A Ética tem sentidos variados, de ethos (costumes, valores, propósitos) à Ciência da Moral, mas também enquanto politicidade (propósito da vida pública), intencionalidade do Político (série histórica das instituições políticas), sociabilidade (níveis de interação social), e é este conjunto que nos permite avaliar um sentido para a Ética na Política. Aqui entendida a Política enquanto revigoramento do espaço público: a Polis redescoberta na era em que a cidadania democrática se efetiva no Estado Constitucional: o século XXI.
E é este endereçamento ao moderno, à sua organização e organicidade – como conjunto complexo de direitos – que designaremos como Ética Constitucional. Uma Ética político-jurídica em que a conceituação fundamental inclui a Ideia de Constituição a ser requerida, discutida, preservada, ampliada como fórum democrático (humanizador) e como espaço público em que o cidadão ativo é requerente e autor dos direitos fundamentais da cidadania.
Por isso, nesta junção entre o cidadão ativo (o intérprete legítimo do “fazer-se política” que há na Constituição) e a Política, enquanto momento privilegiado de manifestação do próprio Espírito da Constituição (a partir de seu preâmbulo: Vontade “da” Constituição) e da Vontade “de” Constituição – abrigada na soberania popular, participante ativa do Princípio do Não-Retrocesso Civilizatório –, surge e se aprofunda a aposta humanitária (libertária) da Constituição como Carta Política.
Simplesmente porque não há sociabilidade sem a politização (intencionalidade) do Direito que transpira do requerimento societário da Constituição, aquele cursor e vetor de humanização das instituições – sangue e “suor histórico” da Liberdade Negativa aplicada ao Poder Político – capaz de libertar a Humanidade da opressão nebulosa, da ignorância jurídica, da incapacidade política, do imobilismo social, da crença fantástica, das ideologias que se opõe à lógica formal e ao conhecimento científico acumulado, da indiferença ao Outro.
Sem que seja preservado este Espírito da Constituição (preambular, como Vontade “da” Constituição), dirigente da Vontade “de” Constituição, restam a apatia e a servidão voluntária – sem requisição explícita, mas aceita e interiorizada acriticamente, ou dirigida de fora para dentro: como amontoado de falácias (mentiras) político-jurídicas –, como flagrantes do típico cidadão do sofá adorador de mitologias do poder monocrático, cesarista, fascista e negador ou violador contínuo da própria Constituição.
Desse modo, sem esta Vontade “de” Constituição – construção cotidiana, no espaço público e privado, derivada da Lei Maior como reserva dos direitos fundamentais da cidadania – nega-se, diuturnamente a capacidade humana de se humanizar na Política. Aí já não vigoram mais o Princípio Democrático, a Processo Civilizatório, a democracia, o conjunto complexo dos direitos humanos. O que também serve como antiética, antitética da cidadania humanizadora, abatendo-se ainda mais a Carta Política. E com este desfecho, planejado ou requerido, subsume-se o humano do Direito e da Política. Porém, o que faria revigorar nosso intuito e nossos instrumentos de afirmação humana? Uma Educação Política capaz de gerar, fomentar, preservar a Ética Política injetora da Vontade de Constituição.
Além disso, e se ainda fosse preciso especificar mais uma vez, somente tal aposta numa Educação Política (libertária) geradora da Vontade de Constituição teria efeito vinculante entre a autonomia (oposta ao automatismo) e o “fazer-se em política” que sensibiliza, mobiliza e conscientiza o cidadão ativo a fim de cumprir sua missão, seu dever público de agir, em prol de si mesmo e das gerações futuras. Esta também é uma convergência entre Ética Constitucional e Educação para a Constituição.
Vinício Carrilho Martinez (Pós-Doutor em Ciência Política e em Direito)
Professor Associado II da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar
Departamento de Educação- Ded/CECH
Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade/PPGCTS