Não fiz o contrato, e agora?

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Voltamos àquela velha história: “não fiz o contrato porque achei que não teria importância/que não precisaria”. Triste demais isso, né?

A ausência de um contrato bem formulado gera uma tremenda dor de cabeça. Agora, imagine a dimensão dessa dor quando nem sequer existe o contrato? Pois é…

Em verdade, quando a lei não exigir a forma escrita, as declarações de vontade das partes podem perfeitamente seguir a forma VERBAL, ou seja, o ajuste desejado pode ser feito numa informal conversa de negócios.

Art. 107. A validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir.

Código Civil.

E aí surge a questão: Fazer ou não fazer?(contrato verbal)

Veja bem, a ausência de um contrato escrito pode dificultar a manutenção do negócio e, principalmente, quando do surgimento de eventual conflito, dificultará o entendimento das intenções e ajustes entre as partes, embora, como já falamos anteriormente, não seja condição indispensável para o deslinde dos negócios. (quando não houver previsão contrária em lei)

Mas, vamos lá: “Lauren, firmei um negócio com ciclano, estamos tendo um conflito, só que não fiz o contrato. E agora?”

Corriqueiramente os contratos verbais são estipulados. E, como a regra parte do pressuposto de que a manifestação da vontade não precisa seguir o modo escrito, fazer um contrato verbal, por si só, não tem problema algum.

Todo contrato, seja ele escrito ou verbal, deve atender, no mínimo, os requisitos previstos pelo Código Civil, quais sejam:

Art. 104. A validade do negócio jurídico requer:

I – agente capaz;

II – objeto lícito, possível, determinado ou determinável;

III – forma prescrita ou não defesa em lei.

Código Civil.

Caso o contrato estipulado de forma verbal atender aos requisitos acima, o primeiro passo para sua validade foi dado. A problemática é saber se, em razão do objeto negociado, possuirá validade jurídica ou não esse meio de manifestação. Temos como exemplos algumas situações das quais são expressamente vedadas a estipulação de forma verbal, vejamos:

Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.

Art. 807. O contrato de constituição de renda requer escritura pública.

Art. 842. A transação far-se-á por escritura pública, nas obrigações em que a lei o exige, ou por instrumento particular, nas em que ela o admite; se recair sobre direitos contestados em juízo, será feita por escritura pública, ou por termo nos autos, assinado pelos transigentes e homologado pelo juiz.

Art. 1.369. O proprietário pode conceder a outrem o direito de construir ou de plantar em seu terreno, por tempo determinado, mediante escritura pública devidamente registrada no Cartório de Registro de Imóveis.

Art. 1.653. É nulo o pacto antenupcial se não for feito por escritura pública, e ineficaz se não lhe seguir o casamento.

Art. 1.711. Podem os cônjuges, ou a entidade familiar, mediante escritura pública ou testamento, destinar parte de seu patrimônio para instituir bem de família, desde que não ultrapasse um terço do patrimônio líquido existente ao tempo da instituição, mantidas as regras sobre a impenhorabilidade do imóvel residencial estabelecida em lei especial.

Art. 1.793. O direito à sucessão aberta, bem como o quinhão de que disponha o co-herdeiro, pode ser objeto de cessão por escritura pública.

Código Civil.

Não adianta acreditar que pelo simples fato de pegar as chaves de uma casa e passar a residir nela, reforma-lá como sempre sonhou, criar seus filhos e os ver crescerem nela que poderá ser considerado proprietário da casa. Isso porque a transferência de propriedade de um imóvel de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País deve ser feito necessariamente por meio da ESCRITURA PÚBLICA, portanto, caso faça um mero contrato “de boca” ou “de gaveta” NÃO SERÁ CONSIDERADO LEGITIMAMENTE PROPRIETÁRIO.

Acontece que, desde a simples prestação de serviços à venda de bens móveis ou imóveis é comum não serem postos definitivamente no papel as condições do negócio entabulado.

Infelizmente, no caso de um conflito judicial, a existência do contrato deve ser necessariamente comprovada, visto que justamente pelo fato de não existir de forma física, não pode ser executado ou rescindido imediatamente, como ocorre com os contratos escritos, para que possa ser garantida, ainda que minimamente, uma segurança jurídica aos envolvidos.

E como faço essa comprovação?

O contrato verbal pode ser demonstrado por meio de documentos físicos ou online (ex: e-mails ou conversas em aplicativos), onde haja a discussão de valores, os comprovantes de depósitos e pagamentos, conversas sobre a transação e outras situações que envolvam a negociação.

Há, ainda, a possibilidade de serem ouvidas pessoas que presenciaram as negociações, ou que presenciaram as transações posteriores ao negócio firmado, consideradas como testemunhas e serem apresentadas todas demais provas possíveis ao alcance da parte, desde que consideradas idôneas.

Ônus e bônus do contrato verbal

A legislação brasileira garante a autonomia para que as partes estipulem suas convenções da forma que entenderem melhor, desde que não violem a moral, a ordem e os bons costumes, e aqui entra também a necessidade de observar a forma escrita quando for exigência prevista expressamente pela lei.

Coloque na balança o seguinte:

Os contratos escritos demandam de investimento para seu debate e confecção, colheita de documentos burocráticos e assinatura das partes e testemunhas, mas também garantem às partes maior segurança jurídica para as decisões presentes e futuras, em especial a garantia dos ajustes no caso de inadimplência. Inclusive, num contrato escrito, as partes podem livremente estipular obrigações e deveres às partes que melhor se adequem ao mercado, ao negócio e às próprias características pessoais.

Por sua vez, os contratos verbais são, por vezes, considerados mais práticos. Aqui as partes não precisam se preocupar com documentos burocráticos, assinaturas e tempo para discussão e custos da confecção e manutenção. Se as partes seguirem religiosamente o acordo, sem nunca entrarem em conflito, o negócio se efetiva rapidamente. Mas, é sabido que, por mais próxima que a pessoa seja, os “imprevistos” acontecem: a pessoa acaba surpreendentemente “precisando” se mudar de cidade ou de telefone; o negócio não se torna mais vantajoso; o dinheiro acaba; o mercado entra em crise e etc etc etc….

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O que eu te digo? Não é a toa que Potyguara G. Graciano já falava:

A natureza humana é mesmo misteriosa: a boca que diz um “sim”, com a mesma facilidade diz um “não”. E vice-versa. Porque o mesmo coração que agora quer, pode logo depois não querer mais. O contrato escrito é a solução.

E tenho dito!

Não quer ter problemas futuros, né? Presumo que não. Então, analise sempre o ônus e bônus da situação que o negócio se encontra, das exigências legais e, principalmente, das características pessoais da outra parte.

Se escolher a forma verbal, esteja ciente dos grandes riscos que correrá e, ao menos, guarde para si todos os recibos de pagamento, conversas e demais documentos que demonstrem o desenrolar do acordo. Calma e atenção, neste momento, são fundamentais! Uma boa sorte.

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Sobre a autora
Lauren Juliê Liria Fernandes Teixeira Alves

Graduada em Direito pela Universidade de Cuiabá/MT. Especialista em Direito Contratual pela Universidade Estácio de Sá. Especializanda em Direito da Proteção e Uso de Dados pela PUC Minas. Membro ANPPD®.Advogada e Sócia nominal da Teixeira Camacho & Brasil Advogados. Presidente da Comissão da Jovem Advocacia da 10ª Subseção da OAB/MT. Colunista da Aurum Software. Já foi professora do Curso de Direito da Universidade do Estado de Mato Grosso Campus de Barra do Bugres. Administradora do Blog contratualista.com e Instagram @papodecontratualista

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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