Inicialmente cumpre observar que o direito de imagem, consagrado e protegido pela Constituição Federal da República de 1988 e pelo Código Civil Nacional de 2002, é considerado pelos consagrados diplomas jurídicos como um direito de personalidade autônomo, por se tratar da projeção da personalidade física da pessoa, incluindo os traços fisionômicos, o corpo, atitudes, gestos, sorrisos, indumentárias, entre outas características.
Conforme previsão legal, o direito de imagem em nossa Carta Magna, aludido no artigo 5º, X e XXVIII, é, tratado, dentre os Direitos e Garantias Fundamentais e como um Direito de Personalidade, em assonância Da mesma forma, em 2002, o Código Civil Nacional albergou a matéria em seus artigos 11 e seguintes.
De acordo com os citados dispositivos o direito de imagem é irrenunciável, inalienável, intransmissível, porém disponível, significa dizer que a imagem da pessoa ou sua personalidade física jamais poderá ser vendida, renunciada ou cedida em definitivo, porém, poderá, sim, ser licenciada diretamente por seu titular a terceiros.
A imagem do indivíduo, apesar de possuir certa relação com os demais direitos de personalidade e, por vezes, até com eles confundir-se, é um direito autônomo ou próprio, o que repercute diretamente no momento de eventual ação indenizatória ante o uso indevido da imagem do indivíduo.
Cumpre lembrar que, enquanto o direito a honra, por exemplo, demanda a existência de dano para aferição de eventual indenização, conforme aludido no artigo 20 do Código Civil de 2002, o uso indevido de imagem independe de comprovação do prejuízo, sendo este inerente à utilização não-autorizada.
Tal questão, inclusive, já foi pacificada pelo STJ Superior Tribunal de Justiça em Súmula:
Súmula 403 - Independe de prova ou prejuízo a indenização pela publicação não autorizada da imagem de pessoa com fins econômicos ou comerciais..
Diante da análise em epígrafe, o que vem sendo decidido pela jurisprudência pátria atualmente, diz que a ação para fazer cessar o uso indevido de imagem, conhecida como a clássica obrigação de não fazer, assim como àquela para pleitear a consequente indenização, que se remete à obrigação de pagar quantia, demandam duas condições alternativas ou concomitantes, a saber:
- Exploração econômica através da imagem
- Lesão da pessoa retratada.
Neste sentido, diante do exposto supracitado, em recente processo de apelação Nº 70080160005, o Site da Revista Veja, divulgou em uma de suas publicações foto de modelo entrevistada pela revista, no entanto, associando sua imagem à atividade criminosa sem qualquer contexto com a notícia ilustrada causa dano moral.
Por isso a 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul condenou a revista Veja a indenizar a modelo por relacioná-la a organização que agenciava "acompanhantes de luxo" para políticos em Brasília. O TJ, no entanto, reduziu a indenização arbitrada pela primeira instância, de R$ 202 mil, para R$ 50 mil.
CNJ
A modelo foi Coelhinha da revista Playboy. No entendimento do tribunal, o uso da imagem dela pela Veja teve "tom apelativo", e não informativo. A revista havia dito que a modelo era uma das estrelas de uma excursão de mulheres a Brasília.
Sem foto e sem nome
Nos dois graus de jurisdição, foi negado o pedido de exclusão da reportagem do site de Veja, por estar acessível apenas a assinantes depois de quatro anos da publicação.
Entretanto, os julgadores foram unânimes em acolher o pedido de remoção do nome da autora e de sua imagem, uma vez que nada acrescentaram ao objetivo da reportagem.
"A manutenção dos dados pessoais da autora e de sua imagem na referida reportagem caracterizaria, por óbvio, a perpetuação do ilícito: a cada novo acesso à reportagem, por meio digital, o ilícito se renovaria, e com ele o dano à honra e à imagem da autora", explicou a juíza Luciane Marcon Tomazelli, da 13ª Vara Cível do Foro Central de Porto Alegre.
O relator das Apelações no TJ-RS, desembargador Niwton Carpes da Silva, disse que a Veja extrapolou seu direito de informar, enveredando para o jornalismo sensacionalista e ofensivo. A modelo não era investigada na operação policial noticiada pela revista.
"Portanto, a menção ao nome da demandante na reportagem, com a referência de que seria a 'estrela da excursão', e a vinculação de sua fotografia em trajes de banho com destaque, mostravam-se totalmente desnecessárias."
Assim sendo, conforme brevemente elucidado, o uso não-autorizado de imagem encontra algumas limitações firmadas, tanto pela doutrina, como pela jurisprudência, dentre elas as mais relevantes de serem comentadas são:
- O chamado ônus da suportabilidade de terem suas imagens expostas nos veículos de comunicação sem a devida autorização.
Neste sentido, é preciso que se enfatize, que essa limitação não comporta abusos que eventualmente possam denegrir a pessoa.
- A outra limitação refere-se à hipótese de a imagem estar vinculada a informação com claro interesse público.
Nesta análise, o direito à informação também se encontra consagrado pela constituição federal e, igualmente, como um Direito Fundamental, conforme disposto no artigo 5º, XXXIII, da CF/88.Desta forma, a hipótese do uso não autorizado de imagem em matéria com claro cunho jornalístico leva a um inevitável conflito entre direitos fundamentais, onde, via de regra, deverá prevalecer o interesse público-coletivo sobre o individual/privado nos moldes do princípio da proporcionalidade.
Como advogado atuante no Direito Cível, Direito Criminal, entre outras áreas, compreendo que além da aplicação do princípio da proporcionalidade para dirimir o conflito existente entre princípios e direitos fundamentais, é indispensável o bom-senso nas decisões dos magistrados de acordo com o contexto do caso-prático que se apresenta.
É fato inconteste que a imagem como um direito de personalidade autônomo, consagrado constitucionalmente, tem o condão de levar seus titulares a buscar a tutela jurisdicional competente para fazer cessar seu uso indevido e desautorizado, assim como para pleitear eventual indenização, inclusive moral, em razão do ilícito cometido.
Igualmente inquestionável é a possibilidade de limitação deste exercício do direito de imagem quando a pessoa retratada for pública ou quando houver conflito com demais direitos ou princípios fundamentais, como é o caso do direito à informação.
Todavia, o que não se pode esquecer é que mesmo essas limitações devem ser mitigadas ou desconsideradas no momento em que o violador age com os propósitos de:
- Explorar economicamente a vítima, titular do direito de imagem,
- Denegrir sua imagem.
Esses, inclusive, são os requisitos que devem ser perseguidos pelo julgador no momento da análise de casos envolvendo imagens de indivíduos divulgadas sem autorização.