CUMPRIMENTO – PROGRESSÃO – ÓBICE – ARTIGO 2º, § 1º,DA LEI Nº 8.072/90 – INCONSTITUCIONALIDADE – EVOLUÇÃO JURISPRUDENCIAL. Conflita com a garantia da individualização da pena – artigo 5º, inciso XLVI, da Constituição Federal – a imposição, mediante norma, do cumprimento da pena em regime integralmente fechado. Nova inteligência do princípio da individualização da pena, em evolução jurisprudencial, assentada a inconstitucionalidade do artigo 2º, § 1º, da Lei nº 8.072/90.”
E prosseguiu o ministro Ayres Britto naquele julgado:
“Cabe “ao próprio Juízo da Execução, avaliar, criteriosamente, caso a caso, o preenchimento dos demais requisitos necessários ao ingresso, ou não, do sentenciado em regime penal menos gravoso ” a fim de que seja respeitada “a competência do magistrado de primeiro grau para examinar os requisitos autorizadores da progressão, eis que não assiste, a esta Suprema Corte, mediante atuação 'per saltum' – o que representaria substituição do Juízo da Execução –, o poder de antecipar provimento jurisdicional que consubstancie, desde logo, a outorga, ao sentenciado, do benefício legal em referência” (cf. HC 88.231/SP, decisão monocrática do ministro Celso de Mello, DJ 05/05/2006). Em igual sentido, vejam-se também: HC 96.853/RS, Primeira Turma, da relatoria do ministro Ricardo Lewandowski, DJ 27/11/2009; RHC 91.300/DF, Tribunal Pleno, da relatoria da ministra Ellen Gracie, DJ 03/04/2009.”
Há a progressão e a regressão do regime.
A progressão é a transferência do condenado de regime mais rigoroso a outro menos rigoroso, quando demonstra condições de adaptação ao mais suave. A progressão soma um tempo mínimo de cumprimento da pena com o mérito do condenado.
É na sentença que o juiz define o regime no qual o condenado deve iniciar o cumprimento da pena privativa de liberdade, nos termos do artigo 33 do Código Penal.
Uma vez fixada a pena-base no mínimo legal, é vedado o estabelecimento de regime prisional mais gravoso do que o cabível em razão da sanção imposta, com base apenas na gravidade abstrata do delito, como se lê da Súmula 440 do Superior Tribunal de Justiça. De toda sorte, exige-se motivação idônea(Súmula 719 do STF).
A progressão de regime compreende os seguintes requisitos:
a) 1/6 da pena nos crimes em geral;
b) 2/5 nos crimes hediondos e afins cometidos a partir de 28 de março de 2007, quando o apenado é primário;
c) 3/5 nos crimes hediondos e afins cometidos a partir de 28 de março de 2007 quando o apenado é reincidente.
Com a redação dada ao artigo 2º da Lei 8.072/90 é admitida a progressão de regime prisional quando se tratar de condenação por crime hediondo e seus equiparados(tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e terrorismo), uma vez que o novo parágrafo primeiro do artigo 2º diz que a pena será cumprida, de início, no regime fechado. O parágrafo segundo estabelece o cumprimento de 2/5 para os primários e 3/5 para os reincidentes, com relação a progressão.
O Supremo Tribunal Federal declarou inconstitucional o artigo 2º em seu parágrafo primeiro da lei de crimes hediondos, uma vez que vedava a progressão de regime para os crimes hediondos.
As penas privativas de liberdade devem ser aplicadas em regime progressivo mediante o qual poderá se dar a substituição do regime, seja por progressão ou regressão, sempre que o condenado praticar novo crime ou praticar falta grave.
O chamado Regime Disciplinar Diferenciado é uma sanção disciplinar, não um regime de cumprimento de pena.
Para o regime fechado a Lei de Execuções Penais instituiu o exame criminológico para classificação dos condenados, o que será feito pela Comissão Técnica de Classificação, encarregadas de elaborar o programa individualizador e acompanhar a execução das penas, propondo a autoridade competente as progressões e regressões devidas.
Essa Comissão será presidida pelo diretor e será composta, no mínimo, por dois chefes de serviço, um psiquiatra, um psicólogo e um assistente social.
Com relação a matéria o STF editou a Súmula 439 afirmando a admissibilidade do exame criminológico sempre que as peculiaridades do caso vierem a recomendar.
O que é progressão per salto? Tal poderia ocorrer quando se verificar, em execução penal, iniciada com o trânsito em julgado da sentença condenatória, que o condenado já cumpriu tempo de prisão provisória suficiente para incidir a progressão de regime per salto – sem a necessidade de cumprir pena pelo prazo previsto para a progressão no regime imediatamente anterior, notadamente se a sentença fixou o regime inicial fechado e o condenado já havia permanecido preso por prazo que seria suficiente para progressão não só para o regime semiaberto, mas ainda para o regime aberto, como afirmam Nestor Távora e Rosmar Rodrigues Alencar.[1]
No entanto, o Superior Tribunal de Justiça entendeu que devem ser respeitados os períodos de tempo a serem cumpridos em cada regime prisional, não sendo admitida a dita progressão per salto, daí que não considera nem o fato de paciente ter cumprido tempo suficiente autoriza a progressão direta do fechado para o aberto.[2]
A medida de segurança aplicada aos fronteiriços será por tempo indeterminado, perdurando enquanto não for averiguada, mediante perícia médica, a cessação da periculosidade, sendo aplicada pelo prazo mínimo de um a três anos(artigo 97, § 1º).
Se o agente for inimputável, o juiz irá determinar sua internação, mas se o fato previsto como crime for punível com detenção cabe tratamento ambulatorial, a teor do artigo 97 do Código Penal.
A Lei de Execuções Penais dá ênfase ao trabalho do apenado, que deve ser remunerado.
O trabalho é previsto como um dever social e condição de dignidade humana, tendo finalidade educativa e produtiva(LEP, artigo 28), e como obrigação do condenado a pena privativa de liberdade.
Há a regressão de regime que é a transferência para qualquer um dos regimes mais rigorosos, quando o apenado: praticar fato definido como crime doloso ou falta grave; sofrer condenação por crime anterior, cuja pena somada ao restante da pena em execução, torne incabível o regime. Tal acontecerá quando se tiver a necessidade de unificação de penas, principalmente, quando houver a condenação por mais de um crime.
Vem a pergunta: O que é regressão cautelar? Tal se dá com relação a ser aplicada pelo juiz, em decisão fundamentada, como decorrência do poder geral de cautela do magistrado, que, diante de situações determinadas, ordene o retorno do apenado ao regime anterior, caso entenda que haja fato dotado do fumus comissi delicti e que recomende decisão que afaste o periculum libertatis.
Há um pedido para que haja regressão, que entendemos cautelar.
O pleito deve ser analisado pelo Ministro Barroso.
A Constituição Federal estabelece, no artigo 5º, III, que ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante. Além disso, não haverá penas: de morte, de caráter perpétuo, cruéis. Será assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral. Há, pois, princípios constitucionais de natureza impositiva que devem ser obedecidos.
O art. 10 da LEP garante que a assistência ao preso e ao internado é dever do Estado, objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade.
O art. 11 da LEP garante ao apenado a assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa. Isso significa dizer que o Estado deve cumprir sua função social em reabilitar o detento, enquanto a sociedade deve acreditar em uma ressocialização verdadeira, digna de respeito por parte de todos os núcleos da sociedade. No entanto, o que vemos é um regresso ao mundo primitivo.
O art. 12 da LEP assegura que a assistência material ao preso e ao internado consistirá no fornecimento de alimentação, vestuário e instalações higiênicas.
Já o art. 14 da LEP afirma que a assistência à saúde do preso e do internado, de caráter preventivo e curativo, compreenderá no atendimento médico, farmacêutico e odontológico.
Já o artigo. 15 e 16 da LEP asseguram que a assistência jurídica é destinada aos presos e aos internados sem recursos financeiros para constituir advogado.
O art. 17 da LEP aduz que a assistência educacional compreenderá a instrução escolar e a formação profissional do preso e do internado. O art. 18 da mesma Lei garante que o ensino de 1º grau será obrigatório, integrando-se no sistema escolar da Unidade Federativa. Já o art. 22 trata sobre a assistência social, que tem por finalidade amparar o preso e o internado e prepará-los para o retorno à sociedade.
Está previsto nas Regras Mínimas para Tratamento de Presos da ONU o princípio de que o sistema penitenciário não deve acentuar os sofrimentos já inerentes à pena privativa de liberdade(item 57, segunda parte). Este parece ser o ponto mais levantado atualmente por certos juristas quando afirmam que, na sanção imposta pelo Código Penal – privação da liberdade – não estão incluídos os sofrimentos acrescidos pela situação reinante nas prisões, os quais terminam por agravar a pena a que foi condenado o infrator.
Entende-se que a Lei de Execução Penal(Lei 7.210/84), impedindo o excesso ou o desvio da execução que possa comprometer a dignidade e a humanidade da execução, torna expressa a extensão de direitos constitucionais aos presos e internos. Por outro lado, a lei deve possibilitar, em sua efetividade, que os apenados possam, em decorrência de sua situação particular, desenvolver-se no sentido da reinserção social com o afastamento de inúmeros problemas surgidos com o encarceramento.
Dito isso, com o devido respeito, considero que a medida proposta afronta aos direitos humanos. Ela é inconstitucional, por impor pena em condições desumanas.
[1] TÁVORA, NESTOR; RODRIGUES ALENCAR, Nosmar. Curso de direito processual penal, 7ª edição, editora Jus Podvum, pág. 1355.
[2] HC 200902066212 – Relator Ministro Og Fernandes, DJ de 10 de maio de 2010.