CARGOS COMISSIONADOS E A REFORMA DO ESTADO

06/03/2019 às 09:18
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A Reforma Fiscal começa pela diminuição do tamanho do Estado, e os cargos comissionados são um elevado peso nas contas fiscais.

CARGOS COMISSIONADOS E A REFORMA DO ESTADO

Em tempos de crise muito se discute sobre o tamanho, e peso do Estado brasileiro, e logo muitas das suas características reabrem novas e maiores discussões.
O pesos dos cargos comissionados no Brasil, é um dos assuntos que jamais saem de pauta, principalmente quando são traçados comparativos com outros países, vejamos alguns exemplos:
1) Os EUA, que tem uma população de 300 milhões de habitantes, há 7.000 cargos em comissão ocupados por particulares sem concurso público;
2) Nosso vizinho Chile, que tem 17 milhões de habitantes, há 800 cargos em comissão ocupados por particulares sem concurso público;
3) Na Inglaterra, que tem uma população de 50 milhões de habitantes, há 500 cargos em comissão ocupados por particulares sem concurso público;
4) Na França e Alemanha, que têm 65 milhões e 81 milhões de habitantes respectivamente, há apenas 300 cargos em comissão ocupados por particulares sem concurso público.
No Brasil, onde temos cerca de 200 milhões de habitantes, há 600 mil cargos em comissão ocupados por particulares sem qualquer tipo de concurso público, nos três entes Federativos (união, Estado e Municípios), considerando dentro deste número os três poderes (executivo, Legislativo e Judiciário).
Para os servidores efetivos a regra é sempre o concurso público, art. 37, II, CF, e logo os cargos em comissão, devem preferencialmente ser transitórios.
O que assistimos, nos três entes é uma burla desse Princípio, com o aumento assustador dos cargos comissionados. Se tomarmos a prefeitura de Florianópolis, no ano de 2003, o número de cargos comissionados era de cerca de 86 cargos, com a conversão das maioria dos postos de função gratificada, convertidos em cargos comissionados esse número passou para cerca de 630, até a última contagem.
É de se destacar que a Emenda 19/98 tentou corrigir essa perversão do sistema, ao alterar o inc. V, art. 37, CF, porém o resultado foi infrutífero, ainda que a mesma determinasse que um percentual mínimo dos cargos em comissão fossem ocupados por servidores concursados, mas poucos Estados e Municípios, e também a União, legislaram para dizer qual seria este percentual mínimo.
Por certo, em verdade, o que ocorre no Brasil, em muitas vezes é uma prática imoral, realmente contrária ao princípio da moralidade, este insculpido no art. 37, caput, CF, de se lotear cargos públicos que deveriam ser ocupados apenas por servidores públicos concursados, um desestímulo à muitos servidores de carreira
A origem dos cargos comissionados remonta ao Brasil-Colônia, cujo sistema de Capitanias Hereditárias permitiu que os portugueses proprietários de terras, conhecidos como donatários, tivessem poderes – estes conferidos pela Coroa Portuguesa – para nomear pessoas de seu interesse a fim de exercer funções públicas no Brasil, com o fracasso das mesmas, as nomeações começaram, sendo que os titulares do poder nas Capitânias nomeavam, ao seu livre arbítrio, indivíduos que deveriam exercer funções públicas.
Mesmo após a proclamação da República, a Constituição Republicana de 1891 continuava prevendo a possibilidade de livre nomeação para cargos públicos, mas agora com duas diferenças: eles deveriam estar previstos em lei e cada Poder nomearia os seus próprios funcionários.
Ocorre, que a necessidade de concurso público e as garantias do cargo foram previstas pela primeira vez na Constituição de 1934 e se estenderam até hoje, com exceção do período ditatorial que, apesar de ainda prever a necessidade de concurso público para o acesso aos cargos no governo, extirpou da sociedade todo e qualquer tipo de garantia ou direito fundamental.
Porém, a troca de favores, configurada como uma afronta ao princípio constitucional da moralidade administrativa e caracterizada como sendo um desvio de poder – tendo em vista que não visa o atingimento do interesse público – não é nova em nossa política. Tal prática sempre esteve presente em nossa história, desde os tempos do Império até hoje.
Nesse momento, os governos estaduais e as prefeituras, já respondem por cerca de 40% do gasto público total, lembrando que nos anos 80, o déficit das contas de Estados e Municípios representavam apenas 25% do total do déficit consolidado.
O mais fantástico é que é que entre 2008 e 2015, os gastos com pessoal e encargos dos Estados e Municípios saltou de 3,7% para 5,2% do PIB, ou seja um aumento real de 40,5%, e do outro lado da conta o investimento caiu de 0,8% para 0,5% ou seja de tudo que se arrecada por esses entes apenas 0,5% vai para investimento.
Ou seja o Serviço Público caminha na contramão das necessidades da sociedade, numa velocidade avassaladora.
Sem uma intervenção urgente nessa direção, os homens público, pouco ou quase nada terão para inaugurar, sendo que o fim do Serviço acaba por se encerrar no servidor.
OS cargos comissionados caminham à passos largos para sua efetiva redução, como medida de sobrevivência, sendo que os mesmos devem ser transformados em funções gratificadas não incorporáveis.
Reduzir a máquina e recuperar a capacidade de investimento será a chave para os homens públicos com projeto de Estado, ainda que estes estejam em falta.
As parcerias, independentemente do modelo adotado, seja PPPs ou concessões, devem ganhar velocidade, em resposta ao movimento paquidérmico Estatal, que muito cobra do cidadão e pouco lhe devolve.
Não será o fim dos cargos comissionado, afinal eles por certo são necessários para muitas funções, mas é necessário que sua dimensão seja sopesada diante da nova realidade financeira, evitando que de contribuintes viremos vassalos de um Estado insensível as demandas sociais e econômicas

Sobre o autor
Charles M. Machado

Charles M. Machado é advogado formado pela UFSC, Universidade Federal de Santa Catarina, consultor jurídico no Brasil e no Exterior, nas áreas de Direito Tributário e Mercado de Capitais. Foi professor nos Cursos de Pós Graduação e Extensão no IBET, nas disciplinas de Tributação Internacional e Imposto de Renda. Pós Graduado em Direito Tributário Internacional pela Universidade de Salamanca na Espanha. Membro da Academia Brasileira de Direito Tributário e Membro da Associação Paulista de Estudos Tributários, onde também é palestrante. Autor de Diversas Obras de Direito.

Informações sobre o texto

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