- INTRODUÇÂO
O mundo virtual é uma realidade que avança em todos setores da sociedade, ficando cada mais difícil não se adequar as modernidades. Estudiosos descrevem como a revolução da informática, dando esta denominação devido a uma grande mudança em um curto espaço de tempo.
Segundo o relatório realizado pela We Are Social e Hootsuite , demonstrou que mais da metade da população mundial esta on-line, sendo que em 2018, 4 bilhões de pessoas no mundo estão utilizando a rede mundial de computadores, a internet.
Com estas mudanças o armazenamento virtual ficava em um espaço físico, inserido no computador o que gerava grande transtorno no momento em que aconteciam problemas nas máquinas. Com isso em 2006 houve uma difusão das chamadas “nuvens” de armazenamento, isto nada mais é que o usuário ou empresa deixar seus dados armazenados à distância, podendo ter acesso em outras máquinas utilizando seu usuário e senha, apenas estando conectado a internet. Atualmente estas nuvens estão muito mais acessíveis ao usuário comum, basta somente ser usuário de um smartphone conectado a internet, onde as empresa criam método de backup contínuo para que não se perca nenhum dado importante, mesmo que em muitas vezes não tenha uma valoração comercial, mas existe um grande valor sentimental do proprietário.
Este mundo novo começou a facilitar consideravelmente a vida do usuário, podendo realizar compras, transações bancárias, bem como expor seu modo de vida através das redes sociais ou via mensagem de texto. Não demorou muito para que esta facilidade para a grande maioria fosse problemas para alguns, através dos cibercrimes. Crimes estes que muitas vezes não geram um prejuízo financeiro, por vezes causa um dano psicológico quando invadem a intimidade de pessoas, com estas ocorrência em 23 de Abril 2014, criou-se o Marco Civil Lei n° 12.965, ou seja a “ Constituição da Internet” como é popularmente conhecida.
O Marco Civil foi à primeira legislação onde se previa o uso da internet de forma a proteger o usuário, principalmente no tocante de sua privacidade de dados, sendo que seu enfoque principal é assegurar os deveres e direitos dos usuário e empresa. Mesmo que seja importante marco esta legislação, ainda existem várias situações que não foram comtempladas pela legislação e que são julgadas por analogia.
Atualmente é uma grande exposição do individuo, através de fotografias, vídeos, arquivos, e-mails, armazenado em nuvem, todo este conteúdo gera um gigantesco patrimônio que por vezes não tem como ser mensurado. Como este acesso ocorre mediante a senha pessoal caso o indivíduo não deixar os dados de acesso, por vezes acaba se perdendo este conteúdo.
- BENS DIGITAIS
No Direito o conceito de bens segundo
Neste mesmo sentido pode se dizer que os bens podem ser os objetos materiais ou imateriais, mas que tenha uma utilidade física ou ideal para o individuo.
Existe uma classificação muito peculiar para diversos tipos de bens , mas que não é o objetivo neste entendimento, sendo assim, para se entender sobre bens digitais é necessário que o entendimento seja sobre os bens incorpóreos: são bens abstratos que não possuem existência física, ou seja, não são concretos. Exemplos: direitos autorais, crédito, vida, saúde, liberdade, etc.
Tal definição se torna fundamental pois vem de encontro com as definições de bens digitais.
Sendo assim , segundo LARA (2016, p. 22):
“ (...) bens digitais são instruções trazidas em linguagem binária que podem ser processadas em dispositivos eletrônicos, tais como fotos, músicas, filmes, etc., ou seja, quaisquer informações que podem ser armazenadas em bytes nos diversos aparelhos como computadores, celulares, tablets.”
Para LACERDA (2017, p. 74) bens digitais são:
“(...) bens incorpóreos, os quais são progressivamente inseridos na Internet por um usuário, consistindo em informações de caráter pessoal que lhe trazem alguma utilidade, tenham ou não conteúdo econômico.” Como exemplo, o referido autor (2017, p. 61) cita que tais bens “(...) podem ser constituídos por textos, vídeos, fotografias, base de dados”
Ademais não se pode deixar de mencionar quando a questão do patrimônio, intimamente ligado a questão dos bens, segundo Carlos Roberto Gonçalves: patrimônio em sentido amplo, é conjunto de bens, de qualquer ordem, pertencentes à pessoa.
- DIREITO SUCESSÓRIO, HERANÇA DIGITAL E DIREITO DA PERSONALIDADE.
Como descrito anteriormente um conjunto de bens denomina-se patrimônio, sendo que o Direito Sucessório tem um enfoque quando diz respeito a sucessão e herança. Nesta linha de raciocínio a ilustre doutrinadora Maria Helena Diniz a define como “o patrimônio do falecido, isto é, o conjunto de direitos e deveres que se transmitem aos herdeiros legítimos ou testamentários, exceto se forem personalíssimos ou inerentes à pessoa do de cujus”.
No mesmo raciocínio sobre herança , podemos destacar dois ilustres doutrinadores:
Carlos Roberto Gonçalves (2012, p. 32):
“A palavra ‘herança’ tem maior amplitude, abrangendo o patrimônio do de cujus, que não é constituído apenas de bens materiais e corpóreos, como um imóvel ou um veículo, mas representa uma universalidade de direito, o complexo de relações jurídicas dotadas de valor econômico (CC, art. 91).”
Sílvio de Salvo Venosa (2013, p. 7) descreve:
“Destarte, a herança entra no conceito de patrimônio. Deve ser vista como o patrimônio do de cujus. Definimos o patrimônio como o conjunto de direitos reais e obrigacionais, ativos e passivos, pertencentes a uma pessoa. Portanto, a herança é o patrimônio da pessoa falecida, ou seja, do autor da herança.”:
Sendo que sucessão é o ato pelo qual uma pessoa assume o lugar de outra, substituindo a titularidade dos bens em decorrência da morte. O ordenamento jurídico, descreve duas espécies de sucessão , sendo testamentária e a legítima.
A testamentária é a manifestação de ultima vontade, expressa por meio de testamento ou codicilo, este não é o enfoque desde trabalho, visto que por meio de testamento poderia ter deixado todas as formas de encontrar, movimentar, excluir ou agregar o patrimônio digital, por meio de informar onde se encontra os bens , bem como os usuário e senhas para acesso.
Quanto não ocorre a manifestação de ultima vontade a sucessão leva a denominação de legítima, este decorre em decorrência de lei.
Conforme art. 1.788 do Código Civil:
“Morrendo a pessoa sem testamento, transmite a herança aos herdeiros legítimos; o mesmo ocorrerá quanto aos bens que não forem compreendidos no testamento; e subsistea sucessão legítima se o testamento caducar, ou for julgado nulo”.
Na sucessão legítima, o principio geral, descreve que são capazes de herdar as pessoas nascidas e concebidas no momento da abertura da sucessão, salvo, as particularidades, mas de um modo geral esta transmissão de bens , após a aceitação, tem a ordem dos descendentes, ascendentes e cônjuges ( sem adentrar nas particularidades e exceções como exemplo a deserdação e indignidade). Ainda não podendo esquecer o direito a herança esta incluído na Carta Magna disposto no Ar. 5°, XXX “ é garantido o direito de herança;”, considerado como direito fundamental.
Quando a sucessão alguns autores tentam conceituar o que esta mais próximo do entendimento do que seria uma herança digital, devido ser um assunto novo ainda necessita de muita discussão , segundo Silva (2014, p. 31), “todo o legado digital de um indivíduo que fica disponível na nuvem ou armazenado em um computador logo após sua morte faz parte de sua herança digital”
Cahn e Beyer (2013, p. 137-138) defendem que a herança digital pode ser dividida em dados pessoais, dados de redes sociais, dados de contas financeiras e dados de contas empresariais.
Arnold, Bellamy, Gibbs, Nansen e Kohn (2013) utilizam o conceito de propriedade digital para definir o conjunto de todos os ativos digitais. A herança digital é constituída, deste modo, pelo conjunto de informações acerca de um usuário (formado pelos ativos digitais e pelas contas digitais) que se encontra em formato digital (OLIVEIRA, p. 23-24).
Em um julgado do Estado do Minas de Gerais, julgou improcedente o direito de acesso aos dados pessoais da filha falecida da autora, com base, no artigo 5º, XII, da Constituição Federal, que trata sobre o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, na alegação o magistrado descreve “Dada essa digressão, tenho que o pedido da autora não é legítimo, pois a intimidade de outrem, inclusive da falecida Helena, não pode ser invadida para satisfação pessoal. A falecida não está mais entre nós para manifestar sua opinião, motivo pela qual a sua intimidade deve ser preservada”. (precedente nº 0023375-92.2017.8.13.0520, juiz Manoel Jorge de Matos Junior, Vara Única da Comarca de Pompeu/MG).”
Diante deste julgado, pode-se perceber que os direitos da personalidade, são direitos que integram a pessoa, como a vida, honra, integridade física, imagem e privacidade. Este direitos são considerados como fundamentais e estão presentes inc. XX do art. 5º da Constituição Federal “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”; não obstante da Carta Magna, no âmbito dos direitos humanos, depara-se no art. 11 do Pacto de São José da Costa Rica, ratificada no Brasil pelo Decreto n. 678/92, e assim dispõe: “toda pessoa tem direito ao respeito de sua honra e ao reconhecimento de sua dignidade”
A situação de não conseguir acesso a herança digital, devido a questão de privacidade não é exclusivamente no Brasil. Com uma reportagem do o ano de 2005 relata o caso do pai de um soldado americano morto no Iraque que solicitou acesso à conta de e-mail daquele com o intuito de preservar o conteúdo ali armazenado, pois tratava-se de patrimônio do filho, da mesma forma que eram patrimônio os bens de origem material. O provedor de e-mail negou acesso ao conteúdo, sob alegação de que o e-mail é uma espécie de comunicação privada e há o compromisso de confidencialidade e proteção entre o usuário e a empresa prestadora do serviço.
Existem diversas situações onde familiares querem continuar o acesso, alguns querem que seja apagado todo o conteúdo pelo sofrimento extremo em que estão vivendo.
Diante da falta de uma regulamentação, os Projetos de Lei n. 4.099/2012 (Situação: Aguardando Apreciação pelo Senado Federal) de autoria do Deputado Jorginho Mello, apresentado em 20.06.2012, que pretende alterar o art. 1.788 do Código Civil, garantindo aos herdeiros a transmissão de todos os conteúdos de contas e arquivos digitais, e o projeto de Lei e 4.847/2012 (Situação: Arquivada) de autoria do Deputado Marçal Filho, apresentado em 12.12.2012, que visa acrescentar o Capítulo II-A e os arts. 1.797-A a 1.797-C ao Código Civil, estabelecendo normas acerca da herança digital, respectivamente. São os que atualmente tem dado enfoque a questão da herança digital.
Na falta desta regulamentação e diante do sofrimento dos familiares, twitter e o facebook facultam à família manter o perfil ativo, transformando-o em memorial, permanece assim um perfil privado, disponível apenas para os amigos já confirmados, informações sobre atualizações e contato são removidas e não é possível fazer login na conta após a mudança, mesmo com a senha de acesso da pessoa falecida.
Desde 2009, o Facebook permite que os parentes e amigos de usuários falecidos preservem sua página para que mensagens de carinho possam ser deixadas pelos amigos. “O mural permanece intacto para que os amigos e parentes possam deixar publicações em memória do usuário, mas somente amigos confirmados podem localizar o perfil na busca”, explica o Facebook em comunicado. (IG, 2012)
O site brasileiro www.brevitas.com.br, permite registrar senhas de e-mails e redes sociais para que familiares ou amigos possam administrar seus bens virtuais após a morte. Pode-se também programar mensagens de adeus e até uma última postagem no Facebook ou no Twitter. Fazendo com que alguns legados não se percam no espaço virtual.
- CONCLUSÃO
O estudo trouxe algumas reflexões quanto à questão da herança digital. Primeiro momento abordado um conteúdo breve sobre a evolução do armazenamento virtual e sua revolução, pela ótica do volume grandioso e sua propagação rápida.
Depois se abordou a questão de bens digitais, com uma síntese em bens do direito, mesmo que o conceito seja novo, pode tranquilamente ser enquadrado no bens incorpóreos pois é o que mais se assemelha e por vezes trazido por doutrinadores.
No ultimo tópico suscitou a questão do Direito Sucessório, bem como patrimônio e espécies de sucessão, sendo que ao enquadra os bens digitais na categoria dos bens incorpóreos os mesmo são passiveis de sucessão. Por fim observa-se a questão da análise do Direito da Personalidade, onde fica claro no julgado apresentado.
Assim , é possível concluir que é necessário uma legislação que regulamente esta questão, sendo que determine os tipos de bens , como os que são exclusivos de valores como as moedas virtuais existe uma facilidade na transmissão, mas quanto ao legado de privacidade não se pode esquecer de discutir a personalidade do terceiro que participou mesmo que de forma passiva para não transgredir o direito fundamental.
A inciativa já começou com algumas redes sociais deixando o legado como memorial, assim o conteúdo postado anteriormente como não feriu a privacidade em vida, não há que ser feito na morte. Mas quando aos contatos e conversas esta herança deve ser bem pensada , para em vez de ser um alívio a quem perdeu um ente querido não se torne mais uma questão judicial.
- REFERÊNCIAS
LACERDA, Bruno Torquato Zampier. Bens digitais. Indaiatuba: Foco Jurídico, 2017.
LARA, Moisés Fagundes. Herança Digital. Porto Alegre: s.c.p., 2016.
RODRIGUES, Silvio (2003), Direito Civil 1 - Parte Geral. Brasil:Saraiva
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, volume 6 – direito das sucessões, 26ª edição, São Paulo: Saraiva, 2012. Página consultada no dia 24 de setembro de 2014.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito das sucessões. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. v. 7.
Gonçalves, Carlos Roberto . Direito civil brasileiro, volume 7 : direito das sucessões – 11. ed. – São Paulo : Saraiva, 2017.
SILVA, J. F. Herança digital: a importância desta temática para os alunos dos cursos da Faculdade de Informação e Comunicação da Universidade Federal de Goiás. 2014. 83 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Biblioteconomia) – Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2014.
CAHN, N.; BEYER, G. W. Digital Planning: The Future of Elder Law. Naela, v. 9, n. 1, 2013. Disponível em: . Acesso em: 01 nov. 2018.
BELLAMY, C.; ARNOLD, M.; GIBBS, M.; NANSEN, B.; KOHN, T. Death and the Internet: Consumer issues for planning and managing digital legacies, Sydney: Australian Communications Consumer Action Network, 2013. Disponível em: . Acesso em: Acesso em: 01 nov. 2018.
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