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Sobre a educação aristocrática e o perfil do educador

22/01/2019 às 08:29
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Pretendeu-se discutir se o surgimento de uma depende da outra e sua efetiva importância. O objetivo foi realizar um paralelo, de forma crítica, entre a figura do educador, tendo em vista o ideal de educação baseado em Nietzsche.

1. INTRODUÇÃO

Em aderências às demandas do grupo de pesquisa Direito à Educação da Pontifícia Universidade Católica de Campinas, o presente trabalho buscou responder à questão: como se pode pensar na educação aristocrática e no perfil do educador? Logo, pretendeu-se discutir, além destes dois elementos, se o surgimento de uma depende da outra. Esta produção teve por objetivo apontar a questão do perfil do educador e da educação aristocrática, lembrando que a ideia de aristocracia é um termo imigrado da filosofia nietzschiana. Neste sentido, os esforços da pesquisa apontaram para uma tentativa de se poder identificar e destacar este educador de excelência dos demais. A intenção foi, portanto, refletir sobre o perfil do mesmo, tendo em vista as contribuições de Nietzsche e alguns de seus comentadores. Ademais, pretendeu-se analisar se o desenvolvimento desta aristocracia nietzschiana depende da figura de um educador também aristocrático, ou seja, se a educação aristocrática é necessária ao surgimento dele. Além disto, cogitou-se sobre a importância desta educação de excelência.

Ao analisar as raízes da palavra “educação” já foi possível encontrar elementos que fundamentem a essência da ideia de educação aristocrática. O sentido romano dado à tal expressão era de: “conduzir para fora, fazer sair, intimar, produzir, exaltar, elevar, criar” 1. Neste sentido, a etimologia apontou a educação como um processo humano que pode resumir-se em duas grandes balizas: transformação e emancipação. Esta transformação, adquirida pela educação, sugere as mudanças de comportamentos objetivos, pensamentos e percepções, os quais refletem na vida profissional e social do indivíduo. É como se, após cada etapa de aprendizado, este indivíduo se tornasse uma nova pessoa, com outra consciência sobre o mundo e sobre si mesmo. Enquanto que, por outro lado, a questão emancipatória pode ser pensada como uma preparação do educando à vida social e profissional, de forma crítico, autodidata e consciente.

Até aqui tratou-se de forma sucinta da educação como é trivialmente entendida. Ou seja, aquela que, grosso modo, aprende-se sozinho através da própria experiência, ou aquela que as crianças recebem de seus pais, ou ainda aquela aprendida nos bancos escolares e universitários. Sendo assim, aqui já se diferencia a educação formal – aprendida nas instituições de ensino – da educação vulgar – desenvolvida a todo momento, por toda a vida.

Não obstante, refletir sobre a educação aristocrata não se resume apenas em pensar nestes aspectos pertinente à educação citados alhures. Esta educação de excelência pressupõe um nível muito mais alto de transformação e, consequentemente, criticidade, autonomia e emancipação individual. Neste sentido, o estudo revelou que a aristocracia aponta para um indivíduo intelectualmente à frente de seu tempo, consciente de sua própria existência e desvinculado dos valores superegoicos impostos à sociedade hodierna.


2. MÉTODO

A metodologia utilizada para esta pesquisa foi a qualitativa, através da revisão bibliográfica de Nietzsche e de alguns de seus interlocutores, neste sentido citou-se: Mendonça 2, Sobrinho 3 e Azeredo 4. Na parte dos resultados e discussão foi primeiramente realizada uma introdução ao conceito de educação, posteriormente foi proposta uma análise às ideias de aristocracia e educação aristocrática segundo a filosofia de Nietzsche.


3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Antes de se discutir propriamente as questões pertinente à educação aristocrática e do perfil deste educador, faz-se necessário uma introdução às ideias de aristocrata segundo a filosofia de Nietzsche. Para tanto, inicia-se a discussão fazendo a ressalva de que, pelo próprio legado deste filósofo, estabelecer conceitos derradeiros e traçar perfis precisos e dogmáticos constitui uma leviandade. Por este motivo, as tentativas de conceitualização do aristocrata, da educação aristocrática e do perfil do educador, representam mera conjectura baseada nas produções nietzschianas e em seus comentadores.

A ideia de aristocrata, aqui colocada, em nada se relaciona com a acepção sócio-histórica, a qual se opõe aos escravos e plebeus do período clássico ou os proletários da hodiernidade. Ela está relacionada ao radical grego άριστος – lê-se “aristós” , que, segundo os romanos, significava aquele que se destaca entre muitos, o que se diferencia do comum, o que foge da massificação e do nivelamento 2.

Esta aristocracia se caracteriza por sua independência, auto-referência e autodomínio em relação a todos os outros homens. Logo, ser aristocrata significa o distanciamento e oposição ao populacho 3. Por este motivo que as ideias nietzschianas sugeriram uma superioridade intelectual, o que resultaria em um indivíduo a frente de seu tempo.

Neste sentido, a aristocracia de Nietzsche representa uma nova classe de homens superiores, afastados da moral dominante vigente. O aristocracismo está fundado na ideia de que os homens eram por natureza desiguais: guias e rebanhos, homens completos e homens fragmentados, homens bem-sucedidos e homens fracassados 3. Por este motivo, seria inútil uma tentativa de se igualar os homens, uma vez que se entendeu o homem como um ser idiossincráticos, ou seja, cujas potências e características apresentam-se de forma singular.

E como surgiria um aristocrata? Pôde-se compreender, segundo as ideias nietzschianas, que as pessoas não nascem aristocratas, não existe um aristocrata inato. É através do trabalho árduo no exercício intelectual que o homem ganha a emancipação do aristocrata. Este desenvolvimento das faculdades intelectivas se daria possivelmente na juventude através de suas experiências e contato com o conhecimento. Iniciado durante a meninice, este processo nunca terminaria, visto que o homem tem a capacidade de aprender e se superar a cada dia.

Uma vez que só se atingiria este grau de superioridade mediante um penoso e difícil trabalho de transformação e emancipação intelectual, a aristocracia deveria ser vista como uma atividade para poucos. Já que a grande maioria das pessoas assume sua fraqueza e debilidade, preferindo continuar sendo passivos partícipes de suas vidas na sociedade.

Através da revisão bibliográfica, pôde-se entender também que a aristocracia a que Niezsche se referia não representava um estado de apogeu humano. Este patamar de sabedoria e emancipação intelectual aristocrático seria um processo contínuo, devendo ser exercitado e melhorado pari passu. Além disso, o aristocrata deveria ter a autossuperação como uma característica peculiar, no sentido de que ele deveria ter consciência de seus limites e tentar se superar.

Se o aristocrata representa esse homem de excelência, superior à massa, como seria possível pensar em uma educação aristocrática? Esta espécie de educação deveria ser tão especial e superior quanto esta categoria humana. Provavelmente ela tenderia a possuir como princípios básicos a busca da máxima emancipação e transformação. Então, um ensino de excelência representaria uma busca pelo pensamento crítico e autodidático, em uma tentativa de se distanciar da massificação.

E como isso seria possível? De acordo com Nietzsche, uma forma segura de propagar o pensamento aristocrático poderia ser a atuação dos próprios aristocratas servindo-se de professores uns dos outros4. Em analogia a este pensamento, seria razoável pensar que a atuação de um professor aristocrata bastaria para garantir uma educação aristocrata? Não seria o professor, consciente de sua função de educador, um aristocrata inato?

Pôde-se cogitar que a educação vigente está muito distante do ideal de educação aristocrática. Por mais que a função de todo educador seja a transformação de seu aluno, entendeu-se aqui que nem todos os educadores se preocupam com esta transformação emancipatória e crítica da aristocracia. Talvez devido a suas próprias limitações, muitos educadores se sujeitam à mera transferência de saber.

Com base nas fontes pesquisadas, sugeriu-se que a educação aristocrática está vinculada necessariamente à figura de um aristocrata, caso contrário ela realmente fosse uma educação de excelência. Neste sentido, não se pôde conceber a ideia da existência de uma educação de excelência proferida por um educador qualquer.

Outro aspecto revisado na aristocracia, que influenciaria esse tipo de educação, foi a questão da individualidade. O aristocrata se distanciaria do popular prosaico por este ser uma atividade individual de superação e desenvolvimento. Logo, não seria possível uma total proliferação de aristocratas, pois este nivelamento populacional levaria à própria massificação.

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Destarte, a educação aristocrática também não poderia ser vista com forma de paradigma pedagógico, ou mesmo ter questionada sua democratização. Tornar os indivíduos igualmente emancipados, críticos e autodidatas resultaria em um nefasto processo de nivelamente e massificação.

Assim, a educação aristocrática nomearia a “diferença” como possibilidade de emancipação do homem, estimulando o desenvolvimento de suas potências, ao contrário da educação ordinária que privilegiava o adormecimento humano e firma-se na igualdade como nivelamento social 2. Por este motivo, os resultado apontaram que, da mesma forma que a aristocracia, a educação de excelência também deveria ser entendida como uma atividade elitista e para poucos.

Uma instituição poderia então se valer de possuir um educador aristocrata para lecionar determinada disciplina, entretanto, isto não significaria que seus alunos se tornariam aristocratas. Pois, como mencionado algures, esta atividade era para a minoria e um desenvolvimento das potências intelectuais, somente seria alcançado através de exaustiva transformação individual.

A educação formal não deveria se restringir na singela transmissão de conhecimentos técnicos, sem a adequada transformação dos educandos em seres pensantes e conscientes. Por este motivo pôde-se imaginar que possivelmente um educador de excelência possa proporcionar maiores possibilidades de formação dentro de uma instituição de ensino.


5. CONCLUSÕES

Através das ideias de Nietzsche e de alguns de seus comentadores citados no decorrer deste trabalho, pôde-se concluir que esta aristocrata sugeria um desenvolvimento intelectual que torna o indivíduo distinto de seu meio. Neste diapasão, a educação aristocrática também representou igual superioridade. Esta também se distinguiu das demais espécies de educação pela preocupação com a excelência de ensino.

Como já discutido, o desenvolvimento da aristocracia era inerente à educação aristocrática, uma vez que esta depende das aptidões e do desenvolvimento pessoal. Não obstante, isto não significaria que uma educação aristocrática de nada adiantaria aos educandos.

Provavelmente uma educação de excelência seja muita mais proveitosa e transformadora do que um processo educativo comum. Uma vez que esta desenvolveria muito mais as habilidades críticas e reflexivas. Em suma, os educandos poderiam se tornar intelectualmente muito mais emancipados, autodidatas e conscientes. Além disso, pôde-se concluir que talvez as chances de alguém vir a se tornar um aristocrata aumentariam, caso ele se valesse de tal educação de excelência.


REFERÊNCIAS

1 DICIONÁRIOS ACADÊMICOS. Latim-Português; Português-Latim. Porto Editora: Porto, Portugal, 2008, p. 154.

2 MENDONÇA, Samuel. Educação artistocrática em Nietzsche: perspectivismo e autossuperação do sujeito. 2009. (Doutorado em Filosofia). Curso de Pós-graduação em Filosofia, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2009.

3 SOBRINHO, N. C. M. Apresentação. In NIETZSCHE, F. Escritos sobre Política. RJ: PUC RIO, 2007.

4 AZEREDO, V. D. (org.). Nietzsche: filosofia e educação. Ijuí: Unijuí, 2008.

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Sobre o autor
Felipe Adaid

Advogado e consultor jurídico em Direito Penal e Direito Penal Empresarial no Said & Said Advogados Associados. Foi Diretor de Gerenciamento Habitacional da Secretaria de Desenvolvimento Social e Habitação e Primeiro Secretário do Conselho de Habitação do Município da Valinhos, SP. Mestre em Educação e Políticas Públicas pela PUC Campinas. Ingressou em primeiro lugar no mestrado e foi contemplado com a bolsa CAPES durante os dois anos de curso. Cursou disciplinas de pós-graduação na Unicamp. É especializando em Direito Penal, Processo Penal e Criminologia, pela PUC Campinas. Na graduação, tem 5 semestres de créditos no cursos de Psicologia, também pela PUC Campinas. Durante a graduação de Direito também foi bolsista de iniciação científica, CNPq, e foi monitor em diversas disciplinas, tanto no curso de Direito como no curso de Psicologia. Foi membro do grupo de pesquisa Direito à Educação do Programa de Pós-Graduação da PUC Campinas. É corretor de revistas científicas pedagógicas e jurídicas. É autor de 11 livros, sendo 3 ainda em fase de pré-lançamento, e organizador de outros 10 livros, além da autoria de 44 capítulos de livros publicados no Brasil, no Chile e em Portugal. É autor de mais de 100 publicações científicas, entre artigos científicos, resenhas e anais, nacionais e internacionais. Ademais, também escreve periodicamente ensaios e artigos para jornais e blogs. No âmbito acadêmico, suas principais bases teóricas são: Foucault, Lacan, Freud, Dewey e Nietzsche. Por fim, tem interesse sobre os seguintes temas: Direito, Direito Penal, Criminologia, Psicologia, Psicologia Forense, Psicanálise, Sexualidade, Educação e Filosofia.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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