MODIFICAÇÃO DO ORÇAMENTO DURANTE A SUA EXECUÇÃO

21/01/2019 às 13:23
Leia nesta página:

Visa a orientar os gestores públicos sobre as possibilidades de modificação do orçamento público durante a sua execução.

A Constituição Federal de 1988, ao tratar das maneiras de se modificar o orçamento público durante a sua execução, estabelece, ad litteram:

Art. 167. São vedados:

(...)

V - a abertura de crédito suplementar ou especial sem prévia autorização legislativa e sem indicação dos recursos correspondentes;

VI - a transposição, o remanejamento ou a transferência de recursos de uma categoria de programação para outra ou de um órgão para outro, sem prévia autorização legislativa;

A Lei nº 4.320, de 17.03.1964, quando estatuiu as normas gerais de Direito Financeiro, cuidou de conceituar os créditos adicionais, classificá-los em créditos suplementares, especiais e extraordinários, bem como estabelecer as regras relativas à indicação dos recursos orçamentários e financeiros, nos seguintes termos:

Art. 40. São créditos adicionais, as autorizações de despesa não computadas ou insuficientemente dotadas na Lei de Orçamento.

Art. 41. Os créditos adicionais classificam-se em:

I - suplementares, os destinados a refôrço de dotação orçamentária;

II - especiais, os destinados a despesas para as quais não haja dotação orçamentária específica;

III - extraordinários, os destinados a despesas urgentes e imprevistas, em caso de guerra, comoção intestina ou calamidade pública.

Art. 42. Os créditos suplementares e especiais serão autorizados por lei e abertos por decreto executivo.

Art. 43. A abertura dos créditos suplementares e especiais depende da existência de recursos disponíveis para ocorrer a despesa e será precedida de exposição justificativa.

§ 1º Consideram-se recursos para o fim deste artigo, desde que não comprometidos:

I - o superávit financeiro apurado em balanço patrimonial do exercício anterior;

II - os provenientes de excesso de arrecadação;

III - os resultantes de anulação parcial ou total de dotações orçamentárias ou de créditos adicionais, autorizados em Lei;

IV - o produto de operações de credito autorizadas, em forma que juridicamente possibilite ao poder executivo realiza-las.

§ 2º Entende-se por superávit financeiro a diferença positiva entre o ativo financeiro e o passivo financeiro, conjugando-se, ainda, os saldos dos créditos adicionais transferidos e as operações de credito a eles vinculadas.

§ 3º Entende-se por excesso de arrecadação, para os fins deste artigo, o saldo positivo das diferenças acumuladas mês a mês entre a arrecadação prevista e a realizada, considerando-se, ainda, a tendência do exercício.

§ 4° Para o fim de apurar os recursos utilizáveis, provenientes de excesso de arrecadação, deduzir-se-a a importância dos créditos extraordinários abertos no exercício.

Art. 44. Os créditos extraordinários serão abertos por decreto do Poder Executivo, que dêles dará imediato conhecimento ao Poder Legislativo.

Art. 45. Os créditos adicionais terão vigência adstrita ao exercício financeiro em que forem abertos, salvo expressa disposição legal em contrário, quanto aos especiais e extraordinários.

Art. 46. O ato que abrir crédito adicional indicará a importância, a espécie do mesmo e a classificação da despesa, até onde fôr possível. (g.n.)

Noutro giro, observa-se que a Carta Magna correlaciona os termos remanejamento, transposição e transferência à realocação de recursos de uma categoria de programação para outra ou de um órgão para outro.

José de Ribamar Caldas Furtado[1], ao tratar do remanejamento, transposição e transferência, ensina que:

O constituinte de 1988 introduziu os termos remanejamento, transposição e transferência em substituição à expressão estorno de verba, utilizada em constituições anteriores ara indicar a mesma proibição.

(...)

Cumpre estabelecer a diferença entre remanejamento, transposição e transferência:

a) remanejamentos são realocações na organização de um ente público, com destinação de recursos de um órgão para outro. Podem ocorrer, por exemplo, em uma reforma administrativa. A extinção de um órgão pode levar a Administração a decidir pelas realocações das atividades, inclusive dos respectivos programas de trabalho, recursos físicos e orçamentários, para outros órgãos, sejam da administração direta, sejam da administração indireta. Nesse caso, não cabe a abertura de crédito adicional especial para cobertura de novas despesas, uma vez que as atividades já existem, inclusive os respectivos recursos não financeiros. Entretanto, se houver a necessidade da criação de um cargo novo, a Administração deverá providenciar a abertura de um crédito adicional para atender a essa despesa;

b) transposições são realocações no âmbito dos programas de trabalho, dentro do mesmo órgão. Pode acontecer que a administração da entidade governamental resolva não construir a estrada vicinal, já programada e incluída no orçamento, deslocando esses recursos para a construção de um edifício para nele instalar a sede da secretaria de obras, também já programada e incluída no orçamento, cujo projeto original se pretende que seja ampliado. Nesse caso, basta que a lei autorize a realocação dos recursos orçamentários do primeiro para o segundo projeto;

c) transferências são realocações de recursos entre as categorias econômicas de despesas, dentro do mesmo órgão e do mesmo programa de trabalho. Ou seja, repriorizações dos gastos a serem efetuados. Pode ocorrer que a administração do ente governamental tenha que decidir entre realocar recursos para a manutenção de uma maternidade ou adquirir um novo computador para o setor administrativo dessa maternidade, que funciona relativamente bem, ainda que utilizando computadores antigos. A opção por recursos para a manutenção da maternidade se efetivará através de uma transferência, que não se deve confundir com anulações, parciais ou totais, de dotações para abrir crédito adicional especial. Nas transferências, as atividades envolvidas continuam em franca execução; nos créditos adicionais especiais ocorre a implantação de uma atividade nova.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

Posto isso, infere-se que a transposição, o remanejamento ou a transferência de recursos visam a repriorizações de políticas governamentais. Com isso, há modificações nas categorias de programação orçamentária que implicam em mudança na estrutura da lei orçamentária aprovada pelo Poder Legislativo.

No âmbito de uma mesma categoria programática, por sua vez, mostra-se devida a utilização de créditos suplementares ou especiais. Assim, como a abertura desses créditos adicionais deve ocorrer por redução de outras dotações do orçamento, mister a existência de recursos e a sua correspondente indicação.

Importante, igualmente, ressaltar que a Constituição Federal possibilita que a lei orçamentária anual contenha autorização prévia e genérica para abertura de créditos adicionais suplementares, mas, nunca, para a transposição, o remanejamento ou a transferência de recursos.

Nesse sentido, dispõe, in verbis:

Art. 165. Leis de iniciativa do Poder Executivo estabelecerão:

(...)

§ 8º A lei orçamentária anual não conterá dispositivo estranho à previsão da receita e à fixação da despesa, não se incluindo na proibição a autorização para abertura de créditos suplementares e contratação de operações de crédito, ainda que por antecipação de receita, nos termos da lei.

De mais a mais, segundo decisão do Supremo Tribunal Federal, é possível que a lei de diretrizes orçamentárias contenha autorização prévia para a transposição, o remanejamento ou a transferência de recursos, verbis:

I. ADIn: L. est. 503/2005, do Estado de Roraima, que dispõe sobre as diretrizes orçamentárias para o exercício de 2006 (....) 1. Permitidos a transposição, o remanejamento e a transferência de recursos de uma categoria de programação para outra, desde que mediante prévia autorização legislativa, no caso substantivada no dispositivo impugnado. (....).

(STF; Plenário; ADI 3.652; rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 19.12.2006, DJ 16.03.2007)

Diante de todo o exposto, conclui-se que:

I) a abertura de créditos suplementares ou especiais e a transposição, remanejamento ou transferência de recursos são as únicas maneiras de se modificar o orçamento durante a sua execução, dependendo, sempre, de prévia autorização legislativa;

II) a lei orçamentária anual poderá conter autorização prévia e genérica para abertura de créditos suplementares;

III) a lei de diretrizes orçamentárias poderá conter autorização prévia para a transposição, remanejamento ou transferência de recursos.

Referências Bibliográficas:

ABRAHAM, Marcus. Curso de Direito Financeiro Brasileiro. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010.

FURTADO, José de Ribamar Caldas. Créditos Adicionais versus transposição, remanejamento ou transferência de recursos. Revista do Tribunal de Contas do Distrito Federal, 32, t. 1, jan./dez 2006. Brasília: Seção de Documentação, 2006.


[1] FURTADO, José de Ribamar Caldas. Créditos Adicionais versus transposição, remanejamento ou transferência de recursos. Revista do Tribunal de Contas do Distrito Federal, 32, t. 1, jan./dez 2006. Brasília: Seção de Documentação, 2006. pp. 11·12. In http://www.tc.df.gov.br/app/biblioteca/pdf/PE500398.pdf.

Sobre o autor
Carlos Antonio Matos da Silva

Advogado. Procurador do Município de São Paulo. Especialista em Direito Público pela Escola Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos