Jus postulandi na Justiça do Trabalho e o efetivo acesso à justiça: uma análise da sua (in) eficácia

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11/12/2018 às 22:36
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JUS POSTULANDI – PRÓS E CONTRA E AS ALTERNATIVAS AO JUS POSTULANDI

Ao ser analisado o jus postulandi, muitos questionamentos emergem e diz respeito à constitucionalidade deste instituto. Ocorre que a Constituição Federal (1988) assevera no artigo 133 diz que a presença do advogado é fundamental à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei (BRASIL, 2018).

O artigo 133, tem provocado uma exaustiva discussão entre os doutrinadores como Silva (1994) e Martins (2010) dentre outros, uns defendendo que Constituição Federal, por meio desse dispositivo não mais permite o Jus Postulandi, alegando que o instituto originou-se com a CLT, antes da publicação da respectiva Constituição, e, assim não fora recepcionado.

Sob esse entendimento, o constitucionalista Silva (1994) lecionou que o princípio da essencialidade do advogado na administração da Justiça tornou-se mais severo, transparecendo não mais concordar que leigos postulassem judicialmente, mesmo que para si, exceto se não houvesse profissional capacitado que o fizesse.

Outros doutrinadores versam ainda que não haja recepção do Jus Postulandi, uma vez que a importância do acompanhamento do advogado, descrita no artigo 133, não denota que esse profissional deva atuar em todas as causas, sem deixar espaço ao instituto ora tratado. Seguindo essa compreensão é que Martins (2010, p. 185) dispôs que:

Não existem divergências entre os artigos 791 da CLT e o artigo 133 da Constituição, pois este apenas perfilha a função de direito público cumprida pelo advogado, não gerando qualquer antagonismo com as reservas legais que consentem à parte ajuizar, pessoalmente, a reclamação trabalhista.

A essência do agir do advogado é indispensável à administração da justiça, e a sociedade reconhece. Segundo Ferreira (2015), em relação ao direito é possível dizer que este se torna efetivo frente às figuras interessadas inseridas no seu contexto de ações, sem esquecer-se do juiz, defensores públicos, promotores, o Ministério Público e outras tantas figuras jurídicas.

Caso não se encontre o advogado, a competência é transferida para as partes e para o juiz. Para os doutrinadores que defendem a continuação do Jus Postulandi, expressar a indispensabilidade do advogado vai muito além da interpretação legal, pois, o direito deve ser também exercido fora dos tribunais. Em sentido amplo se percebe a importância da ação do advogado na realização do direito, mas não estrito e adstrito à atuação em processos judiciais (FERREIRA, 2015).

Outras defesas referentes ao Jus Postulandi contemplam a questão econômica, em que na prática forense, os advogados se recusam atuar em pequenas causas. Esse entendimento está na contextualização de Martins (2010, p.186):

Não vai ser qualquer advogado que irá ajuizar a defesa de pequenas causas ou de empregados que 'desejam extinção de advertência ou suspensão, por não trazerem aspecto pecuniário, [...] os sindicatos muitas vezes não querem prestar serviços a quem não é seu associado, muito embora tiver de fazê-lo, e a Procuradoria do Estado normalmente está atarefada e sem condições de prestar a assistência judiciária gratuita a todos os interessados.

O papel do advogado se encontra descrito legalmente no art. 133 da CRFB, art. 2° da Lei n° 8.906 de 1994, e artigo 2° do Código de Ética, não demonstrando forma hierárquica entre estes profissionais e os Juízes de Direito bem como componentes do Ministério Público. A Lei 8.906 de 1994 que dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil destaca:

No art. 1º, caput, que são atividades privativas da advocacia:

 I – a postulação a qualquer órgão do poder judiciário e aos juizados especiais;

II– as atividades de consultoria, assessoria e direção jurídicas (BRASIL,2018).

Dificilmente, o artigo supracitado, 1º da Lei nº 8.906/94 é analisado de forma conjunta com o artigo 133 da CF/88. Os dois artigos mencionados mesmo que de forma diferenciada produzem a compreensão da importância e obrigatoriedade quanto à contribuição do advogado nos atos processuais. Assim, mesmo que no processo trabalhista vigore o princípio do jus postulandi, nos termos do art. 791, da CLT, nada impedem que as partes estejam representadas por advogado, sendo este considerado um auxiliar da Justiça (BRASIL, 2018).

Segundo Ancelmo (2014 apud SOUZA, 2015) a postulação do trabalhador em causa própria pode ferir a celeridade do processo, por consequência, o princípio da duração razoável do processo (CF, art. 5º, LXXVIII), que muitas vezes não traz o conhecimento jurídico e processual adequado para lidar com a lide. Assim, por extensão, ao desconhecer os procedimentos legais o trabalhador, não dispõe amplamente do que define o princípio da ampla defesa.

Impera, portanto, a contradição entre o que produz os princípios legais constitucionais e infraconstitucionais e a aplicabilidade do princípio Jus Postulandi, ao não avaliar o que é definido pelo Estatuto da Advocacia da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), no art. 1º, que ―serem atividades privativas de advocacia ajuizar a qualquer órgão do Poder Judiciário e aos juizados especiais.

A OAB não concorda com o Jus Postulandi, pois compreendem que somente os advogados conduzirão uma defesa de Direitos perante as varas e tribunais da justiça, com os devidos conhecimentos técnicos (FERREIRA, 2015).

 Os defensores do Jus Postulandi sustentam que, a possível extinção do Instituto tornaria inviável o acesso à Justiça aos hipossuficientes, o que vai de encontro com a doutrina que defende o fim desse instituto, pois acreditam que ele traz mais malefícios a benefícios e que há alternativas mais eficazes no nosso ordenamento jurídico.

Os doutrinadores Bryan Garth e Mauro Cappelletti,(1998, p. 164) asseveram que:

Por mais importante que possa ser a inovação, não podemos esquecer o fato de que, apesar de tudo, procedimentos altamente técnicos foram moldados através de muitos séculos de esforços para prevenir arbitrariedades e injustiças. E, embora o procedimento formal não seja, infelizmente, o mais adequado para assegurar os “novos” direitos, especialmente (mas não apenas) ao nível individual, ele atende a algumas importantes funções que não podem ser ignoradas.

Aqui eles demonstram uma preocupação em relação às inovações promovidas a fim de facilitar o acesso à justiça, inclusive, para o instituto do jus postulandi na justiça do trabalho, pois com a facilitação de acesso ao judiciário sem a assistência de advogado, certas arbitrariedades poderão surgir tornando, assim, o que seria uma forma de acesso à justiça em uma verdadeira injustiça, e isso serve, também, para as formas alternativas que poderão surgir, e para enfatizar a importância do advogado no processo, não apenas como uma formalidade mas como uma segurança de efetividade na solução da sua demanda.

Sergio Pinto Martins, ao desaprovar o jus postulandi, analisa a omissão do estado em fornecer advogados para oferecer assistência aos que necessitam e preconiza como solução a indicação de advogado dativo na ausência do sindicato.

A ausência de advogado para o reclamante implica desequilíbrio na relação processual, pois não terá possibilidade de postular tão bem quanto o empregador representado pelo causídico, podendo perder seus direitos pela não-observância de prazos etc. Contudo, essa assistência deveria ser fornecida pelos sindicatos ou, em sua impossibilidade, pelo Estado. Este deveria fornecer gratuitamente advogados para quem deles necessitasse na Justiça do Trabalho, mediante o que é feito no Juízo Criminal, em que é indicado um advogado dativo, que acompanha o processo e é remunerado pelo Estado. Tal atribuição é considerada um múnus público e deveria ser prestada por advogados recém-formados, para que aos poucos adquirissem a prática e, enquanto isso, poderiam ajudar os necessitados. (MARTINS, 2010, p. 189).

A utilização de advogados dativos é uma alternativa mais eficiente que o jus postulandi, afinal, conforme já tratado no trabalho em comento, o advogado é de essencialidade ímpar junto à lide; seria, porém, uma alternativa de caráter paliativo.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

O contexto bibliográfico deste estudo demonstrou que o instituto do jus postulandi é a condição das partes, sujeitos da relação trabalhista, originada de emprego, atuar na Justiça do Trabalho sem o auxílio de advogado. Compreendeu-se que o jus postulandi mesmo apresentando-se como um instituto que tende a proteger a parte menos favorecida nos processos trabalhistas, no caso, o empregado, na atualidade esse enunciado versa contrariamente, pois, ao invés de promover benefícios, vem gerando ao hipossuficiente prejuízos.

A explicação a esse respeito, parte do princípio de que o empregado fica em condição desvantajosa quando em audiência encontra-se com um empregador assistido por um profissional capacitado, e muito bem instruído, como o advogado.

Fato é que, ao percorrer a contextualização dos doutrinadores, pode-se identificar ainda que alguns defendam a permanência do instituto na Justiça do trabalho, compreendendo o jus postulandi como conquista do empregado, alegando que aquele desprovido de recursos financeiros pode vir a reclamar a tutela de seu direito junto ao judiciário, sem arcar com custas processuais, e honorários advocatícios.

O estudo, no entanto revelou que mesmo a criação do jus postulandi ter previsto maior e melhor acesso à justiça, sabe-se que a sua aplicabilidade nos tempos de hoje, em que as contendas trabalhistas se tornaram mais complexas, requer de fato um acompanhamento de um profissional com conhecimento à altura de resolver as lides e obter sucesso. Ainda que se tenha o conhecimento de que o jus postulandi está ao alcance das partes, e permanece legalmente reconhecido, tornou-se importante frisar que ao optar por essa modalidade de acionar a justiça decorre também de acolher resultados sejam positivos ou negativos acerca da demanda, e como foi falado no texto, sem que haja indenização.

Compreendeu-se ainda neste estudo, que o Estado preza pelos direitos fundamentais do cidadão, e ainda busca caminhos favoráveis para que o mesmo possa interpor judicialmente por meio de institutos como o jus postulandi, se tornaria incoerente permitir que litigue em juízo sem um advogado. Assim, o cidadão ao optar pelo jus postulandi, no intuito de ter maior celeridade na Justiça Trabalhista, e ainda visando a questão econômica, ao não pagar os honorários advocatícios, poderia por outro lado se deparar com o prejuízo nos resultados. Assim, é compreensível que o direito de acesso à justiça deva ser apregoado ante todas as considerações elencadas neste trabalho, mas se torna fundamental a assistência do advogado no processo trabalhista para dar maior segurança aos trabalhadores quanto aos direitos já garantidos na Constituição e CLT.

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Estudos como este, se tornam meio contributivo para todos, uma vez que são milhares de trabalhadores que buscam por seus direitos na seara trabalhista. Ao se tratar do jus postulandi, é preciso compreender que nem sempre postular em causa própria se torna o caminho mais favorável à pretensão do trabalhador.


REFERÊNCIAS

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MARCACINI, Augusto Tavares Rosa. Assistência Jurídica, assistência judiciária e justiça gratuita. Rio de Janeiro: Forense, 1996.

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NETO, Francisco Ferreira Jorge; CAVALCANTE, Jouberto de Quadros Pessoa Cavalcante. Direito Processual do Trabalho. 4º Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009.

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SCHIAVI, Mauro. Manual de Direito Processual do Trabalho. 10 ed. São Paulo:LTr,  2016.

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