Prisão em 2ª instância, o jogo do poder

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Julgamento sobre prisão em 2.ª instância virou uma Novela Mexicana. Entre a CRFB de 1988 e o momento histórico, qual sairá vencedor?

Notícias STF:

Quarta-feira, 19 de dezembro de 2018

Ministro Marco Aurélio suspende prisão de condenados por sentenças sem trânsito em julgado

Em decisão monocrática, o ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal (STF), deferiu liminar na Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 54 para assentar a compatibilidade do artigo 283 do Código de Processo Penal (CPP) com a Constituição Federal e determinar a suspensão de execução de pena nas condenações que não tenham transitado em julgado. A decisão refere-se a sentenciados com pedido de apelação criminal que tenham sido presos antes de seu exame. “A harmonia do dispositivo em jogo com a Constituição Federal é completa, considerado o alcance do princípio da não culpabilidade, inexistente campo para tergiversações, que podem levar ao retrocesso constitucional, cultural em seu sentido maior”, ressaltou.

De acordo com a decisão, a prisão preventiva só deve ocorrer nos casos enquadráveis no artigo 312 do Código de Processo Penal (CPP) – ou seja, quando for necessária para a garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.
O ministro salientou que, levando em conta o previsto no artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal, ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. O ministro Marco Aurélio salientou, ainda, que, embora a concessão de cautelar em ação de controle de constitucionalidade seja medida excepcional, a demora em apreciar o pedido, liberado para pauta em abril de 2018 e com julgamento marcado para abril de 2019, constitui no caso dos autos circunstância a autorizar a excepcional atuação unipessoal do relator.

Há discussões sobre a prisão em segunda instância, e maiores discussões quanto ao ex-presidente da República Lula (Luiz Inácio Lula da Silva). No artigo Decisões do STF em virtude dos períodos históricos: RE 80.004-SE/77 e HC 126.292 — Teorias dualista e monista e a presunção de inocência fiz comparações entre decisões do Supremo Tribunal Federal. A prisão em 2ª instância é criticada por violar o princípio constitucional de presunção de inocência, ou seja, invalido prender qualquer ser humano até esgotados todos os recursos e instância (1ª, 2ª e 3ª).

Recebi no meu correio eletrônico, muitíssimo interessante, matéria sobre prisão em segunda instância, transcrevo:

Prisão em 2ª instância é tema polêmico com muitas idas e vindas

A execução provisória da pena é um assunto que desde 1941 suscita debates.

1941

O ano de 1941 foi importante para determinar o destino daqueles que cometeram algum tipo de crime. Isso porque o CPP foi promulgado e, a partir dele, foram regulados temas como o inquérito policial, prova, interrogatório e confissões, além de ficar estabelecido que o juiz pode aplicar, provisoriamente, medidas de segurança ainda no curso do inquérito mediante representação da autoridade policial.

O CPP teve como base um contexto histórico autoritário, com o Estado Novo, e não partia da presunção de inocência do acusado, mas sim de um juízo de antecipação de culpabilidade. Isso implicava que uma simples denúncia, por exemplo, já poderia colocar alguém atrás das grades. O que vigorava, na época, era isso: para recorrer da decisão de prisão, o condenado necessariamente teria que estar preso.

1973

A história começou a mudar quando o delegado Sérgio Paranhos Fleury teve a prisão preventiva decretada. Fleury liderou o chamado "Esquadrão da Morte", em São Paulo, e atuou como delegado do Dops durante a ditadura militar. O caso do delegado alterou a lei processual penal, em regime de urgência, e deu origem à lei 5.941/73, conhecida como lei Fleury.

Ela abriu a possibilidade do réu primário, e de bons antecedentes, aguardar o julgamento em liberdade. A lei Fleury dispunha que a prisão preventiva somente deveria ser determinada em caso de necessidade, o que é, na verdade, uma das bases do princípio da presunção da inocência.

Anos mais tarde, a lei foi duramente criticada sob o argumento de que ela permitia a impunidade de pessoas influentes. Ela foi alterada e a lei 6.416/77 entrou no lugar. A norma alterou o sistema de prisão provisória, ainda mais com o art. 310 do CPP, com sua antiga redação, que tratava da fiança, que passou a ser aplicada apenas em casos excepcionais.

1988

O princípio da presunção da inocência foi legitimado anos mais tarde com a CF de 1988. Mas as alterações legislativas, ao longo dos anos, não deram uniformidade ao entendimento do tema. De um lado, estava o CPP que discorria sobre a antecipação de culpabilidade; do outro uma CF recém formulada na qual consta a presunção de inocência até o trânsito em julgado da sentença. Ficou a questão: pode ser presa antes que todos os recursos sejam exauridos sem que isso afete a presunção da inocência?

A súmula 9 do STJ, que vigorava na época, respondia que sim. A exigência da prisão provisória, para apelar, não ofendia a garantia constitucional da presunção de inocência.

2009

Entretanto, o STF mudou este entendimento e estabeleceu o direito do condenado em segunda instância de recorrer em liberdade quando julgou o HC 84.078 que tratava do caso de um condenado por homicídio.

A ementa daquele julgado ficou assim redigida:

"EMENTA: HABEAS CORPUS. INCONSTITUCIONALIDADE DA CHAMADA "EXECUÇÃO ANTECIPADA DA PENA". ART. 5º, LVII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. ART. 1º, III, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL.

2016

Anos mais tarde, com o julgamento de outro HC, a jurisprudência sobre o tema mudou novamente. O habeas em questão (HC 126.292) discutia a legitimidade de ato do TJ/SP que, ao negar provimento ao recurso exclusivo da defesa, determinou o início da execução da pena. Por maioria, 7 votos a 4, o plenário mudou jurisprudência da Corte, afirmando que é, sim, possível a execução da pena depois de decisão condenatória confirmada em segunda instância.

Atualmente, aguarda-se que as duas medidas cautelares em ADCs (43 e 44), de outubro de 2016, sejam julgadas no mérito, mesmo com a Corte tendo reconhecido via plenário virtual a repercussão geral na matéria (ARE 964.246) e entendido pela reafirmação do entendimento a favor da execução antecipada.

Referência:

MENDONÇA, A. B. Prisão e outras medidas cautelares pessoais. São Paulo: Editora Método, 2011. (Fonte: Migalhas de Peso)

Destaco:

1) 1941

O CPP teve como base um contexto histórico autoritário, com o Estado Novo, e não partia da presunção de inocência do acusado, mas sim de um juízo de antecipação de culpabilidade. Isso implicava que uma simples denúncia, por exemplo, já poderia colocar alguém atrás das grades. O que vigorava, na época, era isso: para recorrer da decisão de prisão, o condenado necessariamente teria que estar preso.

2) 1973

A história começou a mudar quando o delegado Sérgio Paranhos Fleury teve a prisão preventiva decretada. Fleury liderou o chamado "Esquadrão da Morte", em São Paulo, e atuou como delegado do Dops durante a ditadura militar. O caso do delegado alterou a lei processual penal, em regime de urgência, e deu origem à lei 5.941/73, conhecida como lei Fleury.
Ela abriu a possibilidade do réu primário, e de bons antecedentes, aguardar o julgamento em liberdade. A lei Fleury dispunha que a prisão preventiva somente deveria ser determinada em caso de necessidade, o que é, na verdade, uma das bases do princípio da presunção da inocência. (grifos do autor)

Transcreverei alguns trechos do artigo Como amar ou odiar os ministros do STF, advogados, jornalistas e a própria CRFB de 1988 — "Brasil, ame-o ou deixe-o!":

1) O RE 80.004-SE/77

(...)

A decisão do STF histórica — antes do RE 80.004-SE/77, o STF aplicava a superioridade hierárquica do direito internacional sobre o direito interno — mudou o entendimento da aplicação do direito internacional sobre o direito interno, de forma que prevaleu o direito interno. Tal decisão repercutiu, ulteriormente à década de 1970, nas decisões da Corte Suprema. Parecia que a antinomia estava resolvida, a prevalência do direito interno brasileiro sobre o direito internacional, como as convenções e tratados internacionais.

Parecia! No Recurso Extraordinário n. 466.343/2008, o STF considerou a proibição da prisão civil por dívida só depositário infiel, com fundamento na Convenção Americana de Direitos Humanos (art. 7º, § 7º). A decisão mudou o entendimento do RE 80.004-SE/1977 sobre a hierarquia do direito interno ao direito internacional. Vejam que o RE n. 466.343 é de 2008 enquanto o RE 80.004-SE data de 1997.

2) O HC 126.292

Outra decisão histórica que repercutirá é o HC 126.292 ao condenar à prisão em segunda instância. A presunção de inocência está normatizada na Carta Política de 1988, no art. 5º, LVII, in verbis:

“ninguém será considerado culpado até trânsito em julgado de sentença penal condenatória.”

Trânsito julgado é a possibilidade de o cidadão, mesmo em ato de flagrante delito, como do furto de maçã ao homicídio, ter a legítima defesa e o contraditório. A presunção de inocência [ art. 5º, LVII] é norma basilar numa democracia cuja essência é de se evitar condenações arbitrárias, como motivação pessoal do juiz [projeção, por exemplo] ou que este venha a dar sentença motivado pela pressão popular ou de jornalistas. Assim, a presunção de inocência é a garantia do Estado Democrático de Direito consubstanciado com os direitos humanos.

Por que a presunção de inocência no ordenamento jurídico pátrio? A Carta Política de 1988 é promulgada e, como tal, sua essência deriva de fato histórico perturbador, como foi o Golpe Militar [1964 a 1985], o qual violou vários vários direitos humanos, isto devido ao fato do qual nenhuma Constituição anterior a CF/88 explicitou o princípio da inocência — se verificarmos, mesmo nas constituições promulgadas [1891, 1934 e 1946] anteriores a vigente, violações a dignidade humana eram cometidas sem o menor pudor de ser animalescas; sociopoliticamente falando, por exemplo, os párias [negros, nordestinos, pessoas com necessidade especiais, mulheres, homossexuais] eram transgredidos quanto ao princípio da isonomia, mesmo que declarada nas constituições de 1891, 1934 e 1946, quanto mais a de 1988.

Preceitua o artigo 9.º, n.º 1 do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos

“1. Todo o indivíduo tem direito à liberdade e à segurança da sua pessoa. Ninguém pode ser objeto de prisão ou detenção arbitrária. Ninguém pode ser privado da sua liberdade a não ser por motivo e em conformidade com processos previstos na lei."

Notem que, de certa forma, Tratados Internacionais de Direitos Humanos (TIHDs) podem ser aplicados no ordenamento jurídico pátrio tornando 'letra morta' (norma de algum artigo) no 'corpo constitucional':

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

(...)

LXVII - não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel.

Nada mais a declarar, nada disto.

EM DEFESA DOS MILITARES

ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL 153 DISTRITO FEDERAL (ADPF 153/2008),  por 7 a 2, os ministros consideraram a ADPF 153 improcedente; o ADPF 153 foi proposto pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB.

22. Prossegue dizendo que “[a] relevantíssima questão submetida ao Supremo Tribunal Federal, entretanto, não comporta exame dissociado do contexto histórico em que editada a norma objeto da arguição, absolutamente decisivo para a sua adequada interpretação e para o juízo definitivo acerca das alegações deduzidas pela Ordem, como, aliás, já destacado em outros pronunciamentos trazidos aos autos. A anistia, no Brasil, todos sabemos, resultou de um longo debate nacional, com a participação de diversos setores da sociedade civil, a fim de viabilizar a transição entre o regime autoritário militar e o regime democrático atual. A sociedade civil brasileira, para além de uma singela participação neste processo, articulou-se e marcou na história do país uma luta pela democracia e pela transição pacífica e harmônica, capaz de evitar maiores conflitos” [fls. 598/599].

APURAÇÕES DOS CRIMES COMETIDOS PELOS MILITARES BRASILEIROS

Caso Gomes Lund e Outro (“Guerrilha do Araguaia”) v. Brasil

CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS CASO GOMES LUND E OUTROS (“GUERRILHA DO ARAGUAIA”) VS. BRASIL SENTENÇA DE 24 DE NOVEMBRO DE 2010 (Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas)

174. Dada sua manifesta incompatibilidade com a Convenção Americana, as disposições da Lei de Anistia brasileira que impedem a investigação e sanção de graves violações de direitos humanos carecem de efeitos jurídicos. Em consequência, não podem continuar a representar um obstáculo para a investigação dos fatos do presente caso, nem para a identificação e punição dos responsáveis, nem podem ter igual ou similar impacto sobre outros casos de graves violações de direitos humanos consagrados na Convenção Americana ocorridos no Brasil. 

(...)

E DISPÕE, por unanimidade, que: 

8. Esta Sentença constitui per se uma forma de reparação. 

9. O Estado deve conduzir eficazmente, perante a jurisdição ordinária, a investigação penal dos fatos do presente caso a fim de esclarecê-los, determinar as correspondentes responsabilidades penais e aplicar efetivamente as sanções e consequências que a lei preveja, em conformidade com o estabelecido nos parágrafos 256 e 257 da presente Sentença.

10. O Estado deve realizar todos os esforços para determinar o paradeiro das vítimas desaparecidas e, se for o caso, identificar e entregar os restos mortais a seus familiares, em conformidade com o estabelecido nos parágrafos 261 a 263 da presente Sentencia.

11. O Estado deve oferecer o tratamento médico e psicológico ou psiquiátrico que as vítimas requeiram e, se for o caso, pagar o montante estabelecido, em conformidade com o estabelecido nos parágrafos 267 a 269 da presente Sentença. 

12. O Estado deve realizar as publicações ordenadas, em conformidade com o estabelecido no parágrafo 273 da presente Sentença.

 13. O Estado deve realizar um ato público de reconhecimento de responsabilidade internacional a respeito dos fatos do presente caso, em conformidade com o estabelecido no parágrafo 277 da presente Sentença. 

14. O Estado deve continuar com as ações desenvolvidas em matéria de capacitação e implementar, em um prazo razoável, um programa ou curso permanente e obrigatório sobre direitos humanos, dirigido a todos os níveis hierárquicos das Forças Armadas, em conformidade com o estabelecido no parágrafo 283 da presente Sentença. 

15. O Estado deve adotar, em um prazo razoável, as medidas que sejam necessárias para tipificar o delito de desaparecimento forçado de pessoas em conformidade com os parâmetros interamericanos, nos termos do estabelecido no parágrafo 287 da presente Sentença. Enquanto cumpre com esta medida, o Estado deve adotar todas aquelas ações que garantam o efetivo julgamento, e se for o caso, a punição em relação aos fatos constitutivos de desaparecimento forçado através dos mecanismos existentes no direito interno. 

16. O Estado deve continuar desenvolvendo as iniciativas de busca, sistematização e publicação de toda a informação sobre a Guerrilha do Araguaia, assim como da informação relativa a violações de direitos humanos ocorridas durante o regime militar, garantindo o acesso à mesma nos termos do parágrafo 292 da presente Sentença.

(...)

VI. CONCLUSÃO

30. Finalmente é prudente lembrar que a jurisprudência, o costume e a doutrina internacionais consagram que nenhuma lei ou norma de direito interno, tais como as disposições acerca da anistia, as normas de prescrição e outras excludentes de punibilidade, deve impedir que um Estado cumpra a sua obrigação inalienável de punir os crimes de lesa-humanidade, por serem eles insuperáveis nas existências de um indivíduo agredido, nas memórias dos componentes de seu círculo social e nas transmissões por gerações de toda a humanidade. 

31. É preciso ultrapassar o positivismo exacerbado, pois só assim se entrará em um novo período de respeito aos direitos da pessoa, contribuindo para acabar com o círculo de impunidade no Brasil. É preciso mostrar que a Justiça age de forma igualitária na punição de quem quer que pratique graves crimes contra a humanidade, de modo que a imperatividade do Direito e da Justiça sirvam sempre para mostrar que práticas tão cruéis e desumanas jamais podem se repetir, jamais serão esquecidas e a qualquer tempo serão punidas.

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Depreende-se, até aqui, que o Brasil decide conforme suas próprias motivações, ou forças antidireitos humanos. Neste jogo, é notório que as violações aos direitos humanos são amplos, mas 'justificáveis'. O caos na saúde é assunto para marciana (o), os órgãos da Administração Pública não se entendem, não há uma parceria eficiente (Emenda Constitucional nº 19/1988), por exemplo, contra as barbáries nos serviços público de saúde. Hoje assisti o caos, como sempre, na saúde: sem ar condicionado em pleno calor. A desculpa da Prefeitura, ou qualquer outro ente federativo, é de que 'algo está sendo feito'. Ora, calor e sensação térmica elevada não dá em único ano, disto é descaso, violação à dignidade de cada ser humano por necessidade de prestação, eficiente, de serviço de saúde. A tradicionalidade brasileira de violar direitos humanos não se limita a este século. Interesses, nada humanísticos, transformam o ser humano como objeto; e como qualquer objeto só tem valor enquanto der lucro (votos etc.).

"A anistia, no Brasil, todos sabemos, resultou de um longo debate nacional, com a participação de diversos setores da sociedade civil, a fim de viabilizar a transição entre o regime autoritário militar e o regime democrático atual."

Ora, quem não tem armas pode negociar como quer? Claro que não, negocia conforme a forço de quem pode negociar, ditas condições. Fato! Fato este pelos movimentos sociais, no Brasil, contra os governos militares. Se no início parecia 'salvação', no meio do caminho foi absoluto 'confisco de liberdades públicas'. Tanto foi, Direitas Já! Os militares, ou mesmo os civis, puderam dizer aos EUA, mais precisamente a IV frota, que não queriam nenhuma intromissão externa em sua soberania? Ou mesmo para a URSS ou qualquer outro país? Não!

Querendo ou não, a prisão em segunda instância não afeta somente Lula, como eu já afirmei em outro artigo, contudo coletivamente. Se os presídios estão superlotados, ensejando medidas para impedir superlotações, como evitar encarceramento imediato, em alguns casos, o próprio sistema jurídico em si é bipolar quando admite a prisão em segunda instância. Se há encarcerado, sem o devido processo legal, imaginem com a decretação da prisão em segunda instância? A celeridade do judiciário é movida com combustível adulterado, para cada caso há motivações sociais, com pontas de baionetas ou não; é só ver o caso da não indenização à família real pelo Palácio da Guanabara.

O mais estranho disto tudo, por que é possível entrevistar traficantes e não Lula?

Enfim, a única justiça que se tem no Brasil é 'momento histórico'. Dois pesos e duas medidas, jamais!

Interessante:

No Brasil, o histórico descaso por parte do Estado com relação aos estabelecimentos prisionais, para além de todas as críticas ao encarceramento, impossibilita a satisfação dos fins a que a pena se destina. O sistema carcerário brasileiro está longe de ser um meio de contenção da criminalidade, tornando-se, ao contrário, cada vez mais um dos maiores propulsores do aumento da violência. Muito distantes do propósito de reinserir socialmente, as prisões têm contribuído para o aumento das taxas de criminalidade. O encarceramento produz reincidência: depois de sair da prisão, aumentam as chances de voltar para ela (delinquência secundária). É preciso, sem dúvida, investir nas prisões e garantir melhores condições de encarceramento. No entanto, este investimento deve estar acompanhado da adoção de políticas descarcerizantes, já que em um país como o Brasil a opção pelo endurecimento penal tem um óbvio efeito de seletividade, criminalizando prioritariamente jovens pobres e moradores de periferia. As políticas de descarcerização, para que sejam efetivas e passem a contar com o apoio público, devem estar acompanhadas de mecanismos eficientes para a aplicação e o controle das alternativas ao cárcere. Com esse objetivo tem sido adotada desde 2009, como se nota pelo Decreto Presidencial nº 7.046, de 22 de dezembro de 2009, uma política criminal para o esvaziamento da prisão, vulgarmente conhecido como “saidão” de Natal, observada vedação estabelecida pela Constituição Federal de 1988 sobre a concessão de fiança, graça ou anistia em casos de tortura, de tráfico ilícito de entorpecentes e de drogas afins, terrorismo e dos definidos crimes hediondos (artigo 5º, inciso XLIII). Reconhece-se, assim, que o encarceramento em massa possui caráter deletério e devastador da personalidade humana e da dignidade do preso, por vezes causando maior dano que o próprio fato penal praticado. Vejamos a redação do então parágrafo único do art. 7º do Decreto Presidencial nº 7.046, que apregoa: “Parágrafo único. Na hipótese de haver concurso com infração descrita no art. 8º, a pessoa condenada não terá direito ao indulto ou à comutação da pena correspondente ao crime não impeditivo, enquanto não cumprir, no mínimo, dois terços da pena, correspondente ao crime impeditivo dos benefícios (art. 76 do Código Penal) (grifo nosso).” Ressoa cristalino que não se está a discutir a concessão do indulto ou comutação da pena aos crimes hediondos, mas simplesmente a sua aplicabilidade às demais infrações que não ostentem esta natureza (delitos não impeditivos), respeitando o inciso XLIII, do art. 5º da Constituição Federal.

(...)

Contudo, em 2006, o Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento do Habeas Corpus nº 82959/SP, decidiu pela inconstitucionalidade do dispositivo da Lei dos Crimes Hediondos que determinava o cumprimento integral destes crimes em regime fechado.

Com a publicação da Lei nº 11.464, de 28 de março de 2007, o legislador ordinário incorporou à Lei dos Crimes Hediondos a decisão exarada pelo STF, determinando que a pena imposta seja cumprida em regime inicialmente fechado, admitindo-se a progressão após a liquidação de 2/5 (dois quintos) da sanção, se o apenado for primário, e de 3/5 (três quintos), se reincidente.

Mesmo após a edição da lei supramencionada, o STF julgou que os crimes hediondos podem receber tratamento mais benevolente. Nessa esteira, por maioria de votos, o Plenário do Supremo Tribunal Federal concedeu, durante sessão extraordinária realizada no dia 27 de junho de 2012, o Habeas Corpus nº 111840 e declarou incidentalmente a inconstitucionalidade do parágrafo 1º do artigo 2º da Lei nº 8.072/90, com redação dada pela Lei nº 11.464/07, o qual prevê que a pena por crime hediondo (inclusive tráfico de drogas) será cumprida, inicialmente, em regime fechado.

O julgamento teve início em 14 de junho de 2012 e, naquela ocasião, cinco ministros se pronunciaram pela inconstitucionalidade do dispositivo: Dias Toffoli (relator), Rosa Weber, Cármen Lúcia Antunes Rocha, Ricardo Lewandowski e Cezar Peluso. Em sentido contrário, se pronunciaram os Ministros Luiz Fux, Marco Aurélio e Joaquim Barbosa, que votaram pelo indeferimento da ordem. Na última sessão, em que foi concluído o julgamento, os Ministros Gilmar Mendes, Celso de Mello e Ayres Britto acompanharam o voto do relator, Ministro Dias Toffoli, pela concessão do Habeas Corpus e para declarar a inconstitucionalidade do parágrafo 1º do art. 2º da Lei nº 8.072/90. De acordo com o entendimento do relator, o dispositivo contraria a Constituição Federal, especificamente no ponto que trata do princípio da individualização da pena (artigo 5º, inciso XLVI).

Assim, a partir de tais alterações inovações legislativas feitas pela Lei nº 11.464/2007 e pela jurisprudência da Suprema Corte, a pena aplicada aos crimes hediondos nem sempre é considerada mais grave em sua totalidade, tendo em vista a possibilidade de progressão de regime prisional. Ela só se torna mais grave no cumprimento dos seus iniciais 2/5 (dois quintos), pois realizados em regime fechado. Após este período, a pena de tal crime passa a ser em regime semiaberto, tornando-se menos grave do que eventual cumprimento de pena por outro crime com regime inicial fechado. ( Os desafios de um superencarceramento —  Jornal da Escola Superior da Defensoria Pública da União 2 º Trimestre de 2016/ Ed. Nº 05, ano 2. Disponível em: https://www.dpu.def.br/images/esdpu/jornaldpu/jornal-edicao-5.pdf)

Leia também:

P.S.: Agora mesmo o presidente do STF Dias Toffoli, monocraticamente, suspende decisão, monocromática, de Marco Aurélio. 

Como é final de ano, o presidente do STF, ministro Dias Toffoli, marcou para dia 10 (dez) de abril de 2019 a Novela Mexicana da Prisão em Segunda Instância. Drama, comoção, lágrimas, alívio, esperança. Qual será o desfecho?

Sobre o autor
Sérgio Henrique da Silva Pereira

Articulista/colunista nos sites: Academia Brasileira de Direito (ABDIR), Âmbito Jurídico, Conteúdo Jurídico, Editora JC, Governet Editora [Revista Governet – A Revista do Administrador Público], JusBrasil, JusNavigandi, JurisWay, Portal Educação, Revista do Portal Jurídico Investidura. Participação na Rádio Justiça. Podcast SHSPJORNAL

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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