Nos últimos anos, os clientes das operadoras de telecomunicações têm pagado mensalmente um valor maior do que o devido nos serviços contratados, isto ocorre porque as operadoras de telefonia têm incluído indevidamente a cobrança de serviços não contratados.
Exemplo disso é quem usa telefone pré-pago e percebe que os seus créditos somem assim que faz a recarga e antes de usá-lo para fazer ligações, enviar mensagens ou acessar a internet. Já, para os contratantes de serviços pós-pago, estes podem verificar na fatura e encontrará cobranças adicionais, não identificadas ou estranhas, como por exemplo, “Cobrança Serviços de Terceiro TDATA”, “SVA Engineering”. Nestes casos o consumidor pode estar sendo vítima de cobrança indevida de SVA “Serviço de Valor Adicionado”.
Os SVAs, são serviços que versam sobre serviços adicionais, por exemplos, aplicativos pagos de jogos, horóscopos, notícias por SMS "Short Message Service" ou serviço de mensagens curtas, cursos de idiomas, backup de arquivos, proteção para o celular, dentre outros.
Embora seja oferecida por operadoras de celular, a Lei nº 9.472/1997, “Lei Geral de Telecomunicações”, não considera os SVAs como um serviço de telefonia, mas sim opções agregadas que vão além das funcionalidades básicas de voz e SMS.
Na prática, isso significaria que a Anatel “Agência Nacional de Telecomunicações” não teria o poder de regular e punir operadoras que cometem tais irregularidades.
De modo geral, existe uma infinidade SVAs sendo oferecidos e muitos consumidores acabam contratando o serviço sem perceberem, sem quererem, sem terem solicitado ou, até mesmo, por não entenderem do que se trata ou que se trata de serviço pago.
Como por exemplo, os casos de ativação ou contratação via cliques no aparelho celular, através de mensagens auditivas ou mediante telefonemas, outras vezes as empresas telefônicas simplesmente incluem essas cobranças aleatoriamente ou à revelia, sem quaisquer pseuda manifestação do cliente, aguardando apenas que ele pague.
Acrescento ainda, que outro caso muito comum é a vedada venda casada; ainda mais quando é totalmente oculta do consumidor.
Conforme nos elucida o Código de Defesa do Consumidor, em seu dispositivo legal, artigo 39, inciso I, “é vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos”.
A venda casada é caracterizada por vincular a venda de um bem ou um serviço à aquisição de outro(s) iten(s) ou pela imposição de quantidade mínima de produto ou serviço.
Desse modo, a Lei n.º 8.137/1990 , que define os crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo, no seu artigo 5º, incisos II e III, prescreve como crime:
a) subordinar a venda de bem ou a utilização de serviço à aquisição de outro bem, ou ao uso de determinado serviço;
b) sujeitar a venda de bem ou a utilização de serviço à aquisição de quantidade arbitrariamente determinada.
Essas hipóteses inibem a liberdade de escolha do consumidor; ou seja, desprezam sua liberdade e vontade de contratar, que diz respeito à adesão voluntária.
No caso das empresas de telefonia, o consumidor é atingido por uma oferta, que pode ocorrer por exemplo através de anúncio, propaganda, comercial, folheto, proposta, onde lhe é um oferecido um plano ou pacote de serviços, como minutos de ligações, quantidade de SMSs, franquia de dados de internet, entre outros, por um determinado preço. Ocorre que lhe é ocultado que parte do valor cobrado será para custear um serviço que não lhe foi informado que faria parte do mix de serviços e se soubesse disso não iria querê-lo porque não deseja, não usa e/ou não precisa.
Desta forma, ao receber a primeira fatura, o consumidor percebe um item que nunca ouviu falar, que não sabe do que se trata e que não lhe interessa; pior ainda, percebe que parte do valor total da fatura é destinada ao pagamento desse item que não contratou, o que implica em ter sido enganado sobre o valor real do pacote de serviços que quis contratar.
Nesta esteira, quando o consumidor constata algum verbete estranho na sua fatura e consegue entrar em contato com a sua operadora de telefonia requerendo o cancelamento de tal cobrança de sua fatura, recebe a resposta de que não é possível o cancelamento, vez que tais serviços e/ou valores teriam sido previamente contratados por ele e, assim, fariam parte do contrato.
Desta forma, os consumidores estão sendo cobrados de algo que não deixa claro qual é a sua natureza e que configura um ônus excessivo ao consumidor e numa vantagem ilícita para a empresa.
Como o vício do consentimento impede que a vontade seja livre, espontânea, clara e de boa-fé, fatalmente prejudica a validade do negócio jurídico.
A vontade viciada sempre permite a anulação do negócio, nesta esteira existem quatro vícios da vontade que permitem a anulação do negócio jurídico, o erro, o dolo, a coação e estado de perigo.
O Código Civil equipara o erro à ignorância, mas eles versam sobre situações distintas, enquanto no erro a vontade se forma com base na falsa convicção ou entendimento equivocado do agente, na ignorância não se registra distorção entre o pensamento e a realidade, pois o agente sequer tem ciência da realidade dos fatos ou da lei, em outras palavras, a ignorância é a plena falta de conhecimento; ou seja, o completo desconhecimento da realidade.
O dolo ocorre quando a pessoa é induzida em erro por outra; ou seja, dolo é o emprego de um artifício ou expediente astucioso para convencer alguém à pratica de um ato que lhe prejudica, mas beneficia outra pessoa. Já a coação é o uso de alguma ameaça, seja ela física ou moral, para forçar alguém a praticar, ou deixar de praticar, determinado ato contra sua vontade. Por fim, o estado de perigo, é quando alguém, premido de necessidade de salvar a si mesmo ou a outra pessoa de grave dano conhecido pela outra parte, assume obrigação excessivamente onerosa.
Diante do exposto apresentado, neste sentido em recente decisão, Resp: nº 1523744 / RS 2015/0070352-0, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu que é de dez anos o prazo de prescrição para o ajuizamento de ação de repetição de indébito por cobrança indevida de serviços de telefonia não contratados.
O entendimento da Corte é que tais cobranças devem seguir a norma geral prevista no artigo 205 do Código Civil, de dez anos, a exemplo do que foi decidido pelo STJ nos casos de ação de repetição de indébito de tarifas de água e esgoto, a jurisprudência foi consolidada na Súmula 412.
Nos embargos de divergência analisados pela Corte Especial, o recorrente alegou divergência entre acórdãos da Primeira e da Segunda Seção do tribunal. Foram citados acórdãos das turmas de direito privado que estabeleceram o prazo prescricional de três anos, com base na aplicação do artigo 206, parágrafo 3º, do CC, ao passo que os julgamentos das turmas de direito público fixavam o prazo de dez anos com apoio na regra geral.
Para o relator do recurso na Corte Especial, ministro Og Fernandes, a questão de repetição de indébito por serviços cobrados que não foram contratados não diz respeito a enriquecimento sem causa, o que poderia justificar a aplicação do prazo trienal. Ele explicou que, no caso analisado, há relação contratual entre a operadora e o consumidor e, portanto, isso diz respeito a um fato do serviço.
“A discussão sobre a cobrança indevida de valores constantes de relação contratual e eventual repetição de indébito não se enquadra na hipótese do artigo 206, parágrafo 3º, IV, do Código Civil/2002, seja porque a causa jurídica, em princípio, existe (relação contratual prévia em que se debate a legitimidade da cobrança), seja porque a ação de repetição de indébito é ação específica”, justificou o relator.
Requisitos
O ministro explicou que a pretensão das ações de enriquecimento sem causa possui como requisito o enriquecimento de alguém, o empobrecimento correspondente de outrem, relação de causalidade entre ambos, ausência de causa jurídica e inexistência de ação específica. “Trata-se, portanto, de ação subsidiária que depende da inexistência de causa jurídica”, resumiu Og Fernandes.
Ele citou o Enunciado 188 aprovado na III Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal, segundo o qual a existência de negócio jurídico válido e eficaz é, em regra, uma justa causa para o enriquecimento.
Na visão do relator, acompanhada pela maioria dos ministros, a interpretação do prazo estabelecido no artigo 206, parágrafo 3º, deve ser restritiva para os casos subsidiários de ação destinada a recuperar o que foi obtido à custa do prejudicado.
Por fim, como advogado da área do direito do consumidor, compreendo que ao se deparar com irregularidades, o usuário dos serviços telefônicos precisam primeiro, entrar em contato com a empresa e, depois, procurar o Procon, pois o mesmo ainda apresenta bons índices de resoluções, desse modo, entendo que num primeiro momento não vale a pena se desgastar no Judiciário de imediato. A Justiça é em último caso, destaco ainda, que o prejudicado pode pedir a devolução em dobro do que foi cobrado caso a fatura do mês já tenha sido paga. “Se há uma repetição de cobranças indevidas, tornando a situação extrema, há casos de dano moral à pessoa, se comprovados”.
Acrescento ainda que, a atitude unilateral da empresa de telefonia, além da falta de transparência, configura abuso vedado pelo CDC, conforme nos disposto artigos 4º, inciso III; 39, inciso IX; e, 51, inciso XI, sendo incompatível com o dever de lealdade e com a boa-fé objetiva CDC, arts. 4º, III e 51, IV; CC, arts. 113, 128, 187 e 422; bem como viola a função social da propriedade e dos contratos, elucidado na Constituição Federal, incisos XXIII e XXIX do art. 5º e 170, inciso III; CDC, art. 1º; CC, art. 187, 421 e o parágrafo único do 2.035, vez que se reputa de boa-fé aquele que age sem omitir pontos relevantes a respeito do produto ou do serviço.
Ainda mais, o consagrado Código Civil, no artigo 104, prescreve que a validade do negócio jurídico exige: agente capaz; objeto lícito, possível, determinado ou determinável; e, forma prescrita ou não defesa em lei. Desta forma, se alguém que não seja o titular da linha telefônica, mesmo que de forma voluntária e consciente, ativa algum serviço na linha telefônica de outrem, tal contratação não é válida.
Exemplificando, que é comum criança, estas menores de idade, mexer nos celulares dos pais ou dos avós, com o que seus cliques contratando serviços não são manifestações válidas de vontade. Mesmo que fosse algum adulto, somente o titular da linha é competente para modificar seu plano.
Outro detalhe, muitas vezes em razão de pressa da correria do dia-a-dia, as pessoas costuma colocar os celulares nos bolsos sem ativar a proteção de tela ou o bloqueio de teclas, com o que ao caminharem os ícones e/ou teclas acabam sendo clicados pela pressão da roupa com o movimento do corpo. Quando isso ocorre, inquestionavelmente não se trata de ato de vontade do consumidor em contratar planos e/ou serviços.
Ao final, importante frisar que a empresa de telefonia deve tomar todas as cautelas possíveis de confirmação da pessoa contratante, se esta pessoa é o titular da linha, e de que esta entendeu perfeitamente o que está fazendo tal como quando ela toma estas mesmas medidas para poder aceitar o pedido de cancelamento do plano ou linha.