Uma discussão cuja chama frequentemente se reacende nas indagações tanto de empregados quanto de seus patrões é a possibilidade ou não dos empregadores efetuarem revistas pessoais nos trabalhadores a eles subordinados.
De um lado, tem-se o direito do empregado à sua intimidade e honra, principalmente em não ser constrangido fisicamente por um segurança patrimonial ou em não revelar itens de uso pessoal que carrega consigo, tanto em sua vestimenta quanto em compartimentos de bolsas, mochilas, sacolas etc.
Tal proteção decorre da própria Constituição Federal, que em seu art. 5º, inciso X, prescreve que são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.
No sentido oposto, o empregador é constantemente onerado pelos riscos de seu negócio, não podendo legalmente transferi-los aos seus empregados, de modo que a necessidade de preservação de seu patrimônio para se manter economicamente saudável o obriga a tomar medidas para coibir eventuais furtos que seus empregados possam cometer.
Ainda, muitas vezes a cautela com os bens em sua guarda vai além de meras preocupações de origem econômica. Muitas empresas lidam com produtos cuja venda e distribuição são restritas e cuja dispensa sem controle pode inclusive causar problemas à coletividade, como seria o caso de farmácias e drogarias que comercializam medicamentos controlados, indústrias que lidam com produtos químicos e radioativos, entre outros.
Vale ressaltar que o patrimônio também encontra proteção constitucional no mesmo artigo 5º da Lei Maior, no seu inciso XXII.
Pavimentado o conflito entre propriedade privada e intimidade, fica a questão: o quão longe o empregador pode ir na guarda e manutenção de sua propriedade?
Recentemente a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST) novamente julgou o tema, mantendo a linha que o Tribunal já vinha seguindo sobre a matéria. Foi fixado um meio termo entre a inviolável intimidade do empregado e a irrestrita guarda patrimonial de seu empregador.
Segundo decisão transitada em julgado em dezembro de 2018 – ou seja, já não sendo passível de recurso –, a Primeira Turma do TST julgou improcedente o pedido de indenização de uma encarregada de seção da Rede Walmart em razão da revista de bolsas e armários feita pela empresa.
A decisão segue o entendimento prevalecente no TST de que as revistas dirigidas a todos os empregados e sem contato físico de qualquer natureza não caracterizam dano moral.
Tal decisão segue na mesma direção que os Tribunais Regionais, em sua maioria, já adotavam quanto à questão, de modo que tal posicionamento tenderá a ser o adotado pelos juízes de 1º grau quando forem confrontados com casos semelhantes.
Na hipótese em questão, o TST entendeu que o procedimento adotado pela referida rede de supermercado não atentava diretamente contra a honra e intimidade de seus empregados, por dois principais motivos.
O primeiro, de que a revista era obrigatória para todos os empregados, não havendo individualização de um ou outro, de forma reiterada, para que fossem submetidos ao procedimento. Com isso, não estamos diante de condutas que visam perseguir e humilhar certos empregados, mas apenas de que o empregador possa atuar para a proteção de seu patrimônio.
O segundo ponto é de que as revistas não eram íntimas, ou seja, não eram feitas diretamente no corpo e roupas dos empregados, mas apenas em bolsas, sacolas, armários, pochetes etc. A justificativa para tal permissão é de que o procedimento é razoável para a proteção patrimonial que busca a empresa, uma vez que tais acessórios são os principais meios para que se operem furtos e desvios no ambiente de trabalho.
Tal decisão, no entanto, não exaure todas as possibilidades e exceções que podem se aplicar a tal regra.
Apesar de ser um norte importante para que se estabeleça uma legalidade do procedimento de revistas, sempre podemos estar diante de situações excepcionais, como na hipótese de um empregado precisar portar um item de uso pessoal em seus pertences, como medicamentos de uso controlado ou mesmo decorrente de sua intimidade. Nesses casos, o procedimento de revista poderia gerar constrangimento apto à reparação moral.
Não existe receita de bolo para a questão, sendo que a jurisprudência nesses casos sempre irá sopesar os direitos envolvidos no debate antes de decidir sobre o tema, sempre com o norte sendo a boa-fé e a razoabilidade nos procedimentos seguidos pelos empregadores.
Atualmente, as empresas podem contar com novos meios de proteção patrimonial que não as obriguem a expor seus empregados a situações constrangedoras. A instalação de sistema de vigilância, com câmeras e guardas patrimoniais, instalação de detectores de metais, radiografia etc. obstam a necessidade de se realizar revistas íntimas nos trabalhadores, de modo que a jurisprudência tenderá, futuramente, a ser cada vez mais rígida com procedimentos que violem mais diretamente a intimidade de seus empregados.
Por enquanto, vale a regra do bom-senso, para que se caso tais procedimentos se operem, que eles sejam feitos com o mínimo de intromissão na esfera pessoal do empregado, e apenas nos casos onde a adoção de revistas seja proporcional ao bem material que se busca resguardar.