O artigo 468 do Código Comercial falou da hipoteca marítima, determinando que ela só se poderia fazer por escritura pública, sob pena de nulidade, não podendo o capitão onerar o navio a não ser que tenha poderes especiais, sendo que o registro desse direito real de garantia de dívida deveria ser inscrito no Registro Privativo de hipotecas marítimas, criado pelo Decreto 15.809, de 22 de novembro de 1922. Posteriormente, entendeu-se que a inscrição passaria a ser feita no Registro de Imóveis (artigo 5º, n. IV da antiga Lei de Registros Públicos e uma vez feita a hipoteca o navio torna-se impedido de ser fretado, arrendado ou empregado ou qualquer outro modo no serviço de nação estrangeira, não podendo o navio ter mais de um porto de registro). Paga a dívida a hipoteca se extingue, pois o acessório segue o principal. De toda sorte, segue a hipoteca naval as regras civis na matéria.
Discute-se a questão da outorga uxória para a validade da hipoteca naval.
Formou-se em jurisprudência do antigo Tribunal de Justiça do Distrito Federal que é necessária a outorga uxória para a hipoteca do navio.
João Villas-Boas (Hipoteca Naval, 1942, n. 19 e 131) reconhece que para a alienação tal exigência não se torna necessária, entendendo que a lei civil regulamenta a matéria mesmo a hipoteca naval.
Por sua vez, Sampaio de Lacerda (Curso de Direito Privado de Navegação, volume I, 2º edição, pág. 336) entendeu que o navio é um móvel sui generis que tal garantia pode ser feita independente de autorização do cônjuge.
Esclareça-se que continua o armador com direito sobre o navio, enquanto não se der a venda ou a adjudicação a um dos credores e por isso poderá usá-lo fretá-lo ou dirigi-lo. Mas, por outro lado, como salientou Sampaio de Lacerda (obra citada, pág. 390) tem o dever de não realizar atos incompatíveis com o destino do navio e do frete para a satisfação dos credores.
É tradição em nosso direito, que vem desde a Lei 1.237, de 24 de setembro de 1864, que a hipoteca seria regulada pela lei civil, ainda que comerciantes a pactuem.
Fala-se do registro da hipoteca no Tribunal Marítimo.
Mantém o Tribunal Marítimo o registro geral:
Da propriedade naval;
Da hipoteca naval e demais ônus sobre as embarcações brasileiras;
Dos armadores de navios brasileiros.
O Decreto nº 15.788, de 08/11/22, revogado pelo Decreto nº 11 de 1991, regulamentando o artigo 825 do revogado Código Civil de 1916, que dispõe sobre hipoteca naval, definiu navio, atribuindo-lhe a qualidade de espécie de embarcação, como sendo "toda construção náutica destinada à navegação de longo curso, de grande ou pequena cabotagem, apropriada ao transporte marítimo ou fluvial". As navegações de longo curso e de pequena e grande cabotagem são realizadas sempre no transporte marítimo mercantil, destacando, com isso, o caráter mercantil do navio, que o distingue das demais embarcações.
Acentuou Osvaldo Sammarco (A hipoteca naval no projeto do Código Comercial) que "na vigência do Código Civil de 1916, havia dissonância doutrinária acerca do tema: qual seria o momento inicial para a constituição de hipoteca em face do navio? Atualmente, considera-se possível a instituição do direito real até mesmo durante a construção do navio, por acatar como fato individualizante o respectivo projeto de engenharia naval. Exige-se, porém, que a construção esteja iniciada, "pelo menos com a quilha, colocada nos estaleiros, porquanto não é possível a hipoteca sobre coisa futura”. Nesse sentido, conforme for sendo construída, a porção concretizada já estará abrangida pela hipoteca em virtude de sua natureza jurídica compreender todo o bem, ou seja, todo o navio depois de concluído, em respeito ao Princípio da Indivisibilidade. Não obstante, incidirá, tal princípio, no que tange aos acessórios do navio, compreendidos entre botes, instrumentos náuticos, máquinas e outros equipamentos."
Especificamente sobre o tema o STJ já se manifestou como se lê:
Tema: Hipoteca naval. Tratados internacionais e legislação interna. Inexistência de primazia hierárquica. Plataforma petrolífera estrangeira. Disciplina do Código de Bustamante. Registro de hipoteca realizado no porto de origem do navio. Eficácia no âmbito nacional.
Destaque: A hipoteca de navio registrada no país de nacionalidade da embarcação tem eficácia extraterritorial, alcançando o âmbito interno nacional.
Inteiro Teor: Na execução de origem, ajuizada por instituição financeira, houve penhora de embarcação do devedor visando garantir o adimplemento da dívida, ao tempo em que terceiro peticionou nos autos alegando gozar de preferência sobre o produto da arrematação do bem penhorado em razão de hipoteca outorgada pela executada em seu favor, registrada no país de nacionalidade da embarcação. Nesse contexto, a principal questão controvertida consiste em saber se é possível ser reconhecida a eficácia, no Brasil, de hipoteca de navio registrada apenas em país de nacionalidade da embarcação que não consta como signatário das Convenções Internacionais sobre a matéria. De início, saliente-se que a doutrina especializada defende ser da tradição do direito brasileiro e de legislações estrangeiras a admissão da hipoteca a envolver embarcação de grande porte, em razão do vulto dos financiamentos a sua construção e manutenção. A instabilidade e o risco marítimo oriundos do constante deslocamento se compensa com a estabilidade dos registros em portos de origem. No tocante a navio de nacionalidade estrangeira, não bastasse a clareza do art. 278 do Código Bustamante ao estabelecer que a hipotecamarítima e os privilégios e garantias de caráter real, constituídos de acordo com a lei do pavilhão, têm efeitos extraterritoriais, até nos países cuja legislação não conheça ou não regule essa hipoteca ou esses privilégios, o art. 1º da Convenção de Bruxelas para a Unificação de Certas Regras Relativas aos Princípios e Hipotecas Marítimas, na mesma linha, também estabelece que as hipotecas sobre navios regularmente estabelecidas segundo as leis do Estado contratante a cuja jurisdição o navio pertencer, e inscritas em um registro público, tanto pertencente à jurisdição do porto de registro, como de um ofício central, serão consideradas válidas e acatadas em todos os outros países contratantes. Por seu turno, consigna-se que não cabe o registro, no Brasil, da hipoteca da embarcação de bandeira de outro país, pertencente à sociedade empresária estrangeira. Com efeito, na leitura da Lei n. 7.652/1988 e dos demais diplomas internos, nota-se um claro cuidado do legislador em não estabelecer disposição que testilhe com as convenções internacionais a que o Estado aderiu, respeitando-se a soberania dos países em que estão registrados os navios e respectivas hipotecas, de modo a fornecer segurança jurídica aos proprietários e detentores de direitos sobre embarcações. O registro hipotecário é ato de soberania do Estado da nacionalidade da embarcação, estando sob sua jurisdição as respectivas questões administrativas. Com essas considerações, a negativa de eficácia à hipoteca inobserva diversas convenções internacionais e causa insegurança jurídica, com possíveis restrições e aumento de custo para o afretamento de embarcações utilizadas no Brasil – razões pelas quais o ato analisado tem eficácia extraterritorial, alcançando o âmbito interno nacional.
REsp 1.705.222-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, por unanimidade, julgado em 16/11/2017, DJe 01/02/2018