Parcelamento do solo para fins urbanos. Condomínio de lotes. Lei nº 6.766/79, art. 2º, § 7º.

13/01/2019 às 15:49
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É desenvolvido estudo a respeito do condomínio de lotes, antes do advento da Lei nº 13.465/17. Esclarece como implantar o empreendimento desde a fase de fixação de diretrizes até o registro na serventia imobiliária.

SUMÁRIO

1-Colocação do tema; 2- Estrutura Legal; 3- Regulamentação pelo Município; 4- O Empreendimento; 5- O Registro Imobiliário.

 

1-Colocação do tema

 

A Lei nº 13.465/2017 inclui o § 7º no art. 2º na Lei nº 6.766/79, que disciplina o parcelamento do solo para fins urbanos, autorizando que o loteamento seja constituído sob a forma condomínio, e considerando o lote como unidade imobiliária.

 

 O tema mereceu amplo debate até agora, controvertendo-se até mesmo na terminologia a ser empregada. Falava-se, então, em loteamento fechado, loteamento especial, loteamento em condomínio, loteamento integrado, condomínio deitado entre outras denominações. O que se buscava era distinguir a modalidade de aproveitamento do solo que não estava subordinada ao regime da Lei nº 6.766/79. A disciplina genérica estava n Lei nº 4.591/64, em especial o art. 8º e 68, e no Decreto-lei nº 271/67, art. 3º.

 

Observo que a expressão loteamento fechado era utilizada por alguns doutrinadores para indicar o loteamento constituído na forma da Lei nº 6.766/79, mas que se afastava do loteamento tradicional porque as vias públicas, que passam a ser propriedade do Município, tinham sua utilização assegurada apenas aos proprietários dos lotes, o que se obtinha mediante permissão ou concessão de uso. (a respeito do tema: Marco Aurelio S. Viana, Loteamento Fechado e Loteamento Horizontal, pág.28).

 

Mas havia juristas que utilizavam a expressão loteamento fechado como sinônimo de loteamento horizontal, sendo que este era implantado sob a permissão genérica do art. 8º da Lei nº 4.591/64. (Eurico de Andrade Azevedo, Loteamento Fechado, In Revista de Direito Imobiliário, nº 11/ janeiro-junho de 1983).

 

Condomínio deitado foi terminologia empregada por ELVINO SILVA FILHO, para quem era o condomínio que se estabelecia na construção de casas térreas assobradadas, tendo por base legal o art. 8º da Lei nº 4.591/64. ((Elvino Silva Filho, apud Marco Aurelio S. Viana, Loteamento Fechado e Loteamento Horizontal cit., pág. 108).

 

Se dúvida não havia quanto à possibilidade de se instituir loteamento na forma do art. 8º da Lei nº 4.591/64, com vinculação à construção, divergência se estabelecia quanto ao loteamento sem edificação.

 

JOSÉ AFONSO SILVA e DIÓGENES GASPARINI, não admitiam o loteamento sem edificação. Para essa vertente doutrinária não seria possível a solução, pelas seguintes razões:

 

a)    Não se pode falar em loteamento porque esse vocábulo exprime a divisão de uma gleba com o aparecimento de unidades menores;

 

b)    Inexiste disciplina legal específica, não se aplicando o Código Civil ou a Lei nº 4.591/64;

 

c)    O art. 8º da Lei nº 4.591/64 só tem aplicação a áreas de dimensão reduzida no interior de quadras;

 

d) à míngua de disciplina específica, a Administração Pública fica inibida de autorizar o parcelamento; e) o art. 8º só se aplica em havendo vinculação à construção. (Marco Aurelio S. Viana, Loteamento Fechado e Loteamento Horizontal cit., pág. 107).

 

  Em parecer, EURICO DE ANDRADE AZEVEDO, concluiu pela viabilidade legal de se implantar loteamento sob a forma de condomínio, sem construção, envolvendo apenas execução de obras do sistema viário interno e daquelas necessárias à demarcação dos lotes de utilização exclusiva e das áreas de lazer e de produção, entendendo que a espécie se submetia à Lei nº 4.591/64. (Eurico Andrade de Azevedo, apud Marco Aurelio S. Viana, Loteamento Fechado e Loteamento Horizontal, pág. 112).

 

Para R. LIMONGI FRANÇA não existia texto específico a respeito. Referia-se ao art. 68 da Lei nº 4.591/64, dizendo que na dicção do dispositivo legal citado havia referência

a proprietários ou titulares de direito aquisitivo (sic) sobre terras rurais ou os terrenos” e observava que o artigo em questão dizia, ainda, “onde pretendem construir ou mandar construir habitações isoladas para aliená-las antes de concluídas”. E entendia, a partir da dicção do art. 68 que “se, de um lado não há proibição do condomínio por unidades autônomas de terrenos, vigorando o princípio da autonomia da vontade, do outro, a possibilidade de alienação das habitações antes de concluídas, conforme o citado art. 68, reforça a viabilidade da alienação das respectivas áreas, dentro desta variedade condominial”. (Instituições de Direito Civil, pág. 502)

 

Pessoalmente, sempre sustentei ser possível implantar loteamento sob a forma de condomínio sem vinculação à construção, fazendo-o pela primeira vez em monografia publicada em 1991, cujo título é “Loteamento Fechado e Loteamento Horizontal” pela editora Aide. E em todas as oportunidades que escrevi sobre o tema, mantive esse entendimento. Mais recentemente, no volume XVI dos Comentários ao Código Civil, 4ª. edição, da editora Forense, abordando o condomínio edilício,  defendi esse ponto de vista, apoiado no art. 68 da Lei nº 4.591/64, e fazendo referência ao art. 3º do Decreto-Lei nº 271/1967, onde se lê:

 “Aplica-se aos loteamentos a Lei nº 4.591, de 16 de dezembro de 1964, equiparando-se o loteador ao incorporador, os compradores de lotes aos condôminos e as obras de infraestrutura à construção da edificação”.

 

Entendi, uma vez mais, que “temos previsão clara a respeito da forma de utilização da propriedade. A regulamentação, que deverá vir em Decreto-lei, inclusive para as necessárias adaptações, não impede sua adoção, porque abasta tomar a regulamentação da Lei nº 4.591/1964 para dar segurança jurídica aos interessados”. (pág. 461/462)

 

Em verdade, a matéria é de direito urbanístico e essa modalidade de aproveitamento do solo urbano é decorrência das transformações operadas na sociedade, em busca de segurança, que o Estado brasileiro não é capaz de assegurar. Cuida-se atividade econômica que decorre do processo moderno de urbanização, e já fora previsto no Decreto-Lei nº271/1967 de maneira clara.

 

Em boa hora, mas com significativo atraso, a Lei nº 6.766/79 acolhe a espécie, em que pese ela estar no direito positivo desde 1967…

Cabe ao jurista desenvolver os vários aspectos do tema para viabilizar a adoção desse serviço que a propriedade assegura ao “dominus”.

 

2-Estrutura Legal

 

Tenho como certo que não cuida de loteamento sob a forma de condomínio voluntário, disciplinado pelos artigos 1.314 a 1.326 do Código Civil. Condomínio é espécie do gênero comunhão e expressa a aquela situação em que duas ou mais pessoas exercem em comum o direito de propriedade sobre coisa móvel ou imóvel. O poder de disposição sobre a coisa materializa-se em vários sujeitos simultaneamente. O direito dos titulares é exercido em conjunto e cada um deles exerce o mesmo direito idealmente no todo e em cada uma de suas partes. A participação dos vários comunheiros é qualitativamente idêntica, mas não necessariamente quantitativamente idêntica.

 

A orientação do Código Civil é no sentido da subsistência, em cada um dos condôminos, da propriedade sobre toda a coisa, cujo limite se localiza no igual direito dos demais comunheiros, nas relações internas. Em relação a terceiros, cada condômino atua como titular do direito de propriedade em sua abrangência. O regime legal adotado pelo Código Civil visa justamente estabelecer o equilíbrio entre as esferas jurídicas

No condomínio voluntário é assegurado ao condômino o direito de exigir a divisão da coisa, o que se coaduna com o caráter transitório dessa espécie de comunhão, tendo previsão no art. 1.320 do diploma civil.  Cuida-se de direito imprescritível, porque essa modalidade natural da propriedade é um estado anormal, como já assinalou CLÓVIS BEVILÁQUA, “muito frequentemente gerador de rixas e desavenças, e fomentador de discórdias e litígios”. (Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de Direito Civil, 19ª. ed,. IV, pág. 180, nº317).

 

Acrescente-se, ainda, o fato de não existir propriedade comum e propriedade individual, mas exercício do direito de propriedade por uma pluralidade de titulares, havendo um conflito de sobreposição, que se revolve pela recíproca limitação no exercício dos direitos concorrentes, “de modo a chegar-se a uma situação de identificação de vantagens e sacrifícios”. (José de Oliveira Ascensão, apud Marco Aurelio S. Viana, Comentários ao Código Civil, v. XIV, pág. 407).

 

Não vejo como adotar o condomínio voluntário para a implantação de loteamento em que o lote é tido como unidade imobiliária em condomínio de lotes. Enxergo na figura prevista no § 7º do art. 2º da Lei nº 6.766/79 a adoção da estrutura do condomínio edilício (arts. 1.331 a 1.357 do Código Civil), o que se coaduna com a simbiose entre propriedade individual e propriedade em comum, e se encontra no direito positivo com a Lei nº 4.591/64, art. 68, assim como com a referência clara e objetiva presente no art. 3º do Decreto-Lei nº 271/1967, que equiparou o loteador ao incorporador, os compradores de lotes aos condôminos e as obras de infraestrutura à construção da edificação.

 

A conjugação da propriedade individual, incidente sobre o lote, que se denomina como unidade imobiliária, na dicção da Lei nº 6.766/79, e que se identifica com as unidades autônomas (apartamentos, lojas, salas, garagens, ou seja, unidades isoladas de propriedade exclusiva), com a propriedade em condomínio, propriedade coletiva que incide sobre as partes e coisas comuns só se alcança com a estrutura legal do condomínio edilício.

 

Em comentários ao art. 1.311 do Código Civil observei que “como advertem Francisco Rodrigues Pardal e Manuel Baptista Dias da Fonseca, “a existência as partes comuns no edifício é que dá ao instituto a fisionomia verdadeira e própria” (Da Propriedade Horizontal, 5ª. ed., p. 94). José de Oliveira Ascensão ensina que a propriedade horizontal “é um novo direito real caracterizado pro resultar de um complexo incindível de propriedade do andar e compropriedade das partes comuns” (Direitos Civil – Reais, pág. 408). Caio Mário da Silva Pereira ensina que “o que caracteriza essa modalidade dominial é precisamente a simbiose orgânica da propriedade individual e da propriedade coletiva. Na mesma pessoa coexistem a propriedade individual “sobre a unidade”, devidamente caracterizada; e a propriedade coletiva sobre o terreno e sobre as partes e coisas comuns”. (Direito Civil – Alguns Aspectos da sua Evolução, ed. 2001, pág. 278)”. (Marco Aurelio S. Viana, Comentários cit., v. XIV, 4ª. ed.,pág. 456).

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Importante notar que o condomínio como instituto de direito civil, que permite convivam a propriedade individual e a coletiva, tem suas raízes na lei, que determina a conjugação mediante divisão atípica, que se viabiliza pela instituição do condomínio, quando se põe fim ao estado de indivisão que até então vigorava sobre o imóvel e atribui, no caso de loteamento, os lotes (unidades imobiliárias) aos seus titulares, dividindo a gleba, delimitando a copropriedade, ou seja, a que incide sobre o terreno e partes comuns, que é a essência do instituto, mediante a determinação das frações ideais. ((Marco Aurelio S. Viana, Manual do Condomínio Edilício, págs. 17/18).

 

A instituição do condomínio reclama a obediência a condições de ordem técnica, previstas no art. 1.332 do Código Civil, é o instrumento legal de criação do condomínio. Já sua constituição envolve ato de vontade que submete o condomínio criado a regime legal específico.

 

Deixando aos mais doutos a abordagem desse aspecto do tema, entendo que é no regime legal do condomínio edilício que se encontra o caminho para que se viabilize essa forma de utilização da gleba urbana. Observo, contudo, que não se cuida de modalidade de condomínio edilício, mas de loteamento, e como tal segue, na sua aprovação, as regras da Lei nº 6.766/79, cumprindo ao empreendedor, ao solicitar as diretrizes, informar ao Município que pretende lotear sob a forma de condomínio, o que implica em serem as vias internas de propriedade comum bem, e como tal é que se autoriza o loteamento.

 

3-Regulamentação pelo Município

 

A Lei nº 10.257/2001 (Estatuto da Cidade) regulamenta os artigos 182 e 183 da Constituição Federal, que dispõem sobre a política urbana. A Lei especial fornece os instrumentos a serem utilizados em matéria urbanística, visando o ordenamento do espaço urbano, assegurando o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. (art. 225 da Constituição Federal).

 

O § 1º do art. 182 da Constituição Federal estabelece ser o plano diretor o “instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana”.

 

O Município é competente para ordenar a vida urbana, o que decorre de sua autonomia legislativa nesse particular, sendo sua atribuição, ainda, o planejamento municipal, com destaque para o plano diretor e a disciplina do parcelamento, do uso e da ocupação do solo. (art. 4º, III, a e b do Estatuto da Cidade)

 

A edição de normais gerais em matéria urbanística é da União (art. 24, § 1º da Constituição Federal) Essa competência não afasta a legislativa suplementar dos Estados (§ 2º). O Município, a seu turno, é competente para legislar a esse respeito, o que implica em dizer que pode adequar a legislação federal e estadual segundo o interesse local, já que é sua atribuição desenvolver a política de desenvolvimento urbano. (art. 182 da Constituição Federal) Em que pese estar submetido às diretrizes gerais ou normas gerais editadas pela União e pelo Estado, em sede de direito urbanístico não fica prejudicada sua atuação, no processo de promover a adequação ao interesse local das diretrizes gerais. (art. 30, I e VIII da Lei Maior).

 

Em síntese: o Município é competente para promover a disciplina de utilização do espaço urbano, partindo das normais gerais, e promovendo sua adaptação às necessidades locais, segundo as diretrizes que entenda adequada para o desenvolvimento sadio da cidade. O art. 2º do Estatuto da Cidade deixa esse ponto bastante claro.

 

A toda evidência não é possível ordenar territorialmente o Município sem que o interesse local seja considerado, porque as normais gerais, que primam pela abstração, não têm o condão de particularizar a peculiaridade de cada um dos Municípios brasileiros, o que só pode se fazer pelo próprio Município, pela ligação direta com a realidade concreta.

 

A par da norma geral de direito urbanístico de competência da União, a competência privativa, nesse território, do Estado e do Município está claro no art. 30, I da Constituição Federal, que permite legislar em assuntos de predominante interesse local, promovendo a suplementação da legislação federal e estadual, no que couber (art. 30, II), a promoção do adequado ordenamento territorial, o que se efetiva pelo planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano. (art. 30, VIII). E compete ao Município a edição do plano diretor (art. 182, § 1º da Lei Maior), que é instrumento da política urbana e informa o planejamento municipal. ( art. 4º, III, a do Estatuto da Cidade)

 

Sendo atribuição do Município o planejamento municipal, atendendo ao interesse local e planejando o adequado ordenamento territorial, segundo a realidade concreta, evidente que deve promover a adequação do loteamento sob a forma de condomínio, em especial levando em consideração o seu impacto no sistema viário e na infraestrutura. A teoria dos direitos implícitos socorre o Município, porque se cabe a ele a organização do seu espaço físico e social, seria contraditório que não pudesse legislar sobre direito urbanístico, que vise a urbanificação. A Constituição Federal daria os fins sem assegurar os meios.

 

A Lei nº 6.766/79 e o Decreto-Lei nº 271/1967 acolhem normais gerais ou diretrizes gerais em matéria de urbanismo, o que autoriza o Município a promover a adequação da legislação local para acolher o loteamento em condomínio, em especial trazendo para o plano diretor as áreas urbanas e de expansão urbana que podem receber essa modalidade de loteamento.

 

Não havendo adaptação, ainda, da legislação municipal, isso não pode impedir sua utilização pela iniciativa privada, que encontra apoio na Lei nº 6.766/79 e no Decreto-Lei nº 271/67. Mas é razoável que o Município cuide da espécie, que, como ficou dito anteriormente, não é modalidade ou subespécie de condomínio edilício, mas instituto jurídico que se desenvolve a partir da simbiose da propriedade individual e a coletiva, o que se viabiliza pelas regras legais que disciplinam o condomínio edilício. Cuida-se de uma espécie de loteamento e como tal deve ser tratado.

 

4-O Empreendimento

 

O empresário que pretenda implantar loteamento sob a forma de condomínio fica submetido à Lei nº 6.766/79, no que se refere à fixação das diretrizes para qualquer outro loteamento, observando-se apenas a utilização de regras legais pertinente ao direito privado, especificamente o Código Civil, art. 1.331 e seguintes, no que couber, e a ser examinado para o caso concreto.

 

Por isso mesmo deve-se observar os requisitos urbanísticos (arts. 4º e 5º), solicitar a definição das diretrizes para o uso do solo, o traçado do loteamento, do sistema viário, dos espaços livres e das áreas reservadas para equipamento urbano e comunitário. (art. 6º) Como se trata de loteamento em condomínio, em que o lote é tratado como unidade imobiliária, o loteador informará esse fato ao Município, porque as obras de infraestrutura são equiparadas à construção da edificação (art. 3º do Decreto-Lei nº 271/67), e aos lotes corresponde fração-ideal nas obras de infraestrutura e nas vias que compõem o loteamento.

 

A Prefeitura Municipal, ou do Distrito Federal, se for o caso, fornecerá os dados constantes do art. 7º, sendo que as diretrizes vigorarão pelo prazo máximo de quatro anos. (parágrafo único do art. 7º).

 

A partir das diretrizes traçadas pelo Município é que o empreendedor apresentará, na forma do art. 9º, o projeto, contendo os desenhos, memorial descritivo e cronograma de execução das obras, instruindo o processo, então, quando for o caso, com a certidão atualizada da gleba, expedida pelo Cartório de Registro de Imóveis competente, certidão negativa de tributos municipais e o instrumento de garantias, que é dispensado na hipótese prevista no § 4º do art. 18.

 

Entendo que os desenhos indicarão as unidades imobiliárias (lotes) numericamente, visando individualiza-las, indicando sua área útil privativa, descrita e caracterizada, por suas medidas perimetrais, característicos, confrontações e área, indicando sua participação nas coisas a partes comuns, a fração ideal correspondente no terreno em que se assenta o loteamento, segundo as normas da ABNT, o que reflete no registro imobiliário, mesmo porque o registro de imóveis exigirá do loteador escritura de instituição e convenção de condomínio, o que permitirá que a propriedade privada e a coletiva ganhem vida e passem a existir legalmente e depende dos elementos que constam do ato de aprovação do loteamento para aferir o que foi aprovado e o que consta dos instrumentos citados.

 

O art. 9º estabelece, no § 1º e incisos o que os desenhos conterão; o § 2º estatui o que deve conter o memorial descritivo.

 

O projeto do loteamento será aprovado pela Prefeitura Municipal, ou pelo Distrito Federal, se for o caso. No mais, observa-se em tudo, o que a Lei nº 6.766/79 determina para que o projeto seja aprovado, conforme consta do Capítulo V.

 

Após a aprovação o projeto será apresentado ao registro imobiliário em cento e oitenta dias, sob pena de caducidade, com a documentação exigida pelo art. 18, entre eles a cópia do ato de aprovação do loteamento.

 

A diferença entre a aprovação de um loteamento tradicional e o loteamento em condomínio está na existência da propriedade individual (lotes) e as coisas e partes comuns, que pertencem aos adquirentes e integram as frações ideais correspondentes à unidades imobiliárias (lotes). As restrições previstas no parágrafo único do art. 3º da Lei nº 6.766/79 incidem, assim como os requisitos mínimos previstos no art. 4º.

 

O § 4º do art. 4º da Lei especial, em se tratando de lotes integrantes de condomínio de lotes autoriza a instituição de limitações administrativas, de direitos reais sobre coisa alheia, em benefício do poder público, da população em geral e para proteção da paisagem urbana. É o que se dá com as servidões de passagem, usufrutos e restrições com relação à construção de muros. Nesse dispositivo vislumbra-se a tutela dos não proprietários. 

 

Não vejo obstáculo a que o loteador estabeleça restrições ao uso e ocupação visando atender o interesse dos futuros adquirentes, como a permissão para construção apenas de edificação unifamiliar, os limites de uso do lote, a preservação de áreas verdes, a obrigação de o adquirente desenvolver, no seu imóvel, sistema de captação de água pluvial, proibição de utilização das vias internas para consertos de carros, realização de festas, destacando quadras em que se admite edificação multifamiliar e outra para comércio e serviços. Tudo dependerá, é claro, da legislação municipal que regulamenta o uso e a ocupação do solo urbano.

 

A funcionalização do direito de propriedade sinaliza no sentido indicado.

 

5- O Registro Imobiliário

 

Só se tem loteamento com o registro do projeto aprovado pelo Município, ou pelo Distrito Federal, se for o caso, no Cartório de Registro de Imóveis. Até então há apenas há uma gleba, e sua divisão em unidades imobiliárias (lotes), que depende do processo de aprovação e se concretiza como realidade legal com o registro. Aquela situação de fato, expressa no projeto aprovado, penetra no mundo jurídico somente após essa formalidade.

 

O princípio da instância, que informa o registro imobiliário, não permite que o registrador atue de ofício, razão pela qual a Lei nº 6766/79 determina ao loteador que apresente, no prazo legal, o projeto para análise e registro. (art. 174 da Lei dos Registros Públicos).

 

O registro imobiliário recebe o projeto, procede à sua qualificação. O art. 18 em seus incisos determina que o projeto seja acompanhado de vários documentos, cabendo ao oficial promover o exame de sua legalidade, procedendo à sua qualificação.

 

A função do registrador não se limita copiar os documentos apresentados. Ele os examina sob o aspecto documental e causal, aferindo a registrabilidade do título submetido à sua apreciação. Dessa forma assegura-se a segurança jurídica, e só promoverá registro de loteamento se a Prefeitura, ou o Distrito Federal, se for o caso, autorizar a implantação.

 

Não basta a licença do Município, ou do Distrito Federal, se for o caso, para que o registro seja feito. Importante que os documentos relacionados no art. 18 e incisos da Lei nº 6.766/79 estejam em ordem. Se estiverem, o Oficial do Registro de Imóveis comunica à Prefeitura e fará publicar, em resumo e com pequeno desenho de localização da área, edital do pedido de registro em três dias consecutivos, abrindo prazo de quinze dias para que haja impugnação. (art. 19).

 

Não havendo impugnação, promove o registro. Em havendo impugnação de terceiro, o registrador intimará o requerente e a Prefeitura Municipal, ou o Distrito Federal, se for o caso, para que se manifeste no prazo de cinco dias, sob pena de arquivamento do processo. Com as manifestações o processo será enviado ao juiz competente para decisão. (art. 19).

 

O art. 3º do Decreto-Lei nº 271/67 equipara o loteador ao incorporador, o que merece atenção em razão do mandamento do art. 32 da Lei nº 4.591/64. Tanto a lei que disciplina a incorporação imobiliária como a Lei nº 6.766/7 foram editadas para tutela da economia popular, em razão de problemas criados no desenvolvimento de atividades ligadas ao loteamento e à construção de edifícios.

 

Basicamente, a documentação que o incorporador apresenta ao registro de imóveis é o mesmo que se exige do loteador, observando-se as particularidades de cada um desses empreendimentos, bastando comparar o art. 18 e incisos da Lei sobre parcelamento do solo para fins urbanos e o art. 32 da lei que disciplina incorporação imobiliárias.

 

Ocorre que a Lei nº 6.766/79 não insere no rol de documentos a serem apresentados ao registro de imóveis para o loteamento em condomínio Instrumento público ou particular de instituição e convenção de condomínio. Ora, a divisão atípica que permite a conjugação da propriedade privada com a coletiva, que é da essência do condomínio edilício, reclama essa prévia divisão, que se faz pelo instrumento de instituição (art. 1.332 do CC), que é a forma legal de se criar essa espécie de condomínio. E à instituição segue a convenção de condomínio, pela qual se estabelece a estrutura do condomínio. Só se pode falar em constituição da estrutura de algo que já existe. (Arnaldo Rizzardo apud Marco Aurelio S. Viana, Manual do Condomínio Edilício, pág. 24).

 

A convenção condominial é ato de regulamentação da vida interna do condomínio e ela não atribui propriedade aos condôminos. É a instituição que põe fim à indivisão que existe sobre as áreas de privativas. Por essa razão é que o art. 1.334 do Código Civil determina que da convenção de condomínio constem as cláusulas constantes do art. 1.332.

 

Como a Lei nº 6.766/79 diz textualmente que o lote poderá se considerado sob a forma de unidade imobiliária integrante do condomínio de lotes, a conjugação da propriedade individual, incidente sobre a unidade imobiliária e a propriedade coletiva sobre as partes e coisas comum, só se viabiliza pela prévia divisão atípica, que se faz na forma indicada, e posterior regulamentação da estrutura do loteamento sob essa forma.

 

Nessa linha, penso que o registrador deverá exigir do loteador que apresente minuta de instituição e convenção de condomínio, com os dados existentes no art. 1.332 do diploma civil. Em que pese não haver referência na Lei nº 6.766/79 ao documento citado, ele necessariamente deve ser objeto de qualificação, porque não há como viabilizar essa forma de loteamento senão em obediência ao que estatui o diploma civil.

 

A razão é simples: há o lote, como unidade imobiliária, mas há, igualmente, a propriedade coletiva que incide sobre as edificações, sendo que, no conceito legal de edificações do Decreto-Lei nº 271/67, estão as obras de infraestrutura. Além disso, é de se acrescentar as áreas de lazer, a portaria etc., cuja construção é atribuição do loteador integram as áreas de uso comum, objeto de propriedade coletiva.

 

No mesmo sentido, ou seja, na tutela do adquirente, vejo como indispensável que do contrato, que integra a documentação a ser apresentada pelo loteador, haja referência clara a respeito da descrição do empreendimento, envolvendo aquela pertinente ao lote (unidade imobiliária) objeto do negócio jurídico, ou seja, discriminação e individualização das unidades de propriedade exclusiva, extremando-a das outras unidades imobiliárias e das partes comuns, com atribuição da fração ideal atribuída a cada unidade exclusiva (unidade imobiliária), relativamente ao terreno e partes comuns. Mister que esclareça a finalidade a que as unidades se destinam, e isso porque é possível que haja no loteamento quadras destinadas a edificação multifamiliar ou unifamiliar, serviços, comércio etc.

 

Na mesma linha, é salutar que constem as limitações administrativas e os direitos reais sobre coisa alheia em benefício do poder público, da população em geral e da proteção do meio ambiente, bem como as restrições que o próprio loteador estabeleça no interesse dos adquirentes.

 

Tais dados permitem ao adquirente da unidade imobiliária (lote) uma visão ampla do que está comprando, tutelando os interessados. E na hipótese de o loteador deixar de promover a instituição do condomínio e aprovar a convenção do condomínio, ou mesmo se isso se inviabilizar por divergência entre os interessados, será possível o acertamento da situação de fato por decisão judicial. (Marco Aurelio S. Viana, Manual do Condomínio Edilício, pág. 21).

 

Como já esclarecido, se a documentação estiver em ordem o Oficial do Registro de Imóveis promove o registro observadas as providências previstas no art. 19 da Lei nº 6.766/79.

 

Procede ao registro na matrícula do imóvel e os contratos de compromisso de compra e venda serão registrados na matrícula, ou nas matriculas das unidades, conforme a maneira de proceder do registrador.

 

 

Bibliografia.

 

AZEVEDO, Eurico de Andrade. Loteamento Fechado.  Revisa de Direito Imobiliário. V. 11, janeiro-junho de 1983.

BATALHA, Wilson de Souza Campos. Loteamento e Condomínio. São Paulo: Max Limonad, v.2, 1953.

SILVA PEREIRA, Caio Mário da. Instituições de Direito Civil. 19ª. ed., Rio: Forense, v. IV, 2006.

VIANA, Marco Aurelio S. Viana, Loteamento Fechado e Loteamento Horizontal. Rio: Aide Editora, 1991.

____________________________. Comentários ao Código Civil, 4ª. ed., Rio: Forense, v. XVI, 2007.

____________________________. Manual do Condomínio Edilício. Rio: Forense, 2009.

 

Sobre o autor
Marco Aurelio S. Viana

Doutor em Direito Civil pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Jurista com mais de 40 livros publicados sobre todos os temas do Direito Civil. Realiza palestras e conferências em todo o Brasil. Como advogado, atua no contencioso, bem como elaborando pareceres, consultas presenciais e virtuais, prestando assessoria e consultoria em todas as áreas do Direito Civil, com mais de quatro décadas de experiência.

Informações sobre o texto

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