INSOLVÊNCIA E O CONCURSO DE CREDORES

22/05/2019 às 11:43
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O ARTIGO DISCUTE SOBRE O TEMA DA INSOLVÊNCIA CIVIL À LUZ DOS ENSINAMENTOS DE PONTES DE MIRANDA.

INSOLVÊNCIA E O CONCURSO DE CREDORES 

 

I – A INSOLVÊNCIA

 

Rogério Tadeu Romano

 

O  devedor pode deixar de adimplir um contrato porque tem razões jurídicas para fazê-lo, seja uma dúvida que seja relevante sobre o montante da dívida, exceção de contrato não cumprido, falência do credor. Diverso é o devedor insolvente que é aquele que, sem escusa jurídica, porque não pode fazê-lo, não cumpre a obrigação, porque a situação econômica do seu patrimônio torna impossível a prestação devida.

 Para Teixeira de Freitas(Aditamentos ao código de comércio) a insolvência é a cessação de pagamentos, tal como exigida pelo revogado artigo 797 do Código Comercial. Mas essa opinião ficou isolada na doutrina. Insolvente é aquele que não solve as suas obrigações sem escusa jurídica.

 A inaptidão econômica a adimplir refere-se a insolvabilidade. O insolvável deixa de adimplir porque não pode fazê-lo, porque a situação econômica de seu patrimônio torna impossível a prestação devida.

 A insolvência diz respeito à obrigação, a insolvabilidade é um estado que interessa a totalidade dos credores de devedor. A inaptidão econômica de adimplir caracteriza a insolvabilidade: insuficiência do ativo no patrimônio do devedor(insolvência em sentido clássico) ou falta de meios líquidos para prestar. A primeira é uma impossibilidade definitiva e a segunda é uma impossibilidade mais ou menos durável em função do crédito de que goze ou venha a gozar, o devedor insolvável e do tempo necessário à realização do seu ativo ilíquido.

Pontes de Miranda(Tratado de direito privado, tomo XXVII, ed. Bookseller, § 3.202) entendia que a insolvabilidade é o estado econômico em que a pessoa não pode satisfazer asa dívidas, porque o ativo é menor do que o passivo, computando-se também como parcela do passivo o que seria de mister para as despesas de prestar.

A insolvabilidade é um dos estados de dificuldades dos devedores: não é o único. Por outro lado, o ativo pode ser, no momento, maior do que o passivo, porém faltarem disponibilidade para a satisfação de credores; há, aí, a insolvência ocasional, que pode ser de sérias consequências.

As leis, aos tratarem, das liquidações, das falências e do concurso de credores, não se referem somente à insolvência duradoura ou definitiva, e por vezes aludem a simples dificuldades. A esse propósito, tem-se o caso das sociedades de seguros que são dissolvidas por ato administrativo(Decreto-lei nº 2.063, de 7 de março de 1940, artigo 139, c), se estiverem em má situação financeira, ou praticarem atos opostos aos seus fins ou nocivos ao bem público, infringirem qualquer dispositivo que estabeleça a pena de cassação de autorização para funcionamento. A insolvência, aqui lembrada, traz um dever da autoridade administrativa para decretar a liquidação(artigo 140).

Há ainda nessa seara, a liquidação coativa, que provier do Banco Central do Brasil(Lei 4.595, artigo 8º), de ofício, em hipóteses previstas na Lei nº 6.024, de 13 de março de 1.974, artigo 15).

Pelo Decreto-lei nº 73, de 21 de novembro de 1966, artigo 90,  a autorização para funcionar que tem as sociedades de capitalização pode ser cassada se estão “em má situação financeira”.

Insolvente é o que não solve. Alude à omissão concreta acontecida quanto ao pagamento. O que não pode pagar, diz-se que está em situação ou estado de insolvência, mas já se prevê que não possa pagar, o que não poderá pagar, ou que não poderia pagar. Para Pontes de Miranda(obra citada, pág. 32), rigorosamente há insolvabilidade. O devedor não pode pagar, o que não quer dizer que, à época do vencimento, ou quando lhe for exigida a prestação, não  se dê o adimplemento(por exemplo, terceiro pague o débito).

Todavia, quando se fala de insolvência é do estado de insolvabilidade que mais frequentemente se cogita, como detalhou Pontes de Miranda. A razão está em que se tem a crise da empresa como determinadora dos inadimplementos e a crise preexiste a esses.

A insolvência é estado do devedor que não adimple, não solve, porém ou não solve ou revela má-fé ou não poder solver.

A insolvência não é de, modo nenhum, caso de força maior, mesmo se foram fatos de força maior que a causaram. O inadimplemento que a falência suscitava é o inadimplemento como qualquer outro, embora resulte da impossibilidade de satisfação de todos os credores.

 O dispositivo constante do artigo 1.483 do Código Civil de 2002 foi revogado pela Lei 13.105, de 2015.

O artigo 283 do Código Civil de 2002, assim prevê:

“O devedor que satisfez a dívida por inteiro tem direito a exigir de cada um dos co-devedores a sua quota, dividindo-se igualmente por todos a do insolvente, se o houver, presumindo-se iguais, no débito, as partes de todos os co-devedores.”

Assim prevê o artigo 828 do Código Civil de 2002 quando se fala em benefício de ordem com relação devedor falido ou insolvente determinava:

Art. 828. Não aproveita este benefício ao fiador:

O artigo 333, I, do Código Civil de 2002 determinava que:

“no caso de falência do devedor, ou de concurso de credores; II - se os bens, hipotecados ou empenhados, forem penhorados em execução por outro credor; III - se cessarem, ou se se tornarem insuficientes, as garantias do débito, fidejussórias, ou reais, e o devedor, intimado, se negar a reforçá-las.’

Tem-se do artigo 955 do Código Civil:

Art. 955. Procede-se à declaração de insolvência toda vez que as dívidas excedam à importância dos bens do devedor.

É nulo o pacto pelo qual o credor promete não pedir a decretação da abertura da falência do devedor, como ensinou Renzo Provinciali(Manuale di Diritto Fallimentare, 2ª edição, 146).

Sempre que o passivo excede o ativo é de determinar-se mandamentalmente, com a declaração de insolvência, a abertura do concurso de credores.

O plano de recuperação judicial não se aplica aos créditos tributários, do que se chama na doutrina de credores não concursais, da legislação do trabalho, de acidentes do trabalho e a credores proprietários fiduciários de bens móveis ou imóveis, entre outras espécies.

É conhecida a distinção estabelecida por autores italianos entre credores concursais e credores concorrentes, como se vê da lição de Provinciali. os primeiros são todos aqueles sujeitos aos efeitos da sentença que declarou aberto o concurso; os segundos apenas os que nele se habilitaram. Não sendo concursal poderia a Fazenda Pública habilitar seu crédito. Para Fábio Comparato(Ensaios e pareceres de direito empresarial, 1978,  pág. 431), sob o império do Decreto-lei 7.661/45, a Fazenda do Estado, verificando qualquer das hipóteses previstas no artigo 2º daquele diploma normativo possuía legitimação processual para requerer a falência. Bastaria exibir o título de crédito ainda não vencido.

Determinava o artigo 750, I, do CPC de 1973:

Art. 750. Presume-se a insolvência quando: I –o devedor não possuir outros bens livres e desembaraçados para nomear à penhora.

Dizia-se que a insolvência tinha de ser provada, tocando a quem pedia a admissão do concurso o ônus de afirmar e o de provar que ocorreu o requisito do artigo 748 do Código revogado.

Nesse sentido aduziu Pontes de Miranda(obra citada, pág. 41):

“Quem alega que já está correndo contra o devedor execução forçada, satisfaz o ônus de afirmar, mas precisa provar isso: se junta certidão ou outra prova, inclusive sentença declaratória de existência de relação processual de execução contra o devedor, satisfaz o ônus de provar o requisito do artigo 748. Assim, Alfredo Buzaid(Do concurso de credores, 224 s) confundiu ônus de provar o alegado(= excederem as dívidas à importância dos bens do devedor ou já está correndo execução forçada contra o devedor ou terem sido arrestados bens do devedor, com fundamento no art. 813, I, II e III) e a eficácia da presunção iuris tantum. A presunção de insolvência só se cria se foi junta à petição a prova de já estar correndo contra o devedor execução forçada ou terem sido arrestados bens do devedor, com fundamento no art. 813, I, II e III.”

A matéria de concurso de credores continua a ser regida pelo CPC de 1973, diante do que se vê no CPC de 2015:

Art. 1.052. Até a edição de lei específica, as execuções contra devedor insolvente, em curso ou que venham a ser propostas, permanecem reguladas pelo Livro II, Título IV, da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973.

II  - O CONCURSO DE CREDORES

2. 1 - Histórico 

Durante o período clássico aplicou-se o processo per formulas, segundo salientou Ebert Chamoun(Instituições de direito romano, 1968, pág. 123).

A sentença, no processo per formulas, fazia da ação uma coisa julgada. Aliás, o efeito extintivo da ação decorria da litis contestatio.

Se o réu, apesar de condenado, não pagasse o montante da condenação, o autor promovia a sua execução, intentando contra ele a actio iudicati que substitui, no processo formular, a manus iniectio do processo das ações da lei. O processo executivo iniciava-se com  a in ius vacatio. O autor comparece com o réu perante o magistrado e pede-lhe que autorize a execução. Se o réu reconhece que sofrera a condenação  o magistrado autoriza o autor a levá-lo ao cárcere privado em que permanece até resgatar o débito. Podia, porém, o réu sustentar a nulidade da sentença alegando  a incompetência do juiz, o não preenchimento das formalidades ou então que já havia pago(revocatio in duplum).

Podia acontecer que a execução não fosse possível em virtude da revelia ou ausência do réu e da falta de um representante. Nesse caso, o pretor autoriza, como medida preliminar, a fim de evitar a dilapidação dos bens, o seu apoderamento pelo credor(missio in possessionem, missio in bona). O curador bonorum os administrava. Da imissão dos bens fazia o autor a publicidade  para que os demais credores pudessem valer os seus direitos ou alguém intercedesse em favor do devedor. Passados 30 dias, se o devedor fosse vivo, e 15 dias se fosse morto sem herdeiros, os credores escolhiam por ordem do pretor, um síndico definitivo, o magister bonorum. Depois de 10(dez)  ou  5(cinco) dias, respecivamente, o magister bonorum procedia a venda conjunta dos bens em leilão público. O adquirente(bonorum emptor) se sub-rogava nos direitos e deveres do devedor, podendo intentar ações por meio de fórmulas especiais como transposição do nome e sujeitando-se às ações dos credores pela parte dos débitos não paga.

Uma lex Iulia de bonis cedendis concedia, no entanto, ao devedor um meio de se substrair à execução pessoal e à infâmia oriunda da bonorum venditio; o abandono dos bens aos credores(cessio bonorum).

No principio do Império introduziu-se um processo executivo que iria suplantar a venditio  bonorum no Baixo Império: a distractio bonorum. Em vez da venda total dos bens, um curator procede a vendas sucessivas e particulares apenas na medida em que for necessário ao pagamento dos credores. Isso funcionava, a princípio, apenas para os senadores, evitando que incorressem em infâmia.

Por sua vez, as partes principais da fórmula eram essas: a demonstratio, a intentio, a adiudicatio e a condemnatio. A demonstratio indicava os fatos que ocasionavam o processo; A intentio revelava a pretensão do autor; a adiudicatio era uma pequena frase que autorizava o juiz  a atribuir às partes a propriedade de certas coisas ou de partes delas, como o caso de ações de divisão da herança; a condemnatio dava ao juiz o poder de absolver ou condenar.

Para os romanos valia o princípio prior tempore potior iure. Prefere-se o direito daquele que tenha penhora anterior. Assim passou ao velho direito português, à luz das Ordenações Afonsinas, Liv. 3º, Título 97, pr. E § § 1 -6, Manuelinas( livro 3º, Título 74, § 2º, tit. 91, § 1º). Em Portugal, a Lei de 22 de dezembro de 1761(livro 3º, § 13) suprimiu referências entre os credores quirografários com fundamento na ordem das respectivas penhoras e estabeleceu o principio par condictio creditorum. Lei posterior, de 20 de junho de 1774, restituiu esse principio anterior para os credores quirógrafos portadores de escritura.

Com a independência, foi editado o Regulamento nº 737, de 1850, que proclamou o principio da par condictio creditorum. O Código Civil de 1916 o enunciou,  no artigo 1.556, ao declarar que “não havendo título legal à preferência, terão os credores igual direito sobre os bens do devedor comum”. O princípio diz respeito às relações dos credores entre si, e pressupõe a insolvabilidade do devedor comum, à luz do déficit patrimonial. Se os bens do devedor não bastam para a satisfação integral dos credores, importa reparti-los proporcionalmente ente os credores, atendas as preferências, como ditava o artigo 1.554 do Código Civil de 1916.

2.2 - A execução coletiva

Assim se dizia:

Art. 1.554. Procede-se ao concurso de credores, toda vez que as dívidas excedam à importância dos bens do devedor.

A matéria hoje é ditada pelo Código Civil de 2002;

Art. 955. Procede-se à declaração de insolvência toda vez que as dívidas excedam à importância dos bens do devedor.

O Código Civil de 2002 ainda determina quanto a concurso de credores:

Art. 956. A discussão entre os credores pode versar quer sobre a preferência entre eles disputada, quer sobre a nulidade, simulação, fraude, ou falsidade das dívidas e contratos. Art. 957. Não havendo título legal à preferência, terão os credores igual direito sobre os bens do devedor comum.

Com o Código de processo civil de 1939, o concurso de credores era considerado um incidente de execução. Levava-se em conta credores portadores do título executivo judicial e extrajudicial. Por sinal, desde o direito germânico medieval, os negócios entre particulares poderiam conduzir diretamente à execução forçada, sem prévia cognição. Na Espanha, o “juicio sumario executivo” teve início, em Sevilha, em 1.360. Entretanto, em Portugal, só em 1876, foram introduzidos títulos executivos extrajudiciais.

Sob a inspiração de Alfredo Buzaid, a par das conclusões do seu “Concurso de Credores”, o Código de 1973 veio instaurar execução coletiva contra devedor insolvente, destinada ao devedor não comerciante. Vigora ainda o princípio da par condicio creditorum, segundo o qual a importância correspondente ao produto da execução será distribuída entre os credores na proporção dos seus créditos, salvo nas preferências dos credores privilegiados e com garantia real.

Perante o Código de Processo Civil, que, diante de dispositivo já traçado no CPC de 2015, instaura-se com o pedido de declaração de insolvência, a primeira etapa, num processo que é de natureza cognitiva. Caso declarada a insolvência, desenvolvem-se atos executórios.

Necessário existirem as chamadas condições da ação, na linha traçada por Liebman, lembrando que, no antigo direito falimentar bastava a impontualidade, lembrando-se  o Decreto nº 917, de 1890, onde se exigia o estado de insolvência.

Quanto a legitimidade, por força do artigo 753 daquele diploma legal tem-se:

Art. 753. A declaração de insolvência pode ser requerida:

- por qualquer credor quirografário;

II - pelo devedor;

III - pelo inventariante do espólio do devedor.

Aplica-se o artigo 761 do CPC de 1973:

Art. 761. Na sentença, que declarar a insolvência, o juiz:

I - nomeará, dentre os maiores credores, um administrador da massa;

II - mandará expedir edital, convocando os credores para que apresentem, no prazo de 20 (vinte) dias, a declaração do crédito, acompanhada do respectivo título.

Art. 762. Ao juízo da insolvência concorrerão todos os credores do devedor comum.

§ 1o As execuções movidas por credores individuais serão remetidas ao juízo da insolvência.

§ 2o Havendo, em alguma execução, dia designado para a praça ou o leilão, far-se-á a arrematação, entrando para a massa o produto dos bens.

Pede-se a declaração de insolvência com o objetivo de proceder-se a execução universal. Abre-se assim uma fase preliminar, destinada a verificar a situação econômica do devedor com  o intuito de provar-se a sua insolvência. Essa fase, no entender de Barbosa Moreira, é de  natureza cognitiva, como já revelado, sendo aplicáveis as regras do processo de conhecimento. Se reconhecida, judicialmente, a insolvência, passa-se à execução chamada de coletiva.

Quanto à verificação dos créditos tem-se:

Art. 768. Findo o prazo, a que se refere o no II do art. 761, o escrivão, dentro de 5 (cinco) dias, ordenará todas as declarações, autuando cada uma com o seu respectivo título. Em seguida intimará, por edital, todos os credores para, no prazo de 20 (vinte) dias, que Ihes é comum, alegarem as suas preferências, bem como a nulidade, simulação, fraude, ou falsidade de dívidas e contratos.

Parágrafo único. No prazo, a que se refere este artigo, o devedor poderá impugnar quaisquer créditos.

Art. 769. Não havendo impugnações, o escrivão remeterá os autos ao contador, que organizará o quadro geral dos credores, observando, quanto à classificação dos créditos e dos títulos legais de preferência, o que dispõe a lei civil.

Parágrafo único. Se concorrerem aos bens apenas credores quirografários, o contador organizará o quadro, relacionando-os em ordem alfabética.

Art. 770. Se, quando for organizado o quadro geral dos credores, os bens da massa já tiverem sido alienados, o contador indicará a percentagem, que caberá a cada credor no rateio.

Art. 771. Ouvidos todos os interessados, no prazo de 10 (dez) dias, sobre o quadro geral dos credores, o juiz proferirá sentença.

Art. 772. Havendo impugnação pelo credor ou pelo devedor, o juiz deferirá, quando necessário, a produção de provas e em seguida proferirá sentença.

§ 1o Se for necessária prova oral, o juiz designará audiência de instrução e julgamento.

§ 2o Transitada em julgado a sentença, observar-se-á o que dispõem os três artigos antecedentes.

Art. 773. Se os bens não foram alienados antes da organização do quadro geral, o juiz determinará a alienação em praça ou em leilão, destinando-se o produto ao pagamento dos credores.

Credores chamantes são os credores estantes, ou penhorantes, que propõem, a ação declarativa de insolvência, e o credor que se apresentou, sponte sua, pedindo, explícita ou implicitamente, a declaraçao de insolvência e a abertura do concurso de credores. Credores chamados são todos o que ainda não estão na relação juridica processual de execução e a ela são trazidos incluídos, hoje, os próprios chamantes.

Se o credor não foi o penhorante ou co-penhorante, ou se o foi, tem de declarar o seu crédito, conforme a espécie de concurso de credores, ou se foi o devedor que suscitou a declaração de insolvência e a aberura do concurso de credores, iimplicitamente pediu a sua admissão ao concurso de credores, como devedor, ou se ainda não foi aberto, a abertura do concurso de credores e a sua admissão. Para isso, como explicou Pontes de Miranda(obra citada, § 3.229, pág. 148), se os credores forem chamados à comparência e não se habilitam a tempo ficam de fora(Código de processo civil de 1973, artigo 784). Não se trata de simples aviso ou de comunicação de conhecimento. Há provocatio, sempre, para que os credores, que não estão pela admissão dos apresentados, impugnem os créditos provocatio ad agendum. Mais do que provocatio ad probandum.

Uma vez que ainda não há credor penhorante com título executivo, não é o caso de aplicação do artigo 754 do CPC de 1973.

Se a abertura de concurso de credores já se estabeleceu com a constrição executiva e a presença de credor(credor estante) que pediu a abertura, os outros são convidados.

Se o concurso de credores é só entre credores que obtiveram a constrição executiva, a citação destes é convocatória, e não só provocatoria.

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Chama-se concurso de credores indivíduo ao concurso de credores que o proprio devedor, ainda não chamado à execução forçada. AInda não houve penhora, ou outra medida de finalidade executiva, e o devedor individualmente propõe a declaração da insolvência. Não se provocam os credores, convocam-se.

Sendo assim, ensinou Pontes de Miranda(obra citada, § 3.229, pág. 150), "posto que, na prática se empregue a expressão "credores concorrentes", como oposta a "credor penhorante", ou "credor estante", o credor penhorante, ou credor estante, também é credor concorrente, desde o momento em que se abre o concurso de credores. O respeito integral da legislação brasileira ao princípio da par condicio creditorum, se não há privilégio estabelecido, excepcionalmente, em lei, afastou-a do tipo germano-austríaco, com o princípio prior tempore potior iure(Ordenação Processual Civil alemã, § 804 Lei alemã de Distribuição Civil, § 11, Ordenação austríaca de Execução, § 135, 256, 257 e 300). A melhor solução é a da par condicio creditorum". Se não se trata de concurso de credores, mas sim de pluralidade de penhoras, o Código de Processo Civil de 1.973, artigo 613, afastou-se no Código de Processo Civil de 1.939, artigo 947, e acolheu o prior tempore potior iure.

Ensinou Pontes de Miranda(Comentários ao Código de Processo Civil, t. IX/302, 1976, in RePro 22/267): "O credor que obteve garantia hipotecaria para o seu crédito tem duas ações inconfundíveis: a ação pessoal para satisfação do crédito pessoal, que pode ser executiva (e é possível que o seja) se a lei fez do titulo extrajudicial, que se alega, titulo executivo, e a ação real, pela qual se pede o importe da hipoteca, com os interesses. A ação pessoal, se executiva, vai sobre todos os bens do devedor, ao passo que a ação real só apanha o bem gravado. A ação pessoal dirige-se contra o devedor, que pode não ser o proprietário do bem gravado; a ação real dirige-se contra o proprietário, o possuidor em nome próprio e contra todos que possam obstar à extração do valor do bem gravado, para se satisfazer a hipoteca.Lembre-se que o artigo 754 do CPC de 1973 limitou o concurso de credores aos credores com título de dívida certa e liquida, judicial ou extrajudicial(artigo 586). No direito falencial, todos os devedores devem apresentar as declarações e documentos dos seus créditos. A liquidez e a certeza dizem respeito ao pressuposto do crédito.

O direito de requerer a insolvência não abrange os credores com garantia real, mas aproveitará a Fazenda.

 O fato de se admitirem ao concurso de credores alguns credores, ou algum credor, por nao, ter havido impugnação, ou a sentença a ter julgado improcedente, é de haver credor, ou credores protestantes, que ainda não foram admitidos, torna realmente complexo o conteúdo de sentença que julga o concurso de credores(artigo 772 do CPC de 1973).

O juiz da sentença tem poder para apreciar:

a) a impugnação por inexistência, nulidade ou ineficácia do negócio jurídico de que teria a divida, que ja fora, ex hypothesi, admitida;

b) a inexistencia da dívida a que se atribua outra fonte;

c) os protestos que tenham sido feitos sem tempo para o juiz ter admitido ao concurso de credores os credores protestantes;

d) os embargos de devedor que não tenham sido julgados na ação executiva, ou nas ações executivas de titulos extrajudiciais, de que proveio penhora, ou de que provieram as penhoras;

e) os embargos de devedor, na ação executiva ou nas ações executórias de títulos judiciais;

f) as impugnações por nulidade ou anulabilidade oriundas de simulação ou fraude contra credores;

g) as alegações de preferência e as impugnações a elas;

h) o que o devedor poderia ter alegado em contestação ou em embargos do devedor.

Ha uma pluralidade de sentenças envolvendo pedidos cumulados. Os recursos são sobre cada uma decisão, ou sobre parte ou partes de cada uma, ou cumulutivamente sobre duas ou mais. O trânsito em julgado é de cada decisão, ou parte da decisão, de que não se recorreu, ou de que não há outro recurso para se interpor.

Para Pontes de Miranda(obra citada, § 3.230, pág. 156) a sentença favorável no concurso de credores é executiva Ainda para Pontes de Miranda, a heterogeneidade das questões que ela decide não permite que se determine, para todos os casos, o peso de eficácia declarativa, constitutiva ou declaratoria que a enchem. .

2. 3 - O privilégio 

Estar-se-ia diante de um privilégio, que, na lição de Lafayette Rodrigues Pereira(Direito das Cousas, 2ª edição, pág. 650) não é propriamente um direito, mas uma qualidade que adjetiva o direito pessoal de crédito e consiste na preferência de pagamento em relação a outros credores. A preferência constante no artigo 186 do CTN consubstancia um privilégio.

O privilégio cola-se ao crédito. Se o crédito deixou de existir, ou por ter havido adimplemento pelo devedor, ou por outrem, ou por outra causa de extinção do crédito( como se vê, por exemplo, no caso de assunção da dívida alheia), o privilégio deixa de existir. Só há privilégio se há crédito. 

Se o adimplemento é parcial, persiste o privilégio especial, que é indivisível(o principio da indivisibilidade do privilégio). 

Se em vez da extinção do privilégio por adimplemento, há sub-rogação pessoal legal, ou sub-rogação pessoal negocial ou judicial(ou cessão de crédito com notificação do devedor, se o privilégio não se liga a pessoa do credor), o privilégio continua a marcar o patrimônio do devedor, quer seja geral quer especial o privilégio. 

A simples oblação oral não extingue o privilégio. 

A confusão não se opera em prejuízo dos terceiros que adquiriram direitos reais sobre o crédito, ou se houve constrição do crédito. 

Se o devedor prestou para solver, sem ser com o que devia, ou se o adimplemento havia de consistir em prestação de coisa, e ocorre evicção, os direitos reais de garantia e os privilégios aparecem, porque não se haviam, em virtude da sentença, extinguido, salvo se os titulares eram terceiros. 

Se houve cessão de crédito, extinção do crédito não houve, mas transferência, e o que importa é saber-se se a razão do privilégio era qualidade do crédito, ou da pessoa. Se era qualidade da pessoa, extingue-se o privilégio. 

Se houve assunção de dívida alheia, o assuntor tem de sofrer a eficácia dos direitos reais limitados e dos privilégios, se os credores acordaram na assunção, se não acordaram, como explicou Pontes de Miranda(obra citada, § 3.252, pág. 241), tudo se passa como se a dívida não tivesse sido assumida por outrem. Pensa-se o mesmo quanto às fusões de sociedade, uma vez que há sucessão nos créditos e nas dívidas, como afirmou Giuseppe Ferri(La fusione delle società commerciali, 288).

A compensação uma vez alegada, opera de tal forma que o crédito se extingue. Leve-se em conta que compensação que não se alegou nao se operou. O crédito compensável persiste, como é, e não conforme a regra jurídica excepcional do artigo 1.251 do Código Civil italiano, que suscitava graves dúvidas, como acentuou Pontes de Miranda, quanto a ignorância de se ser credor. No direito brasileiro, o devedor, que é credor privilegiado, pode deixar de alegar compensação e exercer a sua pretensão, com o privilégio, contra os demais credores. 

O privilégio, qualidade do crédito, só é renunciável se não está fundado em lei protetiva. Em alguns casos, a renúncia, devido à ratio legis, seria ilegal, outras vezes, imoral. Antes de se declarar o crédito, o privilégio é irrenunciavel, porque se trataria de renúncia prévia.

Ensinou Pontes de Miranda(obra citada, § 3.253, pág. 243) que encerrado o concurso de credores, quer civil ou falencial, subsistem - no plano do direito material - como crédito, o que não foi solvido concursalmente. Se outro concurso de credores se abre, tem o credor o mesmo privilégio, que era o seu, ou outro, que nova lei haja estabelecido, salvo se foi ab-rogada ou derrogada a lei que o privilegiara. 

A preclusão não é  renúncia. Como ensinou Pontes de Miranda(obra citada, pág. 243), tudo se passa no plano do direito processual. Uma vez que o credor exercera a pretensão a tutela juridica tinha de aludir ao privilégio do seu crédito, alega-lo; se o não fez, dá-se, processualmente, a preclusão. Se não pode ser satisfeito, integralmente, o crédito, o restante é privilegiado, enquanto a lei mantem a regra jurídica privilegiante.

Prosseguiu Pontes de Miranda(obra citada, pág. 243) por dizer que `"é possivel que a nossa lei faça privilegiado o crédito que não o era e não foi satisfeito, ou, só em parte; ou que faça geral o privilégio que era especial, ou especial o privilégio que era geral."

2. 4 - A Fazenda Pública e o concurso de credores 

Já reportado que a Fazenda Pública não é credor concursal. Esse credor é todo aquele sujeito aos efeitos da sentença que declarou aberto o concurso. Será credor concorrencial. Aliás, a pendência do executivo fiscal não impede que se abra o concurso de credores, nem o inventário. A matéria já estava disposta no artigo 45, I, f, do Decreto-lei nº 960, de 1938. Se o juízo concursal ou do inventário não atende ao que reclama a Fazenda Pública, em se tratando de dívida requerida nos artigos 1º e 2º, § § 1º e 2º da Lei 6.830/80), pode a Fazenda Pública prosseguir no executivo fiscal. Já decidiu o STF, em julgamento em 11 de julho de 1.926, AJ V/303, 2 de abril de 1.932, que pode intentá-lo contra a massa concursal. Já se entendeu que se, ao ser decretada a falência, ou o concurso de credores, já estava pendente executivo fiscal, prossegue esse até que se solva a dívida do Estado(STF, 31 de julho de 1.918), se admitido o processo executivo fiscal. Se há concurso de credores ou inventário e a Fazenda Pública não pede ou não obtém que se satisfaça o seu crédito, isso não o dispensa do executivo fiscal, se é o caso(STF, 17 de agosto de 1939, AJ 13/325).

2. 5 - A conduta do devedor e os embargos 

O credor ao propor a ação de insolvência assume o ônus de prova do fato alegado contra o credor, devendo exigir-se cautela, sob pena de reparação por responsabilidade civil trazida ao devedor, por quebra do crédito.

Diversas poderão ser as condutas do devedor:

a)      O devedor que citado paga, elide a execução;

b)      O devedor silencia, quando, então fica em revelia ou reconhece o pedido, que não se confunde com uma confissão. Esta diz respeito a fatos, aquele ao direito e passa por homologação;

c)       Formula embargos. São eles, na visão de Frederico Marques e Moacyr Amaral Santos, ação constitutiva à semelhança na execução proposta pelo Código de Processo Civil de 1973 contra devedor solvente.

2. 6 - Os embargos de terceiro

Fala-se com relação aos embargos de terceiro na execução coletiva. 

Explicou Pontes de Miranda(obra citada, § 1.231) que a omissão da lei processual civil de 1.939 quanto aos embargos de terceiro na execução forçada coletiva era apenas aparente. 

Trata-se a ação de embargos de terceiro de ação mandamental negativa 

O terceiro pode invadir, ou atacar, ou contrariar eficácia da relação jurídica processual estabelecida entre o autor e o réu. 

Assim dirá o embargante: a) para afirmar que lhe pertence a coisa ou direito sobre que versa a demanda; para afirmar que é o legitimado ativo(o autor) ou o legitimado passivo(o réu) na relação ou um dos legitimados; ou c) para excluir a coisa que foi submetida a constrição estatal, em virtude do estabelecimento de alguma relação jurídica processual em que não é ele parte. 

Tem-se embargos de terceiro por ofensa à posse e ao direito, se o ato do juiz provocou constrição judicial. Ensinou Pontes de Miranda(obra citada, § 3.232, pág. 164), que a alusão à posse, de per si, atende à  tradição do nosso direito, que a recebeu, provavelmente no século XIV, como acentuou Manuel Mendes de Castro(Practica Lusitana, I, 164), citando pós-glosadores.

Quanto aos "direitos" que não eram o de domínio sem posse, ainda decisão do Senado português, em 1.614, repeliu embargos de terceiro, mas isso porque ainda não se revelara o principio da coextensividade da constrição e da embargabilidade por terceiro; se o juiz arrestou, sequestrou, penhorou, ou por outro modo prendeu bens(no mais vasto sentido) de outrem, o terceiro ofendido pode embargar o ato. Admitiu-se, mesmo ao embargante, alegar a prescrição da pretensão do executado quanto ao bem objeto da prenda judicial(Manuel Mendes de Castro, Practica Lusitana, 109). 

Registre-se que a ação de embargos de terceiro ou acaba por sentença da repulsa, ou pela sentença de acolhimento, que é preponderantemente mandamental. 

LIpari, ao contrário(Cateri e pressupporti dell'opposizione di terzo, Rivista III, parte I, 29) a admitia com sentença de carater declaratório. 

Em 1946, M. T. Zanzucchi(Diritto processuale civile, 3ª - 4ª edição, pág. 343) classificou a Oppossizione di terzi, como ação de declaração negativa.

Para Pontes de Miranda(obra citada, § 3.234, pág. 174), à base da legitimação ativa dos embargos de terceiro está toda a teoria dos limites subjetivos da eficácia dos atos jurisdicionais e não só da coisa julgada material. 

2. 7 - A insolvência real ou presumida e os efeitos da instauração do concurso 

Volto à questão da insolvência. 

O pressuposto processual da competência na ação de execução por devedor insolvente  é atendido pelo domicílio do devedor.

A insolvência a ser apurada é a real ou presumida. Presumida quando o devedor não possuir outros bens livres e desembaraçados para nomear a penhora ou quando forem arrestados(medida cautelar) bens de sua titularidade com fundamento no artigo 813, I, II, III do CPC.  Trata-se de presunção iuris tantum, que pode ser elidida.

Quando a insolvência é requerida pelo próprio devedor, estamos diante de algo similiar a autofalência, como ditada no artigo 760, I a III. Teria natureza de procedimento de jurisdição voluntária.

Todas as execuções individuais, diante da procedência do pedido de insolvência devem ser remetidas para o juízo comum de insolvência .

A propósito tem-se:

Art. 762. Ao juízo da insolvência concorrerão todos os credores do devedor comum.

§ 1o As execuções movidas por credores individuais serão remetidas ao juízo da insolvência.

§ 2o Havendo, em alguma execução, dia designado para a praça ou o leilão, far-se-á a arrematação, entrando para a massa o produto dos bens.

São efeitos da execução:

a)      Vencimento antecipado das dívidas;

b)      Arrecadação(penhoramento em bloco dos bens do devedor) e perda automática da disposição desses bens;

c)       Execução por concurso universal dos seus credores(artigo 761 do CPC de 1973);

d)      Nomeação de administrador, entre os maiores credores;

e)      Expedição de editais, convocando os credores para se apresentarem, no prazo de 20(vinte) dias.

O pedido de insolvência deve vir instruído por título executivo, líquido, certo e exigível. O devedor, como já pronunciado, poderá se defender por embargos(ônus processual). A contestação é meio de defesa.

Por óbvio, se o devedor paga, está elidida a insolvência.

2. 8 - O administrador 

Cabe estudar a função do administrador. É ele nomeado pelo juiz dentre os maiores credores do devedor, e como o síndico, é o auxiliar do juízo. A ele cumpre arrecadar todos os bens do devedor, onde quer que estejam, requerendo as medidas judiciais necessárias, representando a massa, que é uma universalidade, promovendo a cobrança de dívidas, e alienando, em praça ou leilão, os “bens da massa’.

A arrecadação será feita, independentemente de mandado judicial, incluindo autorização para medidas judiciais necessárias(busca e apreensão, arrolamento, imissão de posse). A arrecadação será materializada nos autos por Auto de Arrecadação.

Com a convocação dos credores, forma-se, ao entender de Alfredo Buzaid, um litisconsórcio especial de natureza voluntária, não necessária, que pode ser inserido como formado por afinidade de pontos comuns de fato e de direito.

2. 9 - A classificação dos créditos 

Após a habilitação, far-se-á a classificação de créditos pelo escrivão(artigo 768, primeira parte, do CPC de 1973). Em vinte dias, os credores alegarão suas preferências bem como poderão, com o devedor, impugnar os títulos trazidos.

Havendo impugnações abrem-se incidentes processuais, que são objeto de instrução processual e sentença(artigo 771 do CPC). Haveria uma sentença para cada impugnação. Para José de Moura Rocha, a natureza dessa sentença é eminentemente executiva, admitindo os credores no produto de execução coletiva. O recurso cabível é a apelação.

Se não houver impugnação, o contador fará classificação dos créditos, na ordem alfabética dos credores quirografários. Ouvidos os credores, no prazo de 10 dias, o juiz sentenciará, cabendo apelação em ambos os efeitos.

Destaco, nesse passo, alguns trechos do Código Civil de 2002 aplicáveis:

Art. 958. Os títulos legais de preferência são os privilégios e os direitos reais. Art. 959. Conservam seus respectivos direitos os credores, hipotecários ou privilegiados: I – sobre o preço do seguro da coisa gravada com hipoteca ou privilégio, ou sobre a indenização devida, havendo responsável pela perda ou danificação da coisa; II – sobre o valor da indenização, se a coisa obrigada a hipoteca ou privilégio for desapropriada. Art. 960. Nos casos a que se refere o artigo antecedente, o devedor do seguro, ou da indenização, exonera-se pagando sem oposição dos credores hipotecários ou privilegiados. Art. 961. O crédito real prefere ao pessoal de qualquer espécie; o crédito pessoal privilegiado, ao simples; e o privilégio especial, ao geral. Art. 962. Quando concorrerem aos mesmos bens, e por título igual, dois ou mais credores da mesma classe especialmente privilegiados, haverá entre eles rateio proporcional ao valor dos respectivos créditos, se o produto não bastar para o pagamento integral de todo Art. 963. O privilégio especial só compreende os bens sujeitos, por expressa disposição de lei, ao pagamento do crédito que ele favorece; e o geral, todos os bens não sujeitos a crédito real nem a privilégio especial. Art. 964. Têm privilégio especial: I – sobre a coisa arrecadada e liquidada, o credor de custas e despesas judiciais feitas com a arrecadação e liquidação; II – sobre a coisa salvada, o credor por despesas de salvamento; III – sobre a coisa beneficiada, o credor por benfeitorias necessárias ou úteis; IV – sobre os prédios rústicos ou urbanos, fábricas, oficinas, ou quaisquer outras construções, o credor de materiais, dinheiro, ou serviços para a sua edificação, reconstrução, ou melhoramento; V – sobre os frutos agrícolas, o credor por sementes, instrumentos e serviços à cultura, ou à colheita; VI – sobre as alfaias e utensílios de uso doméstico, nos prédios rústicos ou urbanos, o credor de aluguéis, quanto às prestações do ano corrente e do anterior; VII – sobre os exemplares da obra existente na massa do editor, o autor dela, ou seus legítimos representantes, pelo crédito fundado contra aquele no contrato da edição; VIII – sobre o produto da colheita, para a qual houver concorrido com o seu trabalho, e precipuamente a quaisquer outros créditos, ainda que reais, o trabalhador agrícola, quanto à dívida dos seus salários. Art. 965. Goza de privilégio geral, na ordem seguinte, sobre os bens do devedor: I – o crédito por despesa de seu funeral, feito segundo a condição do morto e o costume do lugar; II – o crédito por custas judiciais, ou por despesas com a arrecadação e liquidação da massa; III – o crédito por despesas com o luto do cônjuge sobrevivo e dos filhos do devedor falecido, se foram moderadas; IV – o crédito por despesas com a doença de que faleceu o devedor, no semestre anterior à sua morte; V – o crédito pelos gastos necessários à mantença do devedor falecido e sua família, no trimestre anterior ao falecimento; VI – o crédito pelos impostos devidos à Fazenda Pública, no ano corrente e no anterior; VII – o crédito pelos salários dos empregados do serviço doméstico do devedor, nos seus derradeiros seis meses de vida; VIII – os demais créditos de privilégio geral.

2. 10 - Concordata suspensiva e a pensão ao devedor 

O artigo 783 do CPC de 1973 traz algo análogo à figura da concordata suspensiva que existia na antiga legislação falimentar.

Por sua vez, o artigo 785 do CPC prevê a instituição de pensão ao devedor como forma de sua sobrevivência.

Do produto da alienação dos bens arrecadados, são descontados encargos da massa. São eles as despesas processuais, dívidas fiscais, remuneração do administração, pensão do insolvente. O pagamento será feito em função de que o quadro de credores fixar em dinheiro a cada um. Observa-se que os créditos tributários exigíveis no decurso do processo de insolvência, à semelhança da falência, são encargos da massa.

Quanto ao pagamento a cada credor haverá uma decisão, de caráter interlocutório, passível de agravo de instrumento.

O artigo 784 do CPC de 1973 trata dos chamados credores retardatários como assim se vê:

Art. 784. Ao credor retardatário é assegurado o direito de disputar, por ação direta, antes do rateio final, a prelação ou a cota proporcional ao seu crédito.

Trata-se de pedido proposto contra os credores concorrentes e o devedor, objetivando o acesso ao rateio, sempre antes do rateio final.

2. 11 - A prescrição  e a sua extinção das obrigações  

O artigo 777 do CPC dispõe que a prescrição das obrigações recomeça a correr do dia em que se passa em julgado a sentença que encerra o processo de insolvência.

Haverá, para o caso, sentença que extinguirá o processo de execução coletiva. Restando saldo devedor, responderá ainda o devedor insolvente com bens que vier a adquirir.

A lei processual, na linha da antiga lei falimentar, estipula o prazo de cinco anos para a cobrança dos débitos contados do encerramento do processo de insolvência. Tal prazo é decadencial. Ultrapassando este prazo todas as obrigações do devedor são consideradas extintas. O prazo decadencial não se submete a interrupção ou suspensão. Na matéria aplica-se o artigo 778 do CPC de 1973.

Art. 778. Consideram-se extintas todas as obrigações do devedor, decorrido o prazo de 5 (cinco) anos, contados da data do encerramento do processo de insolvência.

A sentença que acolher a esse pedido terá caráter constitutivo.

2. 12 - Outra hipótese de execução de caráter concursal 

Adite-se, aqui, que também há execução de caráter concursal nas heranças, quando o inventário mostra que o ativo não dá para cobrir o passivo. Separam-se, como explicou Pontes de Miranda(obra citada, § 3..224, pág. 132), antes da partilha, bens que bastem para adimplemento das dívidas do monte. Se as dívidas não impugnadas pelos herdeiros, excederem as preferências, havendo-as, observa-se o acordo de credores da herança. Se não ocorre esse acordo, depositam-se os bens e tem de ser aberto, quando satisfeitos os pressupostos, o concurso de credores. A separação de patrimônios é feita, aí, como ensinou Pontes de Miranda, com a finalidade de satisfação oportuna dos credores.

Para Pontes de Miranda, o que acima se disse sobre a herança, também se há de entender sempre que haja de liquidar, por insolvência, ou sem ser de insolvência, algum patrimônio.

III – A NOVA LEI DE FALÊNCIAS E A RECUPERAÇÃO JUDICIAL

A nova de falências, Lei 11.101/2005, acaba com o instituto da concordata e cria a recuperação judicial e extrajudicial da empresa, mantendo-se a falência com alterações.

A recuperação judicial, artigo 47, tem por objetivo viabilizar a superação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, procurando promover a preservação da empresa.

A propósito ensinou Fábio Ulhoa Coelho(Comentários à lei de falências e de recuperação de empresas, 2018, páginas 393 e 394:

"A Lei Falimentar brasileira de 1945 resultou de anteprojeto da lavra de um grande tecnólogo, Miranda Valverde (...). Naquele tempo, os elaboradores do texto legal elegeram o comerciante individual como a figura central da disciplina jurídica. Na reforma de 2005, não houve preocupação de alterar o foco, continuando a lei a disciplinar o instituto a partir da falência do
devedor pessoa física. Isso representa uma dificuldade para o intérprete e o aplicador da Lei Falimentar. Como, na expressiva maioria das vezes, a execução concursal diz respeito a sociedade limitada ou anônima, e o texto preocupa-se mais com a falência do comerciante pessoa física, surgem mal-entendidos acerca do alcance do decreto falimentar contra os sócios da falida, principalmente no assunto relacionado aos seus bens e responsabilidades.

A falência de uma sociedade empresária projeta, claro, efeitos sobre os seus sócios. Mas não são eles os falidos e, sim, ela. Recorde-se, uma vez mais, que a falência é da pessoa jurídica, e não dos seus membros".

A falência, como se sabe, é processo de execução concursal que tem por objetivo a realização do ativo de uma sociedade para satisfação de seu passivo, ensejando, ao final do processo, a dissolução total da empresa.

Contudo, de acordo com o entendimento desta Corte Superior, a mera decretação da quebra – ao contrário do que afirmado pelo Tribunal a quo – não implica, automaticamente, a extinção da personalidade jurídica da sociedade empresária (REsp 1.372.243/SE, 1ª Seção, DJe 21/03/2014, julgado sob o rito dos recursos repetitivos).

De acordo com o disposto no art. 51 do Código Civil, apesar de o decreto judicial da quebra dar início ao processo de dissolução da sociedade, a pessoa jurídica subsiste durante todo seu processo de liquidação, sendo extinta somente quando for promovido o cancelamento de sua inscrição perante o registro próprio. Eis o conteúdo da norma mencionada:
Art. 51. Nos casos de dissolução da pessoa jurídica ou
cassada a autorização para seu funcionamento, ela subsistirá para os
fins de liquidação, até que esta se conclua.
§ 1o Far-se-á, no registro onde a pessoa jurídica estiver inscrita, a
averbação de sua dissolução.
§ 2o As disposições para a liquidação das sociedades aplicam-se,
no que couber, às demais pessoas jurídicas de direito privado.
§ 3o Encerrada a liquidação, promover-se-á o cancelamento da inscrição da pessoa jurídica.
De se registrar: admitir que a extinção da personalidade jurídica se
perfectibilize a partir do momento em que proferido o decreto falimentar
equivaleria a esvaziar o conteúdo de diversos institutos previstos na Lei 11.101/05.

Caso a pessoa jurídica não mais exista no mundo jurídico após ter sua quebra decretada, como poderia ela proceder ao levantamento da falência (providência que decorre da declaração judicial de extinção das obrigações do falido em momento anterior à sentença de encerramento do
processo) ou à sua reabilitação (situação em que se dá a reversão dos efeitos dissolutórios da falência mesmo depois de encerrado o processo falimentar)?

Ora, se ao devedor é permitido retornar à exploração da atividade empresarial, cumpridos determinados requisitos legais (arts. 158 e 159 da LFRE), em momento posterior àquele em que foi decretada sua falência, não se pode falar em extinção da personalidade jurídica.

O falido não perde a propriedade de seus bens, apenas não pode mais deles dispor e gozar, posto que, privado da sua administração, não pode mais perceber-lhes os frutos.
Tampouco existe aqui perda da capacidade jurídica. Tanto assim que pode fiscalizar a administração da falência e requerer quaisquer providências conservatórias dos bens arrecadados e o que for a bem dos seus direitos e interesses, ademais de poder intervir nas ações em que a massa seja
parte.

Cito José da Silva Pacheco(Processo de recuperação judicial, extrajudicial e falência, 2009, pág. 319: 

"Perdendo o poder de dispor de seus bens, não perde a propriedade deles. Continua com o domínio, permanecendo como proprietário, mas não pode dispor deles, ou seja, não pode aliená-los nem gravá-los."

Como dito as concordatas preventiva e suspensiva e a continuidade dos negócios do falido após a declaração de falência que eram mecanismos de recuperação judicial da empresa passam a dar lugar a um único processo, chamado de recuperação judicial que ocorre sempre antes da falência.

Surge a recuperação extrajudicial, ou seja, a tentativa do devedor resolver seus problemas com os credores sem que haja grande necessidade da intervenção judicial. Tem ela os seguintes objetivos: reorganizar a empresa que esteja passando por uma crise econômico-financeira; preservar a relação de emprego; aumentar o âmbito da negociação entre devedor e credores; abranger a maior parcela possível de credores e empregados do devedor; regular a convolação da recuperação em falência, fixar mecanismos de alteração do plano; estabelecer limites de supervisão judicial da execução do plano e regulamentar o elenco de atribuições dos órgãos administrativos dos planos de recuperação.

Para Fazzio , a recuperação judicial é uma ação constitutiva e não um contrato. Inaugura uma nova conjuntura jurídica, modificando a índole das relações entre o devedor e seus credores e assim entre ele e seus empregados. Busca-se sanear a situação gerada pela crise econômico-financeira da empresa devedora.

O Plano de recuperação judicial será apresentado pelo devedor em juízo no prazo de 60(sessenta) dias da publicação da decisão que deferir o processamento da recuperação judicial, sob pena de decretação da falência. Esse plano deverá conter a descrição  , em pormenores, do resultado da situação econômico-financeira do devedor, como a indicação dos meios de recuperação a serem adotados, detalhando os prazos e formas de pagamento dos credores. 
Tal plano pode sofrer alterações da Assembleia Geral de credores. 

Caso o plano de recuperação judicial apresentado pelo devedor seja rejeitado é permitido aos credores apresentarem plano alternativo, sendo que, se rejeitado pela Assembléia, o juiz deverá decretar a falência do devedor.

A nova lei prevê a criação de um comitê de credores que será constituído por deliberação de qualquer das classes de credores na assembleia geral e será composto de:
a) Um representante indicado pela classe de credores trabalhistas;
b) Um representante indicado pela classe de credores com direitos reais de garantia ou privilégios especiais;
c) Um representante indicado pela classe de credores quirografários e com privilégios gerais.

Na recuperação judicial e na falência, o comitê de credores poderá fiscalizar as atividades e examinar as contas do administrador, zelar pelo andamento processual, comunicar ao juiz em caso de violação dos direitos ou prejuízos aos interesses dos credores, apurar e emitir parecer sobre reclamações e requerer a convocação da assembléia geral de credores.

Caberá à Assembleia Geral de Credores deliberar na recuperação judicial pela aprovação, rejeição ou modificação do plano de recuperação judicial apresentado pelo devedor, a constituição de comitê de credores, a escolha de seus membros e sua substituição, o pedido de desistência do devedor e o nome do gestor judicial quando do afastamento do devedor ou qualquer matéria de interesse do credores.

O certo é que o plano de recuperação judicial não se aplica aos créditos tributários, do que se chama na doutrina de credores não concursais, da legislação do trabalho, de acidentes do trabalho e a credores proprietários fiduciários de bens móveis ou imóveis, entre outras espécies..

A classificação dos créditos na falência obedecerá a seguinte ordem:
a) Os créditos trabalhistas limitados a 150 salários-mínimos por credor e os decorrentes de acidente do trabalho;
b) Créditos com garantia real até o limite do valor do bem gravado;
c) Créditos tributários, independentemente de sua natureza e tempo de constituição, exceto as multas tributárias;
d) Créditos com privilégio especial como os assim definidos em outras leis civis e comerciais e os aqueles a cujos titulares a lei confira o direito de retenção sobre a coisa dada em garantia;
e) Créditos com privilégio geral, como os previstos no parágrafo único do artigo 67 da lei e os assim definidos em outras leis civis e comerciais;
f) Créditos quirografários, dentre os quais os saldos dos créditos não cobertos pelo produto da alienação dos bens vinculados ao seu pagamento e os dos créditos derivados da legislação do trabalho que excederem 150 salários mínimos;
g) As multas contratuais e as penas pecuniárias por infração das leis penais ou administrativas, inclusive as multas tributárias;
h) Créditos subordinados como os créditos dos sócios e dos administradores sem vínculo empregatício.

Lembre-se que o privilégio não é propriamente um direito, mas uma qualidade que adjetiva o direito pessoal de crédito e que consiste na preferência de pagamento em confronto com outros créditos. É a lição de Rodrigues Pereira  para quem, no campo do direito civil, filiado o nosso sistema jurídico ao direito romano, o privilégio é simples prioridade ou prelação de um direito pessoal.

Um aspecto polêmico diz respeito a questão dos créditos trabalhistas, uma vez que a lei estabelece um limite para a preferência do crédito trabalhista de até 150(cento e cinqüenta) salários mínimos. O que ultrapassar esses valores será equiparado aos créditos quirografários, que são preteridos aos créditos privilegiados, garantidos por bens imóveis e móveis e créditos tributários em geral. Cria-se uma hipótese de superioridade dos créditos de natureza salarial, no limite de 5(cinco) salários-mínimos por trabalhador que serão pagos antes de qualquer outro crédito privilegiado.

A recuperação  da micro e pequena empresa abrangerá apenas os chamados créditos quirografários, que poderão ser parcelados em até 36 meses, mas corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de 12% ao ano. A primeira parcela deve ser paga no prazo máximo de 180(cento e oitenta) dias contados da distribuição do pedido de recuperação judicial.

Por sua vez, a recuperação extrajudicial é modalidade que permite ao devedor, mediante negociação direta com seus credores, promover a sua recuperação de forma extrajudicial, levando-a a homologação judicial. É um procedimento alternativo para prevenção da quebra nas crises empresariais, que tem como peculiar a gestão privada dos acordos, com previsão de um processo na etapa judicial final, a exigência de concordância da maioria dos credores, a liberdade de conteúdo, a publicidade para terceiros interessados, a homologação judicial que lhe outorga efeitos em face de uma eventual quebra posterior. Como tal o plano de recuperação extrajudicial é instrumento que disciplina a matéria.

O devedor, que é parte legítima para a ação, deve comprovar os requisitos previstos no artigo 48 da Lei:
a) Estar em atividade há pelo menos dois anos;
b) Não ser falido.
Por sua vez, o credor poderá impugnar o plano no prazo de 30(trinta) dias contados da publicação do edital. A impugnação deverá restringir-se:
a) Não preenchimento do percentual de 3/5 de todos os créditos de cada espécie;
b) Prática de quaisquer dos fatos da falência previstos no artigo 94 da LRE;
c) Tratamento desfavorável aos credores que a ele não estejam sujeitos; 
d) Pagamento antecipado das dívidas;
e) Vício de representação dos credores que subscreveram o plano;
f) Simulação de créditos;
g) Prática de ato com intenção de prejudicar os credores;
h) Descumprimento de requisito previsto em lei.
A falência continuou como era, basicamente.
De toda sorte, são princípios que norteiam a nova lei de falências:
a) Preservação da empresa;
b) Separação do conceito empresa/empresário;
c) Recuperação das empresas e empresários recuperáveis;
d) Retirada do mercado de sociedades ou empresários não recuperáveis;
e) Segurança jurídica;
f) Proteção aos trabalhadores, na medida em que tem preferência no recebimento dos créditos da falência e da recuperação;
g) Redução do custo do crédito, fazendo com que haja preservação das garantias;
h) Celeridade processual;
i) Participação ativa dos credores;
j) Desburocratização da recuperação das microempresas;
k) Maximização do valor dos ativos do falido;
l) Rigor na punição de crimes relacionados à falência e a recuperação judicial.

Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1.639.940, entendeu que embora tenha legitimidade para requerer providências necessárias à conservação dos seus direitos, a sociedade empresarial falida não é parte legítima para interpor recurso contra decisão que decreta a indisponibilidade de bens pertencentes a seus sócios.

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento ao recurso especial de uma empresa de laticínios em processo de falência e manteve acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) que não conheceu de recurso interposto pela falida contra decisão que decretou a indisponibilidade dos bens de seus sócios.

Segundo a relatora do recurso no STJ, ministra Nancy Andrighi, por não ocupar a posição de titular das relações patrimoniais atingidas pela medida que decretou a indisponibilidade dos bens, a empresa carece de legitimidade ativa para recorrer.

No caso, observa-se do site do STJ, segundo publicação de 23 de maio do corrente ano:

A ministra Nancy Andrighi lembrou que a Lei 11.101/2005, nos dispositivos em que usa a expressão “falido”, nem sempre se refere à sociedade que teve a quebra decretada; portanto, é preciso ter cuidado ao interpretar suas normas.

A ministra citou entendimento da Primeira Seção ao julgar um recurso repetitivo (REsp 1.372.243 – Tema 702), no sentido de que a mera decretação da quebra não implica, automaticamente, a extinção da personalidade jurídica da sociedade.

Entendimento oposto, segundo a ministra, inviabilizaria os procedimentos empresariais após o levantamento da falência ou a reabilitação.

“Se ao devedor é permitido retornar à exploração da atividade empresarial, cumpridos determinados requisitos legais (artigos 158 e 159 da Lei de Falência), em momento posterior àquele em que foi decretada sua falência, não se pode falar em extinção da personalidade jurídica”, concluiu Nancy Andrighi.

De acordo com a relatora, pelo menos em tese, a pessoa jurídica falida possui legitimidade para manifestar irresignação contra decisões preferidas pelo juízo falimentar. Apesar disso, a ministra lembrou que a situação analisada possui uma particularidade que impede o provimento do recurso.

“Considerando, pois, que a devedora não ocupa a posição de titular das relações patrimoniais atingidas pela medida imposta – uma vez que os bens sujeitos a seus efeitos não integram a esfera jurídica da empresa, mas sim a das pessoas físicas que compõem seu quadro social –, o que se infere é que a sociedade empresária de fato carecia, à vista dessa especificidade, de legitimidade para manifestar a irresignação em exame.”

Por fim, cabe aduzir que os estudiosos analisam mudanças quanto ao instituto da recuperação judicial, segundo o que se lê do Estadão, em sua edição 25 de maio do corrente ano. 

A ideia é que a empresa possa ganhar tempo para apresentar um plano de reestruturação e renegociar seus débitos com credores. Em geral, quando chega nesse ponto, a companhia já está com pouco dinheiro em caixa e com problemas para tocar suas atividades. Por isso, se o processo levar muito tempo, a empresa pode acabar quebrando antes de concluir a recuperação judicial, dizem especialistas.

O pacote de medidas em gestação pelo Judiciário tenta dar uma resposta à morosidade do processo. Liderado pelo ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Luis Felipe Salomão, o grupo criado no âmbito do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) vai propor, entre outras medidas, a criação de varas regionais especializadas para processar as recuperações judiciais.

Nessas varas, o tempo médio até a aprovação do plano de recuperação é de 407 dias, ainda longe dos 180 dias previstos na legislação, mas menor que os 567 dias verificados em médias nas varas comuns, segundo estudo realizado pela Associação Brasileira de Jurimetria e pelo Núcleo de Estudos de Processos de Insolvência da PUC-SP. A taxa de aprovação dos planos de recuperação também é maior quando eles são analisados nas especializadas: é de 81%, frente à taxa de 71,3% nas comuns.

 

 

 

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

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