Hoje, mais do que nunca, é preciso defender o cumprimento integral da Constituição Federal. É esta defesa política e jurídica que denominamos de Positivismo Constitucional, ou seja, a existência e a aplicabilidade do conteúdo da Carta Política, nos seguintes termos: solidariedade, inclusão, emancipação, participação, a fim de que haja meio ambiente, saúde, cultura e educação pública, ciência e conhecimento crítico orientado para a Justiça Social.
Portanto, o Positivismo Constitucional exige uma luta pela conservação do Mal Menor, a própria CF/88, quando observamos algumas de suas inclinações voltadas mais incidentalmente ao interesse privado do que ao público. É o sentido preconizado no art. 218 (ciência e tecnologia), por exemplo, ao redobrar esforços para satisfazer o mercado, com aplicação meramente extensiva de recursos públicos e inteligência criativa dos centros de pesquisa para abastecer a linha de produção.
Trata-se do Mal Menor porque, sem isso, como se prenuncia, a sociedade como um todo está ameaçada de encarar um retrocesso moral e intelectual ainda maior, com a sobrevivência insular de uma reduzida casta de “produtores de ciência”; mas, incapazes de uma crítica social transformadora das injustiças e das desigualdades sociais.
Visto assim, esse Mal Menor – a CF/88 que mais protege interesses mercadológicos, com repasse voluntário e gracioso dos dispêndios públicos (art. 218) – também revela a outra face do Objeto Negativo da Carta Política; pois, ora é o mercado a ser beneficiado (em dissonância com os objetivos de solidariedade social: art. 3º da CF/88), ora é o regresso aos tempos em que o país (rebaixado) importava toda ciência e tecnologia de que necessitava.
Este Mal Menor, preservar a existência da Constituição (eficácia normativa), mesmo sabedores de que não se trata de “ciência com pudor público”, é o único meio efetivo para num segundo momento requerermos uma efetividade democrática de todos os capítulos constitucionais: legitimidade e eficácia societal da CF/88.
Pior do que um pensamento autocrático (ditadura), a feiura imoral do Objeto Negativo da CF/88 – cercear e minguar os investimentos na qualidade da educação e da ciência nacional, agora com ameaça efetiva de corte de 30% dos recursos federais – equivale a impor verdadeiro retrocesso no Processo Civilizatório, uma vez que retroagiríamos a eras em que a luz não sairia ou entraria na caverna da ignorância.
Esta modalidade do Objeto Negativo da Carta Política nos obriga à regressão intelectual aos tempos em que a religiosidade, o curandeirismo, as tradições opressivas, as ideologias permissivas às arbitrariedades e atrocidades humanas, os costumes antissociais, os mitos fascistas, ditavam a voz do poder.
Por isso, o Objeto Negativo da CF/88 – o não cumprimento do Positivismo Constitucional – margeia o absurdo e impõe uma séria investigação sobre a ocorrência de crimes contra a humanidade. Afinal, não há crime maior do que condenar uma nação inteira à ignorância planejada, porque não há forma mais grave de se perpetuar as mais violentas ações e inações impeditivas da sociabilidade.
Vinício Carrilho Martinez (Pós-Doutor em Ciência Política e em Direito)
Professor Associado da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar
Departamento de Educação- Ded/CECH
Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade/PPGCTS