CONEXÃO ENTRE CRIMES ELEITORAIS E COMUNS E COMPETÊNCIA PARA INSTRUIR E JULGAR

10/03/2019 às 13:54
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O ARTIGO ABORDA IMPORTANTE TEMA SOBRE COMPETÊNCIA PARA INSTRUIR E JULGAR CRIMES COMUNS E ELEITORAIS CONEXOS.

CONEXÃO ENTRE CRIMES ELEITORAIS E COMUNS E COMPETÊNCIA PARA INSTRUIR E JULGAR

Rogério Tadeu Romano

 

De início é importante citar caso de conflito de competência entre a Justiça Comum e a Justiça Especial. 

Trago à colação o caso abaixo: 

 

Pet 6820 AgR-ED / DF - DISTRITO FEDERAL
EMB.DECL. NO AG.REG. NA PETIÇÃO
Relator(a):  Min. EDSON FACHIN
Relator(a) p/ Acórdão:  Min. RICARDO LEWANDOWSKI
Julgamento:  06/02/2018           Órgão Julgador:  Segunda Turma

Publicação

ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-058 DIVULG 23-03-2018 PUBLIC 26-03-2018

Parte(s)

EMBTE.(S) : PAULO ANTONIO SKAF ADV.(A/S) : ALAMIRO VELLUDO SALVADOR NETTO E OUTRO(A/S) EMBDO.(A/S) : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA

Ementa

 

Ementa: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NA PETIÇÃO. COLABORAÇÃO PREMIADA NO BOJO DA OPERAÇÃO “LAVA-JATO”. ODEBRECHT. ELEIÇÕES DE 2010. GOVERNO DE SP. PAGAMENTOS POR MEIO DE CAIXA DOIS. CRIMES DE FALSIDADE IDEOLÓGICA E CONEXOS. CRIME ELEITORAL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA ENTRE JUSTIÇA COMUM E JUSTIÇA ELEITORAL. ENCAMINHAMENTO DOS AUTOS À JUSTIÇA ELEITORAL. PRECEDENTES. I – O Parquet Federal, ao elaborar “REGISTRO DOS PRINCIPAIS PONTOS DO DEPOIMENTO”, referiu-se a pagamentos por meio de “Caixa Dois”. II - Somente no momento de ofertar as contrarrazões ao agravo regimental, inovando com relação ao seu entendimento anterior, passou a sustentar que “a narrativa fática aponta, em princípio, para eventual prática de crimes, tais como corrupção passiva (art. 317 do Código Penal) e falsidade ideológica eleitoral (art. 350 do Código Eleitoral)”. III - O Código Eleitoral, em seu título III, o qual detalha o âmbito de atuação dos juízes eleitorais, estabelece, no art. 35, que: “Compete aos juízes (…) II - processar e julgar os crimes eleitorais e os comuns que lhe forem conexos, ressalvada a competência originária do Tribunal Superior e dos Tribunais Regionais”. IV - O denominado “Caixa 2” sempre foi tratado como crime eleitoral, mesmo quando sequer existia essa tipificação legal. V - Recentemente, a Lei 13.488/2017 incluiu o art. 354-A no Código Eleitoral para punir com reclusão de dois a seis anos, mais multa, a seguinte conduta: “Apropriar-se o candidato, o administrador financeiro da campanha, ou quem de fato exerça essa função, de bens, recursos ou valores destinados ao financiamento eleitoral, em proveito próprio ou alheio”. VI - Ainda que se cogite da hipótese aventada a posteriori pelo MPF, segundo a qual também teriam sido praticados delitos comuns, dúvida não há de que se estaria, em tese, diante de um crime conexo, nos exatos termos do art. 35, II, do referido Codex. VII - A orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal, com o intuito de evitar possíveis nulidades, assenta que, (...) em se verificando (...) que há processo penal, em andamento na Justiça Federal, por crimes eleitorais e crimes comuns conexos, é de se conceder habeas corpus, de ofício, para anulação, a partir da denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal, e encaminhamento dos autos respectivos a` Justiça Eleitoral de primeira instância” (CC 7033/SP, Rel. Min. SYDNEY SANCHES, Tribunal Pleno, de 2/10/1996). VIII - A mesma orientação se vê em julgados mais recentes, a exemplo da Pet 5700/DF, rel. Min. Celso de Mello. IX - Remessa do feito à Justiça Eleitoral de São Paulo.

Após o voto do Ministro Relator, que recebia os embargos de declaração como agravos regimentais e a eles negava provimento, pediu vista o Ministro Ricardo Lewandowski. Ausente, justificadamente, o Ministro Dias Toffoli. Presidência do Ministro Edson Fachin. 2ª Turma, 3.10.2017. Decisão: A Turma, preliminarmente, por unanimidade, recebeu os embargos de declaração como agravos regimentais e, por maioria, deu-lhes provimento para que se remeta o feito à Justiça Eleitoral de São Paulo, nos termos do voto do Ministro Ricardo Lewandowski, vencido o Ministro Relator que a eles negava provimento. Redator para o acórdão o Ministro Ricardo Lewandowski. Presidência do Ministro Edson Fachin. 2ª Turma, 6.2.2018.

Assim observa-se que em face de "crime de caixa-dois" onde há conflito de competência entre a justiça comum e a justiça especial(eleitoral) o STF entendeu que cabe à justiça especializada eleitoral a competência para instruir e julgar o feito. 

Saliento daquele julgamento, o voto do ministro Lewandoski:

“Em casos semelhantes, de conflito de competência entre a Justiça comum e a especializada, a orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal, com o intuito de evitar possíveis nulidades, assenta que,“(...) em se verificando (...) que há processo penal, e mandamento na Justiça Federal, por crimes eleitorais e crimes comuns conexos, é de se conceder habeas corpus, de ofício, para anulação, a partir da denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal, e encaminhamento dos autos respectivos à Justiça Eleitoral de primeira instância” (CC 7033/SP, Rel. Min. SYDNEYSANCHES, Tribunal Pleno, de 2/10/1996 - grifei). A mesma orientação se vê em julgados mais recentes, a exemplo da Pet 5700/DF, rel. Min. Celso de Mello, na qual a colaboração descrevia um suposto pagamento de “Caixa 2” para as campanhas, ao Senado, de Aloysio Nunes (PSDB) e Aloizio Mercadante (PT), ambos por meio de recursos de origem alegadamente ilícita da UTC Engenharia. Naquele feito, o próprio Procurador-Geral da República à época, opinou pelo desmembramento e remessa dos autos à Justiça Eleitoral por constatar a eventual prática do crime de “Caixa 2”, enquadrado no art.350 do Código Eleitoral, em conexão com o crime de lavagem de dinheiro(art. 1°, § 1º, da Lei 9.613/98), ambos descritos na inicial da mencionada Pet 5700/DF. No referido precedente, ressalto que o então PGR esclareceu ao Plenário desta Suprema Corte que havia opinado pela remessa da Pet5700/DF para a Justiça Eleitoral de São Paulo “independentemente da origem ilícita da verba”, entre outras razões, porque se tratava de “Caixa2” (art. 350 do Código Eleitoral).”

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Discute-se, que, nos casos de conexão entre delitos sujeitos à competência da Justiça Comum Federal e da Justiça Estadual, haveria de se ponderar que se está diante de uma competência absoluta.

O artigo 109, inciso IV, da Constituição não dá margem a dúvidas, pois estabelece a competência da Justiça Federal para avaliar processos relativos a crimes contra a União, “excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral”.

Ademais, o Código Eleitoral, em seu artigo 35, inciso II, repita-se,diz que cabe aos juízes eleitorais “processar e julgar os crimes eleitorais e os comuns que lhe forem conexos”.

Em recente artigo, datado de 10 de março do corrente ano, para o O Globo, a procuradora-geral da República Raquel Dodge, acentuou que “a interpretação das normas de competência em caso de conexão entre crimes federais comuns e eleitorais não pode incluir apenas a legislação ordinária. Deve prevalecer a regra constitucional, de modo a considerar cada Justiça — a Federal e a Eleitoral — como a competente para processar os crimes que, pela Constituição (no caso da Justiça Federal) e pela Lei (no caso da Justiça Eleitoral) lhes cabem.”

Por este entendimento, em caso de conexão entre crimes federais comuns e crimes eleitorais, a respectiva investigação ou ação penal deve ser cindida, sendo os primeiros julgados na Justiça Federal e os segundos na Eleitoral.

O Código Eleitoral é a lei que definiu a competência criminal da Justiça Eleitoral. Seu artigo 35-II estabelece que cabe aos juízes eleitorais processar e julgar os crimes eleitorais e os comuns que lhes forem conexos. Portanto, a partir da lei ordinária, com suas repercussões, nas inelegibilidades, detalhadas em lei complementar, é que se tem que não cabe à Justiça Federal Comum, o julgamento de crimes federais conexos a eleitorais.

Recentemente houve a proposta de retirar dos juízes eleitorais a competência para processar e julgar os crimes comuns que forem conexos com os crimes de natureza eleitoral e que foi objeto do pacote enviado pelo ministro da Justiça.

“O curioso é que o anteprojeto seria de lei ordinário, mas matéria de atribuições e competências e da Justiça Eleitoral a Constituição exige lei complementar hoje. Projeto de lei ordinária obviamente não pode alterar o artigo 35 inciso segundo (do Código Eleitoral), observação a ser debatida oportunamente”, disse o ministro Celso de Mello, durante sessão da Segunda Turma.

Com todas as vênias entendo que não cabe haver a propalada cisão de competências, diante do quadro do direito positivo brasileiro.

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) confirmou jurisprudência no sentido da competência da Justiça Eleitoral para processar e julgar crimes comuns que apresentam conexão com crimes eleitorais. A Corte observou ainda que cabe à Justiça especializada analisar, caso a caso, a existência de conexão de delitos comuns aos delitos eleitorais e, em não havendo, remeter os casos à Justiça competente.

A matéria foi apreciada no julgamento de recurso (agravo regimental) interposto pela defesa do ex-prefeito do Rio de Janeiro Eduardo Paes e do deputado federal Pedro Paulo (DEM-RJ) no Inquérito (INQ) 4435, no qual são investigados por fatos supostamente ocorridos em 2010, 2012 e 2014. O agravo foi apresentado contra decisão do relator, ministro Marco Aurélio, que havia declinado da competência para a Justiça do Estado do Rio de Janeiro por entender que os delitos investigados não teriam relação com o mandato de deputado federal. Contra essa decisão monocrática, a defesa interpôs o recurso que foi remetido pela Primeira Turma do STF ao Plenário.

No agravo, os investigados pediram a manutenção da investigação no STF, tendo em vista que Pedro Paulo ocupava na época da maior parte dos fatos o cargo de deputado federal. Caso o processo não fosse mantido na jurisdição do STF, requereram o encaminhamento do caso à Justiça Eleitoral fluminense.

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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