AS EMENDAS 13, 14 E 15 À CONSTITUIÇÃO AMERICANA

05/05/2019 às 17:44
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O ARTIGO APRESENTA ANOTAÇÕES SOBRE TRÊS IMPORTANTES EMENDAS À CONSTITUIÇÃO AMERICANA.

AS EMENDAS 13, 14 E 15 À CONSTITUIÇÃO AMERICANA

Rogério Tadeu Romano

Após a guerra fratricida da secessão americana, em 1865, três emendas foram editadas com extraordinário valor social. Seu alcance é inexcedível na afirmação de direitos naquele país.
Venceu o norte em relação ao atraso do sul que preconizava uma economia escravocrata. O país voltou a ser um todo.
Primeiro se fala da chamada Emenda 13.
Votada pelo Congresso em 31 de Janeiro de 1865. Ratificada em 6 de Dezembro de 1865.
Secção 1. Não haverá, nos Estados Unidos ou em qualquer lugar sujeito à sua jurisdição, nem escravidão, nem trabalhos forçados, salvo como punição por um crime pelo qual o réu tenha sido devidamente condenado.
Secção 2. O Congresso terá competência para fazer executar este Artigo por meio das leis necessárias
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A Décima Terceira Emenda à Constituição dos Estados Unidos (em inglês: The Thirteenth Amendment to the United States Constitution) aboliu oficialmente e continua a proibir em território americano a escravatura e a servidão involuntária, essa última exceto como punição por um crime. Foi aprovada pelo Senado em 8 de abril de 1864, aprovada pela Câmara em 31 de janeiro de 1865 e aprovado em 6 de dezembro de 1865. Foi então declarado no anúncio do secretário de Estado William Seward em 18 de dezembro. Foi a primeira das emendas da Reconstrução.

A emenda 13 de 1865(sob a presidência de Lincoln), proibindo a escravidão no país tem caráter importantíssimo nas políticas de igualdade social.

Estava abolida a escravatura no território americano. 

A emenda 14, de 1866, sob a presidência de Andrew Johnson, dispondo sobre a cidadania e a igual proteção das leis sem qualquer distinção, como também, sobre o direito de voto, excluindo os índios e as mulheres.
(Ratificada em 9 de julho de 1868).

Em maio de 1973, a Suprema Corte decidiu que algumas formas de discriminação sexual já eram proibidas pela 14ª Emenda.
Seção 1 Todas as pessoas nascidas ou naturalizadas nos Estados Unidos e sujeitas a sua jurisdição são cidadãos dos Estados Unidos e do Estado onde tiver residência, Nenhum Estado poderá fazer ou executar leis restringindo os privilégios ou as imunidades dos cidadãos dos Estados Unidos; nem poderá privar qualquer pessoa de sua vida, liberdade, ou bens sem processo legal, ou negar a qualquer pessoa sob sua jurisdição a igual proteção das leis.
Seção 2 O número de representantes dos diferentes Estados será proporcional às suas respectivas populações, contando-se o número total dos habitantes de cada Estado, com exceção dos índios não taxados; quando, porém, o direito de voto em qualquer eleição para a escolha dos eleitores, do Presidente e do Vice-Presidente dos Estados Unidos, ou dos membros de sua legislatura, for recusado a qualquer habitante desse Estado, do sexo masculino, maior de 21 anos e cidadão dos Estados Unidos, ou quando esse seu direito for de qualquer modo cerceado, salvo o caso de participação em rebelião ou outro crime, será a respectiva representação estadual reduzida na mesma proporção que a representada por esses indivíduos em relação à totalidade dos cidadãos de sexo masculino, maiores de 21 anos, no Estado. S
Seção 3 Não poderá ser Senador ou Representante, ou eleitor do Presidente e Vice-Presidente, ou ocupar qualquer emprego civil ou militar subordinado ao Governo dos Estados Unidos ou de qualquer dos Estados aquele que, como membro da legislatura de um Estado, ou funcionário do Poder Executivo ou judiciário desse Estado, havendo jurado defender a Constituição dos Estados Unidos, tenha tomado parte em insurreição ou rebelião contra essa Constituição, ou prestado auxilio e apoio a seus inimigos. O Congresso pode, porém, mediante o voto de dois terços dos membros de cada uma das Câmaras, remover a interdição.
Seção 4 A validade da dívida pública dos Estados Unidos, autorizada pela lei, incluindo as dívidas contraídas para o pagamento de pensões e de recompensas por serviços prestados na repressão de insurreição ou rebelião, não será posta em dúvida. Todavia, nem os Estados Unidos nem qualquer dos Estados deverão assumir ou pagar qualquer dívida ou obrigação contraída para auxiliar insurreição ou rebelião contra os Estados Unidos, nem qualquer indenização pela perda ou emancipação de escravos; todas estas dívidas, obrigações, ou indenizações serão consideradas ilegais e nulas.
Seção 5 O Congresso terá competência para executar, com legislação apropriada, as disposições deste artigo.

Na Constituição norte-americana não há sequer uma menção explícita à igualdade de gênero (197 outras Constituições ao redor do mundo o fazem). Em 1923 foi apresentada ao Congresso a Equal Rights Amendment, uma emenda para a igualdade de direitos entre homens e mulheres, mas que nunca teve a aprovação necessária de três quartos dos estados do país. No âmbito internacional, os Estados Unidos nunca ratificaram a Convenção da ONU sobre a Eliminação da Discriminação contra a Mulher, de 1979. Apenas seis membros da ONU não ratificaram essa Convenção: Irã, Somália, Sudão do Sul, Tonga, Vaticano e Estados Unidos.

Conforme é exposto na primeira cláusula, a 14a emenda definiu formalmente a cidadania norte americana garantindo, em tese, a cidadania e seus benefícios aos ex-escravos (NATIONAL ARCHIVES 1, s.d). Tal cláusula revogou o precedente gerado em 1857 pelo caso Dred Scott x Sandford, em que foi negado o direito de mover uma ação judicial a Scott, um escravo, pelo fato de não possuir cidadania e, portanto, não ter acesso a seus benefícios – tal como a proteção do governo federal e das cortes demandada ao se mover uma ação judicial (RODRÍGUEZ, 2009). A segunda cláusula da emenda suscita uma segurança nacional contra violações, pelos estados, dos direitos fundamentais dos cidadãos. Trata-se de aplicar mais restrições constitucionais contra os estados na medida em que se busca garantir frente a estes os mesmos direitos fundamentais que os cidadãos tinham perante a União (COSTA, 2008). Por fim, a primeira seção da 14a emenda versa sobre o direito ao devido processo legal e à igual proteção perante a lei de todos, sem distinções, devendo ser observada tanto pelo governo federal quanto pelo governo estadual (NATIONAL ARCHIVES 2, s.d).

Em 1883 a Suprema Corte derrubou a Lei dos Direitos Civis de 1875, a qual proibia a discriminação em hotéis, teatros e outros espaços públicos. O argumento da Corte foi o de que a 14a emenda não proibia a discriminação por indivíduos ou empresas privadas, não autorizando a Lei dos Direitos Civis, a qual foi, então, declarada inconstitucional (NATIONAL ARCHIVES 3, n.d). Tal decisão, somada à já arraigada cultura de preconceito e às heranças dos Black Codes, pavimentou o caminho para diversos mecanismos que permitiram o desvio dos objetivos da 14a emenda, criando um ambiente propício à segregação e à discriminação. 

Os Black Codes foram leis promulgadas nos estados sulistas logo após o fim da Guerra da Secessão. Rigorosas, tais leis buscavam assegurar a manutenção da supremacia branca, substituindo os controles sociais da escravidão impossibilitados pela 13a emenda. Apesar de terem sido, em tese, suprimidas pela promulgação da 14a emenda, tais leis deixaram como herança a perpetuação da idéia de inferioridade dos negros.

Os Black codes tiveram muitas de suas disposições revividas nas Jim Crow Laws, leis que também se colocavam contra os negros (LYNCH, s.d). Vigorando do fim século XIX até 1965, as leis Jim Crow legitimaram a segregação étnica autorizando, por exemplo, a separação de negros e brancos em ambientes públicos e privados e a proibição de casamentos “inter-raciais”. Tais leis tiveram como sustentáculo a doutrina separate but equal, a qual foi grande responsável por promover nos Estados Unidos uma segregação racial institucionalizada, gerando uma conjuntura na qual a 14a emenda era, na prática, extremamente desrespeitada, como bem acentuou Gabriela B. Born(A instrumentalização do direito no direito pós-guerra de secessão).

Prossegue Gabriela B. Born(obra citada) lembrando que “conforme a doutrina separate but equal, brancos e negros, por serem iguais, deveriam ter acesso aos mesmos serviços públicos, de igual qualidade. O acesso, entretanto, seria direcionado pela cor da pele, conduzindo à segregação racial. Solidificando as Jim Crow Laws, tal doutrina foi constitucionalmente legitimada com a decisão da Suprema Corte no caso Plessy v. Ferguson (1896).

A segregação institucionalizada sofreu seu primeiro grande fracasso apenas em 1954, com o caso Brown vs. Board of Education. Constituído pela confluência de cinco casos distintos, tal caso mostrou à corte que a segregação no âmbito escolar era um problema nacional, e não somente dos estados sulistas. A decisão da Suprema Corte Americana se revelou contra a segregação racial praticada pelo próprio Estado nas escolas públicas, sob o argumento de que o sistema de segregação no campo educacional era intrinsecamente desigual, violando a proteção da igualdade prevista na 14a emenda (DUARTE, 2014). Nas palavras do juíz Earl Warren, componente da Suprema Corte à época, “No campo da educação pública, a doutrina separate but equal não tem espaço, uma vez que as instalações educacionais separadas são inerentemente desiguais”
Importante em face dessa emenda examinar a chamada discriminação em relação a questões de gênero.

A Suprema Corte dos Estados Unidos, em diversas ocasiões, já se manifestou em casos em que se discutia a discriminação em função do gênero. Um dos primeiros precedentes que se tem notícia é o caso Minor v. Happersett (1875), que teve início quando Virginia Minor desafiou a constituição estadual do Missouri, que estabelecia que somente os homens poderiam votar. Minor teve sua candidatura rejeitada por Happersett, por ser mulher e então resolveu levar seu caso à Suprema Corte dos Estados Unidos.

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No mérito, a Corte Suprema firmou o posicionamento de que a 14ª Emenda à Constituição Federal não impedia que os estados da federação negassem o direito ao voto das mulheres(Suprema Corte. Burlington Industries, Inc. v. Ellerth (1998).
"[o]s programas de ação afirmativa para mulheres foram igualmente limitados nas decisões da Suprema Corte. Na ação da 'Universidade para Mulheres do Mississipi contra Hogan' (1982), a escola de enfermagem para mulheres foi processada por um homem que não foi admitido num programa de graduação sob o argumento de que a instituição violara a Cláusula de Proteção à Igualdade da 14a Emenda da Constituição dos Estados Unidos. A Suprema Corte extinguiu a política da universidade de admitir apenas mulheres na escola de enfermagem, julgando que uma classificação por gênero somente seria válida se houvesse uma prova de que aquela política pretendia compensar mulheres por discriminação sofrida na enfermagem, em oposição a uma discriminação mais generalizada enfrentada na escola ou no emprego".

No que se concerne à discriminação em função do gênero, não se pode deixar de mencionar o caso Rostker v. Goldberg (1981), em que se discutia, em síntese, se a adoção de critérios distintos para o recrutamento de homens e de mulheres para o Exército representava uma ofensa ao disposto na 5ª Emenda à Constituição dos Estados Unidos. Ao analisar o mérito do presente caso, a Suprema Corte norte-americana firmou o entendimento de que a decisão do Congresso dos Estados Unidos de isentar as mulheres do serviço militar não violava a cláusula do devido processo legal. Afirmou-se, ainda, que as diferenças estabelecidas para o recrutamento de homens e mulheres para o Exército eram justificadas e que o Congresso tinha a competência para determinar que as mulheres não fossem colocadas em situação de combate.
Por fim, a Emenda 15, de 1869(sob a presidência de Grant) proibia negar o direito de voto sob pretexto de raça, cor ou condição servil.

Foi ratificada em 3 de fevereiro de 1870.
Seção 1 O direito de voto dos cidadãos dos Estados Unidos não poderá ser negado ou cerceado pelos Estados Unidos, nem por qualquer Estado, por motivo de raça, cor ou de prévio estado de servidão.
Seção 2 O Congresso terá competência para executar este artigo, com legislação apropriada.
Com o fim da escravidão, o tratamento igual de todos, independentemente de cor e de origem e ainda o acesso ao voto, tem-se um país vocacionado a sua liderança entre as Nações do mundo civilizado.

A Lei dos Direitos Civis foi o ápice com relações a essas ilações.

Mas, no segregado sul do país, os negros nasciam em hospitais separados e eram enterrados em áreas diferentes, após uma vida em que não podiam estudar nas escolas para brancos, nem viajar em seus assentos, nem comer em seus restaurantes, nem usar o mesmo banheiro público.

A Lei dos Direitos Civis (Civil Rights Act, em inglês) foi o diploma legal adotado pelos Estados Unidos em 1964 e que pôs fim aos diversos sistemas estaduais de segregação racial, conhecidos por Leis de Jim Crow, e foi promulgada em 2 de julho de 1964, estabelecendo um marco legal naquele país.

A lei teve sua proposta iniciada pelo então presidente John F. Kennedy em seu pronunciamento de 11 de junho de 1963, no qual ele pedia que fosse criada uma legislação capaz de "dar a todos os americanos o direito de serem servidos em todas as instalações abertas ao público - como hotéis, restaurantes, teatros, lojas e estabelecimentos similares", e ainda para "reforçar a proteção ao direito de voto.

 

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

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