Transmutação ou negativação da CF/88

06/04/2019 às 10:32

Resumo:


  • A Constituição Federal de 1988 visa estabelecer o Estado Democrático de Direito e promover a Justiça Social, com ênfase na descentralização do poder e na participação popular.

  • Mudanças constitucionais devem ser avaliadas quanto ao respeito ao Princípio da Soberania Popular, podendo ser classificadas como mutação ou transmutação constitucional, dependendo de sua aderência aos princípios originais da CF/88.

  • Reformas e ações político-administrativas que contrariam os princípios da CF/88, como a reforma trabalhista ou previdenciária, só teriam legitimidade após consulta popular, e ações que beneficiam grupos hegemônicos podem resultar em um Estado de Exceção Permanente.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Negar os pressupostos da CF/88 é negar a Humanidade.

~~Na forma de Carta Política, podemos dizer que o objetivo principal da Constituição Federal de 1988 é edificar o Estado Democrático de Direito e promover a Justiça Social, implementando-se os instrumentos da inclusão, descompressão social e participação popular – e reconhecendo que o melhor meio de se proceder para este fim é descentralizando e desconcentrando o poder.
Sob este prisma, a diferença entre Audiências Públicas e referendos é apenas de grandeza, de alcance popular (e de obrigatoriedade para o segundo), mas não de princípios. A origem e a destinação político-jurídica é a mesma: Emancipação.
Assim, toda mudança constitucional, além do interesse público, por derivação, deve ser avaliada quanto a esta fundamentação do Princípio Democrático, se atentatória ou não ao Princípio da Soberania Popular, para só depois seguir os ritos de análise técnica.
Na ausência de prejuízos à soberania popular, pode-se designar como mutação constitucional o processo de “atualização constitucional” (da CF/88); ao revés, com prejuízos, designamos de Transmutação Constitucional, uma vez que este “novo” sentido dado à Constituição Federal de 1988 é absolutamente estanho aos seus postulados (desde o Preâmbulo). E, sendo-lhe estranhas as mudanças, liquida-se com o suporte da Carta Política.
Portanto, temas como reforma trabalhista, previdenciária, desmantelamento do Estado Social, sucateamento dos conselhos gestores e de participação social, Escola Sem Partido e outras ações político-administrativas, só teriam validade (legitimidade e reconhecimento) após ampla consulta popular.
E ainda assim é de se questionar, afinal, a CF/88 não pode ser desmantelada (principiologicamente) sob a argumentação econômica neoliberal. Simplesmente porque não lhe condiz em princípios e porque tais ações não beneficiam a população, os trabalhadores, as “minorias”, os pobres.
Esta principiologia constitucional (Carta Política) segue a lógica de que o princípio regulador da CF88 é o Princípio Civilizatório – e que provém da garantia de fruição dos direitos de cidadania. Para sua eficácia, listou-se uma longa série de direitos de contenção do Poder Político (liberdade negativa), de obrigações públicas e sociais, de remédios jurídicos, de direitos fundamentais individuais e sociais inalienáveis, e de outras garantias de reconhecimento, defesa e promoção da soberania popular, do Estado de Direito, da democracia, da solidariedade social e do conjunto complexo dos direitos humanos.
Por isso, como parte da Transmutação Constitucional que assistimos desde 2016, pelo avesso, o Objeto Negativo da CF/88 – muito além de meramente decorrer de uma suposta necessidade de "atualização neoliberal" – é revelador de uma contracorrente de exceção, anti-humanizadora, agindo em prol de Grupos Hegemônicos de Poder e do capital especulativo e ceifador das iniciativas e conquistas sociais.
Por isso, a sensação de suspensão das regras democráticas – por exemplo, reformar a previdência para atender exclusivamente aos maiores bancos – tende a se tornar uma regra; tanto quanto as ameaças aos professores e alunos das escolas públicas. E o resultado é que convivemos com um Estado de Exceção Permanente.
O Objeto Negativo da CF88 também revela o recrudescimento da exclusão social e cultural, na esteira de fortes sintomas fascistas de negação humana, como o recrudescimento do racismo, machismo, xenofobia, homofobia, elitismo. Para qualquer “nova” objetivação constitucional, por fim, vale a receita romana: “À mulher de César não basta parecer honesta, precisa de fato ser honesta”. No nosso caso, a mulher de César é a República.
 

Sobre o autor
Vinício Carrilho Martinez

Pós-Doutor em Ciência Política e em Direito. Coordenador do Curso de Licenciatura em Pedagogia, da UFSCar. Professor Associado II da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar. Departamento de Educação- Ded/CECH. Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade/PPGCTS/UFSCar Head of BRaS Research Group – Constitucional Studies and BRaS Academic Committee Member. Advogado (OAB/108390).

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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