Entenda a extensão de seus direitos nas compras por aplicativos.
JÚLIO CÉSAR BALLERINI SILVA MAGISTRADO E PROFESSOR COORDENADOR NACIONAL DO CURSO DE PÓS GRADUAÇÃO EM DIREITO CIVIL E PROCESSO CIVIL DA ESCOLA SUPERIOR DE DIREITO – ESD PROORDEM CAMPINAS E DA PÓS GRADUAÇÃO EM DIREITO MÉDICO DA VIDA MARKETING. PROFESSOR DE GRADUAÇÃO DA UNITÁ E DA UNIP, AUTOR DE LIVROS E ARTIGOS JURÍDICOS
Seguindo linha de meu artigo anterior, apresento para vocês entrevista que concedi ao SBT sobre o tema, apresentando informações relevantes a respeito do que vem sendo decidido em conflitos envolvendo compras em aplicativos.
Basicamente, não se pode esquecer de que, nesse tipo de compra ou prestação de serviços, normalmente se tenham relações de consumo, no caso do transporte com uma facilidade a mais que seria a cláusula de incolumidade do bem ou pessoa transportada previsto no Código Civil.
Assim, de acordo com a interpretação do diálogo de fontes, pontuada por Erik Jaime e aceita de modo corrente no direito brasileiro, tem-se que os conflitos com relações de consumo, aplicam-se não apenas as regras do CDC, mas também todas as legislações pertinentes que sejam cabíveis para facilitar a vida do consumidor, visto, num ambiente de operabilidade (em que, em contratos se deva tratar desigualmente os desiguais) sempre como hipossuficiente.
Pela cláusula de incolumidade, toda mercadoria deve ser entregue em estado perfeito, e sendo uma relação de consumo, deve-se aplicar a inversão dos ônus probatórios em favor do consumidor. Isso porque a empresa tem a expertise do negócio e deve tomar a cautela de verificar se a mercadoria estava inteira antes de aceitar o trabalho.
Isso é decorrência óbvia, ocorre dentro da lógica das presunções juris hominis - aqueles máximas de experiência a que se refere o artigo 375 CPC. Vale apontar que, se o transportador aceitou a mercadoria foi porque estava inteira, se o consumidor assim não a recebeu que comprove o transportador, que estava ligado a essa expertise do trabalho, que o consumidor provocou os danos.
Vale apontar que transportadores e fornecedores respondem de modo objetivo, sempre em responsabilidade solidária, eis que, se é certo que a solidariedade não se presume, decorrendo da lei ou da vontade das partes (artigo 265 CC) tem-se que o artigo 17 CDC expressamente prevê o caráter solidário da responsabilidade de todos os envolvidos no setor de fornecimento em relação a consumidores, vistos, nessa mencionada operabilidade sempre como parte hipossuficiente.
Tudo isso sem que se deixe de apontar no sentido de que se o expedidor (vendedor, fabricante, transportador etc) escolheu mal responderia pela própria responsabilidade civil subjetiva por culpa in eligendo, mas como a relação é de consumo, sequer se cuidaria de situação em que isso seria relevante, já que a responsabilidade do consumidor seria objetiva, ou seja, independeria de comprovação de dolo ou culpa para o consumidor.
O próprio conceito de consumidor como destinatário final do produto ou serviço, vem sendo jurisprudencialmente ampliado, por obra da corrente maximalista que dá ênfase em figuras com o bystander enquanto vítima de acidente de consumo, equiparado a consumidor, e hoje pela corrente denominada finalismo aprofundado - ou seja, mesmo a pessoa não seja o destinatário final, eis que seria MEI ou ME ou EIRELI seria obviamente hipossuficiente podendo, a depender do caso, invocar o finalismo aprofundado em seu favor.
Assistam a entrevista, e, se gostarem compartilhem e deixem um like. Vejam os vários exemplos que aponto, inclusive a possibilidade de incidência de danos morais em casos de frustrações de expectativas mormente em épocas festivas, como compras que não foram entregues no Natal ou na data do aniversário.
Vale lembrar que há posturas discriminatórias de preconceito social, com a recusa de entregar mercadorias em determinados endereços, geralmente de pessoas mais pobres, por conta de razões de suposta falta de segurança – fornecedores não podem repassar a ineficiência estatal para consumidores hipossuficientes, isso gera situações de evidente exclusão social em contrariedade ao disposto no artigo 3º CF.
Nos casos de compras exclusivamente por aplicativos, em que o consumidor sequer viu o produto antes da emprega, inclusive, há o direito livre de desistência do negócio, nos termos do artigo 49 CDC, não se podendo, ainda, esquecer da regra ubi commoda ibi incommoda no sentido de que quem arcar com as vantagens do negócio deverá arcar com as desvantagens, mais um argumento a justificiar o ato-fato responsabilidade civil objetiva em casos como este.
Ademais são vários os precedentes que autorizam condenações indenizatórias em casos de preconceito social. Abaixo o link da matéria.