ANOTAÇÕES SOBRE O FEMINICÍDIO

23/02/2019 às 11:50
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O ARTIGO DISCUTE SOBRE O FEMINICÍDIO

ANOTAÇÕES SOBRE O  FEMINICÍDIO
Rogério Tadeu Romano

Noticiou a EBC, em 22 de fevereiro:

"A empresária e paisagista Elaine Perez Caparroz, vítima de uma tentativa de feminicídio em seu apartamento, no Riode Janeiro, deixou na manhã de hoje (22) o Hospital Casa de Portugal, onde estava internada desde o último dia 16. Ela permaneceu no centro de tratamento intensivo por dois dias e, durante a internação, além dos cuidados clínicos diários, passou por avaliações constantes das equipes de cirurgia facial, odontologia, oftalmologia e neurocirurgia.

Segundo o coordenador da equipe médica da Casa de Portugal, Hélio Primo, apesar de ainda ter hematomas diversos, principalmente no rosto, a paciente apresenta boas condições de saúde e, por isso, foi liberada."

Mais um caso, dentre tantos, de agressão à vida de uma mulher.

Entende-se que, comumente, os termos feminicídio e femicídio são usados como
sinônimos para a morte de mulheres em razão de seu sexo.

Feminicídio é algo que vai além da misoginia, criando um clima de terror que gera a
perseguição e morte de mulher a partir de agressões físicas e psicológicas dos mais variados tipos, como abuso físico e verbal, estupro, tortura, escravidão sexual, espancamentos, assédio sexual, mutilação genital, dentre outras condutas abomináveis.

Assim a característica a se ter em mente no feminicídio é a morte intencional e violenta de mulher em decorrência de seu sexo.

Recentemente, a Câmara dos Deputados aprovou texto que torna o assassinato de
mulheres um crime hediondo. O feminicídio passa a ser circunstância qualificadora de
homicídio. Do mesmo modo o Senado Federal o aprovou em sessão realizada no dia 17 de dezembro de 2014.

O assassinato da mulher em virtude da condição de gênero passa a figurar como
crime hediondo.

Estabelece-se uma tipificação nesses assassinatos de mulheres, motivados por
questões de gênero. Considera-se razões de gênero a violência doméstica e familiar, a
violência sexual, a desfiguração ou mutilação da vítima ou o emprego de tortura ou qualquer meio cruel e degradante.

Pelo projeto, considera-se em razão do gênero quando o crime envolver violência
doméstica e familiar e menosprezo ou discriminação à condição da mulher. A punição para homicídio qualificado é de reclusão de 12 anos a 30 anos.

O projeto ainda prevê o aumento de pena para os casos de feminicídio em um terço até
a metade se o crime for praticado durante a gravidez ou nos três meses anteriores ao parto; contra menores de 14 anos, maiores de 60 ou vítimas de deficiência; e na presença de pais ou filhos.

Leve-se em conta que, segundo dados de CPMI, 43.700 mulheres no Brasil, no
período de 2000 a 2010, foram assassinadas, sendo que 40% das vítimas foram assassinadas
dentro de suas casas, muitas delas pelos companheiros ou ex-companheiros.

Nota-se então que o feminicídio leva a tratamento do crime como circunstância
agravante.

É tradição do direito penal brasileiro a previsão casuística de circunstâncias
agravantes de caráter geral aplicáveis a todos os crimes ou a grupo de crimes. Há ainda as circunstâncias agravantes especiais, aplicáveis a determinados crimes e previstas na parte especial do código penal.

Tal será o caso do feminicídio.

Estamos diante de agravante especial, de caráter pessoal, envolvendo motivação e
fim de agir. Dir-se-á, aliás, que já se tem, dentre essas agravantes, para o homicídio
qualificado, o motivo torpe, o motivo fútil.

Ora, o motivo fútil ou torpe é aquele crime cometido por motivo fútil, repugnante,
idiota, torpe, sem verdadeira necessidade de ser cometido. É aquele onde o agente revela falta de sentimentos ao cometê-lo. Fútil é o motivo de somenos, que é destituído de qualquer importância, que indica uma desproporção exagerada com relação ao delito praticado. É o motivo insignificante, mesquinho. Já se entendeu assim na conduta de quem agride a esposa que deixou queimar feijão do almoço. Torpe é motivo abjeto, indigno, imoral, que suscita repugnância, que é próprio de personalidades antissociais.

O que diferencia o feminicídio desse motivo torpe ou fútil é a razão de que a vítima é
vulnerável.

Espancar uma mulher é ato covarde, exercido contra quem tem menores possibilidade de se defender. Reforce-se tal argumentação com a lembrança de que não se trata de dar um tratamento vantajoso para as mulheres à custa dos homens, mas conceder a um grupo da população proteção para a sua vida, integridade física e moral, sua dignidade, que são expostas à ameaça de tal conduta condenável. Essa proteção tem no direito penal especial importância, como razão de prevenção social.

A violência contra o sexo feminino não pode ser ignorada. Sendo assim, combatem-se práticas censuráveis que devem ser objeto de punição. Nasce o feminicídio como manifestação mais extremada da violência machista, que é fruto de relações desiguais de poder entre os gêneros.

Deve ser visto a lei do feminicídio como um avanço político, legislativo e social

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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